A tragédia no RJ e o desespero de quem fica sem plano de saúde, por Cristiane Segatto

Jornal GGNEm coluna publicada no site da Época, a repórter Cristiane Segatto fala sobre o caso da família que foi encontrada morta no condomínio em que morava na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. A polícia trabalha com a possibilidade de um triplo homicídio seguido de um suicídio. Em uma carta encontrada no local, o pai da família , Nabor Coutinho de Oliveira Júnior, fala sobre preocupações a respeito de dificuldades financeiras.

Um dos trechos da carta fala sobre a aflição em relação ao plano de saúde. Para Cristiane, esta preocupação é comum para “1,5 milhão de brasileiros que deixaram os planos de saúde nos últimos 12 meses – a maioria porque perdeu o emprego”.

Para ela, ter um plano de saúde virou um dos principais objetivos dos brasileiros, mas “não deveria ser assim”. “Será que o Sistema Único de Saúde é tão ruim quanto parece? Será que os planos de saúde são tão bons quanto querem nos convencer?”, questiona a colunista.

Leia a coluna completa abaixo:

Da Época

O desespero de quem perde o plano de saúde

Família é encontrada morta em condomínio da Barra da Tijuca, no Rio. A dificuldade para contratar um convênio médico é citada em carta de despedida

Cristiane Segatto

Nesta tarde de segunda-feira (29), aqui na redação de ÉPOCA, eu deveria estar concentrada no depoimento da presidente Dilma Rousseff no Senado. A voz dela e dos senadores ecoam em todas as tevês ligadas a minha volta, mas minha mente escapa. Foi atraída irremediavelmente pelo drama da família destruída nesta manhã num condomínio da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. É uma história singular que, somada a tantas outras dores particulares, diz algo sobre o momento que o Brasil atravessa.

Quatro pessoas da mesma família foram encontradas mortas. A polícia investiga a hipótese de triplo homicídio seguido de suicídio.O administrador Nabor Coutinho de Oliveira Júnior, de 43 anos, teria matado a mulher a facadas dentro do apartamento do casal, no 18º andar. Depois, pulado do apartamento com os dois filhos. Henrique, de 10 anos, e Arthur, de 6 anos, foram encontrados perto do pai. Três corpos na área de lazer.

Não consigo ficar impassível diante da carta encontrada pela polícia e supostamente escrita por esse pai em desespero. O texto está dividido em tópicos. O autor dá a entender que o motivo do crime teria sido a crise financeira.

O trecho da carta a que o jornal O Globo teve acesso começa no item 6: (…) “Me preocupo muito (sic) deixar minha família na mão. Sempre coloquei eles à frente de tudo e até nessa decisão arriscada para ganhar mais. Mas está claro para mim que está insustentável e não vou conseguir levar adiante. Não vamos ter mais nada e não vou ter como sustentar a família.”

>> Outros trechos da carta, segundo reportagem do jornal O Globo

E prossegue: “Sinto um desgosto profundo por ter falhado com tanta força, por deixar todos na mão. Mas melhor acabar com tudo logo e evitar o sofrimento de todos”.

O item 9 revela uma aflição comum a 1,5 milhão de brasileiros que deixaram os planos de saúde nos últimos 12 meses – a maioria porque perdeu o emprego.

“Ainda não conseguimos contratar o novo plano de saúde porque estava aguardando a criação do CNPJ.” Ele menciona que a operadora estaria avaliando o preço a ser cobrado. “Com o histórico médico da Laís e do Arthur será que aprovam? Será que não vai ficar super caro?”

Esse ponto se tornou fonte de sofrimento coletivo desde que os planos individuais e familiares sumiram do mercado. As operadoras perderam o interesse em oferecê-los quando a lei proibiu a restrição de coberturas ou a prática de aumentos abusivos contra o cidadão.

Hoje quem perde o vínculo com uma empresa, se vê obrigado a contratar um plano como pessoa jurídica (criar o tal do CNPJ, como mencionado na carta). Ou a aderir a um sindicato ou associação para se enquadrar num plano coletivo por adesão.

Teoricamente coletivos, os planos são vendidos a indivíduos. Indivíduos esses que não contam com a mesma proteção exigida dos antigos planos individuais – aqueles que sumiram do mercado. Com esses novos contratos, as famílias sem outra opção ficam sujeitas a sofrer aumentos abusivos, negativas de cobertura ou exclusão do plano. É cruel.

>> O lado oculto das contas de hospital

As regras desse jogo precisam mudar. Elas não explicam a tragédia do Rio, mas a menção a esse mercado numa carta suicida suscita uma reflexão urgente.

O desemprego desestabiliza qualquer um. A maioria dos que passam por isso consegue reunir forças e seguir em frente. Outros entram na dolorosa espiral da depressão. Precisam de ajuda e proteção da família, dos amigos, do Estado.

