Jeremy Corbyn e o impasse populista, por Mathias Alencastro

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Foto: Chatam House
 
Jornal GGN – O desempenho do líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, nas eleições legislativas do Reino Unido assinalam o fim da experiência trabalhista com a terceira via, que defende a conciliação da esquerda com o livre mercado e que foi a tônica da gestão de Tony Blair.
 
A análise é do cientista político Mathias Alencastro, que, em sua coluna de hoje na Folha de S. Paulo, afirma que a mudança de rumo da esquerda britânica acompanha uma tendência de toda a Europa, onde os partidos que adotaram a terceira via estão em “risco existencial”. 
 
Apesar desta mudança, a celebração do resultado de Corbyn “mostra como a esquerda se acostumou com vitórias de Pirro”, afirma Alencastro. Para ele, a esquerda portuguesa conseguiu resolver com o impasse populista, com Antônio Costa liderando uma que fez o “impossível: desacelerar a austeridade sem alienar os mercados”. 

 
Leia a coluna completa abaixo: 
 
Da Folha
 
Jeremy Corbyn e o impasse populista
 
Por Mathias Alencastro
 
As universidades do Reino Unido têm sido o principal laboratório de ideias da esquerda europeia nas últimas três décadas. A “terceira via”, que defende a conciliação da esquerda com o livre mercado, foi elaborada por Anthony Giddens na London School of Economics.
 
Base programática dos governos de centro-esquerda nos anos 1990-2000, o conceito ingressou na política pelas mãos do líder do Partido Trabalhista, Tony Blair. Ele conseguiu a façanha de renovar seu mandato de primeiro-ministro em três eleições seguidas, até a desastrosa invasão do Iraque, em 2003, liquidar o seu capital político.
 
O “populismo”, redefinido por Ernesto Laclau como a disputa entre o povo e a elite, ganhou notoriedade com os debates organizados por Chantal Mouffe na Universidade de Essex, também no Reino Unido.
 
Influenciadas pelo sucesso da esquerda latino-americana da década passada, as ideias populistas orientaram a campanha do líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn. Sua notável performance nas legislativas põe um ponto final na era Blair e, de quebra, na experiência trabalhista com a terceira via.
 
Essa virada de página da esquerda britânica acompanha uma tendência da Europa continental, onde movimentos inspirados pelas teses de Laclau estão colocando os partidos que adotaram a terceira via em risco existencial.
 
Aproveitando a crise de legitimidade da classe política depois do colapso do sistema financeiro em 2008, os populistas de esquerda criaram partidos do zero como o espanhol Podemos, costuraram frentes multipartidárias à imagem do grego Syriza, ocuparam estruturas tradicionais da envergadura do Partido Trabalhista britânico e armaram campanhas em torno de tribunos carismáticos ao estilo do francês Jean-Luc Mélenchon.
 
A aposta na inovação tecnológica e renovação política rendeu a adesão em massa dos jovens : 63% da faixa 18-34 anos preferiu Corbyn.
 
Porém, esses movimentos continuam longe do poder.
 
O Syriza abandonou a plataforma populista no verão quente de 2015. A derrota do Podemos nas eleições de 2016, nas quais era favorito, abriu um racha no partido. Apesar de ter chegado em terceiro nas presidenciais de 2017, o partido de Mélenchon, França Insubmissa, parece prometido a um espaço modesto na Assembleia Nacional.
 
A celebração efusiva do resultado de Corbyn mostra como a esquerda se acostumou com vitórias de Pirro. No melhor dos casos, a conservadora Theresa May será obrigada a convocar novas eleições. No pior, ela governará em aliança com a ultradireita. O caminho de Jeremy Corbyn para Downing Street, sede do governo, ainda é longo e tortuoso.
 
Existem alternativas ao impasse populista. Em Portugal, o Partido Socialista costurou uma coalizão heteróclita, incorporando o vanguardista Bloco de Esquerda e o jurássico Partido Comunista.
 
Liderada por Antônio Costa, a aliança é admirada por ter feito o impossível: desacelerar a austeridade sem alienar os mercados, e convencer a União Europeia sem perder o apoio do seu eleitorado. Para a esquerda portuguesa, é possível renovar sem se abster de governar.
 
