155, por Rui Daher
Em trecho do livro “Dominó de Botequim”, deste que aqui assina, (Livraria da Vila ou e-mail para [email protected]), relato a luta de minha mãe com um batente de porta até que a minha altura chegasse a 1,60 m.
– Estica, cabeça alta, erga os ombros, postura menino!
Nada. Não saía dos 159 centímetros. Mais tarde, diante da constante inquisição externa, achei justo arredondar.
– Quanto você mede?
– Um metro e sessenta.
E assim passaram-se os anos, como se ouvia nas novelas da antiga Rádio São Paulo ou hoje nos filmes americanos: “Ten years later”.
No livro, deixo uma confissão. Ou melhor, constatação. Com o avançar da idade minha estatura anda em tenebrosa contagem regressiva, assim descrita no worst-seller: “A cada ano encolho um centímetro, 158 … 157 … 156”.
Família e amigos insistem para que eu recorra a alongamentos, certo pilates que não é Pôncio, RPG (neste posso até pensar, deve ser rotações por gorós).
– Tudo se resume a exercícios e postura adequada.
– Entendi. Se intelectuais, aprovar a degola de presos que já cumpriram pena e não foram soltos. Se físicos, fantasiar-se de gari e varrer ruas.
– Nada disso! Antes de tudo, precisa se animar, ganhar estilo, motivação. O maior estímulo é se paramentar aos exercícios. Tênis, meias curtinhas que mostram os calcanhares, boné, short de corrida com fendas laterais, camiseta-regata com patrocínio de energizante, medidor de pulsação.
– Pronto! Lá se vai a verba reservada para uma caixa salineira e conhecer o novo Al Janiah.
Amigos próximos, que conhecem a história de meus últimos 20 anos, são mais condescendentes. No lugar de sugerir sessões de tortura, lembram as agruras por que tenho passado.
– Relaxa, velho. Foi muito peso nos seus ombros. Te sacanearam demais. Não sei como não está com um metro e meio. E de que vai adiantar você ficar grandão, musculoso, se o que interessa dorme sono eterno?
Sim, sempre terá o amigo que não perde a piada, e arremata:
– Ferrado como está, deveria dar graças por estar sumindo. Quanto maior mais evidente a vida de merda que leva.
Rindo ou achando triste, alerto quem já passou dos 70 para começar a contagem. Se o mesmo estiver acontecendo, enxerguem a vantagem: gastar já a poupança feita para o tamanho do caixão.
Falo disso, porque meu mundo caiu há uma semana. Certa Aline fez comigo o que Maysa tristemente cantava. Fulminou o desânimo de minha finitude.
O médico-clínico que me atende pediu um exame chamado densitometria óssea corporal. Gostei. Não precisava preparo nem nada. Deitaria numa cama e um robô passaria por meu corpo, partes íntimas incluídas, e revelaria segredos de meus ossos. Feliz, a moça delicada, bonitinha, explicava cada etapa.
– Vamos pesá-lo.
O que era terror no passado, hoje tiro de bico. A cirurgia bariátrica me fez perder 32 kg. Não temo mais subir na balança.
– Agora vamos ver sua altura.
– Precisa?
– É fundamental.
Lembrei minha mãe.
– Ereto (êpa, difícil!), ombros bem postados, pés juntos.
– Um metro cinquenta e cinco e meio.
Enquanto ela anotava numa prancheta, eu berrava.
– Como? E meio?!!! Que meio? Se bem entendo, você fala de cinco milímetros, 50, 500, ou o quê?
Aline me estranha:
– Sim, meio centímetro, 5 milímetros.
– Precisa tal exatidão? E se a trava pegou bem numa depressão da minha cachola? Poderia tê-la colocado no calombo que adquiri em recente queda.
– Não importa. É o que deu.
– Não dá pra arredondar? Pode até ser pra baixo. Mais fácil lembrar.
– Quer que eu consulte o doutor?
– Não precisa.
Nesta semana, que acaba com o país em processo de ‘encafonamento’ jamais visto, amiga, proprietária de uma loja agropecuária, vendo meus sapatos totalmente enlameados, me oferece como presente uma botina.
Mencionei o tamanho e deixei o modelo à escolha dela. Apenas recusaria fosse uma daquelas que simula couro de cobra. Puta aflição saber que a picada poderia vir a qualquer momento.
Experimentei, serviu, e reparei que estava à mesma altura dos olhos da moça. Logo saquei a verdade, mas calei. Treino que devo ao golpe de Estado.
No hotel, confirmo: salto com 5 centímetros.
Aline, querida Aline, por extenso: meço um metro, sessenta centímetros e cinco milímetros. Beijos.
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Caro Rui
Esta eu tirei de sua
Caro Rui
Esta eu tirei de sua pgn:
Kkkkkkkkkkk… minha mae fez
Kkkkkkkkkkk… minha mae fez o mesmo comigo e minha “altura”. Parei por 40 anos no 1.69 e um importantissimo 1/2. Ha poucos meses me medi e pra meu pesar agora sou 1.69 e 1/4. Te consolo da mesma maneira que me consolo: se voce quizer ser alto… mude pro Mexico, Rui.
Pô, Ivan
taí! Quando estive lá, circa década de 1980, me senti o pivô da seleção chinesa de basquete da imagem. Agora, depois de seu 1/4, nunca mais verei Aline. Abração
Rui, Rui, somos do tempo em
Rui, Rui, somos do tempo em que “pequenos frascos guardam os melhores perfumes”, “quanto mais alto maior a queda”, “tamanho não é documento” (este com outro sentido mas para nós, hoje, mesmo com viagra, o outro sentido não interessa muito , então usemos para altura mesmo). E use a botina que ganhou para prevenir picada de cobra. No mais ande descalço, sua altura, de pé no chão, é muito maior, só para dar alguns exemplos, de uns 450 inquilinos de uma casa que chamam de congresso, e de todos os partícipes desse governo embusteiro. Grande abraço.
Eduardo,
seguirei suas sugestões. E “tamanho não é mesmo documento”. Já pensou se em aeroportos e outras ocasiões ao perguntarem “seu documento, por favor”, tivéssemos que apreserntar o indigitado em toda a sua plenitude? Abração.
(so fazendo relatorio)
(Nassif, nao ha imagem nem quadrado preto no video. So o som, musica lindissima, por sinal. Eh um Emilio Santiago… mas de outra maneira nao da pra assistir nem no youtube pois o quadrado do video esta completamente branco e sem links; talvez seja so no meu computador, nao sei)
o mesmo problema aqui no meu
o mesmo problema aqui no meu (usando o safari)
Anarca,
desculpe-me a intimidade. Acho que a panela deles enferrujou e, também, a crise os fez mandarem embora as secretárias que faziam isso por eles. Abração.