“INJÚRIA RACIAL” equivale a crime de racismo: imprescritível

Por J. Roberto Militão

Uma vitória extraordinária na luta contra o racismo: o delito de ´iNJÚRIA RACIAL´ é uma espécie do gênero ´racismo´, portanto, imprescritível e não afiançável conforme a nova jurisprudência do STJ.

Ninguém, senão a vítima de uma ofensa racial com alusão ao conceito racista do estigma da inferiorização humana, tem idéia da violência psicológica das tais injúrias, em especial nos jovens e crianças ainda não equipados mentalmente para o enfrentamento da sociedade racista. A baixa estima, a evasão escolar, a marginalização e a busca de refúgio em alucinógenos são efeitos colaterais das ofensas racistas.

Esse excelente artigo abaixo contextualiza a recente decisão do STJ – Superior Tribunal de Justiça (o órgão máximo de interpretação das leis) a injúria racial (a ofensa pessoal tipo “preto burro”) também é igualado ao crime de racismo, previsto no art. 5º, XLII da Constituição Federal de 1988 e na Lei Federal 7716/89 – a ´Lei CAÓ´ de autoria do jornalista e Deputado Constituinte Carlos Alberto CAÓ de Oliveira = PDT/RJ e que regulamentou pela primeira vez no Brasil, o racismo como crime, logo após a promulgação da Carta Cidadã de 1988.

Acontece que desde a vigência da lei quase nunca foi efetivamente aplicada pois as autoridades policiais, Juízes e Tribunais vinham decidindo que a ´injúria racial´, não se configurava no crime de racismo, conforme a lei constitucional – e que seria um ´delito menor´, sem as cláusulas de imprescritível e inafiançável.

Numa tentativa de dar eficácia à lei de punição ao racismo, em 1997 o então Deputado PAULO PAIM-PT/RS conseguiu aprovar projeto de lei, tipificando a injúria raical, introduzida no art. 140, 3º do Código Penal. 

Novamente as autoridades passaram a desclassificar toda denúncia de racismo para o delito do tipo ´injúria racial´, do art. 140 do CP. Não consideravam a injúria racial como ´racismo´ e passaram a não aplicar o rigor da lei 7716/89, e com penas brandas ou alternativas (cestas básicas) o racismo no Brasil continua sendo prática recorrente e impune.

Doravante não podem mais decidir neste sentido!

Por conseguinte e analogia o crime de ´injuria racial´ (art.140, 3º do CP) passam também a serem inafiancáveis. Ou seja, doravante, quem os praticar se preso em flagrante pelo delito de ofensa racial, não será facultado ao delegado nem ao Juiz a fixação de fiança para responder em liberdade.

Assim, os praticantes desses crimes de violação da dignidade humana da vítima, responderá ao processo preso. Uma grande conquista no combate ao racismo!

http://www.conjur.com.br/2016-jan-24/decisao-stj-considera-injuria-racial-imprescritivel-correta

Redação

7 Comentários

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  1. Tratar como subdivisão do

    Tratar como subdivisão do racismo até faz sentido, para quem quer pesar a mão do Direito Penal, e acabar com essa gradação que se faz entre o racista absoluto e aquele que se aproveita da cor para ofender em uma situação singular, feito aquela menina da torcida no jogo do Grêmio, e que afinal era a única branca na roda de amigos dela. Pode até ser que transformar o racismo em tabú, com uma pena pesadíssima, transforme a sociedade mais rápido.

    Mas sem negar que o problema seja grave, não acredito que o direito penal máximo seja bom para resolver todos os problemas. E tenho tendência a concordar que isso está abrindo interpretação extensiva em Direito Penal, algo grave, e que vai repercutir em quem se está tentando defender agora.

    Porém essa decisão é monocrática, de um relator convocado do TJ/SP, aparentemente sujeita ao agravo do 545 do CPC, que vai levar ao colegiado de um tribunal com uns 30 ministros brancos de classe alta. A chance de reversão é grande. E não dá para esquecer que a vítima nesse caso foi o Heraldo Pereira, contra o PHA. Tratar como avanço institucional, e não um caso de exceção feito a AP470 seria bastante otimismo.

    1. Erro grave, gravíssimo, quase má fé…

      Relativizar o direito material é um “colosso” de argumento.

      A lei e o diploma legal dispõem de aplicativos (para sermos “mudernos”) que saem do abstrato da lei genérica para a concretude do caso específico, onde são consideradas as circunstâncias e até a dosimetria penal.

      Mas não há como “separar” o racismo em ” de salão” ou de “fim de semana” do racismo Ku-Kux-Klan porque, simplesmente e conceitualmente, os dois se reatroalimentam em relação de causa e efeito.

