O furo jornalístico que atropela a justiça

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Por Nilson Lage

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Ocorre-me refletir sobre o que é um furo jornalístico.

Ora, diriam, é uma informação impactante que se publica em primeira mão.

No entanto, para mim, há diferença relevante em “como” se obtém o “furo”.

Valerá creditar o furo a meros estafetas – àqueles moleques de recados que uma organização criminosa, como a de Carlinhos Cachoeira, ou um núcleo de justiceiros, como essa procuradoria federal do Paraná, usam constantemente para difundir suas fofocas?

Não será desonesta a autoridade pública que, sem assumir a responsabilidade, viola o segredo de justiça e, escondendo a cara, espalha – portanto, coonesta – denúncias de um criminoso? Será essa prática legítima, tolerada em nome da liberdade de imprensa? 

E os direitos individuais dessas pessoas, onde ficam? E se alguma delas for inocente, a quem se queixa?

A partir do depoimento de uma testemunha, o repórter, sem fazer qualquer ressalva, estipula quais instâncias julgarão os “acusados”. Dispensa a investigação, o processamento judiciário, o direito de defesa..

Do Blog Fausto Macedo / Estadão

Ex-diretor citou em delação 28 políticos beneficiários de esquema na Petrobrás

Paulo Roberto Costa relata em 80 depoimentos relação que inclui ministro e ex-ministros da gestão Dilma Rousseff, governador, ex-governadores e parlamentares; são, ao todo, 10 nomes do PP, 8 do PT, 8 do PMDB, 1 do PSB e 1 do PSDB

Primeiro delator da Lava Jato, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa citou em 80 depoimentos que se estenderam por duas semanas, entre agosto e setembro, uma lista de 28 políticos – que inclui ministro e ex-ministros do governo Dilma Rousseff (PT), deputados, senadores, governador e ex-governadores.

O Estado obteve a lista completa dos citados. A relação inclui ainda parlamentares que integram a base aliada do Palácio do Planalto no Congresso como supostos beneficiários do esquema de corrupção e caixa 2 que se instalou na petrolífera entre 2004 e 2012.

Há nomes que até aqui ainda não haviam sido revelados, como o governador do Acre, Tião Viana (PT), reeleito em 2014, além dos deputados Vander Luiz dos Santos Loubet (PT-MS), Alexandre José dos Santos (PMDB-RJ), Luiz Fernando Faria (PP-MG) e José Otávio Germano (PP-RS). Entre os congressistas, ao todo foram mencionados sete senadores e onze deputados federais.

O perfil da lista reflete o consórcio partidário que mantinha Costa no cargo e contratos bilionários da estatal sob sua tutela – são 8 políticos do PMDB, 10 do PP, 8 do PT, 1 do PSB e 1 do PSDB. Alguns, segundo o ex-diretor de Abastecimento, recebiam repasses com frequência ou valores que chegaram a superar R$ 1 milhão – dinheiro que teria sido usado em campanhas eleitorais. Outros receberam esporadicamente – caso, segundo ele, do ex-senador Sérgio Guerra, que foi presidente nacional do PSDB e em 2009 teria pedido R$ 10 milhões para arquivar uma CPI da Petrobrás no Senado.

delacao-costa

Sobre vários políticos, o ex-diretor da estatal apenas mencionou o nome. Não revelou valores que teriam sido distribuídos a eles ou a suas agremiações.

Foram citados os ex-governadores do Rio Sérgio Cabral (PMDB), do Maranhão Roseana Sarney (PMDB) e de Pernambuco Eduardo Campos (PSB) – que morreu em um acidente aéreo em 13 de agosto, durante campanha presidencial.

Primeiro escalão. A lista inclui também o ex-ministro Antonio Palocci (PT), que ocupou a Esplanada nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma; os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o atual ministro de Minas e Energia, Edson Lobão, e ex-ministros Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Mário Negromonte (Cidades).

Os 28 nomes são exclusivamente de políticos que teriam sido beneficiários dos negócios da diretoria de Costa. A Polícia Federal e a Procuradoria da República trabalham com outros nomes de políticos que se relacionavam com os ex-diretores da estatal Renato Duque (Serviços) e Internacional (Nestor Cerveró).

As revelações foram feitas em depoimentos prestados por Costa à força tarefa da Lava Jato e fazem parte do acordo de delação premiada firmado pelo ex-diretor com o Ministério Público Federal em troca de redução da pena. Desde que sua delação foi aceita pelo Supremo Tribunal Federal, ele cumpre prisão em regime domiciliar, no Rio.

