As parcerias musicais de Noel Rosa e Ismael Silva

Por Laura Macedo

Noel Rosa e Ismael Silva

Grande parte dos pesquisadores da MPB advogam que foi no tradicional bairro do Estácio de Sá (Rio de Janeiro) que o samba se modernizou, deixando de ser “amaxixado”, assumindo uma nova cadência.

Alguns dos protagonistas dessa façanha foram, entre outros, Nilton Bastos, Bide, Marçal, Osvaldo Popoula, Brancura e Ismael Silva que, em 1928, fundaria a primeira escola de samba – a “Deixa Falar”.

Dos compositores citados acima a maioria morreram jovens, exceto Bide (Alcebíades Barcelos) e Ismael Silva. Esse último desde os 22 anos revelou o dom de compor.

Na época era comum a comercialização de composições e, Ismael, emplacou a primeira venda ao cantor Francisco Alves. Era o samba “Me faz carinhos”, sua primeira composição gravada, em 1928. Ismael vibrou de satisfação ao ouvir um samba seu gravado e logo, por Francisco Alves.

“Me faz carinho” (Francisco Alves [o nome de Ismael Silva não consta no selo do disco]) # Francisco Alves. Disco Odeon (10100-B) / Matriz (1480), 1928.

Ismael Silva e Francisco Alves

A boa receptividade de – “Me faz carinho”- fez o nosso Rei da Voz fazer uma proposta mais ampla. Uma sociedade, ou seja, gravaria as músicas de Ismael como se fosse parceria dos dois. Deixou claro que Ismael seria seu fornecedor exclusivo. Ismael concordou desde que seu parceiro Nilton Bastos fosse contemplado na parceria, também.

Segundo o escritor/pesquisador Jairo Severiano tal sociedade durou sete anos, em que o compositor Ismael Silva teve cerca de sessenta músicas gravadas.

Com a morte precoce de Nilton Bastos quem entra na parceria é o então já conhecido Poeta da Vila, Noel Rosa. Como já mencionamos a comercialização de músicas não era nenhuma novidade. O poeta da Vila Isabel, que também não era virgem no ramo, viria a quitar, em sambas, um carro comprado de Francisco Alves. O que Noel Rosa não abria mão, de jeito nenhum, era o tal de acordo de exclusividade.

Segundo João Máximo e Carlos Didier a dupla Noel Rosa e Ismael Silva emplacaram 18 composições. E são essas composições que vamos destacar neste post.

“Gosto, mas não é muito” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # Francisco Alves e Bambas do Estácio. Disco Parlophon (13375-A) / Matriz (131302), dezembro de 1931. [O nome de Noel Rosa não consta no selo do disco. Almirante no livro “No tempo de Noel Rosa” atribui tal autoria].

“Adeus” (Noel Rosa/Francisco Alves/Ismael Silva) # Jonjoca/Castro Barbosa e Grupo da Guarda Velha. Disco Victor (33548-B) / Matriz (65451), abril/1932.

O samba “Adeus” foi composto em homenagem à morte de Nilton Bastos. Diz a lenda que Nilton contraiu a fortíssima tuberculose que o matou, numa chuvosa noite de serenata em que usou o paletó para não estragar o violão de Francisco Alves.

Há quem diga que o estribilho de Ismael Silva é uma homenagem ao amigo Nilton Bastos, quando da sua morte.

“Assim, sim” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # Carmen Miranda/Harry Kosarin e seus Almirantes. Disco Victor (33581-A), maio/1932. [Harry Kosarin: Maestro norte-americano, cognominado o indultor do Jazz no Brasil]

“Pra me livrar do mal” (Noel Rosa/Ismael Silva) # Francisco Alves e Gente Boa. Disco Odeon (10922-B) / Matriz (4467), junho/1932.

“Razão dá-se a quem tem” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # Francisco Alves/Mário Reis e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (10939-A) / Matriz (4472), junho/1932.

