Primeira e última vez que TCU rejeitou contas do governo foi na era Vargas

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Publicado originalmente em 09/07/2015 

Jornal GGN – Reportagem de O Globo publicada na noite desta quinta-feira (8) mostra que a primeira e última vez que um presidente teve contas rejeitadas em parecer do Tribunal de Contas da União foi Getúlio Vargas, às vésperas do Estado Novo. No final da década de 1930, o ministro do TCU Francisco Thompson Flores apontou pagamento de despesas sem aprovação prévia pela Controladoria Central da República, órgão que organizava as contas da Fazenda. A reação de Vargas foi emitir um decreto afastando Flores do cargo. 

Nos últimos anos, Collor, Fernando Henrique Cardoso e Lula tiveram contas aprovadas com ressalvas pelo TCU. Em alguns casos, descumpriram a lei de licitações e a aplicação do mínimo constitucional em áreas como saúde e educação. Dilma Rousseff hoje é alvo do órgão fiscalizador por ter atrasado o pagamento de bancos oficiais para melhorar as contas do exercício fiscal de 2014. O Ministério Público entendeu que isso fere a Lei de Responsabilidade Fiscal. O TCU dá sinais de que irá rejeitar as contas e encaminhar o parecer ao Congresso, onde a possível decisão desfavorável à Dilma pode ou não ser revertida.

Liderada pelo PSDB de Aécio Neves, a oposição torce para que a rejeição das contas chege ao Congresso e seja rejeitadas pelos parlamentares. Dessa forma, o partido poderia ter base para um pedido de impeachment por crime de responsabilidade fiscal. 

Na História do Brasil, só Getúlio Vargas tem as contas rejeitadas pelo TCU

Marlen Couto*

De O Globo

Ministro é afastado do Tribunal no Estado Novo. Presidentes Collor, Fernando Henrique, Lula e Dilma travam embates com órgão responsável por fiscalizar as contas do governo

Já na década de 1930, o debate sobre irregularidades nas contas do governo brasileiro estava em pauta e ocupava as manchetes dos jornais. Em 27 de abril de 1937, durante o mandato do presidente Getúlio Vargas, o também gaúcho Francisco Thompson Flores, vice-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), constatava o desrespeito às leis orçamentárias cometido pela Contadoria Central da República, responsável na época por organizar as contas federais no Ministério da Fazenda. Em decisão unânime e até hoje única na História do Brasil, as contas do governo Vargas foram rejeitadas pelo órgão fiscalizador.

Segundo reportagem do GLOBO, um “longo e minucioso relatório” sobre a gestão financeira do ano de 1936 apontava o pagamento de despesas sem aprovação prévia. “Tem se tornado um uso, e actualmente um abuso, os pagamentos por conta do crédito do Thesouro, no Banco do Brasil, pela expedição de um simples cheque do Ministério da Fazenda”, dizia o documento. A atuação independente do ministro ocorreu às vésperas da implantação da ditadura do Estado Novo (1937-45), iniciado com a quarta Constituição brasileira, apelidada de “Polaca” e outorgada em novembro daquele ano. Vargas só voltaria ao posto em um governo democrático no ano de 1951. Ainda assim, a rejeição das contas e o parecer do ministro do TCU Thompson Flores não passaram despercebidos. Ainda no Estado Novo, em 26 de abril de 1945, um decreto presidencial de Vargas o colocou em disponibilidade, o que significou seu afastamento do cargo público.

Na história recente, a tensão entre o governo e o TCU foi recorrente. No período de redemocratização do país, após o fim da ditadura (1964-85), a pedido do presidente José Sarney, foi lançada a “Operação Transparência”. Era uma ação de fiscalização em autarquias e empresas públicas com o objetivo de assegurar o corte orçamentário previsto no Plano de Controle Macroeconômico. A operação integrava ainda a proposta de desburocratizar o TCU, até então caracterizado pela morosidade e falta de poder.

No início da década de 1990, as contas do governo do presidente Fernando Collor de Mello foram “aprovadas com falhas” em parecer do órgão. Entre as irregularidades, de acordo com apuração do GLOBO, estavam a emissão de papel moeda em limites superiores ao permitido e um valor de recursos do Tesouro Nacional utilizado sem licitação e 93% superior aos gastos efetivamente realizados. Na ocasião, o jornal ressaltava que, em quase seis décadas, o TCU havia rejeitado apenas os números apresentados por Getúlio Vargas.

No primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, as ressalvas também apareceram na avaliação do TCU sobre as contas de 1996. Um relatório destacava a diminuição dos gastos em áreas prioritárias, como saúde, educação, cultura e saneamento, em relação ao ano anterior. No início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, as críticas se voltaram à baixa média de renda dos trabalhadores e à queda nas verbas para a saúde. As contas foram aprovadas com 22 ressalvas e dez recomendações.

