A análise da falta de recursos em Ciência Tecnologia e Educação: Contribuição para o debate com Dagnino..

O artigo de Dagnino –jornalggn.com.br/…/analise-sobre-a-reducao-de-recurso-para-ct-por-renato- dagnino–

me instiga mas também me leva a outros pensamentos que resolvi colocar em debate.

 

O empresariado brasileiro, está longe de ser da estirpe burguesa clássica. Herdeiros da escravatura, boa parte esteve sempre associada ao poder, vivendo basicamente dos investimentos do estado. Uma outra parte se tornou cada vez mais financeira, descolando sua própria riqueza do setor produtivo para o financeiro ou se tornando intermediária do capital produtivo ou financeiro externo. Jamais se propuseram a fazer uma revolução industrial, e as indústrias brasileiras, com raríssimas exceções, não possuem departamentos de pesquisa e inovação. São em geral consumidores de tecnologia e vão buscar isto no mercado externo. Quando lidam com problemas locais, fazem consultorias no Brasil ou no exterior. Existe também uma grande parte deste empresariado ligada a serviços. Como a tecnologia faz parte da vida deles apenas como consumo, abraçaram o golpe na expectativa de flexibilizar as leis do trabalho, e garantir que o grosso do investimento do estado continue em suas mãos. Obviamente também contam com um aumento de subsídios e uma fantasiosa diminuição de impostos. Recentemente foram contra uma clara simplificação de impostos, mas continuam reclamando. Quando apoiaram o golpe me parece que ciência e tecnologia foi a última coisa que lhes passou pela cabeça. Apostam na reforma da educação para melhorar a mão de obra e dar formação sub-técnica a seus sub-empregados. Os que vivem do setor produtivo parecem sequer entender as contradições entre seus interesses e os do capital financeiro e nem o que significa a entrega do país.

 

Para não ser injusto existem alguns que acreditam na tecnologia e que até investem em contactos com os centros de pesquisa estatais e da universidade. Mas me incomoda o fato de que todos consideram que isto é um dever do estado, mas todos votem para a diminuição de verbas . Então vemos hoje em dia a bancada do agronegócio que mais lucrou com o desenvolvimento de tecnologia autoctone, gerado em empresas estatais como a embrapa, ser o primeiro setor a apoiar este engessamento, do orçamento e um retorno ao latifúndio. Um engessamento que sabemos, nos condena a paralisar todo o crescimento possível em ciência e tecnologia. Outro setores onde há desenvolvimento de tecnologia e inovação, como a Petrobrás, Eletronuclear, e até mesmo a Embraer , tem genes estatais. Gostaria muito de ter números claros sobre os investimentos empresariais em contrapartida aos estatais. Isto é quantos centros de pesquisa, quantos doutores e pesquisadores estão trabalhando em departamentos de desenvolvimento. Pelo discurso da EMBRAPII, não se tem isso na nossa indústria, com raríssimas exceções. Uma das quais , a Oderbrecht, foi violentamente atingida por este terrível mar de Lama, que curiosamente todos já sabíam, mas fazem agora caras de virgens ofendidas.

 

Na realidade das universidades, conseguimos ver que a relação com as empresas é essencialmente a de consultoria. Não há relações entre departamentos de pesquisa da universidade, com departamento similares nas empresas, pois em geral elas simplesmente não os têm . O que se tem é contacto com pesquisadores que são transformado em consultores, que utilizam aparelhos caros comprados pelo estado para resolver problemas cotidianos da industria. A indústria lucra com o conhecimento dos pesquisadores e com os aparelhos financiados pelos estado. Obviamente pagam apenas uma boa gratificação aos “consultores”. Quando necessário injetam um pouco de dinheiro para a compra do material necessário para a consultoria. O deslocamento de pesquisadores para o ramo da consultoria está agora sancionada na lei de inovação e tecnologia.

 

Consultoria não é inovação não é necessariamente pesquisa e frequentemente é pura adaptação de tecnologia. O lobby das consultorias dentro do ministério de Ciência e Tecnologia e nas Universidades se tornou taõ forte que conseguiu emplacar a nova lei de Ciência e Tecnologia e Inovação, que tem como objetivo principal ceder mais facilmente os laboratórios das universidades e dos institutos de pesquisa para resolverem problemas comezinhos da indústria. A lei vai principalmente dar o mesmo status de pesquisa ao trabalho de consultoria. Observem que não estou sequer defendendo que não hajam consultorias, mas sim que sem investimento em pesquisa, a consultoria que não tem o potencial da pesquisa inovadora, pois é apenas solução de problemas imediatos pode ser apenas uma forma de empresas, usando o aparato das universidade e institutos, lucrarem mas ao mesmo tempo comprometerem a pesquisa científica e tecnológica. Com os cortes no orçamento a consultoria pode se tornar a única fonte de dinheiro e a única atividade na universidade. Isto é sem dúvida um dos objetivos, pois novas propostas de lei, vão tentar forçar a universidade a buscar na indústria parte de sua verba. A famosa lei de inovação e tecnologia veio junto com EMBRAPII que segundo Jorge Guimaraes não é estatal , é privada. Porém esta é uma afirmação duvidosa, pois o próprio Guimarães lista quase que apenas laboratórios de estatais e ou universidades ,isto é grupos de pesquisa de várias universidades federais e estatais , do Coppe, da Embrapa etc…. . Esta lei e a criação da Embrapii a partir da CAPES, é uma forma de privatizar e oficializar estas consultorias e dar liberdade para o tratamento diferenciado dos consultores dentro da universidade. Isto também demonstra o conflito de interesses no interior da comunidade dos pesquisadores e acadêmicos.

