Exclusivo: Há “cerco informativo” em números da repressão no Chile

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Colégio Médico admite cerceamento de dados que minimizam realidade da repressão de Estado. GGN em parceria com Agência 4V e jornais lançam Mapa da Violência

Observadores de entidades de Direitos Humanos fiscalizam atuação policial e são atingidos por gás lacrimogêneo – Foto: Victor Saavedra/Carta Maior

De Santiago, Chile

Jornal GGN – Os números oficiais dão conta de 1.132 feridos por balas, balas de borracha, armas de fogo e perda de visão, 3.535 pessoas presas, 76 acusações de tortura e 18 de violência sexual pela ação das forças de Segurança nos protestos do Chile. Mas denúncias divulgadas nas redes sociais, em vídeos, jornais e rádios comunitários apurados revelam que os números são ainda maiores. Em entrevista exclusiva ao GGN, a presidente do Colégio Médico de Chile, Izkia Siches Pasten, admitiu que os dados estavam sendo minimizados e que houve o cerceamento destas informações.

“Nos primeiros dias, tivemos um cerco informativo, vivemos problemas para poder quantificar e suspeitamos de que se estava minimizando a quantidade de feridos”, admitiu a presidente da instituição que representa, protege e fiscaliza, por lei, os profissionais da saúde no país.

Ao GGN, Izkia disse que o Colégio Médico está acompanhando “as denúncias de violações a direitos, torturas e feridos pelas forças de segurança durante os protestos, nos diferentes centros assistenciais do país”. “Recebemos uma centena de feridos de diversas gravidades, temos registros de falecidos, assim como em estados graves, como perda de visão, tanto pelas balas, por disparos de arma e balas de borracha, pelo qual gerou a preocupação de todo o nosso Colégio.”

Diante da gravidade destes registros, o Colégio iniciou uma campanha para que os próprios profissionais da saúde, feridos e torturados denunciem diretamente à entidade, que repassa estes dados ao Instituto Nacional de Direitos Humanos do país, o INDH.

“Queremos dar todas as facilidades para quem sofreu derrames, torturas, agressões por parte das forças do Estado, que possam fazer suas denúncias e tomar as ações legais que correspondam. Também já pedimos alguns recursos de proteção para poder tirar as balas de borracha, principalmente no que já gerou, assim como a proteção particular de grupos mais vulneráveis, como crianças e adolescentes”, disse.

Sem citar diretamente a responsabilidade do governo de Sebastián Piñera na omissão e falta de fiscalização destes registros, que diminuem os dados reais relatados de vítimas da repressão do aparato policial no país nos últimos dias, Izkia Siches citou como exemplo a atuação de um diretor de hospital de urgências, a ex-Posta Central, em Santiago, que proibiu a entrada de observadores do Instituto Nacional de Direitos Humanos (INDH) para constatar os feridos ingressados.

A entidade teve que recorrer à Justiça para obter do Sétimo Tribunal de Garantia de Santiago uma permissão de ingresso ao local, e que ainda assim foram proibidos de acessar o hospital. Em um único dia, o hospital recebeu 6 feridos graves, um deles com trauma no tórax por projétil, outra pessoa que perdeu a visão do olho esquerdo e feridos na zona abdominal.

“O caso mais dramático ocorreu na Posta Central, aonde o diretor da Posta deu a ordem de não deixar ingressar ao INDH, o qual foi denunciado pelo INDH, pelo Colégio Médico e, até o momento, exigimos a demissão do diretor, devido à gravidade dos fatos. Da mesma forma, tivemos um registro paralelo, fomos apresentar às duas Câmaras Legislativas, de Deputados e Senado, e estivemos trabalhando ativamente para poder fazer estes informes de vulneração de direitos ao longo de todo o país e o uso desproporcional da força por parte das forças policiais”, pontuou a presidente do Colégio.

Nas ruas, a população acusa o presidente da República pelas mortes, feridos e violações, ao determinar o Estado de Exceção, autorizar o uso da força repressiva e impedir ou dificultar a divulgação destes dados. Além dos coletados pelo INDH, atualizados dia a dia, jornais comunitários e as redes sociais vêm desempenhando um papel paralelo de denúncias, por meio de fotos e vídeos, que não são contabilizados pelas autoridades do governo.

É para cumprir este objetivo que será lançado, nesta semana, o Mapa da Violência de Estado no Chile, um registro dos relatos de violência por parte da polícia chilena, militares e forças de segurança especial desde o início do Estado de Emergência. O dossiê interativo, de acesso público e que será atualizado diariamente com novas denúncias, é uma produção da agência QuatroV em parceria com o Jornal GGN, ÓperaMundi, Pressenza, TVT e El Desconcierto.

 


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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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