“Uma jura que fiz” (Noel Rosa/Francisco Alves/Ismael Silva) # Mário Reis e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (10928-A) / Matriz (4482), julho/1932.

“Escola de malandro” (Noel Rosa/Ismael Silva/Orlando Luiz Machado) # Noel Rosa/Ismael Silva e Batutas do Estácio. Disco Odeon (10949) / Mariz (131447), setembro de 1932. [O nome de Noel Rosa não consta no selo do disco original. Almirante em “No tempo de Noel Rosa” e “Harmonia”, jornal de modinhas de 1932, confirmam a co-autoria].

“Ando cismado” (Noel Rosa/Ismael Silva) # Francisco Alves e Gente Boa. Disco Odeon (10936-A) / Matriz (4532), outubro/1932.

“É peso” (Noel Rosa/Ismael Silva) # Francisco Alves e Gente Boa. Disco Odeon (10936-B), outubro/1932. [O nome de Noel Rosa não consta do selo do disco. A coautoria é registrada no jornal de modinhas “Harmonia”].

“Dona do lugar” (Noel Rosa/Francisco Alves/Ismael Silva) # Jonjoca/Castro Barbosa e Gente Bamba. Disco Odeon (10966-B), dezembro/1932. [O nome de Noel Rosa não consta do selo do disco e sim da partitura. O nome de Ismael Silva não consta da partitura, mas sim do selo do disco].

“Sorrindo sempre” (Noel Rosa/Lauro dos Santos [Gradim]/Ismael Silva/Francisco Alves) # João Petra de Barros e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (11031-A), maio/1933. [O nome de Noel Rosa consta da partitura. No selo do disco original aparece apenas Gradim como autor]

“Isso não se faz” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # João Petra de Barros e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (11031-B), maio/1933.

“Deus sabe o que faz” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # Jonjoca/Castro Barbosa e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (11019-A), maio/1933. [No selo do disco da gravação original aparece apenas Ismael Silva como autor. Na partitura constam os nomes de Noel, Ismael e Francisco Alves].

“Já sei que tens um novo amor” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # Jonjoca/Castro Barbosa e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (11019-B), maio/1933. [No registro da partitura constam os nomes de Noel Rosa, Ismael Silva e Francisco Alves. Curiosamente, o selo do disco da gravação original traz o nome de Carlos Martins como autor].

“Quem não quer sou eu” (Noel Rosa/Ismael Silva) # Francisco Alves e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (11057-A) / Matriz (4704), agosto/1933.

“Nunca dei a perceber” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # Francisco Alves e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (11066-A), setembro/1933. [No selo do disco original consta apenas o nome de Ismael Silva. Na partitura, os dos três].

“Não digas” (Noel Rosa/Ismael Silva/Francisco Alves) # Francisco Aves e Orquestra Copacabana. Disco Odeon (11066-B), setembro/1933. [No selo do disco original consta apenas o nome de Ismael Silva. Na partitura, os dos três].

“Boa viagem” (Noel Rosa/Ismael Silva) # Aurora Miranda e Orquestra Odeon. Disco Odeon (11187-B), dezembro/1934.

Noel Rosa e Ismael Silva produziram pérolas preciosas do cancioneiro brasileiro atraídos pela amizade, admiração recíproca e pelo talento de ambos. Quem lucrou foi a nossa Música Popular Brasileira.

************

Fontes:

– A Canção no Tempo – 85 Anos de Músicas Brasileiras, Vol 1: 1901-1957 / Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello. – São Paulo: Ed. 34, 1997.

– Coleção Folha Raízes da MPB – Ismael Silva (nº 21), 2010.

– Dicionário Houaiss Ilustrado (da) Música Popular Brasileira. Supervisão geral; Ricardo Cravo Albin. – Rio de Laneiro: Paracatu, 2006.

– Fotos montagem: Laura Macedo / Demais fotos: Acervo pessoal/Internet.

– História do Samba. Rio de Janeiro: Globo, 1997-1998. Quinzenal. 40 fasc. 40 CDs.