      É o torcedor racista que xinga o jogador de macaco que dá a senha para o policial agir como pretor de escravos.

      A lei é lei. Racismo é crime e como tal deve ser punido.

      A questão aqui é que os crimes contra os pretos, por mais graves que sejam, não conseguem ter a mesma “mão pesada” Estado dos crimes praticados por pretos, e pior, esses crimes praticados por pretos, se o forem por brancos, também têm tratamento distinto.

      Então, com o seu argumento, por onde quer que olhe, é pau no lombo do negão.

      PS: Quanto a assertiva da exceção do caso em comento, vale dizer o que foi esquecido: Heraldo virou herói da senzala porque serve bem a Casa Grande, e foi ofendido pelo rival PHA.

      Se fosse um jornalista da “casa”(globo) que tivesse chamado ele de pai tomás, estaria tudo bem.

      Esse casdo é excepcional não porque é Heraldo, mas sim porque o Heraldo trabalha na Casa Grande.

    2. Foi decisão da 6a Turma do STJ em Agravo Regimental

      Prezado, embora pertinente o debate doutrinário a que se refere o objeto do post em si, o que saudamos no caso é a mudança jurisprudencial nesta R. Decisão, acolhendo essa dissidência, ou seja: o delito de ´injúria racial´ é espécie do gênero ´racismo´ não se configurando um outro gênero de delito conforme vinha sendo distorcido pela negativa de aplicação do princípio constitucional.

      Por outro lado, não se trata de decisão monocrática, v. certidão da Decisão (fls 13), neste link:

       http://s.conjur.com.br/dl/embargos-stj-paulo-henrique-amorim.pdf 

      ” Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

      Prosseguindo no julgamento pós o Voto Vista da Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Mouta rejeitando os Embargos e os vostos dos Srs. Ministros Sebastião Reia Júnior (Presidente) e Néfis Cordeiro, no mesmo sentido, a Sexta Turma, por unanimidade,  rejeitou oes Embargos de Declaração, “nos termos do Voto do Ministro Relator.”.

      Assim, no âmbito da interpretação da lei, creio que decidiu com todo o acerto, acolhendo a mens legis, da qual aliás, participei ativamente desde a OAB/SP, nos anos 1985/1988, dos debates pré-constituintes de 1988 cujo movimento conseguiu introduzir na Carta Régia, pela vez primeira, a tipificação constitucional, como princípio da voz constituinte, o repúdio ao racismo, até então ignorado no Brasil. Caberá no recurso que certamente chegara ao Supremo Tribunal, a apreciação dessa mens legis no âmbito constitucional, onde provavelmente serão recuperados os debates constituintes da OAB com os deputados constituintes Carlos Alberto Caó de Oliveira, Benedita da Silva, Luis Inácio da Silva, Domingos Dutra, Nelson Jobim e José Serra, ainda vivos, além de textos do saudoso Abdias do Nascimento que informarão os Juízes do Supremo no conhecimento daquele espírito que iluminou a deliberação consituinte. Em alguma representação de ´amicus curiae´ , se for designado, se estiver vivo e em condições de saúde, estarei neste julgamento qu e há de ser a consolidação de um novo posicionamento do estado brasileiro no combate ao racismo e às discriminações de qualquer tipo.

  2. Lei Denorex…

    Uma das características de institutos penais ou princípios garantistas que tratam das violações contra gênero, minorias (ou maiorias) raciais, intolerância religiosa, é um paradoxo, que na verdade é só aparente, porque sua suposta contradição é sua autoexplicação:

    Ninguém tem coragem de combater sua diplomação em público, mas não há um consenso social que leve a sua aplicação.

    E quando falo em consenso, falo em legitimação a ser ratifcada pelas instituições cujo dever é levar a cabo sua aplicação.

    E por uma questão de classe e de escolha política, não levam.

    Tanto aqui, como no Reino Unido, a violência contra a mulher, por exemplo, é subnotificada nas delegacias ou distritos policiais (de acordo com o local e sua nomenclatura).

    Crimes religiosos (intolerância) no Brasil são comuns, mas comumente chamados de conflitos de vizinhança, escondidos atrás dos títulos “ameaça”, “dano”, “injúria”, levados em banho maria nos juizados especiais até que a parte ofendida “aceite” a homologação de um “acordo”.

