Análise: por que a vitória de Trump não surpreende, por Julio Roberto de Souza Pinto

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Para professor do Mestrado Profissional da Câmara, vitória do candidato republicano é só mais um dos resultados da descrença e desconfiança generalizada no sistema-mundo moderno e em suas pernas econômica, política e cultural, e de seu consequente colapso

do Congresso em Foco

Análise: por que a vitória de Trump não surpreende

por Julio Roberto de Souza Pinto

Desde há algum tempo, mais precisamente desde o fim da década de 1960 e início da década de 1970, o sistema-mundo moderno tem entrado em crise.

E não estamos falando aqui de uma dificuldadezinha que possa ser resolvida a partir do interior do próprio sistema. Tudo indica que entramos num colapso do sistema.

Senão vejamos. O sistema-mundo moderno, ao longo dos últimos séculos, tem-se escorado em três pernas: uma economia-mundo capitalista, que se sustenta na constante acumulação de riqueza; um sistema interestatal (internacional) regido por uma potência hegemônica; e uma geocultura liberal centrista, que mantém as outras duas pernas e, por conseguinte, todo o sistema funcionando.

Pois bem, a economia-mundo capitalista vive uma longa fase de estagnação e recessão desde 1970, após o que talvez tenha sido a mais vigorosa fase de expansão da economia mundial, iniciada em 1945. Observa-se uma tendência, de longo prazo, de aumento nos custos de produção (salários, infraestrutura, carga tributária/despesas públicas), apesar dos esforços neoliberais de congelamento dos salários, de externalização dos custos de infraestrutura (transporte, tratamento dos resíduos tóxicos etc.) – na verdade, transferência desses custos para o Estado e, por extensão, para os contribuintes/consumidores – e de desmonte do Estado do bem-estar social. O aumento do custo de produção, combinado com a dificuldade crescente de garantir o monopólio ou quase monopólio dos produtos, tem resultado no encolhido dos lucros e tem levado grande parte dos empresários a lançar a sorte na especulação financeira, onde sabidamente poucos ganham e muitos perdem.

“Não sabemos o que nos espera. Mas a efusividade com que o ex-presidente da Ku Klux Klan e a presidente da Frente Nacional, partido ultra-direitista francês, saudaram a vitória de Trump não parece bom presságio”

O sistema interestatal (internacional) também vive turbulências sem precedentes nos últimos tempos, com o aumento exponencial dos conflitos e da violência. As potências do Atlântico Norte, lideradas pelos EUA desde o fim da Segunda Guerra Mundial, vêm perdendo o poder hegemônico sobre o mundo, e novas potências – não ocidentais – têm emergido ou re-emergido, estabelecendo entre si relações econômicas, políticas e culturais que, pela primeira vez nos últimos cinco séculos, não são intermediadas pelas potências ocidentais, escapando, por conseguinte, ao seu controle.

E, o que é igualmente grave: desde a Revolução Mundial de 1968 testemunhamos a crescente perda do poder de convencimento do discurso liberal centrista que dava ligadura a todo o sistema. Em algum momento depois da Revolução Mundial de 1848, a narrativa liberal centrista do Estado do bem-estar social, que transformara em programa de governo os ideias da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) alcançou a hegemonia sobre as demais – conservadora e radical (marxista) – e, nos últimos séculos, vinha conquistando as mentes e os corações das massas de indivíduos.

Entretanto, a velha mágoa contra a economia-mundo capitalista – que, por depender da constante acumulação de riqueza, inevitavelmente resulta em crescente desigualdade social –, aliada à decepção com o fracasso dos vários governos de esquerda em promover um mundo menos injusto, levou a grande maioria dos indivíduos a desacreditar no sistema, a perder a esperança de que os sacrifícios presentes poderiam garantir uma vida menos sôfrega para seus filhos e netos no futuro.

Essa descrença e desesperança generalizada, manifestada nos grandes protestos que vêm sacodindo o planeta desde dezembro de 2010, tem feito ruir tanto o sistema político interestatal, fundado no discurso liberal da representação, quanto a economia-mundo capitalista, legitimada no discurso liberal do mérito.

A vitória de Donald Trump é só mais um dos resultados dessa descrença e desconfiança generalizada no sistema-mundo moderno e em suas pernas econômica, política e cultural, e de seu consequente colapso.