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Redação

10 Comentários

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  1. Quer dizer, entao, que

    Quer dizer, entao, que Podemos era favorito nas eleicoes de 2016. Deve ser um Podemos qualquer, de Marte ou Saturno. Na Espanha, nao. O maximo que Podemos disputava, nao ocasiao, era ficar em segundo, ultrapassando o PSOE. Era isso o que se especulava. Tá na hora de moderar o emprego do “populismo” para caracterizar qualquer coisa, de Trump a Podemos e, agora, insinua o artigo, até o Bloco de Esquerda portugues. Pelo jeito, populista é tudo aquilo que não cabe no ambiente perfumado da City londrina.

    1. Concordo c/ vc O termo populismo já tem 1 sentido e é diferente

      Populismo, pelo menos na América Latina, tem uma conotaçao negativa, de políticos que fazem promessas inconsequentes para ganhar eleitores. Se bem que os políticos que foram assim caracterizados (Peron sobretudo, e tb Vargas) talvez nao merecessem esse julgamento… Fizeram realmente algo pelos trabalhadores, pouco, mas mais do que fizeram os que assim os caracterizavam. 

  2. Populismo, uma pecha udenista

    O termo POPULISMO é um pejorativo muito utilizado pelos “contadores de histórias” brasileiros para carimbar qualquer governo que respeite minimamente os interesses da classe trabalhadora.  Assim, carimbam os governos de Vargas, Jango, Lula e Dilma com o preconceito da irresponsabilidade fiscal, um clichê do discurso udenista.  Já as benesses bilionárias destinadas aos ricos são consideradas políticas absolutamente corretas e normais, fomento, estímulo ao desenvolvimento.

  3. Populismo?

    Em certo sentido, dá gosto ver o nome da caricatura cair sobre a cabeça dos que a usavam como espantalho.

    Qualquer anglo-americano que queira pintar a imagem do diabo governando uma república de bananas vai bradar a palavra “populismo”.

    Agora, é essa caricatura do Outro, o indizível, a perversão da verdade liberal-utilitarista… é ela que desaba sobre a cabeça dos lordes do livre-mercado.

    Fora esse prazer efêmero, nada há de rigoroso nem na invocação a Laclau, nem no endeusamento deslumbrado das universidades britânicas, nem no mote do populismo, para descrever os novos movimentos da esquerda na Europa.

    A impressão mais elementar é que ao menos uma parte dela acordou do sono no bordel neoliberal onde tinha ido “passar a noite”. Uma parte só! A outra não! Que o digam os cardeais do PSOE espanhol, que pretendiam vender uma cachorrinha (essa palavra em espanhol soaria mais contundente…) como Susana Díaz para nova figura de proa do partido. Os que acordaram no bordel com as calcinhas arriadas logo trataram de reconduzir o Pedro Sánchez ao lugar de onde os cardeais o expulsaram por não ser tão terceira via assim. De qualquer maneira, esse despertar ainda é daqueles nublados pelos vapores do álcool com que se passou a noite enchendo a cara.

    Que tal se pensar na hipótese de que, simplesmente, a esquerda europeia guardou uma memória que não foi inexoravelmente prostituída pelo pretendido fim-da-história neoliberal? Que não é preciso embandeirar populismos, de forma simplória, para explicar isso… Que noções como a de justiça social não foi varrida para o éter da inexistência só porque os senhores das ideias queriam… Que há um vetor cultural mais profundo, pelo qual a vida coletiva e civilizada não é um bem descartável pela obsolescência do consumo… Que tal?…

    Populismo, prezados señoritos da verdade (*), é a vossa mãe!

    (*) señorito  é o termo com o qual, na Andaluzia, a região mais pobre da Espanha, se designam os privilegiados das castas senhoriais. Considerando os paralelos socio-geográficos entre Espanha e Brasil, o termo poderia ser traduzido como “sinhozinho”.

  4. Comentário.

    É bastante complicado quando vc usa os termos “terceira-via” e “populismo”, não ajuda a esclarecer coisa alguma no atual momento. Esta “crise”, em si, nem é tão ruim e, mais , deveria é se tomar cuidado, pois o que pode ser dito aqui como crise pode significar uma guinada mais à esquerda, que o autor da Folha, espertamente, vai colocar no saco conceitual do “populismo”.