    No caso das mulheres é mais ou menos a mesma coisa, apesar do número significativo de ferramentas (direito material e leis processuais), entes (delegacias especializadas, abrigos), e principalmente, de mulheres delegadas e policiais, as vítimas continuam a ser consideradas as maiores “culpadas” pelas agressões sofridas, ou porque são “sem-vergonha” (ótica policial insensível e sexista que desconhece o processo cruel de vitimizaçãoque acomete as mulheres alvo de assédio moral e físico, que as confina em um ciclo de apanha-acredita-perdoa-apanha), ou porque “provocam”…

    No caso da injúria racial, o troço é mais doido…

    Uma amiga pesquisadora aqui do RJ (UENF/Núcleo de Estudos da Violência) auferiu que poquíssimos ou quase nenhum dos casos de intolerância religiosa é sequer anotado como tal (registrado na Delegacia), e muito menos vai aos tribunais.

    A saber, coincidentemente e tragicamente, as vítimas maiores de intolerância e racismo se confundem: Cultos afrobrasileiros e seus fieis, demonizados pela Cruzada Moral Ultraneopenteconstal, eles mesmo vítimas em tempos pretéritos, ironicamente.

    O mesmo vale para o racismo.

    Um labirinto de justificativas e “doutrinas” arrefecem qualquer chance de punição, na nossa melhor tradição Casa Grande e Senzala.

  3. Teorias, teorias,

    Teorias, teorias, teorias…

    Na prática, no dia a dia, o negro continua tomando porrada da policia, a madame continua atravessando a rua quando vê um “negrinho suspeito”, sem direito aos melhoes postos de trabalho, mesmo sendo qualificado para tal. … e por aí vai.

    Que diferença faz, se é injuria racial, ou preconceito racial ?

    E tome teoria.

    O preconceito ou injuria, como queiram, só irá diminuir/atenuar, depois que os negros ocuparem postos chaves, postos de comando, na sociedade brasileira. 

    Parte da sociedade negra tem que está no topo da pirâmide social.

    Já se passaram 514 anos e não conseguimos chegar lá.

    Então como chegar ? Através das cotas sociais,do Bolsa familia, Enem, Sisu, Pronatec, Ciência sem fronteira… que o Militão é contra.

     

     

     

    1. Cotas Sociais, Bolsa família, Enem, Sicu, Pronatec

      Ciência sem fronteiras, MC/MV, aumento do salário mínimo, direitos das empregadas domésticas são todas políticas pública que sempre apoiei. Todas são políticas de ações afirmativas sem a consideração da raça ou da cor do cidadação para o exercício de direitos.

      Basta vc ver que 70% dos beneficiários desses direitos são pretos e pardos. E nenhuma dessas políticas públicas precisa se referir à falácia de ´raça´ nem à cor dos beneficiários. Já pensou num projeto habitacional algum prefeito louco (e existem muitos), hipócrita, paternalista e racista dizer que 50% das unidades serão para pretos e pardos?? Oras, estariam contemplados os afro-brasileiros? Seria outro engodo. Sem tal ´cota raciai´, somente pelo critério de renda per capita, 70% das unidades de qualquer conjunto habitacional MC/MV tem mais de 70% de pretos e pardos.

      Gilson, meu prezado, Vc está totalmente enganado ou jamais leu o que escrevi. 

      No Brasil, a partir de 1986, fui um do primeiros defensores de políticas públicas de Ações Afirmativas – o que não se confunde com ´cotas raciais segregadas´. A minha oposição sistemática é contra a prática do racismo estatal, inclusas as políticas públicas de segregação de direitos raciais pela simples razão: esse tipo de política pública traz a lógica do racismo, com a presunção de uma inferioridade ´racial´ que exige políticas de estado para a igualdade ´racial´.

      A maioria absoluta dos pretos e pardos (63%) são contrários a esse tipo de privilégio pois isso, praticado pelo estado, viola a dignidade humana dos beneficiários e jamais foi empregada em qualque país do mundo. Já adianto para tua informação que mesmo nos EUA jamais houve uma lei de ´cotas raciais´. 

      Na hipótese desse post, a importância do debate ´teórico´,  é que os Juízes e Tribunais de homens brancos, vinham sempre desclassificando a denúncia de racismo como sendo ´injúria racial´ e com isso deixavam de aplicar o rigor da lei Caó que considera crime imprescritível e inafiançável.

      Doravante, após anos de debates ´teóricos´, conseguimos convencer o Superior Tribunal de Justiça – STJ que injúria racial também é ´racismo´ e portanto, agora, mesmo desclassificando o rigor da lei e da pena serão idênticas.

      Isso, do debate teórico, faz parte de nossa luta por igualdade de tratamento e por Justiça!

      Veja que não falo em privilégios, mas tão simplesmente, em igualdade e em Justiça.

      abç;.

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