Carta do Movimento Psicanálise, Autismo e Saúde Pública contra o Ato Médico

21 de junho de 2013
Excelentíssima Senhora Presidenta da República,
Nós, do Movimento Psicanálise, Autismo e Saúde Pública, integrantes de uma
porção significativa de profissionais (psiquiatras, psicólogos, médicos pediatras,
neurologistas, psicanalistas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais,
psicopedagogos) que trabalham no campo da saúde mental inseridos em
diversas instituições clínicas e acadêmicas disseminadas pelo Brasil:
Viemos nos dirigir respeitosamente à Senhora Presidenta Dilma Rousseff para
solicitar seu veto ao (PLS) 268/2002 correntemente apelidado de “Ato Médico” e
que no dia de anteontem completará seu processo de aprovação pelo
Congresso Nacional, razão pela qual passa a estar sob sua consideração.
As razões que nos movem para efetuar esse pedido são as seguintes:
O projeto em questão se fundamenta em um conceito de doença fartamente
superado pela ciência contemporânea tornando anacrônicas todas as suas
proposições de regulamentação de exercício profissional. Sua aprovação não
somente implica em retrocesso no campo conceitual como resultará numa
significativa redução da capacidade operacional de todo o sistema de saúde
pública e privada.
Tornando os atos de ‘diagnóstico de doença’ (que nesse projeto de lei ficou
denominado “diagnóstico nosológico”), ‘indicação terapêutica’, ‘chefia de
serviços médicos’, ‘prescrição de internação e alta’, “privativos” (sic) de uma
única classe de agentes de saúde – os médicos – deixa-se inabilitados para tais
efeitos todos os outros agentes de saúde que, atualmente, constituem a
expressiva maioria dos prestadores desses serviços, especialmente na área de
saúde mental. Tal prevalência assim proposta da classe médica inevitavelmente
virá a gerar uma escassez artificial e também uma tendência ao reducionismo
organicista por força da formação profissional específica e da posição
privilegiada que o médico viria a ocupar nos pontos-chave da condução de todo
e qualquer processo vinculado à saúde, incluso o mental.
No que tange ao conceito que serve de referência para tais determinações
precisamos considerar que hoje em dia “doença” não designa apenas as
afecções exclusivamente orgânicas, mas uma série de anomalias que vão do
orgânico ao psíquico onde – especialmente no que se refere à saúde mental – a
solução de continuidade cede seu lugar à complexidade causal e evolutiva.
Sendo por isso a inclinação contemporânea – quando prevalece o critério
científico e não o corporativo – a responsabilidade interdisciplinar tanto no que
se refere ao diagnóstico quanto às indicações terapêuticas e a direção de sua
cura. Por isso cabe afirmar que esse projeto de lei caminha na direção oposta ao
que atualmente a ciência recomenda.
Tudo o que tem se avançado nos últimos 120 anos nas técnicas de reabilitação
e nos atendimentos de transtornos específicos, e que tem levado a
especificações diagnósticas e a indicações terapêuticas precisas que em muito
excedem o que a medicina e a formação de qualquer médico conseguiria
abranger, fica completamente ignorado pelo texto desse projeto de lei. A
vastidão de conhecimentos acumulados sobre a saúde humana torna absurda a
pretensão de que todo seu saber e todo seu exercício fiquem sob a condução de
uma única classe profissional.
A questão do ensino profissional é um capítulo à parte: propõe-se que o ensino
de disciplinas médicas é privativo de médicos tanto na graduação quanto na
pós-graduação. Isso quer dizer que matéria médica somente será ensinada por
médicos ou que matéria médica somente será ensinada àqueles que virão a ser
médicos? Será que um médico não precisa ter algumas noções de psicologia?
E, no caso de uma resposta afirmativa, quem seria o profissional apropriado
para ensinar tal matéria? Dúvida que surge porque na concepção dessa quase
lei toda doença, incluso mental, é prevalentemente orgânica, única justificativa
para que todas elas estejam sob comando médico. Dúvida em acréscimo: quem
seria aquele que ensinaria as articulações entre o neurológico e o psíquico
(atualmente inseparáveis)? Será, por outro lado, que ficaria dentro da lei ensinar
matéria médica (Estrutura do Sistema Nervoso Central, Genética e Epigenética,
sistema hormonal, diagnóstico diferencial) na carreira de psicologia?
A ciência contemporânea não admite reduções que desarticulem mente-corpo
simplificando artificialmente a complexidade própria do fenômeno humano. O
que torna estranho que se pretenda reduzir a margem de seguridade de um
atendimento de saúde pertinente para toda a população, já que tal seria o
resultado da legitimação jurídica de uma exclusividade nos atos, diagnóstico,
prescrição terapêutica, condução institucional, e ensino de temas vinculados à
saúde. Resultado inevitável de uma prática que se dirige, nesse caso, a romper
a igualdade de responsabilidade profissional perante o paciente, com os
consequentes empecilhos para um verdadeiro e imprescindível trabalho em
equipe.