Não sabemos o que nos espera. Mas a efusividade com que o ex-presidente da Ku Klux Klan e a presidente da Frente Nacional, partido ultra-direitista francês, saudaram a vitória de Trump não parece bom presságio.

Julio Roberto de Souza Pinto – Advogado, doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília, pesquisador da Universidade de Oxford (2011- 2012) e da Universidade de Duke (2014-2015), e professor do Mestrado Profissional em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

10 Comentários

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  1. O que a imprensa e wall street não entendem

    Trump eleito, chovem editoriais mundo afora, da grande imprensa empresarial, dos políticos tradicionais e dos analistas políticos tradicionais, todos reclamando da escolha bsurda e arriscada do povo. Ora, o que a meia dúzia de pessoas que estão lucrando com este mundo atual, capitalista, desigual, concentrador de rendas e excludente, o que estes não enxergam é que a maioria da popualção, inclusive a americana estão se dando muito mal com tudo isto, estão empobrecendo, veem claramente que, se tudo prosseguir como está, só vai piorar pra eles. Então se arriscam, em uam decisão tão deseserada quanto justa. Hillary era a cnadidata do tudo como está, a candidata de Wall Street, a candidata da grande imprensa empresarial. E não pra simplesmente saber que você vai pro abatedouro, enquanto meia dúzia vai ter cada vez mais, e abaixar de cabeça e aceitar isso bovinamente…

  2. A coisa é mais ou menos por

    A coisa é mais ou menos por aí: se a Globo é contra, então sou a favor. Portanto: longa vida a Trump! Ou, parafraseando (em parte) Churchill: se a Globo fosse para o Inferno eu entraria na primeira Igreja e faria uma oração pedindo a Deus que protegesse o Diabo.

  3. O que surpreende não é a vitória de Trump, foi a incapacidade de

    O que surpreende não é a vitória de Trump, foi a incapacidade de todo o establishment de manipular o eleitor médio norte-americano.

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    Trump para o eleitor médio norte-americano apresentou uma política que é coerente com os desejos da classe média norte-americana que vem sendo achatada salarialmente há décadas. O surpreendente foi a imprensa, mancomunada com o grande capital não conseguiu tirar Trump da jogada. E para isto tenho uma explicação mais ou menos armada, a influência da sub-cultura dos pequenos vídeos da Internet gerados pelo cidadão comum.

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    Hoje em dia, os jornais e demais órgãos de imprensa quando fazem as suas edições digitais simplesmente copiam o que é feito nos jornais impressos dando um pouquinho de maior celeridade no processo, logo é o mesmo que quando se inventou o cinema começou-se a apresentar peças de teatro nos filmes, não aceitando a linguagem própria do mesmo.

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    Atualmente há uma subcultura na Internet gerada por pequenas, médias e grandes intervenções de pessoas que procuram expressar o seu ponto de vista, são os chamados “Vlogs” ou coisas do tipo, a difusão destes pequenos vídeos atinge, dependendo do autor, algo que facilmente pode atingir a dezena de milhões de assistências, esta forma de comunicação está atingindo a todos os ramos do pensamento, até a forma de fazer a manutenção de uma caixa de descarga de um vaso sanitário até palestras e aulas de filosofia.

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    A grande imprensa e o grande capital podem até tentar atingir este nicho de mercado, porém a dinâmica própria do meio de difusão é muito maior do que se pode pensar, e a comunicação está mudando de mãos,

