Lava Jato usa delação da Odebrecht para criminalizar a imprensa alternativa

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – A revista CartaCapital se diz vítima de “ilações” feitas pela Lava Jato em conluio com o jornal O Globo, numa tentativa de calar a independência da revista que, assim como outros meios alternativos, não abdicou do “dever jornalístico” de apontar os abusos cometidos pela operação.

O jornal O Globo publicou nesta terça (13) mais uma reportagem no âmbito da Lava Jato, agora tentando levantar suspeitas sobre um “empréstimo” de R$ 3,5 milhões que a Odebrecht forneceu à editora da revista CartaCapital em 2007. O montante foi pago regularmente, mas ainda assim o episódio virou objeto de delação premiada do ex-executivo da empreiteira Paulo Cesena.

Cesena disse à força-tarefa da Lava Jato que intermediou as negociações com a equipe de CartaCapital com autorização de Marcelo Odebrecht. Ele diz que a transferência dos recursos se deu no segundo semestre de 2007, e que o montante teria saído do setor da Odebrecht que ficou conhecido como “departamento da propina”. Os representantes de CartaCapital, porém, não tinham como saber dessa informação.

“CartaCapital não sabe e não tem obrigação de saber de onde vieram os recursos do adiantamento da verba de publicidade. Não existe carimbo em dinheiro e trata-se de má-fé acreditar que o investimento na revista saiu de “um departamento de propina” e o aplicado nos demais meios de comunicação tem origem lícita”, rebateu a revista, em nota.

Sem apresentar provas, Cesena disse também que ficou sabendo por Marcelo Odebrecht que quem intercedeu por CartaCapital numa circunstância de crise e necessidade de investimentos financeiros foi o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.

Desde que foi expedido um mandado de prisão contra Mantega, a imprensa vem noticiando que a Lava Jato tem pressionado executivos da Odebrecht para obter delações que impliquem o ex-ministro da Fazenda e outro titular da pasta durante o governo Lula, Antonio Palocci.

“Marcelo Odebrecht me chamou para uma reunião em sua sala, no escritório em São Paulo, e me informou que a companhia faria um aporte de recursos para apoiar financeiramente a revista ‘Carta Capital’, a qual passava por dificuldades financeiras. Marcelo me narrou que esse apoio era um pedido de Guido Mantega, então ministro da Fazenda”, afirmou Cesena à Lava-Jato.

De quebra, Cesena insinuou que o “empréstimo” foi fornecido porque a linha editorial de CartaCapital está comprometida com interesses petistas.

“Entendi que esse aporte financeiro tinha por finalidade atender a uma solicitação do governo federal/Partido dos Trabalhadores, pois essa revista era editada por pessoas ligadas ao partido”, afirmou.

Não é a primeira vez que veículos da velha mídia associam meios independentes de comunicação ao PT, com o objetivo de desqualificar a imprensa alternativa, taxando-a de parcial. Recorrentemente, o financiamento por meio de anúncios públicos é objeto de reportagens que usam sempre da mesma fórmula: dizer que esses produtos jornalísticos não têm audiência que justiquem aportes e que, por isso, se há qualquer tipo de financiamento, este se dá por “afinidade com o PT”.

Dessa vez, na visão de CartaCapital, a investida contra a revista se deu por iniciativa da Lava Jato, numa tentativa de retaliar o trabalho de jornalistas independentes.

“Desconfiamos que o vazamento dessa citação distorcida a CartaCapital esteja relacionado ao fato de não termos abdicado do dever jornalístico de apontar os erros e abusos da Operação Lava Jato, além da nossa conhecida postura crítica em relação aos meios de comunicação, em grande medida responsáveis, no nosso entender, pelo clima de caça às bruxas reinante no Brasil”, escreveu Manuela Carta, publisher da revista.

DELAÇÃO SEM PROVAS

No caso desse “empréstimo” à CartaCapital, as únicas provas que O Globo diz que Cesena anexou à sua delação premiada foram “e-mails, planilhas demonstrando a alocação de recursos e notas fiscais mostrando o patrocínio aos eventos da Carta”. Esses eventos teriam sido feitos justamente para cumprir com o acordo de apoio financeiro. Essa informação, aliás, casa com as explicações de CartaCapital, que o jornal da família Marinho relegou aos últimos parágrafos.