    Não custa nada lembrar que, ao ser entrevistada, Margaret Thatcher, respondendo qual seria a maior contribuição enquanto foi líder na Inglaterra, declarou que sua maior contribuição teria sido (a existência de) Tony Blair.

    O que ela quis dizer é que ela não apenas teria vencido os trabalhistas, mas também os sindicatos (lembrando, com uma mãozinha do Reagan, chegou a derrotar uma longa greve realizada pelos trabalhadores de mineração de carvão, com base no envio, a preço subsidiado, de carvão norte-americano para a Inglaterra) e colocado para funcionar o projeto neoliberal.

    Enfim, a terceira-via seria um modo de reinvenção da esquerda, que começa a ser mais liberal que de costume, aproximando-se de práticas mais próximas da própria esquerda liberal norte-americana (isto é algo importantíssimo que a esquerda brasileira, ou, uma parte dela, se nega a olhar e influencia as suas práticas militantes de forma direta; a crise de representação que afeta a esquerda no Brasil é parte desta nova configuração).

    O que ele chama de “crise existencial da esquerda continental” é um mau diagnóstico. O fracasso do projeto neoliberal em conciliar desenvolvimento econômico com prosperidade social só estava num horizonte verbal, nada prático; a Inglaterra, por exemplo, depende de maneira grosseira da banca monetária para manter sua balança de pagamentos em ordem (suspeito que a saída da UE, apesar de tudo, foi bom para os bancos, para evitar fiscalização do continente sobre o sistema financeiro da ilha).

    Outra manobra do autor (que ele, na verdade, afirma sem ter onde se escorar), está no fato de considerar que o ascenso do Partido Trabalhista foi devido a uma influência do “populismo latino-americano”.

    O problema fundamental para a esquerda como um todo está em encarar as novas configurações políticas que se aproximam do liberalismo; são menos ou nada classistas, ou mais, não encaram suas demandas como relacionadas com o classismo; não se parecem em nada com as utopias, elas se colocam no horizonte de uma realpolitik (que, afinal, se parece em muito com a terceira-via). Acho que ainda não se colocaram todas as cartas na mesa.

     

  5. mais um artigo para manter o público bovinizado e anesteziado
    Nassif e colegas,

    que artigo sem-noção!

    totalmente escrito para DESinformação do leitor médio (ou seja, a grande maioria das pessoas).

    não sei se o repórter não sabia se aprofundar no tema ou o artigo foi desenvolvido propositalmente confuso ao misturar teorias econômicas e “lendas urbanas” e dados econõmicos reais… ficou uma salada doida…

    antes de prosseguir, acho interessante colocar um alerta:

    não existe “o mercado nervoso”, “o mercado calmo”, “o mercado aceitou bem”;
    isso é só um eufemismo para deixar o grande público mais bovinamente “calmo” ou convenientemente desinformado ou até em pânico, e foi invenção desses comentaristas econômicos pagos para elaborar artigos ou reportagens “sob medida”, e esconder a fonte de suas rePORCAgens encomendadas.

    grandes bancos e alguns mega especuladores tem muito dinheiro sobrando e precisam provocar altas e baixas de aplicações voláteis para alavancar lucros estratosféricos em pouco tempo, não se contentado com juros civilizados e aplicações de longo prazo.

    todo mundo (empresas e pessoas) que tem (muito) dinheiro sobrando pode ser definido como especulador… …

    ao invés de “mercado”, existem, isto sim, >>especuladores

  6. Não está dando para aguentar

    Não está dando para aguentar intelectual de jornal, internet e etc.

    Mathias Alencastro você consegue escreve para o GGN e não consegue entender que “disputa entre o povo e a elite”, não é populismo, é Luta de Classes.

    Se você quiser se informar melhor sobre Jeremy Corbyn, o Partido Trabalhista do Reino Unido, veja o vídeo de Rui Costa Pimenta, Presidente NacionaL do PCO. http://causaoperaria.org.br/blog/2017/04/10/assista-a-analise-politica-da-semana-do-pco-por-rui-costa-pimenta/ 

  7. Os comentários estão melhores
    Os comentários estão melhores que o artigo. Vou continuar lendo esse site, parece que aqui tem gente inteligente.

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