Garoto, muito além da bossa nova

Do Itaú Cultural

MUITO ALÉM DA BOSSA NOVA

No centenário de nascimento do multi-instrumentista Garoto, documentário joga luz sobre a sua obra

texto itamar dantas

Aníbal Augusto Sardinha, o multi-instrumentista Garoto, reformulou a linguagem harmônica do violão. Fotos: divulgação

O centenário de nascimento de Aníbal Augusto Sardinha, multi-instrumentista e compositor conhecido pelo nome de Garoto, se deu no dia 28 de junho. Personagem crucial na formação da bossa nova, o criador de “Lamentos do Morro” e “Duas Contas”, entre outras composições, morto em 1955, aos 39 anos de idade, tem sua obra agora revisitada pelo documentário Garoto, O Gênio das Cordas, dirigido por Rafael Veríssimo com pesquisa de Lucas Nobile e consultoria do seu biógrafo, Jorge Mello.

No filme, depoimentos históricos de grandes personagens da MPB já falecidos, como Tom Jobim, Baden Powell e Vinicius de Moraes, se misturam a nomes que participaram de sua história ou que foram influenciados por sua obra, como os violonistas Zé Menezes (1921-2014) e Paulo Bellinati, o cavaquinista Henrique Cazes, o bandolinista Hamilton de Holanda, os compositores e também instrumentistas Paulinho da Viola, Guinga, Roberto Menescal, Carlos Lyra, João Donato e Dori Caymmi.

O documentário teve início em janeiro de 2014, numa conversa com o músico Henrique Gomide, que estava indo para a Holanda fazer um mestrado baseado na obra de Garoto. Ao procurar material de referência, o músico garantiu ao pesquisador Lucas Nobile e ao cineasta Rafael Veríssimo que havia pouco documento relacionado a Garoto. Na mesma noite, ligaram para Zé Menezes, que começou a contar histórias ainda ao telefone. Logo, estariam na casa dele, com o violonista Marcello Gonçalves, onde gravariam sua última entrevista em vida. Zé Menezes morreu em julho de 2014.

“A primeira reação foi: ‘temos que ligar pro Zé Menezes’. Ele atendeu e contamos que queríamos fazer um filme sobre Garoto. Só que eu não tinha nenhuma ideia se era o Zé Menezes que falava. Apesar das histórias, a voz era muito jovial. Perguntei a idade dele, pra confirmar, meio sem graça. Aí ele falou, tenho 29. Ficou um silêncio. E ele disse aos risos: ‘É 29 ao contrário! Ou seja, sou eu mesmo”, conta Lucas Nobile.

Para Rafael Veríssimo, que assina a direção do documentário, o desafio está em construir a narrativa, uma vez que há apenas duas imagens em movimento do violonista. Uma delas está no filme Serenata Tropical, de 1940, em que acompanha Carmen Miranda na música “Mamãe Eu Quero”. “A experiência que a gente quer trazer com o filme é que as pessoas possam reviver a era de ouro do rádio, queremos trazer isso de uma forma bonita, interessante.”

Entre os destaques dados à sua obra está o seu papel fundamental na construção harmônica mais complexa do violão, muito aproveitada na bossa nova, aspecto unânime entre nomes como Roberto Menescal, João Donato e Carlos Lyra. “ ‘Duas Contas’, de Garoto, era um hino para os músicos que frequentavam o apartamento de Nara Leão, na Avenida Atlântica”, garante Nobile.

>> OUÇA A PLAYLIST “SÉRIE INSTRUMENTO: VIOLÃO” 

Jorge Mello, biógrafo de Garoto e consultor do filme, diz que as composições iam além do que foi aproveitado pelos compositores bossa-novistas. “Garoto foi o reformulador da linguagem harmônica do violão brasileiro. Acho que ele transcendeu a bossa nova. O que eles aproveitaram foi um pouco do que ele propôs.” Além da consulta ao rico material que Jorge Mello havia acumulado sobre a obra do músico, os pesquisadores conseguiram materiais inéditos, como partituras, fotos e até um trailer de um filme perdido, Fazendo Fita (1935), do cineasta Vittorio Capellaro, em que Garoto faz uma participação.

O cavaquinista Henrique Cazes, entrevistado para o filme, sintetiza a importância da obra de Garoto: “Se tivéssemos mais dez anos dele, ele seria o maior compositor brasileiro de violão do século XX”.

O documentário está em fase de filmagens e captação de recursos. As entrevistas já foram gravadas e a obra tem autorização de captação pela Ancine. O filme tem parceria com as produtoras Lente Viva Filmes e TC Filmes. Os realizadores ainda irão filmar números com músicos influenciados pela obra do homenageado e o projeto deve se desdobrar também em um site e em uma série de shows, entre outros produtos.

 

Redação

3 Comentários

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  1. Outro gigante de nossa música

    Só não entendi o título do documentário, que não soma. Mania de comparações, escadas, sugadas e encostos.

    O fato (verdadeiro) de ser influência ou de ser cantado (quem não canta o grande Garoto?) não tem nada a ver com estar muito “além ou muito aquém da Bossa”. Ele é sim um pilar importante  de nossa cultura musical (hoje bastante desmontada ou mercadizada). 

    Com sucessos como Duas Contas, Amoroso, Estranho Amor, Gente Humilde (pós letrada por Vinicius e Chico), Garoto não precisa ser promovido como um pilar “maior” do que qualquer conjunto da obra. 

    Ele está muito além disso.

    Salve Garoto!

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