 

Sim o setor de pesquisa tanto fundamental quanto tecnológica, e tambem social é muito mais sofisticado e muito maior no Brasil de hoje, mas me parece que nosso empresariado dividido entre o financeiro e o produtivo, continuam sendo os mesmos, que ou vivem do capital financeiro e ou de sua influência no estado.

 

Quanto ao discurso de sempre de que o Brasil é pura matéria prima, não se esqueçam que boa parte dos objetivos golpistas tem a ver não apenas com o pre-sal mas principalmente com a tecnologia e o conhecimento criado pelos setores de pesquisa e desenvolvimento da Petrobrás, da Eletronuclear, assim como certos setores da Oderbrecht,( uma das poucas que tem setor de pesquisa e desenvolvimento). Numa sociedade do conhecimento, este é o valor máximo, e muito destes interesses externos se centram na possibilidade de se apropriar deste conhecimento.

 

Um outro aspecto crucial, é que no mundo de hoje, o conhecimento também foi internacionalizado ( para usar algo com conotação diferente de globalizado). Setores tanto de ciências básicas quanto de tecnologia ao invés de criar segredos, e patentes, investem na divulgação deste conhecimento, através de suas revistas e congressos, mas tudo isto é feito sabendo-se que estas corporações e ou países tem massa crítica suficiente para se apropriar deste conhecimento. A internet e os sistemas operacionais exemplificam isto. O sistema aberto é crucial para o desenvolvimento até mesmo da Microsoft e Apple, que mantem em seus quadros um corpo de pesquisadores e uma estrutura,isto é uma massa crítica, capaz de se apropriar de tudo que se faz e que se divulga na comunidade do software livre.

 

Em paises como Estados Unidos uma massa crítica tão grande ( formada por muitos imigrantes) é capaz de, ao escrutinar o que é feito no mundo, transformar até aquele conhecimento considerado o mais abstrato em algo tecnológico. O principal investimento em ciência e tecnologia no país deveria ser a criação de uma massa crítica muito maior em todas as áres do conhecimento. Quando se fala em tecnologia hoje não se trata apenas do que é restrito às áreas duras. Os conhecimentos sociais e das áreas humanas são essenciais para compreendeer a internet e ou tecnologias como o google. A informática é mais do que hardware.

 

Por tudo isto me parece que Dagnino, fala da mais valia clássica, mas acho bom avançarmos na análise para compreender melhor o papel do conhecimento e da mercadoria não material. E quanto a opção de nosso empresariado pelo golpe, e pelo arrocho da educação e na ciência e tecnologia, é uma demonstração cabal de que nossa burguesia sequer compreende o significado de educação ciência e tecnologia, e jamais deixou de ser como diz Jessé, escravocrata, ou simplesmente submissa e associada ao capital financeiro externo .

Enquanto ruralistas se vangloriam dos avanços tecnológicos e de conhecimento na agroindústria, continuam defendendo o trabalho escravo e não à reforma agrária. Não compreendem sequer de onde vem o proprio lucro. De fato, não são eles que investem em pesquisa, mas sim a consomem. Nosso empresariado repete abertamente que enquanto as coisas no estado não estiverem definidas eles tem medo de investir. Palavras curiosas para quem diz ser a favor do estado mínimo e do livre mercado. Mas há excecções é claro , o setor financeiro, continua investindo muito mais durante a crise. Mas a virtualidade deste dinheiro , embora dê lucro a muitos, perde cada vez mais a relação com a economia material. Até que outra crise nos alcance.

 

Portanto para pensarmos a nossa ciência e tecnologia devemos nos preocupar muito com a geração de um sistema e uma estrutura de conhecimento, baseado numa massa crítica, que o Brasil está longe ainda de ter, e que só o terá se reverter não apenas os investimentos em Ciencia e Tecnologia, mas principalmente na Educação. Se esta PEC, cumprir seus desígnios, e destruir a criação das novas universidades, dos novos Institutos Federais de Tecnologia, estaremos comprometendo de forma cruel a possibilidade de vir a ter esta massa crítica.

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Redação

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