A responsabilidade da crise de 2008

Por Waldyr Kopezky

Comentário no post “Crise européia, mecanismos econômicos e crise política

Acho que a regra de impedimento do BCE para empresar diretamente aos BCs dos países-membros é anterior mesmo à gestão do Trichet – é norma prevista na constiuição da União Européia. E aí é mais difícil mudar, da noite para o dia. Vou procurar saber, ok?

A causa da crise é TODA do setor privado – que conseguiu repassar aos governos suas perdas avassaladoras (porque especulou por anos, via renegociação de carteiras de crédito/hipotecárias supervalorizadas e estimou seu falso crescimento num valor irreal, jamais garantido por qualquer empenho/alavancagem equivalente). E criou cenários de default estatal em muitos lugares do globo…

Vou ser um pouco mais explícito: os governos nacionais (á exceção dos EUA – que sempre tiveram déficits monstruosos bancados com a impressão de dólares a rodo) tinham, com o “estopim” (palavra sua)da crise em 2008, este dilema: ou deixavam os bancos quebrarem (default) por si mesmos, denunciando sua irresponsabilidade (mas eximindo-se de tentar qualquer ação para suportar as perdas dos clientes bancários, aplicadores ou poupadores regulares e comprometendo de vez a aura de crediilidade do setor financeiro, tido como âncora do sistema capitalista) ou então emprestavam dinheiro público para tentar um resgate dos bancos, da credibilidade do sistema financeiro como um todo e, portanto, da manutenção da normalidade da economia nacional.

Essa última medida foi a adotada, com a seguinte justificativa: resgatar os bancos seria só o começo, pois os bancos (com sua liquidez normalizada) iriam cdertamente resgatar seus clientes, refinanciando seus débitos; aí, a crise passaria como um mero “soluço” da economia e nem transações financeiras ou ou comércio (mercado interno) iriam ser reduzidas, mantendo setores produtivos, as suas empresas e empregos de sempre, graças ao volume de negócios mantido em normalidade. E o déficit orçamentário estatal a mais (fruto da absorção do rombo do setor privado) poderia ser solucionado em médio/longo prazo – a manutenção da economia e dos negócios em bons níveis garantiria o giro do dinheiro, que volta (inexoravelmente) ao Estado via tributação regular do fluxo de negócios e transações comerciais. Os papéis públicos não desvalorizariam e sua liquidez (valor de mercado) possibilitaria o esforço maior dos Estados (esta, com certeza, a maior empresa de um país) a um empenho na busca de dinheiro – tanto no sistema financeiro local quanto nas irganizações internacionais como FMI, Clube de Roma e Banco Mundial – para honrar seus compromissos.

Era um ótimo plano. Mas os bancos privados conseguiram o dinheiro que tapava seu “rombo” de caixa com os Estados sem exigências explícitas ou condicionantes de repasse obrigatório desses valores como liquidez destinada a refinaciamento dos débitos de pessoas físicas/jurídicas, todos eles clientes regulares da carteira dos bancos. Ingênuo, mas compreensível: como é que Obama ou Bernanke poderiam imaginar que uma(s) empresa(s) iria(m) agir para “matar” seu mercado, a fonte de sua lucratividade e continuidade? Jamais!!! É a negação de uma premissa basilar da nosso sociedade de mercado e da livre-concorrência, verdadeiro alicerce físico e conceitual (pois determina na população a confiabilidade necessária para uma livre outorga de sua renda e prosperidade) do que convencionou-se chamar de sistema capitalista global.

Não repassaram o dinheiro – e, se antes poder-se-ia alegar incompetência ou irresponsabilidade no “estopim” da crise, nesse momento não se pode falar nada menos do que má-fé do setor financeiro privado. E a razão para isso não é uma loucura conspiratória, não – é muito simples: refinanciar os débitos dos clientes significa um risco maior (presença de volume de inadimplência) com lucro menor, pondo o (raro) dinheiro conseguido junto aos agentes estatais sem que isso garanta expansão de mercado via novos negócios – é crescimento zero, com valor de mercado idem para estes agentes financeiros. Ademais, executar a clientela garantiu a tomada de posse de uma infinidade de novos bens aos bancos (casas, carros, terrrenos, fábricas, estoques, navios, insumos), patrimônio passível de especulação (especialmente em um ambiente recessivo e de carência de négócios produtivos). Enquanto a economia está na pior o valor desse “estoque de bens” será baixo, mas garante um número maior no balanço anual da empresa (crescimento de ativos patrimoniais) e um índice (enganoso) de expansão e lucratividade. Depois que a economia recuperar-se, seu valor aumentaria ainda mais no mercado, talvez até para os antigos patamares pré-2008. É so esperar: novas perspectivas em oportunidades de  negócio futuras – e sem compromenter um centavo do caixa recuperado. É um cenário win-win (não há como perder).

E ademais, vem com um plus: o dinheiro no caixa permite que você empreste AO GOVERNO, em taxas maiores da que você pegou emprestado (de 5% a 6%, contra 1% cobrado pelo agente estatal)  – você lucra com seu próprio cenário quasi-falimentar, sem risco ou porcentagem alguma de inadimplência – algum governo no mundo desde 2008 anunciou que deixará de pagar seus compromissos? Não! Os Estados SEMPRE precisam de dinheiro e linhas de crédito abertas, então são obrigados a se sujeitar a condições escorchantes dos agentes financeiros privados, sob pena de não ter caixa para atender às demandas públicas por investimentos, ações sociais e custos de gestão – e nenhum político pode se reeleger se for acusado de quebrar o Estado, não é mesmo?

Não se engane: os Estados nacionais não tiveram NADA que ver com a crise de 2008, em termos de rombo por má gestão ou prática temerária. Prova disso é que vários países (mesmo desenvolvidos) viveram décadas com oscilações constantes em seus fluxos de liquidez – um ano no azul, outro no vermelho – e isso jamais causou uma crise econômica no mundo. E menos ainda uma como a de 2008, pior do que a de 1929. Se há que se identificar uma responsabilidade dos Estados nacionais nessa crise, ela seria a da total falta de percepção no perigo de um processo (gradual) de desregulamentação das economias e dos fluxos de capitais (privados e migrantes), que vão e vêm nesse (novo) ambiente de economia globalizada. À miopia do Obama e do Bernanke somaram-se anos de governos (Reagan, Clinton, Bush) implementando políticas econômicas que destruíram qualquer capacidade de inferência ou mínimo controle nas ações dos players de seu mercado financeiro. Coisa que não ocorreu no Brasil, já que BB e CEF são empresas que atuam competindo no mercado com seus pares privados e pressionaram estes a uma liberação de crédito que mantivesse o aquecimento da economia – por decisão POLÍTICA do Governo Lula, que apostou em uma ação de risco maior e lucro incerto (mas não improvável) e contra toda a opinião (insidiosa, pois ensaiada com os agentes privados) de seu staff econômico encabeçado pelo Henrique Meirelles.

Tudo o mais é ilusão que obnubila (adoro essa palavra!) a realidade dos fatos. Abs.

Luis Nassif

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