A destruição da ciência brasileira na era Bolsonaro, por Felipe Melo

É importante que a sociedade entenda uma universidade pública funciona com diversas fontes de recursos. Não é só o Ministério da Educação – MEC, que financia a universidade.

Foto APUFPR

A destruição da ciência brasileira na era Bolsonaro

por Felipe Melo

As Universidades Federais do Brasil estão funcionando “com a ajuda de aparelhos” nesse momento. Os cortes no custeio ameaçarão a existência física das já precárias estruturas dessas instituições. Estamos falando de cortes no custeio que dão o mínimo de funcionalidade a edifícios repletos de vazamentos, instalações elétricas obsoletas, e todos aqueles defeitos, com os quais nos acostumamos a conviver. Apesar disso, fazemos ciência e produzimos conhecimento em quantidade e qualidade jamais experimentados por este País.

É importante que a sociedade entenda uma universidade pública funciona com diversas fontes de recursos. Não é só o Ministério da Educação – MEC, que financia a universidade. O Ministério da Saúde repassa recursos aos muitos hospitais universitários, a Petrobrás mantém vários centros de pesquisa incubados nas Universidades, e claro, o Ministério da Ciência Tecnologia Inovação e Comunicações – MCTIC e as fundações estaduais (FAPs) financiam milhares de projetos de pesquisa nas Universidades. Na verdade, são esses financiamentos “externos” que compram equipamentos caros, reagentes químicos, livros para bibliotecas e até veículos para o trasporte de equipes de trabalho. A lógica é simples, as agências de fomento federais e estaduais financiam a pesquisa contando com a contrapartida das Universidades em dar as mínimas condições de trabalho como água, luz, internet, segurança e banheiros limpos. Qual Reitor pode garantir isso, agora? No futuro próximo? Qual investidor colocaria dinheiro para financiar pesquisas em Universidades que mal conseguem manter seu funcionamento básico?

O estrangulamento financeiro do CNPq e sua possível fusão com a subfinanciada Capes, principais órgãos federais de fomento à pesquisa no Brasil, somam-se aos elementos que antecedem a paralisia completa das Universidades. Sem acesso aos financiamentos, a pesquisa para, a formação de pós-graduandos é reduzida e a produtividade das universidades é afetada drasticamente. Observo o laboratório que divido com um colega aqui na UFPE e todos os equipamentos que permitem nossa pesquisa foram adquiridos com recursos “externos” como CNPq, FAPs ou instituições estrangeiras, inclusive. O carro que movimenta as equipes de campo, foi comprado e é mantido com recursos de projetos. Nossa pesquisa em ecologia é até barata se comparada com outras, mas sem esse recurso, paramos. A atmosfera das universidades está repleta de incertezas, os estudantes desestimulados e os pesquisadores ansiosos.

A construção de um sistema sólido de pós-graduação e órgãos de fomento à pesquisa só foi possível porque acadêmicos e servidores desses órgãos aturam em conjunto por décadas. São um exemplo de solidez institucional, para usar uma expressão da moda. A Capes e o CNPq sempre contaram com a contribuição crucial e gratuita dos pesquisadores brasileiros para pensar, planejar, executar, avaliar e corrigir todos os projetos que impulsionaram a ciência brasileira. Quando o governo federal apresenta projetos para as Universidades como o Future-se, cheio de promessas de modernização, mas sem a participação da comunidade acadêmica, está impondo um projeto sem a legitimidade necessária. Quando somado a isso, suspende editais do CNPq, ataca as instituições de pesquisa e retira orçamento do MEC, está comunicando que o futuro não contempla as vozes da comunidade universitária. O conhecimento popular aqui no Nordeste nomeia essa atitude de afagar com a mesma mão que apedreja como: “morde e assopra”. Não é digna de confiança. Contra esse ataque autocrático, só nos resta a resistência, a desobediência e a insurreição.

Felipe Melo – Centro de Biociências – Universidade Federal de Pernambuco

Redação

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