Entrevista com Mauro Iasi (PCB), candidato à Presidência

Mauro Iasi em visita ao Assentamento Emiliano Zapata (MST), PontaGrossa/PR.

Segundo Iasi, “é necessário quebrar o enorme poder dos monopólios midiáticos”.

“A auditoria das remessas de lucros das empresas transnacionais é um primeiro passo para superar nossa subordinação internacional”, diz o presidenciável do PCB.

Especial para o Jornal GGN

Por Roberto Bitencourt da Silva (*)

O Partido Comunista Brasileiro (PCB), fundado em 1922, é a organização partidária mais antiga da história brasileira. Em grande medida, a trajetória do PCB foi marcada por uma atuação na clandestinidade. Décadas seguidas perseguido pelas forças políticas e sociais conservadoras. Nos últimos anos perdeu apelo na sociedade brasileira. Hoje tem buscado recuperar o seu espaço na vida política nacional. Contudo, o seu papel histórico na luta por direitos sociais no país é inegável, sobretudo tendo a sua mensagem libertária e igualitarista alcançado importante repercussão em diferentes setores da sociedade brasileira, durante o período anterior à ditadura civil-militar instalada em 1964.

Para a eleição presidencial que se aproxima, o PCB lançou como candidato o sr. Mauro Iasi: um paulistano, de 54 anos de idade, historiador (PUC/SP) e doutor em Sociologia (USP), também professor da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ainda jovem, começou a sua militância política em um grupo teatral, em 1976, e ingressou no PCB em 1979. Em seguida, em 1980, acompanhou o lendário “Cavaleiro da Esperança”, Luis Carlos Prestes, em seu rompimento com o partido. Militou no PT, tendo atuado como dirigente municipal e coordenador nacional da Secretaria Nacional de Formação. Em 2004, abandonou as hostes petistas e regressou ao PCB. Entre 2011 e 2013 esteve à frente da entidade sindical dos professores da UFRJ (ADUFRJ-Seção Sindical).

Mesmo com escassos recursos, a campanha de Mauro Iasi tem cumprido agenda corrida, com atividades recentes em diferentes estados, como o Paraná, o Espírito Santo, o Maranhão e o Pará. Em meio a essa atribulação, conseguimos obter um tempinho do professor Mauro Iasi. Nossa conversa teve em vista noticiar as suas avaliações sobre o Brasil e o mundo, bem como as suas propostas de governo. Ela segue abaixo.

 

Professor Mauro Iasi, por ser candidato na competição eleitoral à Presidência da República, iniciamos a entrevista com perguntas que dizem respeito aos seus concorrentes. Desse modo, como o sr. avalia a candidatura à reeleição da presidente Dilma Rousseff, da ampla coalizão centrada no Partido dos Trabalhadores (PT) e no Partido do Movimento Democrático do Brasil (PMDB)?

Mauro Iasi: A candidatura de Dilma Rousseff representa a continuidade de um caminho, que nós do PCB nos colocamos frontalmente contrários. Os 12 anos de governos do PT consolidaram um pacto social com a grande burguesia, em detrimentos dos interesses da classe trabalhadora e da população brasileira. Esse caráter conservador se expressa na coligação que agora apresenta a candidatura de Dilma, e se agrava no âmbito das alianças estaduais nas diferentes regiões do país.

 

E a candidatura que opera com uma agenda neoliberal explícita,  como a do candidato Aécio Neves (Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB): qual a sua percepção sobre as propostas desse candidato?

Mauro Iasi:  Uma vez que o governo do PT optou por um caminho de pacto social, não conseguiu diferenciar-se profundamente do ciclo neoliberal que o antecedeu. Este quadro coloca uma dificuldade para a oposição de direita representada por Aécio Neves que precisa diferenciar-se do governo, mas não pode questionar suas premissas, tais como: a política do superávit primário, as privatizações, reforma do Estado, entre outras. 

 

Em relação à candidata Luciana Genro (Partido Socialismo e Liberdade – PSOL), que se apresenta à população como uma opção à esquerda da candidatura Dilma Rousseff, como o sr. se situa?