Respeitosamente,
Movimento Psicanálise, Autismo e Saúde Pública/MPASP
Instituições participantes do Movimento Psicanálise,
Autismo e Saúde Pública – MPASP
Universidades
FEUSP
FMUSP
Grupo de estudo sobre a criança (e sua linguagem) na clínica psicanalítica –
GECLIPS/UFUMG
IPUSP
PUC /RJ
Psicologia PUC /USP
Fono PUC/SP
UERJ
UFBA – Ambulatório Infanto-Juvenil da Residência em Psicologia Clínica e
Saúde Mental do Hospital Juliano Moreira/UFBA-SESAB
UFMG Laboratório de Estudos Clínicos da PUC Minas
UFPE
UFRJ
UFSM
UnB
Unesp Bauru
UNICAMP
Universidade Católica de Brasília
Setor de Saúde Mental do Departamento de Pediatria da UNIFESP
Centro de Referência da Infância e da Adolescência – CRIA/UNIFESP
DERDIC/PUCSP
Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCMMG)
UNIFOR
Instituições de Psicanálise
ALEPH – Escola de Psicanálise
Associação Psicanalítica de Curitiba- APC
Circulo Psicanalítico MG – CPMG
Círculo Psicanalítico de Pernambuco – CPP
EBP/SP (Escola Brasileira de Psicanálise)
EBP/MG (Escola Brasileira de Psicanálise)
EBP/RJ (Escola Brasileira de Psicanálise)
Escola Letra Freudiana
Espaço Moebus/BA
Laço Analítico
Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano – Brasil (EPFCL-Brasil)
Fórum do Campo Lacaniano – São Paulo (FCL-SP)
Rede de Pesquisa sobre as Psicoses do FCL-São Paulo
Rede Brasil Psicanálise Infância/ FCL
IEPSI
Associação Psicanalítica de Porto Alegre – APPOA
Instituto APPOA
IPB (Instituto de Psicanálise Brasileiro)
Intersecção Psicanalitica do Brasil/NEPP
Grupo que estuda a clinica com bebês e as intervenções precoces da Sociedade
Brasileira de Psicanálise de São Paulo
Grupo de Estudos e Investigação dos TGD da Sociedade Brasileira de
Psicanálise de São Paulo
Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae (SEDES)
Departamento de Formação em Psicanálise do Instituto SEDES
Departamento de Psicanálise de Crianças do Instituto SEDES
Espaço Potencial Winnicott do Depto. Psicanálise de Crianças do Instituto
SEDES
Departamento de Psicossomática Psicanalítica do Instituto SEDES
Núcleo de Investigação Clínica Hans da Escola Letra Freudiana
Sigmund Freud Associação Psicanalítica/RS
GEP/Campinas
NEPPC/SP
Instituto da Família –IFA/SP
Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo
Invenção Freudiana – Transmissão da Psicanálise
Centros de atendimentos não governamentais
Ateliê Espaço Terapêutico/RJ
Attenda/SP
Centro de Atendimento e Inclusão Social
CAIS/MG
Carretel – Clínica Interdisciplinar do Laço/SP
Carrossel/BA
Centro da Infânica e Adolescência Maud Mannoni – CIAMM
CERSAMI de Betim
Centro de Estudos, Pesquisa e Atendimento Global da Infância e Adolescência –
CEPAGIA/Brasília/DF
Clínica Mauro Spinelli/SP
Clube Barra SP
CPPL – Centro de Pesquisa em Psicanálise e Linguagem
Centro de Pesquisa em Psicanálise e Linguagem de Recife – CPPL
Escola Trilha
ENFF
Espaço Escuta de Londrina
Espaço Palavra/SP
GEP-Campinas
Grupo Laço/SP
Grupo de Pesquisa CURUMIM do Instituto de Clínica Psicanalítica/RJ
Incere
Instituto de Estudo da Familia INEF
Insituto Langage
Instituto Viva Infância
LEPH/MG
Lugar de Vida
Centro Lydia Coriat de Porto Alegre
NIIPI/BA
NINAR – Núcleo de Estudos Psicanalíticos
NÓS – Equipe de Acompanhamento Terapêutico
Projetos Terapêuticos/SP
Trapézio/SP
Associação Espaço Vivo/RJ
Centros de atendimentos do governo
Caps Pequeno Hans/RJ
Capsi Guarulhos/SP
Capsi-Ipiranga/SP
Capsi-Lapa/SP
Capsi Mauricio de Sousa/Pinel-RJ
Capsi Mooca/SP
CAPSI-Taboão/SP
CAPSI de Vitória
CARM/UFRJ
NASF Brasilândia/SP
NASF Guarani/SP
UBS Humberto Pasquale/SP
Centro de Orientação Médico-Psicopedagógica – COMPP/SES-DF
Capsi COMPP/SES-DF
Capsi Campina Grande/PB
Associações
ABEBÊ – Associação Brasileira de Estudos sobre o Bebê.
ABENEPI/Maceió
ABENEPI/RJ
ABENEPI/BSB
Associação Metroviária do Excepcional AME
Associação Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental
CRP/SP ( Conselho Regional de Psicologia)
Hospitais
Centro Psíquico da Adolescência e Infância da Fundação Hospitalar do Estado
de Minas Gerais (CePAI/FHEMIG)
CISAM/UPE – Centro Integrado de Saúde Amauri de Medeiros – Universidade
de Pernambuco
HCB (Hospital da Criança de Brasilia)
Serviço de psicossomática e saúde mental do Hospital Barão de Lucena – HBL/
Recife
Hospital Einstein
IEP/HSC Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital de Santa Catarina
Hospital Pinel
Hospital das Clínicas – Universidade de Pernambuco
Revista
Revista Mente e Cérebro
Grupo de pesquisa
PREAUT BRASIL
Grupo de pesquisa IRDI nas creches
Redação

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