Primeiro, a revista nega (e, de fato, o delator ainda não apresentou provas de) que Mantega tenha participado de reuniões para discutir o apoio de Odebrecht à Carta. “Não houve interferência de ninguém a nosso favor.” 

Segundo, não foi um “empréstimo” propriamente dito, mas sim um “acordo de publicidade que previa um adiantamento de verbas.”

“Segundo [Manuela Carta], tudo já foi quitado, com páginas de publicidade e o patrocínio da Odebrecht a eventos. Ela citou o apoio da empreiteira aos encontros chamados Diálogos Capitais e Fórum Brasil, e a um encontro com a presença do economista Paul Krugman.”

O Globo cita ainda um segundo “empréstimo”, de 2009, no valor de R$ 500 mil, este conquistado por lobby de Luiz Gonzaga Beluzzo, um dos membros do conselho editorial de CartaCapital. O delator não deu detalhes que coloquem essa transação em xeque.

Leia, abaixo, a nota de CartaCapital:

A VERDADE SOBRE O DINHEIRO DA ODEBRECHT

Por Manuela Carta

Embora as informações pertinentes tenham sido prestadas ao jornal O Globo, as distorções na reportagem “Odebrecht ‘emprestou’ verba a CartaCapital”, publicada na edição desta terça-feira 13, exigem novos esclarecimentos:

1. Em 2007 e 2009, a Odebrecht fez um adiantamento de publicidade no valor total de 3,5 milhões de reais a CartaCapital, uma operação normal no mercado. Naquele momento, a revista procurou vários anunciantes em busca de um reforço de caixa. O adiantamento foi negociado diretamente com a empresa por Mino Carta e Luiz Gonzaga Belluzzo, sócios da Editora Confiança, que edita a revista CartaCapital. Não houve interferência de ninguém a nosso favor.

2. O adiantamento foi pago da forma tradicional: por meio de anúncios e patrocínios de eventos. A Odebrecht chancelou vários de nossos seminários regulares intitulados “Diálogos Capitais”, bem como patrocinou a premiação “As Empresas Mais Admiradas no Brasil” em 2009, 2011, 2012, 2013 e 2014. Em 2013, figurou entre os patrocinadores do “Fórum Brasil”, que trouxe o economista Dani Rodrik. No ano seguinte, também patrocinou o mesmo evento, cujo principal palestrante foi Paul Krugman, Nobel de Economia. A editora possui os registros e notas fiscais dos anúncios publicados e eventos realizados.

3. Uma das maiores empresas do País, a Odebrecht  regularmente anuncia e patrocina eventos em diversos veículos, entre eles, o próprio O Globo. CartaCapital não sabe e não tem obrigação de saber de onde vieram os recursos do adiantamento da verba de publicidade. Não existe carimbo em dinheiro e trata-se de má-fé acreditar que o investimento na revista saiu de “um departamento de propina” e o aplicado nos demais meios de comunicação tem origem lícita. Além disso, o investimento publicitário da empreiteira deu-se quando não havia nenhum sinal do envolvimento da empresa nas ilicitudes apontadas pela Operação Lava Jato. Lembremos que outros meios de comunicação receberam verbas da Odebrecht em 2016, quando os fatos eram sobejamente conhecidos, nem por isso esses veículos podem ser acusados de conivência com qualquer tipo de atitude da empresa ou de defender este ou aquele interesse.

4. Desconfiamos que o vazamento dessa citação distorcida a CartaCapital esteja relacionado ao fato de não termos abdicado do dever jornalístico de apontar os erros e abusos da Operação Lava Jato, além da nossa conhecida postura crítica em relação aos meios de comunicação, em grande medida responsáveis, no nosso entender, pelo clima de caça às bruxas reinante no Brasil. Nossa lisura e transparência, reforçadas semanalmente ao longo dos últimos 22 anos, não serão abaladas por essa classe de ilações.

*Manuela Carta é publisher de CartaCapital

 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

13 Comentários

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  1. Realmente, deve ser muito

    Realmente, deve ser muito comum construtoras que dependem muito do governo adiantando milhões a uma revista de linha governista. Que mal pode haver nisso?

  2. Ilusão atoa

    E tem gente que se ilude com a direita brasileira. Ai que preguiça! E lá vai o Aécim, botando todo mundo na roda e correndo pros braços da galera.

