Sobre o financiamento de campanha e as prévias partidárias

Por Fernando Candelaria

Comentário ao post “A lentidão nas mudanças das regras eleitorais

Financiamento Público da Campanha Eleitoral

Aproveitando este dia dominical em que ainda se respira um pouco a campanha eleitoral para prefeito e dando continuidade a propostas de Reforma Política gostaria de contribuir com mais uma sobre o tema em voga: Financiamento Público de Campanha Eleitoral.

Com a finalização do processo chamado de mensalão ficou claro que as regras atuais de financiamento eleitoral estão eivadas de incentivos a práticas a vícios ou, na pior das hipóteses, a crime eleitoral. A conclusão que se chega para a regra atual é a de que a estrutura partidária só poderá funcionar para conquistar o voto do eleitor se a prática eleitoral for de imoral para criminosa – um vício ou deturpação do sistema.

Aproveito este momento para relembrar o texto anteriormente mandado em 25/03/2012, a partir do qual é importante o seu conhecimento para compreender a proposta que se apresentará. Como talvez alguns tenham apagado de seus micros, então tomei a liberdade de transcrevê-lo abaixo para uma breve leitura.

Só algumas premissas. O Partido é o elemento mais importante numa campanha eleitoral, devendo ser eliminado o componente da pessoalidade do candidato e devendo destacar a ideologia ou propostas partidárias e a efetiva participação dos seus filiados, que são os que realmente formam o Partido e não uma ou poucas pessoas.

Feitas essas considerações, passo a análise.

Sou a favor da campanha eleitoral financiada por dinheiro público, mas nos seguintes parâmetros.

Sou a favor porque a Campanha Eleitoral hoje está privatizada. Os Partidos Políticos estão a mercê dos Doadores Privados e vice versa. Essa lógica precisa acabar.

Precisamos recuperar o caráter público e democrático de uma Campanha Eleitoral.

Trata-se de um Sistema Público e como tal deve ser tratado, retirando todo e qualquer elemento privado ou de interesses individualistas, comerciais, mercadistas ou financistas.

O financiamento público deve ser feito a partir da premissa de que o Doador contribuirá para um Sistema Público e não ao Partido ou Candidato, assim, o Doador saberá que o seu dinheiro estará contribuindo para o funcionamento organizado e eficaz da máquina pública para gerir a Campanha Eleitoral, bem como saberá que os Partidos receberão o dinheiro do Poder Público para realizarem a sua campanha política e a difusão de suas idéias.

A proposta é despartidarizar o dinheiro doado.

Na regra atual, o financiamento já tem o dinheiro público envolvido quando o Tribunal Superior Eleitoral – TSE “paga”, com incentivos fiscais, às emissoras de televisão e rádio pelo espaço usado na campanha eleitoral obrigatória.

O diferencial é que fora desse espaço midiático todo o restante é financiado pelas doações privadas de campanha ao Partido ou ao Candidato ou Legenda partidária. Aqui mora o perigo para todos os lados: para o próprio candidato que fica refém do dinheiro privado para realizar a campanha, pela falta de dinheiro ou porque a fatura será cobrada, se eleito. Para o doador, que também ficará refém, caso não realize a doação, pois poderá sofrer eventuais ameaças que o candidato eleito fizer se for eleito, pois poderá impedir ou dificultar a participação do doador nas suas atividades diárias como empresa ou pessoa física, ou seja, infernizar a vida do doador. Ao Partido, que  sempre enfrentará relutância em doações e viabilizar a difusão do seu pensamento ideológico partidário. E, por fim, o Estado, aqui no seu sentido “lato”, pois mais a ele interessa que uma campanha eleitoral seja realizada de uma forma democrática, serena e que as idéias sejam repassadas para a população de forma a chegar a sua totalidade de eleitores, os quais poderão escolher entre as políticas que melhor lhe atenderão.

Muitas formas e regras foram criadas para democratizar o acesso aos recursos públicos para os Partidos, mas sempre baseados na representação partidária daqueles que foram eleitos. Se não houver qualquer eleito, alguns Partidos ficarão sempre à míngua.

Assim, o primeiro parâmetro que deve ser considerado é a de que a doação, com as suas benesses fiscais, NÃO pode ser mais direcionada a um candidato ou partido, mas sim ao Sistema que gerencia a Campanha Eleitoral, no caso do Brasil, esta atividade compete ao TSE.

