Aquiles Rique Reis
Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.
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O borogodó de Júlia Vargas, por Aquiles Rique Reis

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Foto: Divulgação

Por Aquiles Rique Reis

Mulher fortaleza, louca varrida, dona do nariz. Ares de menina – mulher de voz potente. Afinação de diapasão. Suingue negro na flor da pele. Pop, rock, baião, samba, balada, tango, tudo serve à voz de quem não se prende a um universo limitado – caminha sem se emparedar, sem tirar o pé do acelerador. Voa e paira sobre vilas e mundos. Navega em mil e uma águas: rasas, profundas, turvas, cristalinas, bravias, plácidas.

Timoneira de seu destino, está pronta para encarar o que chegar. De seu canto brota a gênese de uma vitória que surge, inexorável. Respiração precisa, o diafragma não lhe falta – sempre que carece ali está ele, atento, flexível –, e sem golpes de ar que forçam a voz a fraquejar aos primeiros compassos. Ginga maneira; divisões que multiplicam a força dos versos; falsetes, graves, agudos e vocalises desdobrando-se nos cantares.

Cantora, dançarina, tem o dom da emoção ilimitada. Mulher criança, cantando como gente “mais maior de grande”. Mágica, mandinga? Pé de pato mangalô três veiz. que assim seja e siga (en)cantando. Mulher música que o infinito escolheu, ávido para ser seu parceiro de fé. Duo fantástico: mulher infinita.

Júlia Vargas lançou Pop Banana (Biscoito Fino), seu segundo disco solo. Álbum que embute a plenitude de uma conceituação musical explícita. Solidez que, sem medo nem da eira, nem da beira,  ruma ao norte (ou seria ao sul?), loucamente tatuada pela boniteza de seu cantar.

Gabriel Barbosa (bateria), João Bittencourt (acordeom e piano) e Marcos Luz (baixo elétrico) formam a base das levadas. E mais Ary Dias (percussão), Ayran Nicodemo (violino), Beto Lemos (rabeca), Durval Pereira (zabumba e percussões), Federico Puppi (violoncelo), Jonas Hocherman (trombone), José Arimatéa (trompete) e Marcelo Bernardes (flautas, flautim, clarinete, saxes, clarone, pífanos, arranjador do naipe de sopros), além de Nei Matogrosso e Pedro Luís.

Todos com um só pensamento, levar a diversidade musical até onde os ouvidos alcançarem. Arranjos coletivos, plenos de sopros e percussões. Grooves de fina tessitura. Uníssonos, quando a melodia carece de simplicidade; duos, quando a harmonia pede riqueza; dinâmicas, quando o pianíssimo antecede o fortíssimo… musicalmente primoroso, assim é o Pop Banana de Júlia Vargas.

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Foto: Marcos Hermes/Divulgação

Ela selecionou onze músicas que pintam como se feitas só para seu brilho. Como “Pedra Dura” (Ivo Vargas e André Vargas, irmãos de Júlia), de versos bem costurados, que tem Nei Matogrosso em duo com Júlia. Daí passando por “Eva Maria” (Claos Mózi e Victor Lobo), nordestinidade com rabeca, zabumba e acordeom resfolegando. Indo então a “Comadre” (João Bosco e Aldir Blanc), depois “A Vida não é Sopa” (Marcos Mesmo) e chegando a M Ã (Tom Zé, grafado assim mesmo). Só musicão, para seu vozeirão!

Júlia Vargas tem um quê de ainda maior genialidade a ser expressado. Pensando bem, além do poder de sua voz, o que fará dela uma estrela máxima é o seu borogodó – ah, meus tempos! –, dom que poucos têm!

Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4

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Aquiles Rique Reis

Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.

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