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  4. Eu nunca vi com bons

    Eu nunca vi com bons olhos,essa historia de mulher metida em politica “disputando cargos majoritarios”.Aos meus olhos,está por provar-se, que a equação fecha.Para mim não fecha.Deixe de ser machista seu FDP,ouço nas minhas costas o esbregue do inefavel peru.Sua excelencia os fatos.Dilma Roussef,foi o maior desatre ferroviario já registrado nos anais da Central do Brasil em todos os tempos.De tão devastador,ainda hoje não se sabe ao certo,o numero de óbitos da tragédia.Marina Silva,que tem a seu favor a primazia de falar com Deus,nunca chegou e jamais chegará a lugar nenhum.De Deus ouve apenas o conselho de que abandone esse negocio de politica,corte o cabelo,e volte a Rio Branco para cuidar do seu pequeno rebanho.Martha Suplicy foi sem nunca ter sido.Os maldosos atribuem ao excesso de botox.Eu discordo.Acho que chegou onde chegou,por que nunca abdicou do sobrenome do sempre notavel Senador Suplicy,antes de começar cantar.Luiza Erundina até que tentou,mas a tentação ficou por isto mesmo.Dizem que o esfarelamento do Estado do Rio de Janeiro,começou com Rosinha Garotinho.O marido Anthony que de bobo nada tem,pintou o diabo e jogou tudo nas costas dela.Madame Benedita Silva tem as as razões de foro intimo dela,que nem vou comentar.Heloisa Helena + Luciana Genro=Nada com coisa nenhuma.Glesi Hoffmann espera pelo futuro sem nunca ter chegado.Vanessa Graziotini pulou do trapézio e esqueceram de colocar a rede.Minha companheira de infortunio Alice Portugal,jamais vai voltar a disputar uma eleição majoritaria.Vou dá um pulinho em terras do Tio Sam.Essa eleição americana,quando tentaram enfiar na goela do povo americano, o maior blefe e eganação já acontencido no planeta,representada por essa loira fajuta Hillary Cllinton,doi-me a região situada entre o figado e alma.Uma pagina em branco,um traste,uma facista em estado de putrefação,cuja palavra dada vale tanto quanto uma nota de $ 3 reais.Todas as 10 digitais dela estão incrustadas no Golpe de Estado Brasileiro.Notabilizou-se como Secretaria de Estado,a espalhar o terror mundo afora,inclusive aqui.Supera Donald Trump em tudo que não presta,por fazer a socapa e posar de boa moça.Representa o que há de pior na politica americana.Conseguiu perder para um emperucado exotico,que se fez de doido e de doido nada tem.Inventou um discurso tipo me engana que eu gosto,e conseguiu derrota-la.Encerro meu comentario de forma emblematica,provando que mulher disputando “cargo majotitario”,não é boa coisa.Apesar da memoria curta,devem se lembrar da Deputada Eronildes Vasconcelos,a Tia Eron,ligada a IURD.Quando da ultima reunião para cassar Eduardo Cunha no Conselho de Etica,abriu os pulmões, deblaterou:”Nessa Nêga ninguem manda”.Anunciou que seria candidata a Prefeita de Salvador.Veio de Brasilia,desceu em Salvador,e um menudo a soldo de ACMNeto,o Grampinho, já a esperava.Entrou em carro chapa fria,tomaram rumo do Paço Municipal.Adentrou o Gabinete do Prefeito Grampinho.Deputada Eron,soube que quer disputar comigo a Prefeitura,indagou o Prefeito.É imposição do partido,respondeu-lhe Tia Eron.Grampinho inverteu a pauta.Pois fique sabendo que a senhora está possuida pelo demonio,para desespero de Tia Eron.Peço-lhe por favor,que se ajoelhe e feche os olhos,vou tirar satanás do seu corpo.Grampinho,que aprendeu toda sorte de malandragens com o avô ACM,Cabeça Branca para os intimos,abriu uma pasta abarrotada de notas de U$ 100 dolares,e soltou o verbo:Satanás,ordeno,saia deste corpo agora,e jogava notas de 100 dolares para o alto.Repetiu a traquinagem tres vezes.Pronto,a senhora está curada.Tia Eron abriu os olhos,se levantou,catou todas as notas de U$ 100 dolares do chão,e nunca mais se ouviu falar da candidatura dela.Se existe algum machista por aqui,que chame as falas os americanos do norte,não eu.

    1. Que permita-me o editor uma

      Que permita-me o editor uma reparação,para que eu não carregue para sempre um peso n’alma.Nao posso deixar de fazer referência a ex Governadora do Rio Grande do Sul,Yeda Crusius.Assim como a Ministra carcereira Carmen Lúcia,era humilde,simples e paladina da moral e dos bons costumes.Dirigia o próprio carro,quando do vencimento IPVA,ia até o Detran Gaúcho,pagava as taxas do próprio bolso,o troco mandava colocar em uma conta,vamos por assim dizer,de origem duvidosa.Deu um choque de gestão tão pesado nos pampas,que a descarga elétrica atingiu os olhos  do o então Deputado e hoje Governador Ivo Sartori,um imbecil de quatro costados,que carrega até hoje o apelido de instalação trocada.

