Por que a polícia mata, por Maurício Dias

Da Carta Capital

Licença para matar

Por Maurício Dias

Polícia Militar tem no DNA, desde a criação, a cultura da violência contra pobres e negros, aumentada a partir do combate aos traficantes

O paradigma da polícia é a guerra. Uma guerra contra os pobres

Não surpreendeu o assassinato recente de um menor no Morro da Providência, Rio de Janeiro, por soldados da Polícia Militar integrantes da Unidade de Polícia Pacificadora(UPP). O jovem traficava drogas e estava armado. Não reagiu. Entregou-se. Mesmo assim foi fuzilado.

Há uma diferença nesse acontecimento quase corriqueiro nas favelas cariocas. O crime, filmado por um morador, flagra os PMs assassinos montando a cena para legitimar a execução que na sequência seria mascarada como “auto de resistência”.

Por que a PM mata?

“A cultura do extermínio está na história da polícia. Isso foi magnificado pela guerra às drogas e pela inculcação da mídia quanto à necessidade de tratar penalmente problemas sociais. O paradigma da polícia é a guerra. Uma guerra contra os pobres”, denuncia a professora Vera Malaguti Batista, mestre em História Social e integrante do Instituto Carioca de Criminologia.

Ela identifica na trajetória da corporação militar a permanência cultural de violência contra os pobres e negros. Teria se estabelecido a partir daí “um padrão duplo de cidadania” que, entre outras razões, tornou a ação truculenta nas favelas um cenário natural. E aponta um agravante na extensão da barbaridade.

Seria uma oficiosa “licença para matar” muito mais profunda porque “é facilitada pelo sistema como um todo”. Aí estão incluídos promotores e juízes.

Vera Malaguti foi uma das primeiras, se não a primeira, a criticar o modelo das UPPs quando o aplauso era quase unânime. O que ela, então, percebia?

“Minha crítica baseava-se na vergonhosa cobertura dada pelos meios de comunicação ao projeto para a cidade como um todo. Eu também conhecia a experiência de Medellín, na Colômbia, e seus efeitos negativos. Sabia que nunca foi um projeto social, e sim uma replicação das técnicas bélicas de controle do território.”

Vera Malaguti foi uma das primeiras a criticar o modelo das UPPs / Crédito: Pablo Vergara

Segundo ela, “construiu-se, na democracia brasileira, uma ambiência que naturaliza essa matança pelo paradigma da guerra às drogas. Tudo é legitimado se o menino é traficante. A grande mídia destila seu veneno cotidianamente incutindo uma mentalidade exterminadora. Passamos da resistência à truculência policial à sua naturalização e, agora, ao aplauso”.

Malaguti tem um arsenal de perguntas disparadas para embaraçar as mais impolutas autoridades e os mais distintos públicos. Eis algumas:

“Que sentido tem uma operação policial com aparato bélico como caveirões e helicópteros, quando os trabalhadores estão saindo de casa e as crianças estão indo para a escola? A prisão de alguns comerciantes varejistas vale as mortes por balas perdidas e escolas fechadas? Estamos mais seguros com essas ações ou elas produzem mais danos?”

Vera Malaguti lança em seguida uma questão provocante que, entretanto, ganha força em todo o mundo: os efeitos do proibicionismo.

“A proibição alimenta a indústria bélica e a do controle do crime. O tráfico é consequên-
cia disso, como a Máfia estadunidense foi consequência da proibição do álcool. A guerra às drogas está desmoralizada pela seletividade letal e pela ineficácia.” Aqui termina ela: “Aumentou o abismo entre o asfalto e a favela”.

Redação

12 Comentários

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  1. Por que os bandidos mataram

    Por que os bandidos mataram 58.995 pessoas em 2014? Nesse mesmo período, cfe. post desde GGN, as polícias mataram 3.8 mil pessoas, salvo os “efeitos colaterais” da profissão, desses, 99% de mortos pelas polícias, ora vejam, são bandidos psicopatas que entram no confronto com as forças de segurança para matar ou morrer, são esses mesmos bandidos (a mentalidade esquerdista acha que bandidos serão seus aliados quando vier a revolução, por isso a defesa) que cometeram os outros 55 mil homicídios.

     

  2. E vale tudo isso TB com
    E vale tudo isso TB com relação ao combate à corrupção – dos vermelhos sempre, por óbvio -, td tipo de violência e desmando é legitimado pela histeria da mídia e da claque reacionária.

    1. É a lógica do matar ou morrer

      É a lógica do matar ou morrer.

      É a consequência óbvia de adotar a política de não fazer prisioneiros, de matar quem se rende fazendo um teatrinho de auto de resistência.

      A mensagem que se transmite aos que estão à margem da lei é “reaja como bicho acuado porque sua única alternativa é morrer.”

      1. Essa exceção estrapola a

        Essa exceção extrapola a realidade da polícia.

        Mas, vc já viu bandidos (que são gente) acuar e matar pessoas, na maioria das vezes, como se nós fossemos bichos?

