Da sabedoria que vem com a idade, por Sérgio Saraiva

Não pretendia voltar tão cedo ao tema, mas três veteranos das belas letras chamaram minha atenção, e como sempre obedeci aos mais velhos, tratemos novamente da manipulação da informação.

Os três textos comentados aqui estão na Folha de São Paulo de 02ago2015. Deus nos proteja… deste mês de agosto.

Começo com o texto do professor Arnaldo Niskier, “O preço alto da greve”.

Nele, o professor comenta a greve de 90 dias dos professores paulistas do ensino público. Mais precisamente, responsabiliza os professores pelos efeitos deletérios do pós-greve para a educação. Realmente, 90 dias de greve não podem ser compensados nos 30 dias das férias usados para aulas de reposição. Além do que, por óbvio, nesses dias, havia que ser servida a merenda aos alunos e fornecido o transporte escolar. Faltaram ou foram insuficientes.

Onde então o professor desliza? Quem lê o texto de Niskier, se não estiver muito atento, chega a acreditar que o calendário escolar e o fornecimento de alimentação e transporte são responsabilidades dos professores e não do governo estadual. O texto trata, na sua essência e conteúdo, dos professores públicos e não da administração da educação.

O professor reconhece que seus colegas da educação básica ganham muito mal e que a greve é um direito. Mas considera que seja um direito ao qual os professores não deveriam recorrer para não prejudicar os alunos. Como se professor mal pago já não fosse um prejuízo em si mesmo. Preconiza Niskier que os professores deveriam aguardar que se “rediscuta o relacionamento das autoridades com os integrantes do sistema”.

Ora, a greve só durou 90 dias por que o Governador Alckmin se recusou a negociar com os professores. Bastaria a Niskier, para saber disso, ler a própria Folha que comemorou o fim da greve em manchete na primeira página chamando os professores de derrotados.

Aliás, a considerar as declarações de Alckmin sobre a greve dos professores, Niskier estaria falando de uma inexistência. Alckmin repetidas vezes declarou que não existia a greve, já que em 95% das escolas estaduais havia aulas.

E como o tema deste post é manipulação da informação, tomo as palavras do governador para cometer a audácia de recomendar um livro ao professor Niskier: “Como mentir com a estatística” de Darrell Huff.

Mais um detalhe, em nenhum momento de seu texto, o professor Niskier cita o governador Alckmin. Creio que ele julgue que a greve foi apenas dos professores. Afinal, Alckmin foi trabalhar todos os dias.

Prosseguindo com Elio Gaspari.

Ah, meu dileto Elio Gaspari. Cito tanto Gaspari que já começo a despertar desconfianças em meus colegas de boteco.

Pois bem, em seu texto, “O dilema de Dilma”, Gaspari recomenda que a presidente adira à delação premiada na Lava Jato. Gaspari não adianta o que ou quem ele crê que Dilma deveria dedurar. Mas diz que, se não o fizer, Dilma estará cometendo o mesmo erro de Lula que não dedurou José Dirceu e Antonio Palocci, de Collor que não dedurou PC Farias e até do general Figueiredo que não dedurou os responsáveis pelo atentado do Riocentro.

Completando Gaspari, se Dilma sabe de algo condenável em seu governo e, em ralação a isso, nada faz, comete crime de responsabilidade.

Claro, como não vem ao caso, Gaspari não comenta que FHC tampouco dedurou quem deu o dinheiro para pagar R$ 200 mil por voto na compra da emenda da reeleição. Não dedurou igualmente quem, no seu ministério, ganhou dinheiro com a privataria tucana ou quanto Pedro Barusco embolsou de propina na Petrobras no período de 1998 a 2002.

Termino com Carlos Heitor Cony.

Em seu texto, “Marilyn Monroe e a inflação”, Cony responsabiliza Dilma pessoalmente pela inflação atual. E avia a receita do impeachment como único remédio para retomarmos a estabilidade financeira. Cony mostra-se ainda um saudoso da era FHC, período em que insinua que não houve inflação. Há “a inflação que começa a subir e inquietar cada dona de casa” e “tivemos a experiência da inflação anterior ao Plano Real”.

Já de tempos, Cony tem sido bastante duro com Dilma. Não entendia o porquê.

Cony e Dilma têm trajetórias até parecidas. Nos anos 60, ambos foram, a seus modos, resistentes à ditadura. Ambos foram prisioneiros  dos generais. Dilma foi brutalmente torturada, Cony foi severamente constrangido com, inclusive, ameaças à integridade física seus familiares.

Na redemocratização, Dilma se tornou presidente da República e Cony tornou-se milionário.