Mauro Iasi: O PCB tem defendido uma unificação da esquerda que se opõe aos governos petistas. Foi desta maneira que participamos ativamente da Frente de Esquerda em 2006, com o PSOL e o PSTU. Sempre afirmamos que a frente de esquerda não pode ser uma mera coligação eleitoral. O que nos unia era o fato de compor movimentos e organizações de esquerda, que resistem aos ataques contra os trabalhadores, e que culminasse em um programa e uma alternativa popular e socialista para o Brasil. Infelizmente dessa vez isso não foi possível. As jornadas de junho e as lutas sociais ocorridas em 2013 exigiam uma alternativa que levasse a pauta de mudanças radicais e um claro questionamento à ordem burguesa. Nesta direção o PCB acreditou ser necessário apresentar candidatura. A candidata do PSOL, assim como as candidaturas do PSTU e do PCO, representam alternativas de esquerda e com perspectiva socialista. O PCB tem como prioridade diferenciar-se do bloco conservador, afirmando também uma crítica anticapitalista e um objetivo socialista. Nossa candidatura enfatiza a necessidade de construirmos uma real alternativa de poder que denominamos de “poder popular”.

 

Mais de vinte anos após a dissolução do comunismo soviético, uma histórica referência do PCB, qual a mensagem comunista para o país em nossos dias? Quais os caminhos para a construção de uma sociedade pós-capitalista no Brasil, nos termos comunistas?

Mauro Iasi:  O socialismo é necessário. Temos que fazer uma reflexão sobre o socialismo do século 20. Não podemos mais confundir o socialismo com mera socialização de meios de produção e a produção acelerada de bens, como é o caso da China. Para nós, o socialismo implica uma profunda mudança no modo de vida, em todos os sentidos, não apenas econômica, mas social e moral, tornando possível uma vida mais humana. O capitalismo que chegou prometendo bem-estar só trouxe barbárie, desigualdades, miséria e guerras. Ser socialista hoje é, antes de tudo, reagir a isso, negando-se a crer que esta ordem é natural e não pode ser mudada. A própria incapacidade do capitalismo de sobreviver nos oferece a certeza de que é necessário pensar e construir um novo modelo político e social. Como dizia Che Guevara: “Não podemos produzir o socialismo com os meios que são legados pelo capitalismo”. É preciso construir as condições para uma nova sociabilidade, um novo ser humano. Por isso defendemos o poder que emana do povo, ou seja, o poder popular que integrará o próprio conceito de Estado, por meio do estímulo à participação democrática nas decisões do Estado.

 

O nacionalismo econômico representa um tema que, historicamente, sensibilizou ao PCB e marcou as suas propostas políticas, assim como demais forças das esquerdas brasileiras, em especial o antigo trabalhismo de João Goulart, bem como o socialismo trabalhista de Leonel Brizola, após a abertura do regime civil-militar. Diferentemente do que ocorre em alguns países da América do Sul, há alguns anos a perspectiva nacionalista desapareceu do debate público em nosso país e a questão do papel das corporações multinacionais na economia brasileira encontra-se excluída da agenda política. Precisamente em uma época histórica em que fica, cada vez mais, evidenciado o poder mundial dessas grandes empresas. No programa da sua campanha, um dos itens concebidos como necessários a uma “alternativa socialista para o Brasil” é a “auditoria imediata das remessas de lucro das corporações transnacionais”. Nesse sentido, qual a opinião do sr. em relação ao papel desempenhado, em nossos dias, pelas corporações multinacionais em nosso país? Porque é importante a auditoria da remessa de lucros dessas empresas?

