A exploração da tragédia

Por alberto manoel ruschel filho

É verdade, está tudo errado.

As catástrofes naturais, ajudadas por gente que mora em lugar errado, gente que vende terreno em encostas, gente que desvia dinheiro de obras, gente que nunca saberá planejar, gente que dá alvará de construção em troca de cerveja, gente que administra o sofrimento das filas de doentes no SUS, e gente pior ainda, aquela, que vive do seu sofrimento em casa, vendo as imagens das inundações, dos destroços de casas, rostos de gente chorando e corpos embrulhados em cobertores baratos, dão mais audiência que a Copa do Mundo

Você aí sabia que quando pior a imagem, “melhor” a audiência? Você sabia que “quanto maior o seu choro, maior o nosso faturamento”, né? Então, dê um desconto. A aparência de que o mundo está no fundo do seu quintal, ou na sua área de serviço de três metros quadrados, é pura fantasia. É “técnica de comunicação” versus “venda por estímulo”. Gente é um bicho difícil de entender, no fundo, age como formiga. Reage ao feronômio de alarme, ou cheiros de dramas, da mesma forma.

HalHá algum tempo atrás, contei aqui no Blog que, quando trabalhava na TV, fui chamado de rebelde. Explico como isso começou.

Era um Globo Repórter sobre roubo de aviões.  Estávamos, o câmera e eu, em Curitiba. No portão da casa de uma senhora cujo marido, piloto, havia sido jogado de seu avião em pleno vôo.  

Por respeito ao luto dela e dos filhos, preferi não invadir seu espaço. Respeito, aqui, naquela hora, queria dizer mais que respeito, queria dizer um mínimo de humanidade. Ela contou o que queria contar. Falou dele, seu caráter, honradez, relembrava sua maneira de ser, seu companheirismo.

Além de fazer as eventuais perguntas, naquele caso, desnecessárias, eu acompanhava a gravação da imagem por um pequeno monitor que estava sobre o muro, via seu rosto em close. Mas, no momento em que passou a descrever a luta a bordo do avião, segundo havia sido informada por outro piloto que voava com o rádio aberto na mesma freqüência, começou a chorar. Calou-se e escondeu o rosto com as mãos.

Em voz baixa, ordenei ao câmera-man:  “Corta!”. E fiquei ali, olhando aquela tela, pensando no futuro da família da esposa do piloto.

Mas o câmera não cortou, De repente, sua mão entra em quadro e segurou o queixo da mulher. Até que o cafajeste foi delicado. Com jeito, e a câmera no ombro, posicionou a mulher e seu choro num “belo” contra-luz…

– Corta!! – ordenei em voz alta.

Me despedi , agradeci e entramos no carro.

No avião, de nada adiantou tentar explicar minha irritação pro sujeito. Falar de linguagens de documentário.

A história espalhou-se, passei a ser visto como “talentoso, mas rebelde…”

E o seu queixo?

Você também vai deixar que um idiota qualquer o ajeite pra melhorar o enquadramento??

Sofra, mas dê um desconto. Transformar dramas humanos em fator de culpa coletiva, não tem nada a ver com solidariedade.

Solidariedade é outra coisa. É no mínimo, esbravejar, espernear, alertando e pressionando quem de direito…e enviar pros lugares tudo que sabemos que estão necessitando.

É verdade, está tudo errado.

As catástrofes naturais, ajudadas por gente que mora em lugar errado, gente que vende terreno em encostas, gente que desvia dinheiro de obras, gente que nunca saberá planejar, gente que dá alvará de construção em troca de cerveja, gente que administra o sofrimento das filas de doentes no SUS, e gente pior ainda, aquela, que vive do seu sofrimento em casa, vendo as imagens das inundações, dos destroços de casas, rostos de gente chorando e corpos embrulhados em cobertores baratos, dão mais audiência que a Copa do Mundo

Você aí sabia que quando pior a imagem, “melhor” a audiência? Você sabia que “quanto maior o seu choro, maior o nosso faturamento”, né? Então, dê um desconto. A aparência de que o mundo está no fundo do seu quintal, ou na sua área de serviço de três metros quadrados, é pura fantasia. É “técnica de comunicação” versus “venda por estímulo”. Gente é um bicho difícil de entender, no fundo, age como formiga. Reage ao feronômio de alarme, ou cheiros de dramas, da mesma forma.

Há algum tempo atrás, contei aqui no Blog que, quando trabalhava na TV, fui chamado de rebelde. Explico como isso começou.

Era um Globo Repórter sobre roubo de aviões.  Estávamos, o câmera e eu, em Curitiba. No portão da casa de uma senhora cujo marido, piloto, havia sido jogado de seu avião em pleno vôo.  

Por respeito ao luto dela e dos filhos, preferi não invadir seu espaço. Respeito, aqui, naquela hora, queria dizer mais que respeito, queria dizer um mínimo de humanidade. Ela contou o que queria contar. Falou dele, seu caráter, honradez, relembrava sua maneira de ser, seu companheirismo.

Além de fazer as eventuais perguntas, naquele caso, desnecessárias, eu acompanhava a gravação da imagem por um pequeno monitor que estava sobre o muro, via seu rosto em close. Mas, no momento em que passou a descrever a luta a bordo do avião, segundo havia sido informada por outro piloto que voava com o rádio aberto na mesma freqüência, começou a chorar. Calou-se e escondeu o rosto com as mãos.

Em voz baixa, ordenei ao câmera-man:  “Corta!”. E fiquei ali, olhando aquela tela, pensando no futuro da família da esposa do piloto.

Mas o câmera não cortou, De repente, sua mão entra em quadro e segurou o queixo da mulher. Até que o cafajeste foi delicado. Com jeito, e a câmera no ombro, posicionou a mulher e seu choro num “belo” contra-luz…

– Corta!! – ordenei em voz alta.

Me despedi , agradeci e entramos no carro.

No avião, de nada adiantou tentar explicar minha irritação pro sujeito. Falar de linguagens de documentário.

A história espalhou-se, passei a ser visto como “talentoso, mas rebelde…”

E o seu queixo?

Você também vai deixar que um idiota qualquer o ajeite pra melhorar o enquadramento??

Sofra, mas dê um desconto. Transformar dramas humanos em fator de culpa coletiva, não tem nada a ver com solidariedade.

Solidariedade é outra coisa. É no mínimo, esbravejar, espernear, alertando e pressionando quem de direito…e enviar pros lugares tudo que sabemos que estão necessitando.

Luis Nassif

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