Bruno Lima Rocha
Bruno Lima Rocha Beaklini é jornalista formado pela UFRJ, doutor e mestre em ciência política pela UFRGS, professor de relações internacionais. Editor do portal Estratégia & Análise (no ar desde setembro 2005), comentarista de portais nacionais e internacionais, produtor de canal estrangeiro e editor do Radiojornal dos Trabalhadores.
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Moro condena Lula, a disputa pela agenda pré-2018 e o múltiplo conflito, por Bruno Lima Rocha

Múltiplos conflitos em ambos campos da política brasileira pós-golpe

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Foto: Ricardo Stuckert

Por Bruno Rocha Lima

Introdução deste cenário complexo

O relatório na CCJ terminou reprovado por 40 a 25, com o governo emplacando o substitutivo por placar de 41 a 24. Considerando que o Jaburu trocou 20 membros ao longo da montagem da Comissão para apreciar a denúncia, então está parelha a coisa em plenário. Assim, durante o curto recesso do Congresso nesta segunda quinzena de julho, observamos as manobras de aproximação e afastamento entre Michel Temer e o deputado federal Rodrigo Maia (DEM/RJ). Simultaneamente, o racha da direita aumenta, com a base de Temer apontando as baterias contra a Globo e apoiando, tacitamente, a correta ofensiva da Record. No caminho inverso, o ex-secretário de Segurança de Quércia e Fleury Filho, é o alvo permanente da emissora líder. As razões – ou as possíveis motivações – constam de tese desenvolvida por Luis Nassif, a qual este analista corrobora. O alvo simultâneo do telejornalismo em rede nacional, aborda tanto o ex-presidente Lula e a condenação sem provas cabais por Sérgio Moro, como termina fazendo discurso de apoio às leis regressivas e retirada de direitos através da contrarreforma ou restauração burguesa levadas a cabo no Brasil pós-golpe. São rodadas múltiplas de um cenário que ultrapassa o binarismo.

Moro deu um nó na política nacional

No dia de julho de 2017, o país assistiu a já esperada condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O feito veio de Curitiba e pode ser inserido na guerra jurídico-política midiática instaurada no Brasil através da Operação Lava-Jato. Sérgio Moro é um magistrado de primeira instância e se revelou o senhor do tempo. No momento perfeito – maquiavelicamente perfeito como este analista afirmou nos instantes após a sentença – condena o ex-presidente Lula em uma sentença de 238 páginas. Logo, uma peça jurídica desta envergadura, não foi feita às pressas, pela lógica isso seria impossível. Quando a sentença foi preparada, quando a mesma foi concluída? Quanto tempo as páginas ficaram na gaveta (linguagem figurada antes que me chamem de antiquado) antes de seguir o caminho processual? Vamos supor que foi tudo coincidência – supondo com vontade de suposição para não arriscar uma ilação que venha a me processar – logo, foi uma combinação perfeita, embora probabilisticamente improvável. Sendo ou não um “acaso”, o momento preciso levou Moro para o epicentro da política nacional. Novamente.

Um dia após o esquartejamento dos direitos do mundo do trabalho (o óbio foi assinado pelo Senado em 11 de julho e sancionado na íntegra pelo presidente ilegítimo Michel Temer no dia seguinte), simultaneamente a longa sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara cujo relator tem vínculos familiares históricos com as Organizações Globo, o juiz que representa a mentalidade da UDN do Paraná e o emprego de Lawfare no Brasil, condena o fiador do pacto de classes. De imediato, pela afirmação acima, a bandeira de defesa incondicional dos direitos conquistados – essa unitária das esquerdas e centro-esquerdas – se vê contra a parede. Em 1954, o varguismo hegemonizava o imaginário popular. No século XXI, o lulismo o substitui.

Lula é a representação do modelo de crescimento com distribuição de renda sem mudança na correlação de poder e força na sociedade. Logo, é o único que poderia “pacificar” o país, especialmente na liderança do bloco de interesses populares, mesmo que sob a condução ex-reformista e social-democrata. Assim, através da condução política de seu partido e com a brilhante defesa de seus advogados, o calendário eleitoral de 2018 se impõe –  ou vem tentando ser imposto – sobre as demais pautas.  

Por obviedade, observamos a indignação com pesos distintos. A defesa de Lula mobiliza mais suas bases sociais do que a defesa do direito coletivo. Ao afirmar que uma eleição presidencial sem a possibilidade de Luiz Inácio concorrer é uma eleição ilegítima, seus apoiadores têm razão. Se todas as esperanças forem colocadas no pleito presidencial do ano que vem, como lutar para garantir o que resta – como a Previdência em seu regime geral – sem reproduzir o reboquismo que tanto mal já fez ao povo em momentos anteriores. Vale observar momentos de nossa história política assim como de um país hermano.