  5. O que surpreende é ele ter

    O que surpreende é ele ter conseguido ser o candidato de um dos dois grandes partidos americanos, depois conseguir ter percentuais eleitorais tão altos ao longo de todas as pesquisas. Com esse histórico de ‘recordes” ninguém deveria se surpreender com a vitória nas urnas. As pesquisas indicavam um empate técnico, com a distância que o separava de Hillary dentro da margem de erro. A vitória acabou sendo apertadíssima, com Hillary inclusive vencendo no somatório simples dos votos por uma diferença de pouco mais que 200 mil.

  6. Vai ser muito interessante

    Vai ser muito interessante observar os desdobramentos desta eleicao. Se Trump fizer o que prometeu, esperem grandes deslocamentos de placas tectonicas nos proximos anos.

    Quero crer que Trump podera’ fazer aquilo que Obama nem tentou fazer depois que foi eleito, isto e’, desmantelar a supremacia neoliberal instalada desde os tempos de Reagan e acentuadas com Bush, Bill Clinton, e Bush filho. Implantar um programa tipo “New Deal” para reconstruir a infra estrutura do pais, gerar empregos e dinamizar a economia interna.

    Desencarrilhar os desastrosos tratados de comercio com a Asia e com a Europa, cuja agenda essencial e’ a destruicao dos estados nacionais e instauracao da soberania juridica corporativa/financista a nivel planetario.

    Exatamente por ter sido eleito pela “direita cultural” americana (a “direita” de verdade, que nao aparece em publico, estava apoiando Hillary). Trump podera’ conseguir fazer aquilo que a esquerda jamais conseguiria. Assim como so’ um cara de direita, como Nixon, poderia ter estabelecido relacoes diplomaticas e comerciais com a China, no final dos anos 60.

    Parece que Trump esta’ mais comprometido com o setor produtivo da economia, em oposicao ao setor financeiro; economia domestica/mercado interno versus capitalismo financeiro global. Ele esta’ prometendo o fim da austeridade em politica economica interna.

    Outro ponto fundamental no qual Trump podera’ ter mais sucesso do que mesmo Bernie Sanders poderia, e pela mesma razao anterior, e’ desmantelar o establishment neocon, que tomou o poder no golpe judiciario que levou George W. Bush ao poder em 2000, contra Al Gore.

    Este establishment neocon, do qual Hillary e’ apaixonada representante, tem como agenda o “full spectrum dominance”, que inevitavelmente levaria/levara’ a uma guerra contra a Russia (e China), por todos os meios possiveis, inclusive militar.

    Tambem aqui, se Trump conseguir destruir o legado dessa gente, reorientar o grande navio americano away from the iceberg, o povo americano e a humanidade sairao ganhando.

    Do lado negativo (estrategicamente), Trump nao acredita em aquecimento global, e prometeu detonar as iniciativas para controla’-lo. Bad news. Outro assunto grave, para o povo pobre nos Estados Unidos, e’ a destruicao do Obamacare, o grande e unico legado positivo de Obama no plano social. No resto Obama nunca passou de um manager do establishment, do imperio, apesar da retorica de  esquerda que o elegeu ‘a presidencia.

    O resto e’ perfumaria, diante dos grande problemas estrategicos que ameacam a humanidade.

    Quero desejar boa sorte a Donald Trump e muita luz para que ele escolha as pessoas certas e efetivamente realize essas mudancas cruciais que a esquerda americana dificilmente conseguiria realizar. Vide fracasso de Obama, com uma agenda bem mais modesta.

    Na verdade, a esquerda esta’ muita fragmentada, confusa, e… perdida. David Harvey uma das maiores autoridade em neo-liberalismo, escreveu, nalgum lugar que esta ideologia se apropriou das causas liberais, como liberdade, direitos humanos, igualdade de genero, casamento gay, direitos civis, e mesmo algumas abordagens importantes da causa ambiental – George Soros, com sua Open Society, mostra claramente que Harvey tem razao. Vide tambem Marina/Rede, Freixo no Rio, e o PSOL em Porto Alegre, bem longe do povo e apoiado na classe media intelectual que tem ojeriza ao Lulismo e ao povao.

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