  3. Lies, damn lies and statistics

    A frase do título foi dita por Mark Twain mais de um século atrás. Mas faz sentido ainda hoje (talvez cada vez mais). E faz sentido em qualquer língua. A gente tem prazer em pegar um dado qualquer, de preferênciaum número preciso, que vá até a última casa, e calar a discussão. Nem que para isso a gente tenha que “torturar os dados”, eliminando o contexto, por exemplo. Para tentar trazer um pouco de luz à discussão, que tal usarmos as informações do Anuário Brasileiro de Segurança Pública – 2015 (http://www.forumseguranca.org.br/storage/download//anuario_2015.pdf)? Lá estão os números sobre 2014. Um deles chama a atenção: 58.559. Não deve ser coincidência a semelhança com outro número que foi oferecido aqui neste fórum: 58.995. O problema é que o primeiro número refere-se ao total registrado de “mortes violentas intencionais”. Cabe tudo aqui, inclusive o número de pessoas que “bandidos mataram”. O que não cabe é ser menor do que o segundo número citado, pois teríamos um conteúdo maior do que o continente, e inconsistente logicamente. Na verdade, o primeiro número citado soma homicídios dolosos (89,3%!), latrocínio – roubo seguido de morte (3,5%), lesão corporal seguido de morte (1,3%), vitimização policial (0,7%) e mortes decorrentes de intervenção policial (5,2%). Para essa última categoria, dever-se-ia acender uma luz vermelha, pois era 4% em 2013. Além disso, quando a morte decorrente da intervenção policial ocorre “fora de serviço” (as chacinas de Osasco, por exemplo) os números vão para a categoria “homicídio doloso”.

  4. “A cultura do extermínio está

    “A cultura do extermínio está na história da polícia. Isso foi magnificado pela guerra às drogas e pela inculcação da mídia quanto à necessidade de tratar penalmente problemas sociais. O paradigma da polícia é a guerra. Uma guerra contra os pobres”, denuncia a professora Vera Malaguti Batista, mestre em História Social e integrante do Instituto Carioca de Criminologia.”

    Que afirmação mais idiota é essa: “O paradígma da polícia é a guerra”. A cultura do extermínio não está na polícia, e sim na sobrevivência, o natural da história das guerras. É uma disputa de posição política “contra as drogas” para sobrevivência; e não importa qual farda se dá para a guerra!                                                                                                                                           Vera disse que é uma guerra contra os pobres. Isso não é uma verdade, mas um problema social que é combatido com armas. A cobiça de quem tem armas contra um batalhão com armas é a guerra. E combate de armas se combate com armas. A população civil, como em toda guerra, deve evacuar-se do local, e chegar na agenda dos políticos.                                                                                                                                                                                                       A mídia está erradíssima de tratar penalmente problemas sociais. Se é um problema social – e claro que o é de sobrevivência – os governos devem oferecer aos moradores uma moradia digna, onde eles possam ter o mesmo padrão de cidadania que ficará do lado da sociedade, e assim termina o abismo entre o asfalto e a favela. 

  5. Ninguém vai ressuscitar os

    Ninguém vai ressuscitar os mortos dos dois lados, nem criminalisando a violência, porque ela não é algo em si mesma, e nem diz, a tempo de impedir, como e o porquê se comportavam as pessoas nessas estatísticas.

    A mídia reclama que não há polícia nas ruas o tempo todo.

    Se a polícia pára de agir nas favelas os bandidos ganham o campo da impunidade, e a mesma mídia reclama que há o vazio de autoridade nas ruas.

    Por isso, não se deve fazer história com a reação do polícial que sofre a mesma sindrome do bandido, quando se assusta com o movimento repentino de uma pessoa inocente, e atira, ou o polícial que no revide da morte de um soldado abatido por bandidos crava os olhos na vitória da lei; mas  todos querem fazer a amminésia dos covardes, por que é mais fácil punir a história do policial que está dando a sua vida pela sociedade. A morte não se soluciona com estatística. 

    O problema social é eminentemente político.

  6. Complicado

    Se não mata, o Juiz solta o bandido e este procura vingança

    Se mata, o Juiz prende o policial.

    O problema não está na policia, mas sim na Justiça, aquela que prende rapazes negros sem família, mas que libera 500 quilos de cocaína, os donos, os pilotos e até o helicóptero também.

  7. A resposta é a impunidade da qual o MP é cúmplice

    Por que a polícia mata tantas pessoas criminosamente? Porque seus crimes ficam impunes. E tem mais: se a matança criminosa de pobres não for contida, logo se verá, de novo, juízes sendo assassinados, pois a sensação de impunidade estimula crimes cada vez mais ousados. Criminosos querem sempre agir sem quaisquer limites. Como  o judiciário pode impô-los, vira alvo desses criminosos armados legalmente até os dentes. A conivência judicial com assassinatos de pobres causa as circunstâncias ambientais que contribuem para que membros do judiciário sejam intimidados e até assassinados.

  8. Em tono de 60 mil pessoas

    Em tono de 60 mil pessoas assassinada no Brasil por ano, mais que em qualquer guerra vigente no mundo.

    Desse total 3 mil foram vítimas da polícia, quer dizer 5% do total….

    E o problema é a polícia…sei , sei…..

    Só queria entender como em um páis, onde o cidadão do bem , não consegue ter uma arma, tem tanta gente com arma se matando….

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