Vamos embora pra Pasárgada?

Do blog Chata por Opção

Me lembro da primeira vez que li o poema de Manuel Bandeira “Vou-me Embora pra Pasárgada”, fiquei um tempo imaginando como seria aquela terra onde, sendo amigo do rei, você poderia ter tudo o que quer.  Quando a professora pediu que escrevêssemos como seria nossa Pasárgada cada um idealizou a sua com elementos que compõe a utopia de um paraíso, com a garantia de sua própria felicidade.

Recentemente li uma declaração de um jornalista famoso e polêmico se queixando de uma professora da filha dele, que teria criticado o político que ele defende e a revista onde ele trabalha.  Furioso, ele disse que em breve livraria a filha desse tipo de professora, pois está de mudança para os EUA.

Desde o último período eleitoral tenho visto muita gente com um desejo forte de ir embora do Brasil. Normalmente, essas pessoas querem se ver livres dessa terra onde não conseguem ter o querem ou fazer prevalecer suas vontades, então passam a procurar suas Pasárgadas, onde todos os problemas da terra tupiniquim não existem, onde elas esperam ter a vida que sonham.

Acho muito saudável morar em um outro país, a diferença cultural e social enriquece a formação e amadurecimento do ser humano.  Conheço algumas pessoas que foram morar fora e outras que decidiram adotar o Brasil como lar. Sempre que converso com essas pessoas sobre como é viver em um outro país percebo que há um consenso: há perdas e ganhos, não existe um lugar perfeito.

O que chama atenção na atitude do tal jornalista, e de muitos outros que gritam em coro que vão embora do Brasil, é a motivação que eles têm. Insatisfeitos com a atual situação política, social e econômica e sem poder impor suas vontades e ideias para um Brasil melhor, essas pessoas sonham com a Pasárgada de Manuel Bandeira.  É curioso pensar que tanta gente acredita que nos EUA as pessoas são livres. Cada vez que passo por lá fico mais convencida de que o conceito de liberdade dos americanos é uma ilusão. A sociedade é bem organizada e funcional, porém isso é fruto de um controle acirrado que tolhe a liberdade. Recentemente, um colega me chamou a atenção para uma placa em um mall a placa dizia “loitering forbidden”. Já havia visto essa frase em outros lugares , mas como não conhecia a palavra loitering sempre a ignorei. De acordo com o dicionário essa palavra significa ficar parado ou esperando sem razão aparente. Fiquei impressionada de haver uma palavra para definir isso, mais chocada ainda de pensar que em um local “público” você não poder estar parado esperando alguém, pois é difícil imaginar como alguém aparentaria uma razão para esperar. Esse é só um exemplo de coisas que fazem acreditar que a sociedade americana não vive em liberdade, ela funciona, mas a um alto preço.

É verdade que a sociedade brasileira ainda tem muitos problemas que não encontramos com tanta evidência em outros países. Porém, não podemos ignorar que a história de formação e evolução desses países foi bem diferente da nossa. Se hoje eles tem uma sociedade com poucos problemas sociais, certamente isso não foi construído em 50 anos. Além disso, é notório como em outros países a população, sobretudo a parcela mais esclarecida, tem um compromisso com a terra onde vive, contribuindo para o desenvolvimento e preservação da sociedade a qual faz parte. Infelizmente, isso não é tão comum aqui no Brasil.

Não consigo observar o comportamento de pessoas como esse jornalista e não associar aos colonizadores e exploradores do passado, que após terem sugado de nossas terras tudo quanto puderam foram embora com os bolsos cheios, deixando um rastro de asco e repúdio. Certamente, mesmo vivendo lá na terra do tio Sam ele continuará enriquecendo às custas dos brasileiros que cultuam seus ensinamentos e sonham em se juntar a ele.

Lamentavelmente, essas pessoas não querem um Brasil justo, desenvolvido. Na verdade o que buscam é um lugar onde os problemas fiquem camuflados ou afastados para bem longe, se possível do outro lado do oceano, para que os amigos do rei possam viver livres. É triste pensar que muitos são iludidos com a ideia do paraíso assim como Pasárgada era para o poeta. São induzidos por discursos inflamados de formadores de opinião tal qual o jornalista referenciado aqui. Muitos aceitariam até abdicar de suas competências intelectuais para exercerem funções que os amigos do rei não querem executar, desde que possam viver na Pasárgada da elite.

Prefiro acreditar que é possível  construir uma Pasárgada brasileira, realmente livre e justa. Onde a alegria seja geral e todos se sintam incluídos como amigos do rei.
Essa Pasárgada pode ser construída. Para isso o povo precisa ter orgulho de viver aqui. É necessário desconstruir antagonismos entre ricos e pobres, acabar com o oportunismo que ainda impera por aqui, ter compromisso com o coletivo acima do individual. O caminho é longo, mas juntos podemos chegar lá. E então, vamos embora pra Pasárgada?

Ref: http://chataporopcao.blogspot.com.br/2015/03/vamos-embora-pra-pasargada.html

Redação

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