A profecia do censor da ditadura, por Fernando Morais

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Foto: Assis Chateaubriand e Carlos Castelo Branco

Por Fernando Morais

A profecia de Ataliba, o censor

Do blog Nocaute

A propósito da volta sorrateira da censura, lembrei da história do Ataliba, o último censor do jornal Estado de Minas durante o Estado Novo. O episódio me foi contado pelo genial jornalista piauiense Carlos Castelo Branco, o Castelinho, para o livro “Chatô, o rei do Brasil”.

No começo de outubro de 1945 já se podia perceber que os dias do Estado Novo estavam contados.

Farejando a agonia do governo, Chateaubriand distribuiu uma ordem a todos os órgãos Associados: em suas rádios e jornais as instruções da censura deveriam ser pura e simplesmente ignoradas.

Em Belo Horizonte era Carlos Castelo Branco quem estava na chefia de redação do Estado de Minas quando Chateaubriand telefonou pessoalmente para o diretor Gregoriano Canedo:

– Canedo, dispense o censor. De hoje em diante não tem mais censura no jornal.

Amigo do prefeito Juscelino Kubitschek (que além de patrono de generosas dotações de verbas oficiais ao jornal era politicamente ligado a Getúlio), Canedo entrou em pânico com a ordem que recebera. Chamou Castelo e passou o abacaxi adiante:

– Castelinho, o Chateaubriand mandou dispensar o censor, não receber mais ordens dele. Eu vou embora para casa, você se vira aí com o Ataliba.

Fazia tantos anos que Ataliba, o censor, dava seu plantão ali, que ele já se sentia parte integrante da redação. Chegava todas as noites de terno branco e chapéu panamá, pendurava o paletó na cadeira e ia recebendo as pilhas de laudas datilografadas das mãos de Castelo. Com o tempo estabeleceu critérios pessoais do que podia ou não podia ser publicado (a palavra democracia, por exemplo, só poderia sair em títulos quando estivesse entre aspas, e desde que fosse parte integrante de discursos de Churchill ou de Roosevelt).

Naquele dia ele chegou como se nada tivesse acontecido, pendurou o paletó e pediu a Castelo o primeiro pacote de trabalho para ler. O rápido diálogo entre os dois ficou célebre, para as gerações de jornalistas que vieram depois, como um presságio da ação de ditaduras sobre a liberdade de imprensa. Castelo transmitiu com bom humor a ordem de Chateaubriand ao censor:

– Não, Ataliba, hoje você não vai ler o jornal aqui. Se você quiser ler o Estado de Minas vai ter que comprá-lo na banca amanhã de manhã.

Ataliba se levantou, pegou o paletó e deixou no ar uma frase profética:

– Já entendi tudo, eu vou-me embora. Mas não tem importância, um dia eu volto.

Ataliba voltou dezenove anos depois, na noite de 1º de abril de 1964.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

6 Comentários

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  1. Ataliba virou dono de mídia…
    Nassif, Ataliba aliou-se aos banqueiros, rentistas e multinacionais interessadas em nossas minas gerais ou específicas como SP. Como quarto poder sustenta os golpes dos outros três e vive, como os demais participantes do festim, das privatizações sob encomenda e verbas meritocráticas a fundo perdido ou anistiado que aplica no mercado financeiro – de preferência internacional, pois de quando em vez por aqui renasce algum “pai dos pobres” e até reduzi-lo a sub-molusco – a poder de novelas associadas à falta de educação e notícias reais – os seus herdeiros fazem como a nova PGR, a bradar contra os corruptos, de braços dados com os mesmos. Pouco importa a tiragem ou audiência, o segredo desse faz-de-conta exitoso é manter as aparências e cantar “moro em um país tropical” ao som do batuque em panelas vazias liderado por sub-contratados do estrelato que cria e fomenta a seu bel-prazer e interesse. Ataliba virou dono de mídia…

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