Advogado de Palocci critica “festival de prisões arbritrárias”

Jornal GGN – Em artigo publicado na Folha de S. Paulo, José Roberto Batochio, advogado do ex-ministro Antonio Palocci, critica a maneira como estão sendo conduzidas as investigações da Operação Lava Jato. Para ele, há um “festival de prisões arbitrárias, antecipatórias da final condenação” e um desprezo pela instituto da presunção da inocência. Batochio ainda afirma que as delações são obtidas “sabe Deus a que meios” e diz esperar que o STF “possa reconduzir a nau da Justiça ao porto da legalidade”.

Enviado por Webster Franklin

Da Folha

Curto-circuito no Direito

José Antonio Batochio

“Toda vez que acende a luz do sr. Francisco Campos há um curto-circuito na democracia.” (Rubem Braga)
 
Francisco Luís da Silva Campos (1891-1968) foi um brilhante jurista das Minas Gerais, o primeiro ministro de Estado da Educação, em 1930, e autor de leis que modernizaram o Direito no Brasil, como o primoroso Código Penal de 1940.
 
Mas o prato situado à direita da balança representativa da sua concepção de Justiça era tão pesado que se inclinava na direção do fascismo. Foi com tal inspiração que escreveu a Constituição de 1937, baseada na legislação imposta à Itália por Mussolini, bem como o Ato Institucional nº 1, que deu início à institucionalização do regime militar.
 
Daí a fina ironia do cronista autor de “O Conde e o Passarinho”, transcrita na epígrafe destas linhas.
 
Transposta aos nossos dias, a blague já não focaliza apenas um homem soturno, mas se ajusta à parte de nossos operadores do Direito que, quando põem o dedo no interruptor da jurisdição penal, acendem-se espessas trevas processuais.
 
Trata-se de um segmento dos órgãos da persecução penal e de certos magistrados “justiceiros”, que atropelam o devido processo legal e se autoinvestem de legisladores para os casos com que se deparam e para os quais pretendem reescrever as leis penais e processuais.
 
Excitados pelo “clamor da turba”, na expressão de Rui Barbosa a lembrar Pôncio Pilatos no mais célebre julgamento da história, esses operadores do Direito estão mandando às favas princípios e garantias universais e calcando o prato direito da balança da Justiça.
 
Assistimos atônitos a um festival de prisões arbitrárias, antecipatórias da final condenação, ao desprezo pelo instituto da presunção de inocência, à submissão de réus a constrangimentos para que revelem crimes de outras pessoas, ao desrespeito flagrante às leis, ao abandono da boa prática da apuração e à correção das investigações que resultam em prova indiciária factual.
 
Entronizou-se no nosso processo o boato, o “diz que”, o “suspeita-se que”, de delações obtidas sabe Deus a que meios, embora saibamos, seguramente, que não são meios de Deus. Processo com sigilo decretado (só para a defesa, é claro), então, tornou-se melancólica “mentira legal” quando se trata de “vazar” dados para se assassinarem reputações e se prepararem arbitrariedades. Assistimos a esse acinte diariamente no noticiário.
 
A matéria é tanta que se faz necessário um recorte para que o todo não esconda a parte. Particularmente escandaloso é o desrespeito à lei nº 9.296/96, a chamada “Lei do Grampo”, que regulamenta a interceptação de comunicações telefônicas, telemáticas etc.
 
Seu artigo 8° é meridiano: “A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas”.
 
Autos apartados para preservar sigilo? Na prática, saem dos escaninhos oficiais para as manchetes. O que deveria ser sigiloso, resguardado no interesse exclusivo do processo legal, resplende em público na forma de “vazamentos seletivos”.
 
Ninguém jamais é identificado, muito menos responsabilizado. Exceção a essa regra é o ex-deputado Protógenes Queiroz, que não era do clube, foi condenado a dois anos e seis meses de prisão e perdeu o cargo de delegado da Polícia Federal por “violação de sigilo funcional”, isto é, forneceu à imprensa dados sigilosos da Operação Satiagraha.
 
Já os intocáveis hodiernos, a pretexto de “fazerem justiça”, ficam impunes. Lavram os autos nos jornais, nas revistas e nas ruas, buscando apoio fora dos tribunais, como chegou a pedir um procurador. Essas ilicitudes costumam prosperar em ambientes de decadência institucional e social, em que germinam disputas de fundo, praxe em conjunturas políticas turbulentas.
 
O império da lei, e aqui se trata de um ordenamento jurídico democrático e justo, esvai-se na tibieza de autoridade de uns e crescimento do poder autocrático de outros. Resta-nos esperar que o Supremo Tribunal Federal possa reconduzir a nau da Justiça ao porto da legalidade.
 
