O conflito na área econômica entre o Tesouro e a Caixa

Jornal GGN – O jornalista João Villaverde, repórter da sucursal de Brasília do jornal Estado de São Paulo, explica o conflito na área econômica entre a Caixa Econômica Federal e o Tesouro Nacional. Segundo Villaverde, a disputa comea em novembro de 2012, quando o Tesouro começou a adiar o repasse de recursos para bancos oficiais, como a Caixa. Leia mais abaixo:

Do Estadão

O conflito na área econômica

JOÃO VILLAVERDE

O Tesouro Nacional e a Caixa Econômica Federal estão quase em pé de guerra. Entenda por que esse conflito começou e como que isso mexe com o governo Dilma Rousseff.

Há um conflito surdo a pleno vapor nos gabinetes de Brasília. Numa ponta, a direção e corpo técnico da Caixa Econômica Federal; na outra, o núcleo duro do Tesouro Nacional, comandado há mais de sete anos pelo economista Arno Augustin.

Neste exato momento, a disputa está no auge. Mas o começo de tudo remonta a novembro de 2012.

Sem dinheiro entrando no cofre, por conta da arrecadação em queda, e tendo uma meta fiscal para cumprir, o Tesouro teria começado, naquele mês, a postergar em alguns dias o repasse de recursos para os bancos oficiais, em especial à Caixa. Segundo um técnico gabaritado, que esteve na linha de frente do governo Dilma Rousseff até poucos meses atrás, a operação iniciada em novembro de 2012 ainda não foi terminada. Como funciona isso?

Os bancos, públicos e privados, têm obrigações com o setor público. Eles são obrigados, por exemplo, a pagar benefícios sociais e previdenciários em dia. No caso da Caixa, que paga também o Bolsa Família, há ainda mais obrigações. Esses benefícios são custeados com dinheiro do Tesouro Nacional. O governo lança em seu sistema automático uma ordem bancária de pagamento. Funciona como um DOC ou TED que todos nós fazemos. Essa é uma operação rotineira e cotidiana. Os bancos repassam o dinheiro aos beneficiários e recebem, no mesmo dia, o dinheiro do Tesouro. O que estaria ocorrendo é: o dinheiro do Tesouro aos bancos, como a Caixa, não está chegando no mesmo dia, mas com um descompasso de alguns dias.

O que o governo ganha com isso? Tempo.

Ao deixar de transferir o dinheiro nos dias 30 ou 31 de um mês e passar nos primeiros dias do mês subsequente, o balanço mensal das contas públicas fica artificialmente bom. A Caixa, que não é um banco com capital aberto (como Bradesco, Itaú Unibanco, Banco do Brasil e outros), ou seja, é inteiramente uma instituição financeira do governo federal, tem entrado no jogo. Segundo especula-se entre gabinetes de Brasília, a Caixa não é a única instituição financeira que tem recebido com atrasos esses pagamentos…

Esta prática de atrasar em alguns dias o repasse financeiro, se estiver mesmo ocorrendo, não é nova. Desde os anos 1990, em períodos pontuais de aperto, o governo federal tem recorrido à esse tipo de manobra. Mas segundo fontes seguras do governo, isso não existiu entre janeiro de 2011, quando Dilma Rousseff assumiu a Presidência, e novembro de 2012. Ali começou tudo, e os atrasos foram se espalhando.

Parte dos especialistas em contas públicas, no mercado e na academia, começou a sacar em meados de 2013 que havia um ritmo estranho ou “atípico” nas despesas federais (onde esses repasses se inserem). Eram de pouca monta, então. A partir do fim de 2013 e o início deste ano de 2014, o jogo engrossou.

