Ao abrir exceção para Moro, TRF-4 cria nova leitura da ordem jurídica, por Callegari

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – A afirmação dos juízes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região de que as situações da Lava Jato escapam ao “regramento genérico” e que há “uma ameaça permanente à continuidade das investigações” é “claramente” uma carta branca para que, “em nome de uma operação inédita que está em curso”, tudo seja “possível”. Isso cria insegurança jurídica, na visão do criminalista André Luís Callegari. 

Por André Luís Callegari

Do Conjur

Em recente decisão proferida pela Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região o colegiado decidiu que os processos da “lava jato” não precisam cumprir as regras dos processos comuns. Dos 14 magistrados que integram a corte, somente um votou contra, ou seja, afirmando que a regra vale para todos os procedimentos.

A afirmação dos magistrados da corte é que as situações da “lava jato” escaparam ao regramento genérico e que há “uma ameaça permanente à continuidade das investigações”. Analisando o voto condutor verifica-se, claramente, que em nome de uma operação inédita que está em curso tudo será possível, pois, como dito pelo próprio relator, a excepcionalidade desse processo respaldaria a excepcionalidade da exceção às regras.

E lá se foi a segurança jurídica. Aliás, essa segurança, que deveria ser o norte dos tribunais, parece que cede a cada dia diante das ditas “exceções” que ocorrem nos processos.

Depois desse julgamento vem a perplexidade: e para que serve mesmo a Constituição Federal? Provavelmente esse livreto que serviu um dia para garantir os direitos fundamentais dos cidadãos e para garantir-lhes um pouco de segurança — sim, um pouco — hoje não serve para muita coisa, pois, como vimos, vale muito mais a interpretação do Direito excepcional para um processo que “escapa do regramento genérico”.

Nesse ponto, vem a nova perplexidade. Onde que este procedimento escapa do regramento genérico a permitir as exceções? Até o momento todo o procedimento foi respeitado e, onde excessos foram cometidos houve a intervenção da corte constitucional, garantindo às partes que a paridade de armas no processo fosse assegurada. De outro lado, se houve qualquer problema em relação ao magistrado ou ao procedimento, existem mecanismos dentro do sistema jurídico suficientemente capazes de resolver a questão, sem qualquer necessidade de interpretação excepcional.

A falta de reflexão e cumprimento dos preceitos constitucionais deixa um caminho aberto e perigoso para a consolidação de uma interpretação casuística dos casos afeitos à “lava jato”, interpretação essa que uma vez feita contamina a ordem jurídica, pois, como se sabe, depois de aplicada uma vez deixa de ser exceção e vira regra.

Na realidade, essa interpretação da Corte Especial do TRF-4 serve a uma política criminal que busca a efetividade a curto prazo, justificada pelo ineditismo da operação “lava jato”. Porém, abre um precedente perigoso de que no futuro, em nome dessa efetividade, as regras e preceitos garantistas pelos quais lutamos tanto sejam destruídos.

Para que não fique uma interpretação equivocada desse artigo, não somos contra a operação “lava jato”. O que queremos é que os direitos e garantias fundamentais sejam respeitados. Nada mais! Basta que a Constituição Federal seja o norte para as decisões. Só isso! Parece pouco, mas, no caso concreto, é muito.

André Luís Callegari é advogado criminalista e professor na Unisinos. Pós-doutor em Direito Penal pela Universidad Autónoma de Madrid. Doutor honoris causa pela Universidad Autónoma de Tlaxcala e pelo Centro Universitário del Valle de Teotihuacan. Fundador do Centro de Estudos Ibero-americano de Ciências Penais.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

12 Comentários

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  1. Concordo digo mais.
    A putaria

    Concordo digo mais.

    A putaria começou quando José Dirceu foi condenado porque não provou sua inocência.

    Desta decisão derivam tanto a denuncia por convicção de Lula, quando a prisão de Palocci porque não existem provas do crime e a permissão concedida pelo TRF para Sérgio Moro se colocar acima da Lei. 

    Isto quando estamos falando dos casos mais notórios. Nos casos miúdos os advogados podem citar centenas de situações em que a Lei tem sido deliberadamente ignorada.