JOSÉ ROBERTO BATOCHIO, 71, advogado criminal, foi presidente nacional da OAB e deputado federal por São Paulo. Defende o ex-ministro Antonio Palocci na Operação Lava Jato
Redação

5 Comentários

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  1. Um contraponto – também na Folha

    Sem emitir nenhum comentário, trago aqui o outro lado da questão, o do Ministério Público. Na mesma edição da Folha de São Paulo o procurador Carlos Fernando Lima defende as investigações.

    http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/07/1650490-nao-existe-jesus-cristo-nem-judas-no-petrolao-diz-procurador-da-lava-jato.shtml

    Ideólogo e principal negociador das delações premiadas da Operação Lava Jato no Paraná, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima disse que a presidente Dilma Rousseff fez uma “comparação infundada” ao igualar a Joaquim Silvério dos Reis, o traidor de Tiradentes, os delatores que negociaram com a Justiça em troca de redução de pena no caso do petrolão.

    Segundo ele, a delação do dono da UTC, Ricardo Pessoa, desmonta a tese de advogados de que prisões preventivas viraram instrumento de coação. Lima diz que não existem indícios suficientes para investigar Lula, mas que a situação de José Dirceu ficou “muito difícil”.

    Folha – Como o sr. interpreta as declarações da presidente Dilma Rousseff que comparou delatores da Lava Jato a Joaquim Silvério?

    Carlos Fernando Lima – A comparação com Joaquim Silvério ou com Judas Iscariotes, como já vi, é totalmente infundada porque não vivemos nem na Roma imperial nem nos tempos de Maria Louca [rainha de Portugal, 1777-1816]. Vivemos na democracia. Como não há [entre delatados da Lava Jato] nem Jesus Cristo nem Tiradentes, não há entre os delatores nem Judas nem Silvério.

    Advogados de defesa vêm reiterando que as prisões preventivas decretadas pelo juiz Sergio Moro são uma forma de coagir para obter delações.

    É absolutamente inverídico. Dois terços das delações feitas foram de pessoas sem foro, que não estavam presas. Seria o caso da delação do Ricardo Pessoa, por exemplo, que se deu no STF. As pessoas optam por colaborar muito mais medo do processo e da prisão no futuro do que pelo encarceramento preventivo.

    Qual o impacto da delação do Pessoa para as investigações?

    Não sei até onde ela existe e os elementos colhidos. O que vejo são notícias a respeito. O que tranquiliza é que foi feita com o empresário com a garantia de um habeas corpus –o derruba a tese de que prisões são decretadas para coagir. Se ele estava solto e decidiu delatar é porque sabe o nível de prova. É uma delação que nos fortalece porque não foi feita pela nossa força-tarefa em Curitiba nem homologada pelo juiz Moro. Portanto, nenhuma pecha que as defesas usam para denegrir as investigações se aplica.

    O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) também aventou possibilidade de anulação da delação premiada se ficar comprovado que Pessoa deu informações falsas.

    Fico preocupado quando vejo que alguns advogados considerem o Ministério da Justiça como uma extensão de seus escritórios. O ministério deveria agir como órgão superior do Executivo que tem encargo de providenciar meios materiais para que a Justiça seja feita.

    O ex-presidente Lula tem dito a pessoas próximas que é o próximo alvo da Operação Lava Jato. Ele é?

    Não há investigação sobre o ex-presidente. O que existe é investigação sobre prestadoras de serviços para as empreiteiras. Entre elas, surgiu o nome da empresa dele, a Lils. A princípio, nenhum colaborador ou análise indica que as palestras dele não foram prestadas. O fato de estar na lista de prestadores não caracteriza crime.

    Mas a empresa do ex-ministro José Dirceu também recebeu de empreiteiras e ele é investigado.

    Ele [Dirceu] recebeu de empresas que operavam lavagem de dinheiro. Uma coisa é receber da Camargo Corrêa ou UTC e ter justificativa. Agora, receber da Jamp Engenharia [do lobista e delator Milton Pascowitch], aí fica difícil.

    Em nota e por meio de advogados, a Odebrecht diz que não existem provas que sustentem a prisão de seus executivos.

    Temos elementos significativos das atividades da Odebrecht na direção do cartel e no pagamento de propina no exterior. Não temos dúvidas que o Marcelo Odebrecht mantinha contato muito próximo com os executivos do grupo nas atividades de cartel e corrupção. Tanto é verdade que o pedido de habeas corpus dele foi rejeitado, também, pelo Tribunal Regional Federal. Neste momento, não falamos de provas, mas de indícios.