O Banco Central percebeu. A área de fiscalização da instituição monetária verificou os descompassos nos saldos dessas contas dos benefícios sociais da Caixa, e questionou o banco estatal. Como a Caixa não tinha o que fazer, buscou uma solução inédita: foi à Advocacia Geral da União (AGU) e pediu que fosse aberta uma Câmara de Arbitragem para que se chegasse a um denominador comum. O ministro Luis Inácio Adams, o advogado-geral da União, confirmou ao Estadão o pedido da Caixa. O papel da AGU nesta Câmara de Arbitragem é o de mediação. De cada lado da mesa estão a Caixa e o Tesouro Nacional. Sabe-se em Brasília que a solução adotada pela Caixa desagradou – e muito – o órgão chefiado por Arno Augustin.

Quando procurados oficialmente, a Caixa e o Tesouro responderam o Estadão com a mesma resposta, por escrito. Rigorosamente a mesma resposta. Leia com atenção, caro leitor, que essa resposta contêm uma pista importante: “Os repasses do Tesouro Nacional para pagamento de benefícios sociais, entre eles o Bolsa Família, seguem a programação financeira e não há qualquer anormalidade no processo de transferência. Conforme dados da própria Caixa, o saldo nas contas dos programas sociais está atualmente positivo.”

Não foi à toa que Tesouro e Caixa tenham dito que “atualmente” o saldo dessas contas está positivo. A senha foi dada por fontes do próprio governo: ao longo do primeiro semestre, nem sempre o saldo esteve positivo, ou seja, faltou dinheiro do Tesouro, deixando o saldo negativo na Caixa, que acabou sendo captado pelos fiscalizadores do Banco Central. Além disso, a Caixa estava prestes a soltar seu balanço trimestral, então era razoável que, neste cenário, o saldo das contas estivesse positivo.

Mas o conflito entre Caixa e Tesouro não fica apenas nisso. Como brincou um economista do governo federal, o jogo está Tesouro 7 x 1 Caixa…

Ainda há a história dos dividendos e do crédito. Em busca de todo e qualquer centavo que puder encontrar para cumprir sua meta fiscal, o governo tem dado sinais às estatais de que vai precisar de todos os dividendos que elas pagam à União. E mais um pouco. Somente a Caixa deve depositar aproximadamente R$ 5 bilhões nos cofres do Tesouro, em dividendos, até dezembro deste ano.

O problema é que o mesmo governo quer fazer da Caixa a “ponta de lança” do mercado de crédito. Com a economia estagnada e um pacote que acabou de sair do forno do Banco Central, que libera recursos do depósito compulsório para os bancos emprestarem mais dinheiro às pessoas e empresas, as esperanças do governo federal estão depositadas na Caixa, principalmente, para forçar os demais bancos comerciais a pisarem no acelerador. E como todo mundo sabe, mas não custa lembrar…  “a vontade do controlador (o Tesouro) sempre prevalece”, disse um alto dirigente da Caixa, em reportagem recente do Estadão.

Como essa disputa vai terminar?

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Técnicos em contas públicas tem apontado que o “caso dos R$ 4 bilhões” pode estar relacionado aos atrasos do Tesouro com os bancos. Grandes contas, como a Previdência Social, geram créditos (arrecadação com folha de pagamento) e débitos (despesas com benefícios) entre os bancos e o Tesouro Nacional. O caso dos R$ 4 bilhões encontrados pelo BC em um banco privado nacional, que tinha feito uma mudança contábil e transferido aquele dinheiro para uma conta em separado, continua com fios desencapados.

Redação

13 Comentários

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  1. Noticias como essa o blog de

    Noticias como essa o blog de Nassif só deveria divulgar depois de fazer uma checagem.

    Notícias do estadão baseada em “um técnico gabaritado, que esteve na linha de frente do governo Dilma Rousseff até poucos meses atrás” é suspeita total, mesmo porque a Caixa e o Tesouro emitiram uma nota fazendo o contraditório.

     

    1. Tambem achei suspeitissimo. 

      Tambem achei suspeitissimo.  Eles mencionam o caso da Caixa pra dizerem que “outros bancos” tambem nao estao sendo pagos.  Prova?  Nomes?  Causos?  Nada.

      E o caso que deveria ser escandaloso mesmo ta escondido nos ultimos paragrafos, onde o banco igualmente nao tem nome!