– Noel pela Primeira Vez – Discografia completa, de Omar Jubran. – FUNARTE, 2000.

– Noel Rosa: uma biografia. João Máximo e Carlos Didier. – Brasília: Editora Universidade de Brasília: Linha Gráfica Editora, 1990.

– Sites YouTube: Canais: “obarseular”, “rafa18154”, “Gravadora Galeão II”, “SenhorDaVoz”, “luciano hortencio”, “Guilherme Tonon”, “Nole Rosa”, “Gilberto Inácio Gonçalves”.

– Uma história da música popular brasileira – Das origens à modernidade, de Jairo Severiano. – São Paulo: Ed. 34, 2008.

Laura Macedo

8 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Nossos cancionistas

    sempre diretos, claros, explícitos, cantando como se fossem estivessem em uma conversinha trivial e básica com seus interlocutores.

    Importantíssima contribuição.

    No meu caso, então, faz voltar ao que ouvia em criança na Rádio Nacional, no Rio.

    Apenas, que agora, tenho outros registros de vida e de canções também.

    Bela contribuição, Laura.

    1. Excelente comentário

      Odonir,

      Nas palavras expressas do seu comentário senti que você o fez com o coração. E tudo que toca os nossos sentimentos é lindo e emocionante. Agradeço por registrá-lo aqui.

      Deixo para você uma foto do Ismael Silva com algumas Pastoras que acho muito bonita e significativa.

      Abraços.

       

  2. A canção no tempo

    Lindo post, Laura. A Laura é craque, mesmo! Esses dias vi o Mario Lago, numa antiga entrevista, contando causos com esse bando todo postado por você. Contava como o Francisco Alves se “achava” e uma outra vez, como fez Custodio Mesquita para Orlando Silva gravar Nada Além. Essas musicas todas nos levam para essas historias da nossa imensa MPB.

    1. Cócegas na minha alma

      Querida Maria Luisa,

      O título do seu comentário – “A Canção no Tempo” – realmente fez cócegas na minha afetividade .Adoro saber as histórias de bastidores das nossas canções. Os livros: “A Canção no Tempo – 85 anos de Músicas Brasileiras” (Volumes 1 e 2) dos pesquisadores Jairo Severano/Zuza Homem de Mello, dão conta do recado direitinho.

      Há seis anos iniciei uma série no meu Blog “Portal Luis Nassif”, batizada com o título de “A canção no tempo”. Cheguei até a edição nº51. E outras séries com outros compositores, a exemplo de Chico Buarque e Paulo César Pinheiro.

      O início da série foi com a composição “Casinha Pequenina” (modinha/autor desconhecido), 1906. Caso tenha interesse deixo o link: AQUI.

      Super beijos.

    1. Uma mão lava a outra rsrsrsrs

      Querido amigo Luciano,

      Como ré confesso vou logo avisando que estou indo “marretar” a excelente foto do Roberto Martins e Mario Rossi. Em compensação deixo outra pra você hehehhehehehe

      Grande abraço.

  3. Tudo vale a pena: a MPB não é pequena


    Acompanho as suas maratonas para realizar as pesquisas e elaborar posts, mas, convenhamos, diante de uma coletânea como essa, o mínimo que se pode dizer é: VALE A PENA.

    Eis aí mais uma razão pra você ter o blog fixo: armazena preciosidadades como essa, que a gente revisita de tempos em tempos. (Para destacar um exemplo entre tantos: o post sobre Jacob do Bandolim).

    Grande Ismael Silva! Grandes monstros da MPB!

    Beijos.

     

    1. A MPB é infinita

      Gregório,

      Quanto mais pesquiso mais encontro histórias e fatos… reveladores.

      Você sabe que faço tudo para ficar em casa, mas nem sempre é possível. Sem falar nos problemas “técnicos” do meu blog, principalmente, referentes aos áudios que utilizo. Haja paciência. Esse post mesmo há dias que iniciei e só hoje tive tempo de terminar.

      Deixo pra você vários “Beijos” (André Filho).

       

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador