“Cabeça augusta, que uma luz contorna” por Fernando Pessoa

Sugerido por Gilberto Cruvinel

 

Cabeça augusta, que uma luz contorna,
Que há entre mim e o mundo que me faz
(Porque em espinhos a auréola se torna?)
Ansiar a minha morte e a tua paz?

A tua história — Pilatos ou Caifás
Que tem? São sonhos que o narrar transtorna.
Não é esse o calvário a que te traz
Tua sina onde todo o fel se entorna.

Não. É em mim que se o Calvário ergueu.
É em meu coração abandonado
Que Ele, cabeça augusta, alto sofreu.

Quem na Cruz onde está ermo e pregado
O pregou? Foi Romano ou foi Judeu?
Bate-me o coração. Meu Deus, fui eu!

                                                             20-1-1933

 

 

Cristo carregando a cruz, Via Sacra de Congonhas

Mestre Antonio Francisco Lisboa, o “Aleijadinho”

 

 

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Fonte: Cleonice Berardinelli, “Fernando Pessoa Antologia Poética”, p.60, 1ª ed. – Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2012.

 
Redação

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