O que não é aceitável é que o pavor de não receber assistência durante o adoecimento tenha se tornado tão generalizado no Brasil. Ter um plano de saúde privado virou um dos maiores objetos de desejo dos brasileiros. Não deveria ser assim.

Será que o Sistema Único de Saúde é tão ruim quanto parece? Será que os planos de saúde são tão bons quanto querem nos convencer? Conversaremos mais sobre isso.

(Cristiane Segatto é repórter especial, colunista de ÉPOCA on-line e comentarista do Boletim saúde e bem-estar da Rádio CBN)

 
Redação

18 Comentários

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  1. Nada é tão ruim que não possa piorar
    Vemos agora o “ministro da saúde” propor planos de saúde populares.

    Assim, o “paraíso” da classe média será acessível a todos.

    Mesmo com a água acima do pescoço, setores majoritários da nossa sociedade não percebem, ou não querem, a necessidade do sus. Vejo que a nossa classe média o considera ” aquela coisa para os pobres”, quase um ato de caridade.

    E com isso virou massa de manobra dessa elite PREDADORA que quer acabar com as conquistas sociais da CF 88.

    Tristes tempos pela frente.

    E aqueles que iam às ruas dizendo que “não era só por vinte centavos” e sim por” educação e saúde padrão fifa”, padrão este a se provar, se quedam mudos.

    Mas enfim esqueceram aquelas tardes heróicas em que ” saíram do Facebook”.

    Tanto esqueceram que o mote “não vai ter copa” não foi atualizado para as olimpíadas.

    Talvez porque estivessem ocupados em dar um golpe de estado. Golpe este que visa destruir a educação e saúde que eles “tanto defendiam”.

  2. A classe média brasileira esta imitando as neuras e psicoses da

    classe média americana! É a única explicaçãode pois de 50 anos a Globo esta conseguindo o que queria um bando de robos dipostos a qualquer loucura para parecerem americanos 🙁

    1. sempre ela, Globo…

      usada como calculadora financeira científica para toda desgraça

      e como mecanismo temporizador de sofrimentos

      estudem melhor qual é a principal função de uma TV, sendo um dos predadores dos mais vorazes, por internos,

      ou admitidos dentro de casa por nós mesmos

  3. Poderia ter plano de saúde individual

    Hoje quem perde o vínculo com uma empresa, se vê obrigado a contratar um plano como pessoa jurídica (criar o tal do CNPJ, como mencionado na carta). Ou a aderir a um sindicato ou associação para se enquadrar num plano coletivo por adesão.

    Ele saiu da TIM e foi trabalhar como consultor para uma empresa estrangeira. Deve ter criado uma microempresa, ou coisa parecida (daí a referência a CNPJ), e iria contratar um plano pela empresa, que certamente sairia mais barato e mais completo do que um plano individual.

    Mas essa não é a única opção pra quem não é empregado, como diz a Época. Pode contratar um plano de saúde individual também. Minha esposa passou um tempo como autônoma enquanto estudava pra concursos e contratou um plano individual.

    A questão é que, em qualquer opção, planos de saúde são extorsivos pra quem está na nossa faixa de idade (40/45 anos), e simplesmente proibitivos para idosos…

  4. Tá estranho demais…..

    Muito.

    A classe média tá pankadona, por todos os PLIM motivos.

    Mas matar os filhos por…..?

    Vc. abre uma MEI pela internet em 24 horas…. e faz um plano com os dependentes.

    Tá louco, demais.

  5. A próxima onda de depressão

    A hora que a classe média – que deu apoio ao processo ilegítimo do Golpe – se der conta que não tem mais SUS, nem aposentadoria, nem Enem para faculdade dos filhos, a depressão virá e será brava.

    Para quem vive a vida pequena, só de trabalho, sexo e circo, a ficha da ditadura que virá após o GOLPE ainda não caiu. Para o resto de nós, que aprendemos a ler o mundo e a sonhar com país decente, a figura de Dilma ontem, como o farol da Democracia iluminando o país na escuridão, é a última luz que veremos por muitas décadas.

    O abismo de fascismo, barbárie e corrupção que se prenuncia com o avanço do GOLPE será o fim de todos os nossos sonhos de uma vida melhor.

  6. sus

    com todo respeito com quem discordar : utilizo o SUS desde 2005………….faz 11 anos, e nada tenho a reclamar.

    o pessoal se apega ao plano de saúde como de fosse uma bóia num grande oaceano.  