Mauro Iasi: O capitalismo brasileiro desenvolveu-se de tal forma que atingiu patamares monopolistas preservando sua posição subordinada ao centro do sistema. Por isso, boa parte da riqueza produzida pela classe trabalhadora de nosso país aflui para as empresas transnacionais, que têm origem nos países que constituem o “centro” do sistema capitalista. Isso ocorre tanto por mecanismos legais, através da lei de remessa de lucros, como ilegais, tais como o superfaturamento das importações e subfaturamento das exportações. A pressão sobre nossos salários e a precarização das condições de trabalho, para que o “custo Brasil” caia continuamente (junto com nossa qualidade de vida), torna-se muito maior. À burguesia brasileira interessa a importação de capitais, pois é esta a condição necessária de seu desenvolvimento, que eleva a sua produtividade e dinamiza sua reprodução. A nós, trabalhadores, interessa que esta riqueza seja socializada entre os que a produzem e que a vida seja desmercantilizada. Por isso, nossa luta só pode ser, ao mesmo tempo, anticapitalista e anti-imperialista. A auditoria dessas remessas de lucros é nosso primeiro passo para superar nossa subordinação internacional.

 

Dois temas ganharam forte repercussão entre os/as jovens ativistas das Jornadas de Junho de 2013: educação e democratização da mídia. Na hipótese de uma vitória eleitoral comunista, como um eventual governo liderado pelo sr. iria lidar com essas questões?

Mauro Iasi: Nosso programa aponta para a necessidade de desmercantilizar a vida e, nessa direção, os serviços essenciais à vida humana, que inclui educação, assim como saúde, moradia, transporte e outros. Todos esses serviços e bens coletivos devem ser entendidos como direitos e, portanto, garantidos pelo Estado de maneira pública, universal e gratuita. No mesmo sentido, é inadmissível que um setor tão importante como a comunicação seja controlado por poucos grupos e sirva como moeda de troca da velha forma de governabilidade que prevalece no país, como se vê na política de concessões. Para o PCB não basta democratizar a mídia, mas quebrar o enorme poder dos monopólios midiáticos.

 

______________

Obs: registro meus agradecimentos à atenção dispensada pela assessora de imprensa do candidato, Fania Rodrigues, e ao apoio dos professores Caio Andrade e Cícero Simões.

 

(*) Roberto Bitencourt da Silva – doutor em História (UFF), mestre em Ciência Política (UFRJ), professor da Faeterj-Rio/Faetec e da SME-Rio.

 

 

 

 

 

 

Redação

6 Comentários

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  1. Um bom candidato…

    … mas a incapacidade da esquerda comunista, socialista e anti – capitalista se unir é impressionante.

    PCB,  PSTU,  PCO e PSol com candidatos. Isto é uma estratégia que faz sentido?

  2. É evidente que os interesses

    É evidente que os interesses da grande burguesia estão muito distantes dos interesses da classe trabalhadora, mas esses comunistas, socialistas devem ser surdos para ignorar o que os próprios trabalhadores dizem, quando afirmm que não querem uma revolução comunista!

  3. Tá aí, Mauro Iasi, um cara

    Tá aí, Mauro Iasi, um cara com propostas realmente materias, e não na simples busca do poder. Está horrível ver debates que querem só saber “de quem será o poder?”. Um candidato com propostas e que tem um ponto de vista bem formado. Parabéns

  4. TRAIÇÃO

    querido Mauro, me sinto traido pelo Lula  por ter votado nele.  mas o “time” de traidores da Nação brasileira vem de longa data.  a traição feita pelo governo d São Paulo com o saudoso e patriota dono da verdadeira industria nacional de carros GURGEL que morreu de desgosto por ver seu sonho destruido pelas multinacionais em “acordos” com governos brasileiros( Fleury) etc… da época.

    Moro na China atualmente, que apesar de estar se corrompendo ao capitalismo ainda guarda um patriotismo. por exemplo, toda industria de fora que entra no Pais TEM que ter um parceiro chines ( joint venture ) e depois de alguns anos esse parceiro chines APRENDE como faz aquele produto e passa a fabricar sozinho. eles tem 30 FÁBRICAS Chinesas , muitas estatais.

    no Brasil é ao contrário!

     

    bom, querido primo, espero que tenha sucesso nesse desafio de ideal , torço por voce!

     

     

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