Esta proposta retira todo a carga ideológica ou de pressão que o dinheiro carrega na doação ao partido ou ao candidato.

Hoje um doador pessoa física ou jurídica para não melindrar um partido ou candidato faz doações em proporções iguais ou maiores ou menores, conforme o caso, para cada força política de sua localidade (ex.: doador 1 contribui para o candidato A com $ 100 e para o candidato B com $ 100; doador 2 contribui $ 150 para o candidato A e $ 50 para o candidato B). Na hipótese proposta, os doadores 1 e 2 contribuirão com $ 400 para o Sistema, sem precisar se preocupar para quem está doando, pois a “pessoa” que receberá a doação é o Poder Público, é o Sistema Eleitoral Brasileiro, que depois repassará aos Partidos políticos, que depois repassará as suas campanhas eleitorais.

Outro exemplo de disfunção nas doações eleitorais. Se uma empresa é fornecedora ou contratada pelo Poder Público, esta não poderá doar, pois tem interesses neste ou naquele candidato ou partido, sob a lógica que esta empresa teria interesses que o seu contrato seja mantido na próxima gestão elegendo o seu candidato ou partido.

Pela regra proposta de contribuição para o Sistema, primeiro a empresa poderá realizar doações, mesmo contratada pelo Poder Público, e segundo ela estará contribuindo para um regime mais democrático de financiamento privado e descompromissado com interesses individuais numa campanha eleitoral, pois ela contribuirá ao Sistema e não a um partido ou candidato.

Creio que com este formato, o financiamento de campanhas eleitorais seria muito melhor e arregimentaria muito mais contribuintes ou doadores, pois retiraria a carga ideológica de partidos e candidatos nas doações e nortearia o caráter público da doação, a qual conferiria ao doador benesses de isenção fiscal.

Essa proposta proibiria que uma pessoa ou empresa doasse para um Partido de sua preferência? A resposta é não. Digo isso porque qualquer regra neste sentido impediria a liberdade de uma pessoa contribuir para uma agremiação específica de sua preferência, tenha ela caráter privado ou público. O viés neste caso é o de que este tipo de doador não terá qualquer benesse fiscal, muito pelo contrário, será tributado como doação de bens e direitos, incidindo neste caso o ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação, que hoje é devido aos Estados Membros da União, Territórios ou Distrito Federal. (talvez aqui devesse ser destinado à União Federal para financiamento do Sistema Eleitoral).

As doações nesta regra ficariam restritas somente ao período eleitoral ou teriam limitações de valores doados? A resposta também é não. Na medida em que a contribuição é para o Poder Público e não mais aos Partidos ou Candidatos, as doações podem acontecer diariamente por qualquer pessoa e em montantes de sua livre escolha.

Uma vez formado o “bolo” que financiará o Sistema Eleitoral é apurado o quanto tem e o quanto será distribuído aos Partidos que conseguiram vencer as Prévias Partidárias (veja texto de 25/03/2012 abaixo), cuja distribuição poderá ser feita igualitariamente a todos os Partidos ou, na menor das hipóteses, uma parte maior igualitariamente e outra menor proporcionalmente a representação nas casas legislativas. Confesso que a primeira é mais democrática para difusão das idéias, mas mais difícil de passar em uma reforma política atual, então, se caminharmos um passo de cada vez, passando pela segunda para depois chegar à primeira é satisfatório.

Aqui é preciso destacar que o “bolo” tem uma regra. Para que o Sistema Eleitoral funcione é preciso ter um orçamento mínimo ou um funcionamento mínimo, a partir do qual o Sistema funcione conforme desejado para atender o preceito de levar a democracia a todos os lares. Assim, se porventura as doações privadas não forem suficientes para cobrir o orçamento mínimo necessário para “tocar” uma campanha eleitoral, então, é admitido que o dinheiro público cubra a diferença apurada, mas até esse teto.