A resposta para a birra está no próprio texto de Cony. Ele não é apenas de críticas, é também revelador do que vai na alma do velho jornalista. A Marilyn Monroe citada no título é a própria presidente Dilma. Além da incompetência administrativa, Cony critica o “charme quase libidinoso” com o qual Dilma, bem maquiada, se exibe ao dar declarações à imprensa ou passear de bicicleta. Em Dilma, chama a atenção de Cony sua “expressão coquete que poderia aparecer na capa dessas revistas dedicadas aos homens solitários”.

Resta explicada a má vontade de Cony para com sua companheira de lutas na juventude: é tesão recolhido.

 

PS1: para quem tem algum tempo e dinheiro para perder, segue acesso aos textos da Folha:  Cony, Niskier e Gaspari.

PS2: para quem só dispõem de tempo que jogar fora: oficina de concertos gerais e poesia.

Redação

10 Comentários

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  1. Esse Sérgio Saraiva é muito

    Esse Sérgio Saraiva é muito bom em manipulação de informação: conhece tão bem que pratica habilmente. Só não entendi como ele refutou os textos de Gaspari e Cony. No primeiro, como de costume, remeteu a FHC (a culpa seria dele?). No segundo, contra-argumentou freudianamente com….libido(?!?!?!).

  2. Nem tanto

    Não considere perda de tempo e dinheiro ler seus supostos desafetos políticos e ideológicos.Sem isto quantos posts deixariam de ser publicados. Pois não? Não me alinho politicamente com o pensamento deste blog , mas sou um frequentador assíduo de suas páginas mesmo que , na maioria das vezes,apenas para dar uma rápida vista d’olhos e  comentar , mesmo que ramente ,determinados temas. E assim vou vivendo e aprendendo.

  3. Sempre fui fã do Cony, de

    Sempre fui fã do Cony, de quem tenho e admiro vários livros. E por isso sempre fiquei  constrangido e evitei comentar sua atuação caquética no microfone da CBN. Mas depois dessa, ele me liberou. Temos que dizer com todas as letras que ele está  gagá, ridículo e causa pena e risos em quem o ouve pela manhã. Prá quem não ouviu ainda  é fácil de explicar. Lembram do professor Bartolomeu, um dos impagáveis personagens de Ronald Golias? Pois é, Cony está o próprio. Aliás, não é difícil explicar a derrocada da CBN em São Paulo e em outras praças. A aposta em velhos rancorosos e ridículos como Cony, Leitão, Jabor, Garcia (arrgghhh…) leva a emissora, cada vez mais, para a zona do rebaixamento do Ibope. 

  4. Dispenso a leitura dos textos

    Dispenso a leitura dos textos dessas três múmias. Contento-me com a dissecação didática feito pelo competente colaborador do blog do Nassif, o Sergio Saraiva. É por isso que não leio jornal desde 2006, só blog sujo.

    Não dá para ler pig assim a sêco, só devidamente analisado por pessoas que não recebem salário dos barões midiáticos. Valeu Sergio

  5. Quase Memória

    Nassif: sem tempo disponível e dinheiro para perder (nem tenho para ganhar), vou direto ao assunto. Dos tres porquinhos, dispensei o Niskier e o Gaspari por motivos particulares. Fico com o Cony, o imortal Carlos Heitor Cony, octogenário, escritor de vastas literatura e de merecida consagração como ficcionista. Amigo (íntimo) de outro imortal, aquele que proibiu a inauguração da Estação do Metro na Consolação (SP/SP) só para não ser incomodado com a presença de pobres pela região. E seus ataques ao governo, que tem sido uma constante, refletem mais a defesa do amigo confrade, pseudo intelectual e péssimo presidente, do que uma preocupação política-social da atual situação do Pais. Mas seus textos têm charme e verve, apesar de meras ficções. Que de ficções não passam suas elucubrações. Talvez agravada pelos quase 90 anos de idade, ou pela revolta contra a tortura psicológica por que passou no tempo em que os amigos do seu amigo comandavam a Nação. Agora, que é uma pena mercenária, isto é. Lembra da apaixonada e dramática defesa dele no caso Doca Street? É dos tais que se pedirem um artigo sobre Jesus Cristo há de perguntar ao patrão se quer contra ou a favor. Portanto, não é de hoje que ele diz a que veio.

  6. Cony

    É aquele que recebe uma mesada da viúva ?. Já o li,  no tempo que lia tudo o que me passava pela frente, mas honestamente a única crônica dele que gostei foi uma que falava da morte de sua cadela, de nome Mila.

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