  3. Certa vez afirmei que só as

    Certa vez afirmei que só as estranhezas da Mecânica Quântica podem servir servir de comparação para as também estranhas situações com que nos deparamos de certo tempo para cá. Mais precisamente nos ditos governos de esquerda. 

    Por esse aspecto, nos vem de imediato à cabeça a dualidade onda-partícula. Ou seja, um coisa ser uma coisa diferente do que é ou ser a mesma coisa que se torna duas coisas diferentes. Em resumo: terem a propriedade ou se comportarem ora como onda ora como partícula. 

    Na perspectivas da mídia corporativa, por exemplo, doações de campanha: se forem para o PT é propina, ou onda na MQ. Se forem para os demais, são doações, ou partículas. Forma-se a dualidade propina-doações. 

    Já no relacionamento com o meio empresarial, com anunciantes, a mesma equivalência: para ela, agora mancomunada com a República de Curitiba, o recursos provindos das empreiteiras ou empresas modo geral, são verbas publicitárias, patrocínios de eventos, antecipações de faturas etc. Para a sua minúscula concorrente(em termos de poder financeiro e político), não: trata-se de propina intermediada ou induzida pelo apoio aos governos petistas. Outra dualidade: verbas publicitárias lícitas-propinas. 

    Mas tudo isso pode ser desprezado. Afinal, qual o crime cometido pela Carta Capital mesmo que por hipótese os recursos tenham sido gratuitos, sem contrapartida? Claro que restaria o aspecto ético, mas ficaria por conta de cada um o julgamento. Tal hipótese é remota porque os esclarecimentos dos editores da revista elucidam de vez as dúvidas. 

  4. Não é por acaso…

    …que o Brasil perdeu posições no ranking da liberdade de expressão elaborado pela organização Repórteres sem Fronteiras. Estamos em 104º lugar. 

  5. Cala a boca (índio, negro,

    Cala a boca (índio, negro, mameluco, branco pobre, operário, esquerdista, petista…).

    Sabe com quem você está falando?

    É fato.

    Se equivocam aqueles que imaginam a história como uma suscessão de fatos que muitas vezes não podem ser encadeados uns nos outros. 

    Também estão errados aqueles que acreditam numa história cíclica, em que os mesmos fatos voltam a ocorrer de maneira semelhante ou idêntica. 

    No Brasil a história é um fenômeno impossível. Sob uma superfície fina de verniz podemos ver as estruturas de poder colonial operando 500 anos depois do descobrimento.

     

     

  6. EFEITO ODEBRECHT NOS TÚMULOS DE PINDA

    Efeito Odebrecht em Pindamonhangaba: foi estourar a denúncia e começarem a desenterrar à noite o dinheiro escondido nos túmulos dos cemitérios. Santo” Paulão Ribeiro” da Merenda, cunhado mais famoso do “Santo Geraldo Alckmin”, é dono de um cemitério na cidade e manda e desmanda no Cemitério do Santíssimo que fica bem ao lado. Foi dos Santos a idéia de construir os túmulos novos do centenário e perpétuo Cemitério do Santíssimo estrategicamente junto ao muro de trás. O cão de guarda do Santíssimo, também chama Sr Paulo, não tem cara de santo mas é bem treinado, obedece cegamente e inventa desculpas como ninguém (mas enterro de obeso de madrugada já está muito manjado).

  7. DESENTERRANDO UM MAR DE LAMA

    Efeito Odebrecht em Pindamonhangaba: foi estourar a denúncia e começarem a desenterrar à noite o dinheiro escondido nos túmulos dos cemitérios. Santo” Paulão Ribeiro” da Merenda, cunhado mais famoso do “Santo Geraldo Alckmin”, é dono de um cemitério na cidade e manda e desmanda no Cemitério do Santíssimo que fica bem ao lado. Foi dos Santos a idéia de construir os túmulos novos do centenário e perpétuo Cemitério do Santíssimo estrategicamente junto ao muro de trás. O cão de guarda do Santíssimo, também chama Sr Paulo, não tem cara de santo mas é bem treinado, obedece cegamente e inventa desculpas como ninguém (mas enterro de obeso de madrugada já está muito manjado).

  8. Estou com CC

    A CC  é o unico semanario que se consegue ler!

    Ponto final!

    E eu leio com gosto!

    Que moral tem o globo de falr qualquer coisa?

    Sei identificar um jornalzeco lixo muito bem!

     

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