Aperto monetário, câmbio e desenvolvimento, por Rodrigo Medeiros

Na última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil, ocorreu a decisão de continuar o aperto monetário pela quarta vez seguida. A taxa básica de juros foi elevada para 12,75% ao ano. O Brasil reassumiu a liderança no ranking de juros reais no mundo (clique aqui). Em um contexto de expectativas negativas, incluindo a nítida perda de dinamismo econômico, o BC sinaliza preocupação com a inflação. Farei um breve comentário sobre o assunto.

Desde o advento do Plano Real (1994), a política monetária vem mirando o câmbio como forma de reduzir a inflação doméstica. O “barateamento” dos importados (tradables) permitiu que houvesse a redução da inflação a partir de juros básicos altos e medidas de abertura econômica. Enfrentamos crises cambiais pelo caminho, 1998-1999 e 2002, por exemplo. Logo mais adiante, a combinação entre o boom das commodities, a vontade política e a continuidade da sobrevalorização cambial do real permitiu os ganhos sociais que vivemos em nosso país. A expansão do crédito ao consumo também se fez presente nesse processo.

Ao refletir na semana sobre o complexo momento brasileiro, tomei conhecimento de um interessante artigo escrito sobre a Grécia pelo acadêmico Ricardo Hausmann, de Harvard (clique aqui). Ainda que o Brasil tenha uma moeda própria e um mercado maior, algumas observações publicadas recentemente no “Project Syndicate” merecem apreciação.

Para Hausmann, “o problema é que a Grécia produz muito pouco do que o mundo quer consumir. Suas exportações de bens são, sobretudo, frutas, azeite, algodão cru, tabaco, e alguns produtos petrolíferos refinados”. Ele continua: “A Grécia nunca teve a estrutura produtiva para ser tão rica como o era, a sua renda foi inflada por grandes quantidades de empréstimos não utilizados para atualizar sua capacidade produtiva. De acordo com o ‘Atlas de Complexidade Econômica’, de minha coautoria, em 2008, a diferença entre a renda da Grécia e o conteúdo de conhecimento das suas exportações foi a maior entre uma amostra de 128 países”.

O que a Grécia teria em comum com o Brasil? Talvez a antiga fábula de Esopo (século VI a. C.) sobre a cigarra e a formiga seja rica em reflexões. Não estou aqui eximindo a liderança da Alemanha no caso da Grécia, afinal, ninguém pode esperar ser eternamente “formiga”, sem algum ônus, em uma união monetária. Em relação ao Brasil, creio que caímos no canto de sereia de que a China e a Ásia emergente representariam “um algo novo” e que isso geraria um contexto de elevada alta permanente das commodities que exportamos. Ciclos de euforia e pânico não são novos na história econômica mundial. Já deveríamos saber disso. 

Rodrigo Medeiros é professor do Ifes (Instituto Federal do Espírito Santo)

Rodrigo Medeiros

2 Comentários

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  1. Solução: Brasil desvaloriza a moeda e Alemanha sai do Euro

     

    Rodrigo Medeiros,

    Não sou economista, mas pelo que acompanho o Brasil e o mundo nos últimos 45 anos, esta crise brasileira se resolve com a desvalorização. E o juro alto é para evitar a fuga de dólares e não para combater a inflação. E não está tão alto assim. Em 2003 ele foi a mais de vinte e o país voltou a crescer em 2004. Aliás, o problema em 2004 foi o governo deixar o país crescer muito e precisar apertar o juros novamente em 2005.

    No ano passado eu acreditava que o dólar a 3,1 permitiria o saldo de 1 bilhão de dólares mensais que resolveria o problema do Brasil. Os déficits muito acentuados em janeiro e fevereiro me preocuparam. São dois meses atípicos, mas não havia razão para déficit tão alto a menos de o real estar mais valorizado do que eu pensava.

    Há que esperar.

    A Grécia poderia resolver o problema do país forçando a Alemanha sair da zona do Euro. O Euro desvalorizava, o marco valorizava e a Alemanha comprava mais da Grécia e a Grécia conseguiria recuperar a economia. Não sei se a Grécia tem cacife para pegar essa empreitada e convencer a outros países da Zona do Euro a apoiar a saída da Alemanha.

    Uma alternativa para a Grécia seria aquele pais adotar o real como moeda. Pensei nessa solução há um mês. Esta chance pode já não ser interessante, pois a Grécia pode adotar o real exatamente quando a nossa moeda já se encontra desvalorizada e assim aquele país vai permanecer com problema de Balanço de Pagamentos.

    E lembro que as crises vem ocorrendo há muito de modo quase constante e a solução da desvalorização vinha sendo postergada. Em 79, o Brasil poderia tomar a iniciativa e desvalorizar a moeda diante da subida do juro americano com Paul Volcker. Achou que o juro alto americano era passageiro e foi pego de calças curtas quando o juro voltou a subir em 81 chegando a 22%. E o país só adotou a solução correta em 1983. Em 88 quando da crise dos Fundos de Pensão americanos, o Brasil estava atolado na herança do Plano Cruzado de 1986 e não deve ter sentido nem coscas, mas não pode acompanhar a recuperação da economia mundial que ocorreu a partir de 1992. Em 97 e 98 a crise dos Tigres Asiáticos e da Rússia chegou aqui, mas a solução foi adiada para 99 e com medo de ingovernabilidade ficou segurando o câmbio e, além disso, houve o problema do racionamento e depois a crise na Argentina de tal modo que quando chegou a eleição de 2002, tudo estava no buraco.

    A partir de 2003, houve a recuperação econômica que acabou sendo feita um pouco aos tranco e barrancos até a crise de 2008, e a recuperação em seguida foi um tanto forçada com uma valorização muito acentuada do real.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 06/03/2015

  2. O Brasil sofre de um atavismo

    O Brasil sofre de um atavismo na sua administração econômica: sempre que a situação da liquidez internacional favorece o consumo, ou seja quando entra muito dólar, nos esquecemos de aproveitar o momento favorável para construir um país fazendo os devidos investimentos e torramos tudo com coisas frívolas. Trata-se de uma mal de economias com forte concentração de renda e cujo topo da pirâmide vive (ou se vê, ou gostaria de viver) como se não pertencesse ao país. Houve uma época durante o século XX em que até tentamos de alguma maneira meio torta, senão superar esse problema, pelo menos mitigá-lo. Desde o governo Collor e a abertura econômica que desistimos dessas tentativas e de qualquer outra de superar este problema. Acho que atingimos o abandono de pavlov, pois tudo que interessa agora é só administrar crises.

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