Cada vez mais observo analogias com o interregno de democracia liberal limitada do Brasil entre 1945 e 1964, ou o período da Argentina após a derrubada de Perón, em 1955. No país vizinho, o peronismo era proibido de concorrer após sua derrocada (com a “revolução” Libertadora dos militares gorilas, em setembro de 1955) e os mandatos presidenciais nunca terminavam. Nem por isso houve fechamento de entidades de base ou sindicais ligadas ao Justicialismo. Nem no regime militar inaugurado em junho de 1966 com o general Onganía como seu primeiro presidente. A repressão generalizada foi decorrência também da guerra civil peronista, entre 1972-1976, concluindo já na ditadura genocida de Videla e a Junta Militar (1976-1983). Com a licença da comparação histórica, entendo que vivemos momentos de democracia liberal contida, limitada, cujo Poder Moderador – não sei por quanto tempo – é o aparelho Judiciário (em franca disputa interna, tanto de controle como de doutrina).

Ao condenar Lula no epicentro do terremoto político e social do país, Moro deu um nó na política nacional. Com isso escanteou ainda mais a esquerda restante – eleitoral ou não – e coloca o reboquismo como a bandeira a ser debatida ou derrotada no embate – saudável e não sectário – para com o bloco da centro-esquerda. O momento realmente é muito difícil.

Jogos simultâneos e a tarefa mais urgente

A prepotência dos paladinos de toga é tamanha que, de forma astuta, a defesa do presidente – perfeita na sua argumentação – colocou Temer e Lula como alvos do arbítrio. A defesa do residente no Jaburu aponta o inimigo comum, o MPF – Força Tarefa de Curitiba – tendo Lula como alvo; e a PGR com Janot à frente, tendo como alvo ao ex-vice de Dilma, Michel Temer. Reconheço o talento do advogado, mas repudio a comparação. Mesmo entendendo a necessidade do Fora Temer, até frear momentaneamente o golpe parlamentar-institucional – taticamente e interromper a cessação de direitos, taticamente também – vejo que o defensor Antônio Cláudio Mariz faz a manobra perfeita. Traz para o seu argumento o Judiciário X o MPF, e entra na guerra da doutrina Romano-Germânica X o Anglo-saxão e a cultura punitiva e negocial. A argumentação de Mariz é direta, mas sem memória. Seu cliente usou e abusou desta para derrubar Dilma e agora se apavora porque Janot quer lhe pegar também. A crítica aos grupos de mídia também acerta no alvo, mas obviamente fora de lugar, no simples uso do oportunismo.

O país está na grelha e a massa vai sendo incinerada ainda em fogo alto. Temos uma coleção de ataques de todas as dimensões: há subordinação geopolítica – não mais projeção geoestratégica – risco de massificação dos interesses externos e o reboquismo que acua a esquerda restante diante da cruzada da UDN contra Lula. Os tempos são duros, está difícil, mas entendo que é preciso fortalecer o que existe à esquerda do lulismo, preferencialmente passando distante dos arranjos pré-eleitorais. Não tem sentido algum, agora, publicamente, ficar se batendo com a social-democracia (não que não mereça, ou ainda o stalinismo restante), mas temos de nos concentrar no que é central. Se o líder carismático é chave para os partidos de centro-esquerda apoiadores do governo deposto, a perda de direitos e a resistência para retomar ou perder menos é central para quem luta socialmente.

A condenação de Sérgio Moro foi de um tempo perfeito, cronometrada, no meio da votação da CCJ, logo após a perda de direitos duramente conquistados após mais de 40 anos de ilegalidade (1889-1932). É assim mesmo, quem sabe controlar a agenda de seus tempos e processos se antecipa na luta de classes e popular. Vamos como sempre, paciência histórica, convicção ideológica, lealdade para com a maioria e trabalho de inserção com debate e difusão ininterruptos.

Temos muito a fazer, incluindo redescobrir o nós. Se a social-democracia, os liberais-democratas e os stalinistas querem reconquistar o centro da política, tudo bem. Esta é sua coerência interna. E a coerência interna das esquerdas, eleitorais ou não? Por aí seguimos no debate.

Bruno Lima Rocha é professor de ciência política e de relações internacionais

(www.estrategiaeanalise.com.br / estrategiaeanaliseblog.com / [email protected] para E-mail e Facebook) 

Bruno Lima Rocha

Bruno Lima Rocha Beaklini é jornalista formado pela UFRJ, doutor e mestre em ciência política pela UFRGS, professor de relações internacionais. Editor do portal Estratégia & Análise (no ar desde setembro 2005), comentarista de portais nacionais e internacionais, produtor de canal estrangeiro e editor do Radiojornal dos Trabalhadores.

