O ensino universitário é uma torre de marfim?

Passou quase despercebido o lançamento o ano passado, de um documentário produzido pela CNN, intitulado “Ivory Tower”, A torre de marfim, no qual se investiga e se questiona o modelo universitário norte americano atual. Esse modelo inspira-se e em certa medida acompanha os parâmetros introduzidos pela Universidade de Harvard: campi residenciais, vastos espaços para confraternização, estádios para esportes e estudantes segregados durante quatro ou cinco anos de suas vidas, em um ambiente artificial e afastado da realidade cotidiana.  Segundo alguns depoentes do documentário, trata-se de um modelo ultrapassado e elitista, que tem encarecido tremendamente o custo da educação e desviado os propósitos do ensino universitário.

Alguns gráficos do filme mostram o crescimento espantoso do valor das anuidades, que tiveram uma alta de 1.120 %, isso mesmo, mil e cento e vinte por cento ao longo de dez anos chegando algumas à quantia de US$ 60.000 por ano o que representa US$ 1,2 trilhão de endividamento, algo que tem preocupado o país.

É um modelo excessivamente caro para a conjuntura econômica atual, gera dívidas imensas para os estudantes e as famílias que talvez nunca consigam paga-las e ainda não satisfaz a expectativa anunciada pela tríade clássica do ensino superior: conhecimento, diploma e possibilidades de contatos profissionais a preços razoáveis e com um mínimo de igualdade de oportunidades.

Uma das perguntas mais interessantes propostas pelo filme é: por que um estudante médio (ou seja, sem nenhum traço de genialidade) ou sua família pagariam uma dívida de mais ou menos 140.000 dólares ao final de uma graduação, considerando que aproximadamente 40% dos que conseguem se graduar estão desempregados ou subempregados em trabalhos que exigem pouca qualificação ou totalmente fora das competências para as quais pagaram?

O documentário mostra o desvio que se tem produzido em várias instituições que, em lugar de oferecer ensino de qualidade, desafiador e pautado nas necessidades concretas da nação, optam pela construção de grandes instalações esportivas, estádios e piscinas suntuosos, alojamentos em modelo de condomínios de luxo, onde a festa é contínua e as obrigações acadêmicas quase inexistentes.  Felizmente as bibliotecas também continuam grandes e suntuosas, apesar da pouca frequência.

O filme faz um esforço, pequeno talvez, em destacar alguns aspectos positivos do sistema universitário americano: a quantidade e qualidade dos programas de pós, a internacionalidade, o estímulo constante para uma busca de métodos de ensino inovadores, como é o caso da Universidade Deep Springs cujas instalações são modestas e que se baseia em três pilares: autogoverno, estudos e trabalho braçal.  

Há também depoimentos sobre o valor simbólico da universidade, como espaço de convivência coletiva, seu valor histórico na construção do conhecimento humano, mas a melancolia e a crítica acerba prevalecem amparadas em discursos que desqualificam o papel da universidade e do conhecimento sistemático.  Vários nomes de empreendedores famosos são citados como exemplo de sucesso fora do ambiente universitário, tais como: Bill Gates, Jobs e o movimento UnCollege que estimula jovens a deixarem a universidade para aprenderem por conta própria.

Por outro lado, o documentário aponta para uma característica vital da democracia americana: a capacidade de refletir sobre si mesma, com maturidade e sem complacência o que nos diz bastante sobre a vitalidade de sua esfera pública.  E que poderia servir de inspiração à nossa insípida, tendenciosa opinião pública. 

Redação

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