    Eu mesmo advoguei num caso em que isto ocorreu. Há bem pouco tempo o TJSP negou provimento aos agravos retidos de minha cliente dizendo que o Juiz de primeira instância havia agido correto ao: a) deferir a contradita da autoridade municipal cujo ato havia resultado na ação indenizatória (suspeita para depor porque poderia ser condenada regressivamente); b) indeferir a substituição de testemunha (requerida e fundamentada no prazo legal); c) indeferir a perícia técnica (indispensável para provar o dano alegado na inicial). No mérito o TJSP julgou a ação improcedente com base no depoimento da autoridade causadora do dano e porque a autora não provou suas alegações (como se a cidadã não tivesse sido impedida de demonstrar o que alegou).

    Muitos outros casos poderiam ser citados aqui. Mas não vou me dar ao trabalho de fazer isto, pois não quero cansar os leitores.

    A democracia foi usurpada com ajuda do STF, a constituição (que garante a presunção de inocência, a liberdade e o direito de prova) está sendo acintosamente revogada através de decisões judiciais. O Direito foi para a lata do lixo, a Justiça não existe e a única coisa que muitos juízes brasileiros fazem bem é defender seus próprios interesses mesquinhos. Se houver uma guerra civil eles também irão sangrar. E quando isto ocorrer “Pequena perda, direi…”. 

    1. Mas agora…

      Mas agora temos uma complicação para o J Dirceu: a pf diz que ele NÃO roubou os  43 milhões que tinha roubado. Isto é gravissimo e até um petista como eu não vê como ele escapará desta.

      Não roubar, para petista é cana certa. Não escapará.

  2. A CF é letra morta. O articulista se mostra medroso ou covarde.

    Prezados,

    O Estado Fascista de Exceção, chancelado pelo TRF4 e, por omissão conivente, pelo próprio STF, já impera em nosso País. Notem que o advogado criminalista, que assina este artigo, precisa se justificar, desculpando-se e declarando:

    “…não somos contra a operação “lava jato”. O que queremos é que os direitos e garantias fundamentais sejam respeitados. Nada mais! Basta que a Constituição Federal seja o norte para as decisões. Só isso! Parece pouco, mas, no caso concreto, é muito.”

    Ora, ora, ora! Se o advogado criminalista que escreveu o artigo concorda com os expedientes ilegais e criminosos praticados pelos integrantes da chamada operação “Lava a Jato” – agora coonestados pelo TRF4, que em sentença, admitiu e aprovou o Estado de Exceção – não há qualquer razão para ele escrever um artigo crítico em relação a essa operação midiático-policial-judicial que nada mais é do que o uso da burocracia estatal (PF, MP e PJ), para perseguir e aniquilar um partido político, o PT, criminalizando, condenando e encarcerando seus líderes. O advogado deve saber que a Fraude a Jato é responsável por mais de 2/3 da recessão econômica que assola o Brasile há dois anos e responsável por mais de 2/3 do desemprego que acomete os brasileiros. Ele deve saber, também, que o ataque à Petrobrás segue um roteiro estabelecido pelas agências e departamentos de Estado dos EUA, que estão de olho no Pré-Sal, o qual já começa a ser disputado a dentadas pelas ‘7irmãs’. Sabe o articulista que a Fraude a Jato provocou a crise política e a instabilidade que levaram ao golpe de Estado midiático-policial-judicial-parlamentar, derrubando um governo legítimo e no lugar dele colocando uma quadrilha de saqueadores que, em 4 meses, conseguiu desmontar um projeto de desenvolvimento soberano duramente construído nos 12 anos de governos encabeçados pelo PT.

    Se ele faz a crítica, presume-se, é porque não concorda com a operação e com a forma como ela vem sendo conduzida. Faltou coragem ao articulista, para se colocar contra essa nefasta operação: a Fraude a Jato. 

    1. temer é saudável…e FORA TEMER

      Não ouso perguntar a opinião do criminalista sober as investigações do “castelo de areia e satiagraha”.

      Mais uma crença a se desmanchar, não existe sulista macho!!!!!

  3. A fase I da exceção foi a

    A fase I da exceção foi a fase de um minúsculo juiz desconhecido alçado à celebridade pela Globo e por interesses e treinamentos especiais nos EUA: Joaquim Barbosa. A fase II, o Fim, vai buscar um desconhecido provinciano e um grupo louco para se tornar uma banda  cover de rock internacional do juizo menor. Também trabalhado pelo ministério do imaginário (desde 1964), a rede globo e seus seguidores. Com todas as investigações preciamente realizadas pela espionagem da NSA (quem?! Acuma?!, diria Cerra, o sem noção). inventou-se o espetáculo bollywodiano made in Curitiba. Sem inventividade, nenhum dado novo além do único objetivo  que não pode ser mudado, segundo o script original, temos a cada manhã a reprise de um golpe que nunca termina. Deu para entender? Também não tem muita importância o entendimento. É assim mesmo. 

