Mitos sobre as cotas raciais

Por Marcelo Trindade Miterhof

1. O que a política de cotas raciais não é:

i) Uma reparação á população negra. Isso é impossível e inconcebível. Os negros de hoje não sofreram coma escravidão e os brancos de hoje não foram responsáveis por ela.

ii) Uma política de inclusão social.

2. As cotas raciais visam apenas a ser um instrumento de diversificação da elite brasileira. Em relação à inclusão social esse é um trabalho distinto, paralelo e, ainda que menos importante, também é necessário, pois o país será melhor se sua elite se reconhecer plenamente na população como um todo, o que ainda não ocorre atualmente.

3. Transformar as coras raciais em cotas sociais é um grande erro, pois:

i) os instrumentos de política social são mais numerosos e mais efetivos, a começar pelo bolsa família.

ii) em termos de inclusão social, precisamos de políticas de universalização dos serviços públicos com qualidade. Cotas sociais nas universidades seria uma forma de eximir o Estado de seu dever de prover escola básica boa: “eu (Estado) não melhoro a escola, mas dou acesso aos pobres às universidades públicas de qualidade que foram construídas para os ricos”.

4. Não podemos cair no fetiche da meritocracia. Será que é por falta de mérito que os negros são pouquíssimo representados nos cursos mais concorridos das principais universidades brasileiras?

Creio que não. A discussão do mérito é muito complexa, repleta de cumulatividades históricas, que fica difícil pensar o mérito como fruto de empenho ou talento individual. Mesmo coletivamente é difícil até pensar como as coisas poderiam ser diferentes. Por exemplo, os árabes, que tantas contribuições deram ao conhecimento humano (o zero é uma invenção arábica, sem qual a revolução digital seria impensável) fazem mil anos que pouco ou nada contribuem. No entanto, os árabes e seus descendentes que imigraram para países capitalistas ocidentais são extremamente bem sucedidos e contribuem para o desenvolvimento, vide os casos do Hospital Sírio-Libanês em São Paulo, o Steve Jobs, filho biológico de um sírio, ou vc mesmo. Se vc ou eu tivéssemos nascidos numa aldeia indígena estaríamos aqui? Mas e se determinados acontecimentos disruptivos (a invenção da pólvora ou a maquina a vapor ou filosofia grega, por exemplo) tivessem ocorridos entre os índios peruanos, como seria o mundo? Não dá para saber. Outro exemplo, na Unicamp, que era uma universidade que tinha uma política ativa de abrir cursos noturnos, cansei de ver elitismo disfarçado de “defesa da qualidade do ensino” (curso noturnos seriam piores). Portanto, a meritocracia (um dos principais argumentos contra as cotas) deve ser relativizada.

No entanto, ainda que seja verdade que os negros são menos capazes intelectualmente (sim, apesar de a inteligência ser outro fetiche moderno, isso é possível: a inteligência é algo difícil de comprar por sua subjetividade, mas pessoas e populações se diferenciam por ela), prefiro ter uma elite minimamente bem diversificada, às custas de uma discriminação positiva, do que ter um abismo racial na sociedade brasileira. A experiência americana mostra isso muito bem. Nos EUA, com todo racismo que há por lá, há uma forte elite negra. Certamente porque é um país muito mais rico. Mas eles já eram ricos quando Kennedy mandou tropas federais para garantir a entrada de dois estudantes negros na Universidade do Alabamba. De lá para cá, sem as cotas, não existiria o presidente Obama e outras preocupações raciais relevantes.

Luis Nassif

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