      Perdoem me por suspeitar bancos tucanos.

      Alias, ja que estamos falando de cachorradas bancarias, nao sei se voces viram:

      Santander NÃO DEMITIU executiva que autorizou ataque a Dilma“!!!

      1. Ataque? Que ataque? Se se

        Ataque? Que ataque? Se se refere a previsões de mercado com a posição à frente de uma ou outra candidatura, isso absolutamente não é ataque, pelo contrário, o banco faz bem em esclarecer a seus clientes a interferência da política na economia. Só faltava calar-se por medo de nossa Presidente não gostar… O funcionário que emitiu a nota merece elogios, não demissão! O pedido público de desculpas do presidente do Santander demonstrou claramente que nossa democracia tem mais fachada do que conteúdo, pois ele teme retaliação do governo.

        1. Verdade, nao foi

          Verdade, nao foi “ataque”.

          Foi “ataque ilegal”.

          E o Santander esta mentindo a respeito das providencias “que tomou”.

    2. “Notícia boa a gente mostra

      “Notícia boa a gente mostra na hora, notícia ruim só se transitado em julgado, com ampla defesa”

  2. Muito superficial a análise e

    Muito superficial a análise e não toca no assunto que são as cosequências disso.

     

    Imagine que vc seja um empresário que decide investir SEU dinheiro no programa governamental chamado MCMV organizado pela CEF,

    Vc vai lá e gasta R$2mi na obra esperando a medição da CEF para receber estes R$2mi, já gastos, de volta.

    Aí vai a CEF e mede R$1mi.

    Como é que vc fica? Fica com cara de ladrão? Tem que pedir favor pra CEF medir CORRETAMENTE?

    E a pergunta que fica no ar, quando a CEF vai medir a mais para corrigir isso?

    Tem que entrar na Justiça?

     

    Tem pior, tem quando a CEF nem vai la para medir tendo vc um contrato assinado com a CEF dizendo que ela deve medir.

     

    Ou ainda, vc pode fazer acordo com a CEF para lançar um empreendimento. Vc vai lá e lança. Um sucesso. vende TUDO e na hora de assinar com a CEF, tem que esperar alguma coisa. Esperar o sobrenatural de almeida.

    então, vc fica lá no seu terreno com 200 compradores te perguntando quando a obra vai começar. Fica vc com cara de estelionatário.

    Aí vc explica pro comprador que está tentando assinar com a CEF há 18 meses e eles NÃO ASSINAM.

    Qual o risco da CEF em assinar um empreendimento 100% vendido? Qual o risco?

     

    Tudo isso não é picuinha da minha cabeça. Aconteceu nos MEUS empreendimentos.

    Até a PORRA do MP foi lá ver o qe estava acontecendo. E aí, vai vc lá DEPOR no MP para explicar o inexplicável, que está há 24 meses tentando ASSINAR com a CEF.

    E a cada 2 meses mais R$2000 em certidões. Nova entrada para depois mais um DETALHE burocrático impedir a assinatura do emprendimento 100% vendido.

     

     

    Fica a pergunta, nesta briga toda, quem vai pagar pelo MEU PREJUÍZO?

    1. É o feitiço se virando contra o feiticeiro

      O governo faz malabarismos fiscais pra corresponder as expectativas do big money, o mercado “globalizado”. (vulgo caracu, onde E.E.U.U. e Europa entram com a cara, e o resto…)

      Enquanto isso os players menores, que dependem do governo, sofrem com as consequências…

      Imagina com o Ecim…

  3. O problema é se não repuserem

    O problema é se não repuserem o dinheiro. Se atrasam alguns dias muda o que ? A matéria está mal contada.

    1. O que muda?

      É o que se pode chamar de contabilidade criativa, visando mostrar um superávit que na verdade não existe.

      Geralmente essas operações são feitas para embelezar contas públicas.

      Não é a primeira vez que a equipe econômica do governo atual é pega usando critérios heterodoxos para melhorar as contas. A consequência é a perda de credibilidade, e isso é mais sério…

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