  4. Invasão da competência do legislativo

    Essa sentença, na prática, derruba o princípio da separação dos poderes. O Judiciário nesse caso não se limitou a interpretar a Lei, mas literalemnte a revogou parcialmente.

    É um fato gravíssimo, prenúncio de um novo AI-5. E dessa vez não há qualquer descupa para o STF “lavar as mãos”, como tanto gosta (a verdadeira operação “mãos limpas” deve ser essa).

  5. TRF-4 é um puxadinho da Vaza-Jato, para legitimá-la

    Combate à corrupção? Sou a favor! … Vaza-Jato? Sou contra!

    Por que? Porque ela estará apenas  consolidando a corrupção dos de sempre contra a corrupcinha.dos inimigos.

    Com nefastos efeitos na economia e no caráter cultural e sócio-político do país (vide as agressões aos Lindbergs, Mantegas, Chico Buarques e outros).

    Seu balanço é nefasto, entre uma boa causa contra seu resultado final, hipócrita e cambeta, além de sabermos que ela não passará de uma clara perseguição política, ainda que continue mais 10 anos até realizar apenas este objetivo,

    Já estou convencido de que não preciso me envergonhar de ser explicitamente contra mais esta farsa, cuja tecnologia psico-pública é a mesma do mensalão®.

    Ou desmascaramos estas farsas definitivamente ou construiremos um país de ódio entre facções concorrentes.

    E a população agachada no meio deste tiroteio.

  6. O TRF-4 deu um GOLPE no Estado de Direito brasileiro

    Minha hipótese é que os desembargadores de Curitiba não o fizeram por medo, como o STF, mas por “farra”, por “diversão”, porque “We can”. A Lava Jato é um trem descarrilhado que ninguém mais recoloca nos trilhos. Só está faltando o austríaco de bigodinho para completar o desastre.

    Tão grave quanto essa decisão inconsequente é o projeto de lei a Força Tarefa “10 medidas contra a corrupção”. Ambos, a decisão e o projeto, descerram as portas ao fascismo judicial, mas o projeto é infinitamente mais tóxico. Estou em estado de choque depois que consegui entender onde é que eles querem chegar. É uma ninhada de ovos de cobra.

    Como disse o juiz Marcelo Semer: ‘Podemos escolher entrar num Estado policial. O que não podemos escolher é sair.”

  7. Tem suas vantagens

    Ficaremos livre do judiciário e de todo o seus custo para o estado.

    As questões serão resolvidas dentro do “regramento” mais conveniente para o momento por alguma autoridade ou coronel e dispensaremos juizes do primeira, segunda ou terceira instâncias. Ufa!

    Assim o reparo das contas públicas será rápido. O fmi deve estar propondo algo semelhante.

  8. Corpo etéreo

    O que é feito do livro que guarda a CARTA MAGNA ? Poderemos, clado, encontrá-lo  com facilidade sobre algumas mesas  gavetas ou prateleiras e, com certeza ainda abrigam todas as garantias. Talvez seja mais interessante perguntar se algum dia tivemos magistrados suficientemente honestos para dar garantias legais esuficientes para abrigo legal de seu povo. Que poder é esse  ? De onde saem essas resoluções estapafúrdias que, sem mais nem porquê,  alteram e jogam no lixo as garantias constitucionais e “ilesos” continuam sem que haja um só órgão qje os faça retroagir nessas “pedaladas jurídicas” ? O judiciário sempre foi  o órgão mais emperrado do Brasil, e duvido que seja por falta dasletras das leis, de falta de interpretação.  Pelo jeito é por causa dos homens que as guardam sob seus “sovacos ”  com menos apreço que guardam pelo ser humano,  pelos direitos consitucionais  e mais com suas cabecinhas e canetas dos feitores escavagistas. 

  9. Fiat lux! Agora dá para

    Fiat lux! Agora dá para entender a perpetração de largo espectro do Moro ao Direito! Ele não está; ele sempre esteve respaldado pelo TRF4! Deram-lhe corda, e agora dão-lhe rede! Como um destes corporativistas do ministério público me disse outro dia: “É mínima a quantidade de decisões do Moro derrubadas”! Claro: é tudo carta marcada! Agora que a gang se mostrou, saberemos logo quem é o capo de tutti capo que desvirtuou a Sra. Justiça…

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