Alguns nomes dessa lista também aparecem na relação fornecida pelo doleiro Alberto Youssef, que firmou acordo semelhante – ainda não homologado pelo ministro Teori Zavascki, do STF. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve denunciar os envolvidos no esquema de desvios da estatal em fevereiro, quando tem início a nova legislatura (mais informações no texto abaixo).

A delação do ex-diretor da Petrobrás, já homologada pelo Supremo, estava com Janot desde novembro. Ele aguarda o teor do depoimento de Youssef para cruzar os nomes citados, o que deverá ser realizado até o início da próxima legislatura.

Foro. Na troca da composição do Congresso, alguns dos citados perdem foro privilegiado e passam a ser julgados pela Justiça de primeira instância. Por decisão do ministro Teori Zavascki, as investigações permanecem divididas entre a Suprema Corte e a Justiça Federal no Paraná, onde serão investigados os acusados que não têm mandato.

A lista de 28 nomes foi revelada por Costa exclusivamente no âmbito da delação premiada. Como são citados políticos com foro privilegiado, o caso foi parar no STF. Em depoimentos à primeira instância da Justiça Federal, o ex-diretor da Petrobrás não falou de políticos, mas citou que o PP, o PMDB e o PT recebiam de 1% a 3% sobre o valor dos contratos da estatal para abastecer caixa de campanha.

A investigação desvendou uma trama de repasses a políticos na estatal. A Lava Jato foi desencadeada em março e identificou a parceria de Costa com o doleiro Youssef. Na última fase da operação, deflagrada em 14 de novembro, foram presos os principais executivos e dirigentes das maiores empreiteiras do País, todos réus em ações penais por corrupção ativa, lavagem de dinheiro, crimes de cartel e fraudes a licitações. / FAUSTO MACEDO, RICARDO BRANDT, JULIA AFFONSO e FÁBIO FABRINI

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

17 Comentários

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  1. e então os bandidos delatam

    e então os bandidos delatam para minorar suas penas e está tudo bem…

    não preciam de provas…fatos…

    só de vazamentos espúrios…

    enquanto não se resolver essa chaga dos vazamentos

    seletivos, a democracia brasileira corre perigo,

    sério perigo, inclusive para os que denunciam

    arbitrariamente, pois já pensam pelo jeito que

    ficarão eternamente impunes.

  2. tijolaço

    Ainda acho que o Estadão inventou tudo isso, o jornal não se conforma com a perda da eleição presidencial. Continua em campanha assim como seu candidato.

    De toda forma, digo eu, algum % do percebido pelas empreiteiras nas suas atividades legais SEMPRE vai financiar (por dentro ou por fora) a eleição dos políticos enquanto for permitido o financiamento privado de campanha.

    Na “lista da propina”, falta dinheiro, ou faltam políticos ou falta verdade

    19 de dezembro de 2014 | 09:12 Autor: Fernando Brito

    prc

    Muito estranha a lista dos beneficiários de dinheiro de empreiteiras que trabalhavam para a Petrobras, divulgada hoje pelo Estadão.

    Dois valores citados, chega-se á conclusão que os maiores foram para políticos de oposição, em valores que, de forma alguma, poderia ser confundidos com doações eleitorais: Eduardo Campos (R$ 20 milhões) e Sérgio Guerra (R$ 10 milhões).

    Supõe-se que, embora hoje ambos estejam mortos, Costa tem os meios de demonstrar como e por que meios foram feitos os repasses.

    Aliás, o mesmo deve se aplicar àqueles que, diz o jornal, “segundo o ex-diretor de Abastecimento, recebiam repasses com frequência ou valores que chegaram a superar R$ 1 milhão”.

    Mas, estranhamente, a reportagem afirma que “sobre vários políticos, o ex-diretor da estatal apenas mencionou o nome. Não revelou valores que teriam sido distribuídos a eles ou a suas agremiações”.

    Muito pouco para quem quem está “enojado”, “arrependido” e disposto a “entregar tudo”.

    E para quem vai sair livre depois de ter roubado – com todo este “nojo” alegado – R$ 23 milhões de dólares, com a ajuda da família, também perdoada.

    Não tenho a menor simpatia por nenhum dos citados – muito ao contrário, na maioria dos casos – mas é preciso discernir entre o que é pedir para conseguir doações e negociar contratos para receber propina.

    Porque se pedir doações eleitorais de empresas for crime, dos 513 deputados e 81 senadores sobraria uma dúzia, se tanto.

    Nenhuma empresa doará se não se lhe pedir, não é?

    Goste-se ou não (viu, Ministro Gilmar Mendes?) é assim que funcional eleições com financiamento privado de campanhas.

    É algo completamente diferente, senão do ponto de vista moral, do ponto de vista jurídico.