Distribuídas as fatias do “bolo” para cada Partido, estes terão de apresentar ao TSE os seus orçamentos e formas de gastos, relacionando as empresas e pessoas físicas que ela vier a contratar e o quanto cada uma receberá. O detalhe é que somente as empresas que estiverem previamente cadastras no TSE, ou nos TREs, através da formação de cadastros pela Lei de Licitações, é que poderão ser contratadas. Esse cadastro pode ser permanentemente atualizado para entrada e retirada de empresas. Tal medida se faz necessária exatamente porque o dinheiro que será gasto pelos Partidos Políticos tem a rubrica pública, então, só pode receber do Poder Público quem estiver em dia com as suas obrigações trabalhistas, previdenciárias e tributárias.

Acredito que esses poucos parâmetros apresentados sejam suficientes para iniciar um bom debate sobre a Reforma Política na parte da Campanha Eleitoral.

Um abraço e bom voto.

Fernando Candelaria

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Date: domingo, 25 de março de 2012 21:05

Subject: Prévias Partidárias – Obrigatoriedade

Com 52,1% (3176 votos), Serra confirmou seu favoritismo e derrotou o secretário estadual de Energia, José Aníbal, que obteve 31,2% (1902 votos). Em terceiro lugar ficou o deputado federal Ricardo Tripoli, com 16,7% (1018 votos). Ou seja, 47,9% rejeitaram o ex-governador. Dos cerca 20 mil filiados aptos a votar, 6.229 compareceram às urnas. O comparecimento não foi obrigatório.

Esta é a notícia nos sites noticiosos deste domingo 25/03/2012.

Trata-se de um dado revelador da deficiência e empobrecimento da política-partidária do brasileiro.

Vamos lá. 

Quero aproveitar este evento que pouco é noticiado ou divulgado na mídia brasileira para renovar algo que defendo já há algum tempo, ou seja, a obrigatoriedade das prévias para a escolha dos candidatos de um partido para qualquer cargo do Poder Executivo.

Funcionaria mais ou menos da seguinte maneira.

Todo partido que quiser ter um candidato para concorrer às eleições de uma vaga para o chefe do executivo TERÁ OBRIGATÓRIA E NECESSARIAMENTE que realizar prévias no seu partido, mesmo que haja um único candidato e mesmo que ele tenha sido ‘ungido’ por ‘aclamação’ entre os seus pares caciques.

Tal medida se deve ao fato de que muitas vezes os partidos escolhem os seus candidatos não a partir de uma vontade dos seus filiados, mas por vontade dos caciques ou aqueles que realmente mandam ou são donos do partido. A realização obrigatória de prévias traria ao partido mais próximo para a verdadeira expressão ou posição dos seus filiados para a vontade ou visão político-partidária que rege um partido.

Outra regra que venho defendendo há bastante tempo é a de que mesmo ocorrendo as prévias a votação tem que ser expressiva, ou seja, não podemos trabalhar como uma votação de condomínio em que a vontade dos presentes é suficiente para direcionar as regras do condomínio, mas a de que tem que ter uma presença de votantes da ordem de pelo menos de 50% mais 1 daqueles filiados aptos a votar. Se não houver a presença dessa quantidade o partido simplesmente NÃO terá candidato para aquela eleição, pois ele foi inábil em arregimentar os seus filiados em torno de suas idéias e trabalhos político-partidários, o que o descredencia e o desqualifica para colocar um candidato na rua.

Pegando a notícia acima, temos que o PSDB, na cidade de São Paulo, seu berço, possui 20 mil filiados aptos a votar, sendo que somente 6.229 compareceram para a votação das prévias, o que representa pífios 31,15% dos filiados do partido, assim o candidato escolhido na prévia foi eleito com irrisórios 15,88% da totalidade dos filiados. Na pior das comparações, 0,06% da população votante da cidade de São Paulo, da ordem de 10 milhões de eleitores.

Temos aqui, com a notícia acima, a mais nítida e clara realidade das distorções da representação político-partidária no Brasil de hoje, onde uma pessoa é colocada como candidato sem que a maioria qualificada dos filiados o tenham avalizado. Trata-se de uma deturpação democrática da mais grave que podemos visualizar nos dias atuais.

Como proposta para a reforma política que tanto se pretende hoje no Congresso Nacional trago essa idéia como uma forma de democratizar os partidos nacionais, bem como forçá-los a ter um diálogo mais contundente com os seus filiados, além do fato de que é necessário tê-los e arregimentá-los (os filiado) para os seus ideários político-partidários, tornando o brasileiro mais politizado.

É isso.

Um bom domingo.

Fernando Candelaria


Luis Nassif

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