  7. Fico imaginando esses

    Fico imaginando esses empresários que tiveram que depor na lava jato e que estava ganhando dinheiro com todas as obras que eram ofertadas pela demanda de um país que crescia e ver tudo acabar na sua frente. Fico imaginando tantas pessoas que tinha garantido um curso superior através do fies, enem, podia ir ao exterior com ajuda do governo fazer um intercâmbio e ver tudo desmoronar na sua frente. Fico imaginando tantas pessoas que sonhavam com uma vida melhor com um apartamento novo, casa nova, viagens ao exterior e tudo desmoronou em sua frente. Sem sonhos, tudo acabado de uma hora para outra, como essas pessoas poderá aguentar. E esses caras que roubaram tantos sonhos ficaram soltos sem pagar nada por isso?

  8. E ainda tem mané querendo Dilma de volta?
    Quem lê uma reportagem dessas e ainda defenda a volta daquele ser à presidência deve ser tratado por loucura ou preso preventivamente por corrupção. A mulher destruiu o país! Não importa o motivo, tirem ela já, nem que seja pelo gosto duvidoso nos vestidos….chutem que é macumba!

    1. Coxinha fascista.

      Prezado coxinha fascista (que acha que quem não é trouxa como ele deve ser preso), se o Brasil está mal das pernas, agradeça aos golpistas da câmara que paralisaram o país (ou votaram apenas as pautas bomba). Volte a comer a alfafa da veja e globo e não nos importune com a sua ignorância, ok?

  9. Forte mesmo são os pobres – a
    Forte mesmo são os pobres – a esses não é dado a fraqueza de se matarem por conta da ausência de um plano de saúde, moradia ou falta de emprego. Todo dia é mais um dia de encarar a realidade, pois a vida é aqui e agora. Ainda foi egoísta ao não dar a chance das crianças crescerem. Até parece que ficamos doentes a todo instante!

  10. como faço questão de ser frio nessas horas…

    a primeira tragédia de muitas que virão

    e que jamais acontecerão com os que fabricam camisetas da seleção

    1. como faço….

      Não sei se foi a censura auto-implantada pela imprensa ou outro tipo de  ocultação de fatos que está se tornando a prática no estado de SP, mas não entendi porque o suicidio desta família no RJ foi tão divulgado e o mesmo tipo de ocorrência em SP, foi tão escondido e omitido.

  11. Sinceramente……o cara era
    Sinceramente……o cara era maluco, autoritário, escroto……apenas isto……

    Qualquer um tem plano de saúde…..desculpinhas fajuta

  12. Escandinávia

    Nossa classe média não se permite dividir enfermaria com a esposa do porteiro…

    Não admite que seus filhos dividam sala de aula com filhos de operários…

    Mesmo que saúde e educação, de qualidade, sejam custeados pelo Estado… Como nos países “primitivos e comunistas” da Escandinávia.

  13. Poucos aguentam

    Diante do sofrimento extremo, poucos seres humanos mantém a serenidade.

    A pessoa quando perde aquilo que estava identificado, como emprego, renda, plano de saúde, condições de se alimentar, na maioria das vezes colapsa.

    Nisto,os pobres são muito mais fortes do que os ricos e a classe média, pois o pobre sempre viveu uma vida sofrida, ele na hora da dor é mais forte, é muito  mais calejado contra a crise econômica,

    O pobre, quando não tem emprego, faz bicos, vira camelô. Quando não tem plano de saúde, apela para benzedeiras, curandeiros, ervas, chás e medicina alternativa. O pobre quando não tem dinheiro para comprar eletrodomésticos, compra usado. Quando não tem dinheiro para comprar roupas, apela pra brechós de roupas usadas. Quando não tem o que comer, busca nas matas e terrenos baldios, ervas, e plantas comestíveis. A grade religiosidade dos mais pobres é onde eles buscam forças e explicações quando tudo falha e parece que chegou ao fim da linha, e a vida perde o sentido.

  14. plano de saúde

    Pretender culpar a falta de plano de saúde – ou a preocupação com sua falta, melhor dizendo, pelo assassinato e suicídio desse pai de família, é forçar a barra de uma maneira muito irresponsável.

    Sem discordar da análise sobre quão bons ou ruins são os planos em comparação com o SUS, tanto o SUS real quanto aquele que todos desejamos que venha e existir um dia – está mais que óbvio que o motivo que levou esse homem a tal ato extremo foi pura e simplesmente insanidade, fosse ela momentanea ou cronica.

    Querer avaliar este comportamento claramente insano pela ótica racional e lógica (um sujeito que sequer estava com as contas atrasadas) seria justificar a priori o suicidio coletivo de milhoes de brasileiros.

    Se há que se lamentar a falta do plano de saude, seria a notavelmente péssima cobertura da especialidade psiquiátrica, sempre relegada em nosso país, inclusive e a começar pelo SUS.

    Como se as desordens psiquicas fossem questões menores e não se tratassem de problemas de saúde.

     

     

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