Ion de Andrade
Médico epidemiologista e professor universitário
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O colapso do abastecimento em SP e as cortinas de fumaça

A falta d’água em São Paulo pode selar o destino das eleições presidenciais em detrimento do PSDB e tem poder suficiente para descontinuar 20 anos de governos tucanos em São Paulo. Este fato político maiúsculo nada é diante do risco real de catástrofe de conseqüências humanas, sociais e econômicas desconhecidas. De fato não há paralelo conhecido para a não oferta de água para grupo populacional avizinhando 20 milhões de habitantes.

A tentativa de criar escândalo em torno de um possível erro empresarial da compra de uma refinaria nos EUA (que dá lucro, aliás), parece tentativa diversionista obrigatoriamente fadada ao fracasso pois, o tema destinado a ocupar as preocupações nacionais neste ano e no próximo será, se chuvas em grande volume não aparecerem, o colapso do abastecimento de água na maior megalópole do hemisfério sul. O problema é que a diversão assume, na psicologia de quem está acuado, papel desmobilizador da tomada de decisões enérgicas, que implicariam, para serem viabilizadas, no reconhecimento aberto da derrota indiscutível de um projeto administrativo de 20 anos.

O problema de gravidade única, a confirmar-se, terá repercussões nacionais, pois a economia de São Paulo é ainda a locomotiva econômica do Brasil e não há atividade industrial que não dependa fortemente de ÁGUA.

A água não serve somente para beber ou lavar a louça, a casa e tomar banho, a água é matéria prima ou toma parte de inúmeras atividades econômicas. A confirmar-se a penúria que se avizinha, o impacto da falta d’água em São Paulo para o PIB brasileiro será imenso, muito maior do que os míseros pontos percentuais projetados a menor para 2014 em virtude das questões econômicas.

A gravidade do problema é patente para todos, mas há um ônus político, inevitável, para os governos paulistas que não investiram para ampliar a oferta de água. Vinte anos. Não há como desvencilhar-se desta pesada responsabilidade e o gestor responsável deve assumi-la para ir adiante.

O desespero, não assumido, é berço de medidas diversionistas sobretudo quando o governo está acuado e não tem a  estatura moral ou política para envidar esforços e energias para galvanizar as soluções emergenciais que já deveriam estar sendo materializadas aos olhos de todos, num esforço de guerra. Vamos reconhecer que as medidas de contenção de energia elétrica do governo FHC foram mais dignas e robustas do que o que vemos em São Paulo hoje,

Ao PSDB caberia o mea culpa público, única base sobre a qual, ainda que derrotado, poderia tentar enfrentar o problema de pé. A diversão adiará medidas mais robustas de enfrentamento do problema, pois o cisco no olho dos outros é sempre alívio para a trave nos próprios olhos. O trem porém corre para o abismo.

É hora dos tomadores de decisão de todos as esferas de governo sentarem à mesa para dar início às obras que podem, ainda que num horizonte de alguns meses ou anos, minimizar ao menos no médio prazo, a catástrofe que, até aqui, parece aproximar-se. O tempo corre e cabe irrecorrivelmente ao governo de São Paulo liderar o esforço, por isto o reconhecimento da magnitude do problema é fundamental como parte do processo de enfrentamento.

Se em lugar de uma seca ocasional, isto vier a mostrar-se um novo padrão climático o problema em lugar de pontual seria a regra. Nem isto está excluído.

É hora de buscar saídas emergenciais, pois a imprevidência político-administrativa dos governos paulistas criou o risco de uma catástrofe nacional sem precedentes. Vai a nação viver  nos próximos meses a contagem regressiva dos níveis da Cantareira, enquanto a grande mídia falará de Pasadena? Se isto contecer, mesmo assim, a realidade baterá à porta de todos.

Ion de Andrade

Médico epidemiologista e professor universitário

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