Ascensão e queda de Wolfgang Sauer, o mais influente CEO do país

Falecido esta semana, Wolfgang Sauer foi talvez o mais influente CEO de multinacional no Brasil durante os anos 70.

A primeira vez que o  vi foi em um evento da Volkswagem – de quem ele acabara de assumir a presidência. Deixou de lado o discurso preparado pela assessoria e falou de improviso.

Impressionava pela segurança e pelo porte e pelo olhar atilado, com olhos azuis que se tornaram.

Sua carreira ficou à altura da estreia: durante os anos 70 foi talvez o mais influente CEO de multinacional estrangeira no Brasil. Participou dos grandes episódios do período e nas negociações com o novo sindicalismo que avançava e na interlocução com o governo.

A última vez que vi Sauer foi em um jantar em São Paulo, alguns anos atrás. A voz estava firme, estava conservado, mas os olhos marejados. A intenção do jantar foi entender o que se passou no Brasilinvest, o banco de negócios pioneiro do empresário Mário Garnero, que acabou naufragando no início da redemocratização e marcou o fim da era Sauer na indústria automobilística.

O cativante Garnero

Garnero foi um líder estudantil eficaz, quando presidente do DCE da PUC-SP organizador de eventos memoráveis sobre temas nacionais. que lhe permitiram os primeiros contatos com o mundo político pré-64.

Depois, casou-se com uma herdeira do poderoso grupo Monteiro Aranha, que possuía 20% do capital da recem-instalada Volks do Brasil. Nos anos 70, assumiu cargo na Volks, como representante do grupo.

Lá, tornou-se amigo de Sauer e também das novas lideranças sindicais que surgiam no ABC.

No auge do chamado “Brasil Grande” montou um congresso em Salzburg, Alemanha, para onde convergiu a nata do capitalismo mundial da época. Do encontro surgiu a ideia do banco de investimento, com participação de grandes multinacionais, incumbido de preparar projetos para investimentos externos no país.

Sauer apoiou a ideia desde o primeiro momento, Seu prestígio internacional assegurou ao recém criado Brasilinvest a adesão de inúmeras multinacionais de primeira linha, de diversos países. Foi uma constelação como jamais se viu outra no país, com 80 empresas de 16 países. 

Sauer tornou-se membro do Conselho do banco, ao lado de outros empresários influentes, como Mauro Salles, publicitária, e Hélio Smidt, presidente da Varig, na época maior companhia aérea da América Latina.

O fim do mito Garnero

O mito Garnero acabou nos anos 80.

Imaginoso, bem relacionado, com ótima visào de mundo mas sem a visão de negócios dos grandes banqueiros, e apoiado na lógica dos “campeões nacionais”, Garnero conduziu uma operação complicada para ampliar seu controle sobre o banco. 

O Brasilinvest emprestava para um conjunto de holdings de nomes africanos, controladas por ele próprio. Aí, na condição de presidente do banco, ele convocava os acionistas para aumentos de capital. E definia prazos incompatíveis com a lentidão do processo de decisão das grandes multinacionais.

A operação garantiu o controle quase total sobre o banco, mas também sua descapitalização, que tornou-se maior quando se meteu em aventuras com usinas de álcool na Bahia e acabou quebrando a cara. 

A descapitalização levou o grupo a entrar em crise.

Poderia ter se amparado no governo Figueiredo, que lhe devia favores.

No período em que Figueiredo esteve internado em Cleveland, para operar do coração, armou-se uma conspiração civilista no país, tentando colocar o vice presidente Aureliano Chaves na presidência.

Essa operação deu-se entre os líderes empresariais reunidos pelo jornal Gazeta Mercantil. Participaram dela desde o empresário Abilio Diniz até economistas, como Luiz Gonzaga Belluzzo e João Manuel Cardoso de Mello. Seria o caminho mais rápido para abreviar a sucessão para um civil.

Garnero foi a Cleveland e alertou Figueiredo, que abortou o movimento.

Mas não conquistou sua gratidão.

Pouco tempo antes, o estouro do grupo Capemi – registrado magistralmente pelo então jovem jornalista José Carlos de Assis, na Folha – ajudara a corroer ainda mais a legitimidade do governo Figueiredo. Agora a corrupção chegava ao próprio Montepio da Família Militar.

Quando Tancredo foi eleito, por via indireta, Figueiredo viu a maneira de dar o troco. Um dos membros do Conselho da Brasilinvest era o próprio genro de Tancredo, Aécio Cunha, pai de Aécio Neves. Outros três eram dos mais influentes empresários brasileiros: Smidt, Sauer e Mauro Salles.

 

Proibiu, então, o Ministro do Planejamento Delfim Netto de qualquer ajuda e deixou o pepino para o governo Tancredo e para o novo Ministro da Fazenda Francisco Dornelles, com o aviso irônico: esse aqui é a Capemi de vocês.

Percebendo a armadilha, Tancredo ordenou a Dornelles que agisse com o máximo rigor e sem nenhuma condescendência.

Até hoje Garnero acha que Dornelles foi movido por vingança, devido a uma disputa feminina/ O que estava em jogo era a afirmação da Nova República.

Ali acabou o reinado de Garnero, que foi depenado pelos novos vitoriosos. A NEC, empresa da qual era sócio, foi transferida para Roberto Marinho, em uma manobra com nenhuma sutileza: Antonio Carlos Magalhães suspendeu os pagamentos da Telebras para a empresa e avisou os sócios japoneses que só retomaria quando o controle passasse para Roberto Marinho. Passaram o controle e, em contrapartida, ACM conseguiu ser a afiliada da Globo na Bahia.

A quebra da Brasilinvest levou junto os três conselheiros. Sauer teve todos seus bens bloqueados e viu terminar sua carreira de CEO mais prestigiado do país.

Décadas depois, o homem de ferro da VW era capaz de ir às lágrimas, ao relembrar o episódio.

Luis Nassif

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