    O tráfico de influência, juridicamente, liga o pedido à promessa de uma vantagem.

    Dizem as metáforas jurídicas que teria vindo de  um certo Vetronio Turino, que vendia supostos favores do imperador romano Alessandro Severo e que foi executado com fumaça, pois fumaça vendia.

    Não duvido que os demais políticos citados tenham pedido a Paulo Roberto Costa que conseguisse doações de empreiteiras para suas campanhas.

    Centenas de  candidatos a deputado, a senador, a governador, a vereador pediram diretamente ou solicitaram a alguém que pedisse dinheiro a empreiteiras. No mínimo, aceitaram que alguém pedisse em seu nome.

    Será que as empreiteiras, as  citadas na Lava Jato  e outras, foram bater na porta de Aécio Neves e dizer “queremos te doar R$ 50 milhões”?

    Será que a Odebrecht (diretamente ou através de sua controlada Foz do Jaceaba) doou mais de R$ 7 milhões a Aécio, sem contar os R$ 4 milhões da Braskem, da qual é sócia?

    Será que os candidatos mandam pedir ao contínuo das empresas?

    Se esta lista for tratada sem hipocrisia, ela é muito pequena.

    Se for olhada frente à realidade política que faz as campanhas mergulharem na tenebrosa promiscuidade  pode incluir quem não fez nada além de pedir que pedisse, sem prometer ou acenar com vantagem.

    E se for olhada pelo ângulo do dinheiro, está faltando, se chegou à casa dos bilhões que se diz ter chegado.

    Tem contra-sensos evidentes, como dar 20 milhões de reais à campanha de um governador e, supostamente, um décimo disso a uma campanha presidencial. Aliás, a Odebrecht deu o mesmo valor às campanhas de Dilma e de José Serra, naquele ano…

    Ou será que foi Costa que prometeu conseguir doações para construir uma teia de simpatias para que ele próprio pudesse, “enojadamente”, roubar a Petrobras?

    De qualquer forma, a registrar que o “vazamento seletivo”, antes circunscrito aos Ministério Público Federal do Paraná, chegou à Procuradoria Geral da República.

    A ver como reagirá o Procurador-Geral Rodrigo Janot a isto.

    Porque, se ele mantém estes depoimentos a sete chaves, deve saber quem deles poderia “catar” nomes.

    Ou se quem os enviou a ele está fazendo isso, traindo seu dever funcional.

     

    1. “Dois valores citados,

      “Dois valores citados, chega-se á conclusão que os maiores foram para políticos de oposição, em valores que, de forma alguma, poderia ser confundidos com doações eleitorais: Eduardo Campos (R$ 20 milhões) e Sérgio Guerra (R$ 10 milhões)”:

      E se a reportagem nao for invencao isso eh so mais prova de delacao dirigida.

  3. “são 8 políticos do PMDB, 10

    “são 8 políticos do PMDB, 10 do PP, 8 do PT, 1 do PSB e 1 do PSDB”:

    “Delacao dirigida”, ou “delacao combinada”?

    E eram DOACOES pra campanha ou nao eram?  (A de 20 milhoes a Campos nao tem explicacao sob qualquer circunstancias.)

  4. Algo estranho …

    Será que só eu fico incomodado que essa lista contenha apenas dois nomes de políticos da oposição, agraciados com as maiores quantias, e os dois já estejam mortos ? 

     

  5. Por muito menos o Protógenes sofreu pesadas penas

    Por muito menos o Protógenes sofreu pesadas penas, de condenação a prisão convertida em serviços comunitários a perda do cargo de delegado pq teria contribuido para o furo da Globo sobre a prisão de Daniel Dantas…Mas a República do Paraná se transformou num vazodouro descontrolado e tudo bem…ahaaaaaa…os delados  da oposição somente os mortos….hum….essa Dra. Catta Preta, especialista em delação combinada(sic, premiada) é muito espertinha(http://www.josecarloslima80.blogspot.com.br/2014/12/nassif-para-entender-operacao.html)

    1. Fenômeno da Natureza é a Seca Em SP

      e deve ser por isso que o escândalo dos trens não preocupa os eleitores paulistas.. fenômeno da natureza.

      Detalhe, não tem lama em SP… já secou!!!

    2. Fenômeno da Natureza é a Seca Em SP

      e deve ser por isso que o escândalo dos trens não preocupa os eleitores paulistas.. fenômeno da natureza.

      Detalhe, não tem lama em SP… já secou!!!

  6. O mais lamentável eh ver
    O mais lamentável eh ver jornalistas calejados ainda na.”esperança” de que essa imprensa possa, de uma hora pra outra, “abandonar” a guerra total em que se enfiaram… Comovente!

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