    1. O senhor Flavio Patricio

      O senhor Flavio Patricio pinça um fato particularissimo da

      Operação Lava-Jato e tenta, com ele, robustecer e dar ares de legalidade as diatribes

      do Dr. Moro e iguais em todo esse nebuloso e enviezado processo.  Do particular ao todo. 

    2. É a mesma coisa que

      É a mesma coisa que entrvistar o capeta e ele falara a respeito das maravilhas do inferno.

      O cara só está defendendo o peixe dele.

      Gostaria de falar aqui, de verdade, o que penso sobre lele e o judiciário brasileiro, mas, isso impediria o Nassif de publicar minhas sinceras opiniões aqui…

  2. Concluindo

    Estive pensando: o que houve é que o pt já foi condenado a uma nova e expressiva pena, muito severa e efetiva: ele foi condenado a ser o suspeito permanente. Suspeito público de corrupção número 1. Suspeição pública e publicada, permanente.

    A pena se dá nas páginas dos jornais, a já afamada grande mídia,  alimentadas continuadamente com delações premiadas, vazamentos seletivos, no noticiario do dia a dia, comediantes, cronistas sociais e cronistas afinados com o pig, etc. 

    Duração: eterna (enquanto dure?). Denúncias também eternas espaçadas em capítulos mensais como nas séries da fox. Uma dosezinha de tortura diária com anúncios que a prova está logo alí.

    Tudo o mais só agrega penas à pena ja decidida. Seja um juiz da corte suprema dizendo que estranha o elevado número de delatores (é um caso único em que toda a quadrilha delata e delatores se contradizem e tudo bem), outro dizer que seria retornar à barbaridade recusar os hc que deu, uma autoridade envolvida no processo dar declarações tipo “:”ainda” não encontramos nada, mas a coisa esta preta”, comentários e mais comentários, etc.

    Com o vantagem que condena também todos aqueles que votaram e que vêem grandes virtudes, inclusive enormes virtudes sociais, no governo pt. Todos condenados e devidamente apenados.

    Enquanto isso a constituição vai pro lixo e ganhamos um eduardo cunha de presente.

    Proponho aqui ao PT que peça um habeas corpus caracterizando esta bárbara condenação e pena.

  3. Muito feliz o advogado ao

    Muito feliz o advogado ao lembrar do único sujeito responsabilizado por crime de colarinho branco em quase 30 anos de vigência da Constituição Federal: o ex-delegado Protógenes. O único que foi para a cadeia, perdeu emprego e carreira e teve sua vida destruída pelo crime imperdoável de tentar fazer alguém do andar de cima cumprir a lei. Mas para o advogado aí é pouco. Não basta a impunidade da turma do andar de cima e a punição exemplar do outro lado: ele quer ainda mais refresco pros seus e mais sangue daqueles que os perseguem, oras!

    Pois então entra na fila, dotô. Com a devida venia, tem gente muito mais capacitada (leia-se mais cara) que o senhor e com muito mais influência junto às altas Cortes do país, repetindo o mesmo discurso cretino na mídia. Entendo a raiva da turma do andar de cima, afinal toda essa diatribe contra as instituições republicanas não tem produzido o efeito desejado. A destruição de Protógenes e o ostracismo de De Sanctis e De Grandis não foram suficientes para convencer policiais federais, procuradores e juizes a se esconderem atrás de suas mesas e desistirem de fazer seu trabalho de zelar pelo patrimônio público. Muito pelo contrário, eles estão mais ativos e motivados do que nunca.

    Mas o senhor não tem do que reclamar. Pelo contrário, agradeça pelo fato de haver tantos servidores públicos dispostos a processar seus clientes dotô, afinal é isso que lhe assegura emprego e destaque na mídia! O que o senhor preferiria, defender bicheiros e traficantes como fazia o Dr Nelio Machado antes de conhecer o patrono Daniel Dantas? Pelamordedeus, isso é baixo astral, não dá status. Ninguém se sensibiliza com os direitos de bandido pobre. Ninguém vai lhe dar uma página de destaque num jornal para descrever as condições desumanas de um traficante na cadeia, e muito menos para criticar um “vapor” cagueta que entregou os chefes do seu morro. Só os maganos da Lava Jato, branquinhos, estudados, ricos e cheirosos, merecem ser comparados às vítimas da Inquisição ou quem sabe aos judeus de Auschwitz, como já fizeram por aqui (risos). Esses sim, vale a pena defender. E não se preocupe com os honorário$$$: o povo brasileiro paga, dotô! De um jeito ou de outro..

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