5 Comentários

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  1. Os inimigos de Lula se arrependerão de bloquearem seus bens .

    DO LIMÃO, UMA LIMONADA !!

    Que tal, além de uma campanha arrecadatória em favor de Lula, para repor o que a bandidagem acaba de lhe furtar, organizarem uma campanha “Lula, Receba o Amigo” ?

    Explico :

    Que todas as associações comunitárias, estudantis, de trabalhadores etc… organizem em suas sedes, um espaço adequado para acolher o nosso querido Lula e sua assessoria indispensável, por uma semana (uma semana apenas, para conseguir visitar todo o Brasil) enquanto durar o bloqueio dos bens imóveis ?

    E mesmo depois de desbloqueada, todos os imóveis terão que passar por um processo de descontaminação, pois é possível que bandidagem contamine com variados venenos (até radioativo) tudo que o Lula possa tocar .

    Além é claro da desmontagem do aparato eletrônico para arapongagem nos imóveis para bisbilhotar o maior líder político das américas .

    Já imaginaram, Lula passar uma semana num acampamento do MST, noutra semana na sede do sindicato dos bancários, sindicato dos metalúrgicos, na sede da associação de moradores da comunidade x ou y, na sede da UNE etc etc etc.. ?

     

  2. Moro – Maior cabo eleitoral

    Moro – Maior cabo eleitoral do LULA, nem a desconstrução global foi capaz de destruir…

    Por um motivo simples: As teses do moro e equipe da lava-jato não resistem ao binômio “inteligência + isenção”, pois estas duas coisas NÃO ANDAM JUNTAS quando a coisa se refere a LULA e ao PT!

    E os seguidores dele, consequentemente têm deficit na percepção destas duas coisas de forma SIMULTÂNEAS por motivos múltiplos que vão desde a ignorância, desinformação, preconceito e outros motivos sem perder a possibilidade de serem pessoas mesquinhas!

    Ou inteligência ou isenção – uma sacrifica a outra e nunca juntas.

    E convenhamos, ele usa uma apelação midiática – quase psicologia infantil, com conotação pessoal – já que ninguém consegue ser maior do que é – por isso ter um inimigo mesquinho é ter a certeza que ele partirá para a depreciação, como buscando o efeito contrário de crescimento pessoal em relação ao outro, ou seja – eu cresço quando você diminui – isso ele buscou fazer ao comparar LULA a Cunha – é para criar desprezo, ignominia, tornar o LULA abjeto em relação a ele.

    Olha onde estou e olha onde estão LULA e Cunha!

    A história de cada um diz o que cada um pode fazer: O LULA mostrou o que pode fazer e ele também, ele foi o juiz do banestado…

  3. Projeto de ditadura do Judiciário prestes a ser enterrado:

    Globo vs. Temer: o exemplo mais ilustrativo da tragédia brasileira

    Por Romulus

    A Globo nunca ficou do lado perdedor…

    Assim, em constatando a derrota final dos Procuradores, não hesitará 2 segundos antes de jogar o PGR Rodrigo Janot e o MPF ao mar…

    À Globo, no curto prazo, basta que siga a Lava a Jato de ~Curitiba~…

    (que visa exclusivamente a Lula e ao PT!)

    É verdade que o “passo maior que as pernas” – a guerra total contra ~toda~ a classe política tocada pela Lava a Jato de ~Brasília~ – animou a Globo (e a Finança) num primeiro momento…

    Afinal, a implantação da “Noocracia (escamoteada!)/ “‘Democracia’ à iraniana” no Brasil – seu projeto de longo prazo – estava a apenas um passo…

    Mas aí…

    Chegou o Ortega y Gasset e estragou a “festa”:

     

    “Entre o ser e o crer que já se é…

    … vai a distância entre o sublime e o ridículo”

     

    – Certo, Globo/ MPF/ Janot??

     

    LEIA MAIS »

    http://bit.ly/GLOBOxTEMER

     

     

  4. Não sei,mas observo nos
    Não sei,mas observo nos textos do bom Professor Bruno Lima Rocha,uma melhor condição de se fazer valer o poder da síntese.A impressão que tenho,reside na falta de uma prescisao mais adequada na elaboração dos seus textos,a começar pela extensão deles.

    1. Extensão???

      2,5 linha contra a boa análise!
      A síntese melhor que a extensão!
      Nas redes há ‘textões’ maiores
      De menor pertinência…
      Laconismo não é mérito!
      Fique no twitter ou HAICAI. 

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