Música: 100 anos do nascimento de John Cage

Música moderna 
Há 100 anos nascia John Cage

Hoje se completa o centenário de nascimento do compositor norte-americano. Um dos grandes nomes da geração do segundo pós-guerra, ele tentou, à sua maneira, apresentar uma solução para a crise da música 

5 de setembro de 2012

 

No dia 5 de setembro de 1912 nascia em Los Angeles o compositor norte-americano John Cage, um dos últimos grandes nomes da tradição da música de vanguarda.

Ainda na década de 1930, Cage foi aluno de alguns dos mais importantes músicos da época, particularmente de Arnold Schoenberg, o fundador da Escola de Viena, que foi, entre as vanguardas modernistas, a tentativa mais séria de se superar o impasse vivido pela música tonal.

Na década de 1940, Cage começou a aproximar-se das ideias da antiarte, e é a partir daí que se inicia sua contribuição mais importante para a tradição musical do século XX.

Ele empreendeu, pouco mais tarde, uma viagem à Ásia que o marcaria profundamente, e que lhe forneceria as ideias fundamentais para desenvolver suas experiências musicais.

Depois de conhecer filosofias orientais como o I Ching, o hinduísmo, o zen budismo, etc. com sua valorização do homem em contato com o mundo natural, Cage passou a encarar de uma nova forma a infinidade de sons da natureza. Ele concluiu, daí, ser essa uma forma musical tão válida quanto a tradição musical estabelecida, a “música organizada logicamente”. Sua resposta a isso foram as experiências que ele chamou de “música aleatória”, que consistiam basicamente incorporar à tradição da música ocidental, os sons aleatórios produzidos pela natureza, reproduzindo-o, ou por meio de instrumentos tradicionais, ou utilizando motores e outros aparelhos “não musicais”. Essa era uma transposição para o terreno da música, do que já havia sido feito nas artes plásticas por Marcel Duchamp na década de 1910, com seusready-mades dadaístas. Havia, no entanto, uma diferença fundamental no que dizia respeito aos objetivos de Cage.

Entre 1916 e 1921, quando nasce e se desenvolve o dadá, esse movimento de crítica radical a toda cultura burguesa estabelecida desenvolveu diversas atividades que representavam uma negação da arte enquanto tal. Foi um movimento impulsionado por artistas que haviam concluído ser necessário efetuar uma ruptura radical com os rumos que a cultura havia tomado até aquele momento. Eram denunciadores da falência das artes e da miséria moral dos artistas, supostos bastiões da sensibilidade humana, mas que haviam se calado e sido coniventes com a barbárie promovida pela Primeira Guerra e a política genocida dos governos imperialistas europeus.

Os dadaístas não estavam interessados em “ampliar” as fronteiras da arte, mas em negá-la e ridicularizá-la usando para isso recursos que eram próprios dela, incluindo aí a promoção de eventos públicos farsescos e a criação de obras que visavam unicamente criticar e zombar da tradição artística.

Muito depois que o dadaísmo já havia sido esquecido, no final da década de 1940, começou a desenvolver-se em Nova Iorque um novo movimento artístico de contestação da tradição da vanguarda oficial. Esse movimento, que corria marginalmente à explosão de popularidade do expressionismo abstrato – e em oposição a ele –, era um movimento de crítica que antecedia a formação da pop arte. Reabilitando a crítica e os procedimentos utilizados pelo dadá décadas antes, essa nova geração, porém, empreendeu uma crítica similar, mas muito menos radical do que haviam feito os dadaístas. O efeito principal desse movimento foi, curiosamente, o de transformar tudo o que fora antes antiarte, em uma nova corrente “institucional” das artes modernas. No caso de Cage, como também no caso de Jasper Johns e outros, isso foi feito com uma intenção definida. Eles não buscavam mais simplesmente contestar a tradição, mas também propor um novo caminho para as artes em crise.

O neodadaísmo foi, acima de tudo, um movimento que atestava a profundidade da crise em que a cultura vivia então, quando tudo o que havia sido antiarte e que vivia ainda à margem da história da arte oficial das vanguardas foi tomado pelos novos artistas como a única tradição que valia a pena ser desenvolvida. Esse era o significado também da música experimental de John Cage.

Da mesma forma que artistas plásticos como Jasper Johns e Robert Rauschemberg retomavam os ready-mades de Duchamp; John Cage em sua música retomava experimentos que haviam sido feitos pelo futurista italiano Luigi Russolo, autor do influente Manifesto dos Ruídos(1913), e criador dos intonarumori (1914), que eram máquinas de fazer ruídos. Com essas parafernálias, Russolo apresentou concertos que causaram escândalo em Londres e Paris, assistidos na ocasião por figuras como Stravinsky, Ravel e Honegger. Essas mesmas ideias pioneiras de Russolo foram pouco depois tomadas pelos dadaístas.

A criação mais famosa de John Cage, nesse sentido, é bastante representativa dessa situação de impasse e de crise. É a peça 4″33′, organizada em três movimentos. Os músicos sobem ao palco, sentam-se com seus instrumentos em punho, e permanecem imóveis durante quatro minutos e meio. A rigor, dir-se-ia que o objetivo de Cage seria o de produzir uma “música silenciosa”, mas a ideia do compositor era que o público presente, durante esses quatro minutos e trinta e três segundos, prestasse atenção no ruído produzido pela plateia. Essa seria a “música”, e esse seria o objetivo da composição.

Com isso se pode perceber que, se na primeira metade do século XX os músicos buscaram fugir do impasse da música tonal tentando criar uma nova teoria musical “atonal” que suprisse o impasse, na segunda metade do século, os músicos simplesmente concluíram o fracasso dessas tentativas e – John Cage foi apenas o representante mais radical dessa tendência – viraram as costas para a música enquanto tal, se embrenhando pelos caminhos mais improváveis.

Redação

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