Em abril de 2015, a equipe econômica da presidente Dilma Rousseff foi acusada, em parecer do TCU, de adiar repasses de recursos do Tesouro Nacional para bancos públicos, como BNDES e Banco do Brasil, melhorando artificialmente as contas do governo em 2014, ano eleitoral. Batizadas de “pedaladas fiscais”, as manobras descumpriram a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), segundo o Ministério Público (MP) junto ao TCU. No último mês, um relatório do MP pediu a rejeição das contas de Dilma por fraude da LRF e citou a atuação de Thompson Flores na reprovação das contas do governo Getúlio Vargas. “Se, após a implantação do Estado Novo, o corajoso gaúcho Thompson Flores foi vítima de represália com disponibilidade compulsória decretada pelo ditador, na era democrática os magistrados de Contas dispõem de garantias especiais, que constituem as salvaguardas necessárias para exercerem, com plena independência, coerência, isenção e compromisso com a sociedade brasileira”, destacou o documento.

O TCU é um tribunal tipicamente republicano, criado por Rui Barbosa, então ministro da Fazenda, em 7 de novembro de 1890, um ano após a Proclamação da República. O órgão é responsável por examinar as contas federais e tem a missão de verificar sua legalidade antes da análise do Congresso Nacional. Cabe aos deputados e senadores a decisão de aprovar ou rejeitar as contas do governo. Ao todo, compõem o TCU nove ministros, seis indicados pelo Congresso, um pelo presidente da República e dois escolhidos entre auditores e membros do Ministério Público.

* Estagiário sob supervisão do editor Gustavo Villela
 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

23 Comentários

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  1. Com o nascimento e desenrolar

    Com o nascimento e desenrolar da operação Lava Jato sempre me pergunto onde se encontravam os ministros do TCU e todo o seu corpo funional, encarregado de investigar as contas dos entes públicos, como a Petrobrás, que jamais viu qualquer indício de irregularidades nas contas da Estatal. Foi omisso, ou incompetente? 

    Agora, que o mundo conehce as malandragens de diretores da Petrobrás com outros bandidos, o TCU mostra cara feia para a Presidente, como por um oportunismo. Afinal, se as contas do Governo Dilma não estão batendo, ainda não seria o momento para os ministro do TCU darem entevistas à imprensa, acirrando o jogo golpista da oposição e da própria própria imprensa. Como órgão auxiliar do Poder Legislativo, cabe a esse Tribunal analisar as contas do Governo e encaminhá-las para o Congresso, que tem o poder de julgar. 

    Por um lado, uma Primeira Instância no Paraná apresenta uma força de um Supremo, e por outro, o TCU que aparecer como julgador, função que não lhe compete. 

    1. E o que políticos fracassados

      E o que políticos fracassados entendem de administração pública? Se entendessem já teriam descoberto o que a Vaza Jato diz que descobriu.

  2. Parece que há um precedente

    Parece que há um precedente de rejeição de contas pelo TCU

    Mas quem poderia ser? Ora, ora, pois, pois.

    Se não aquele que foi o alvo do pior rancor e perseguição das elites brasileiras até aqui. (Mitterand dizia que a aversão da burguesia francesa por ele estava em que o viam como um desertor, um traidor, dada a sua origem de classe. Com Getúlio ocorreu algo similar, mas o ódio de que foi alvo de seus pares de classe foi muito maior).

     

    Sobre  Vargas, disse Tancredo Neves em 1984, menos de um ano antes de morrer:

    Eu nunca vi, de todos os homens públicos com quem convivi nesses últimos quarenta anos, um que pudesse se aproximar dele, não só em senso político, como nisso que eu poderia chamar a compostura do poder.

    V.L. A dignidade do cargo, não é?

    A dignidade do cargo.

    (…)

    Mas o Getúlio, é preciso conviver com ele! Eu convivi com o Getúlio, convivi com o Osvaldo, convivi com o Juscelino, convivi enfim com todos os grandes do país que se lhe seguiram, mas era uma diferença de Himalaia aqui para a serra da Mantiqueira. (Risos). 63.

    Do livro “Tancredo fala de Getúlio”, de Valentina da Rocha Lima e Plínio de Abreu Ramos Ed. L&PM, 1986, com entrevista feita em 10 de julho de 1984 para o programa de História Oral do CPDOC da FGV, disponível na Biblioteca do Senado

     

    De modo que se também tiver rejeitadas suas contas pelo sobredito Tribunal, Dilma Roussef não poderá estar em melhor companhia.

    1. Reflexão perfeita

      É preciso, neste momento, que resgatemos nossos maiores, e Getúlio é um deles . São inspiração para que entendamos o presente e para que lutemos por um caminho melhor para o país.

      Você tem toda a razão, a eventual rejeição das contas de Dilma sinaliza que ela está do lado certo.

  3. É hora de avançar, ou avançar!

    Nosso querido blog tornou-se quase que exclusivamente polo de notícias ameaçadoras: ameaças à governabilidade, ao governo, à democracia, ao povo. Tais notícias são tratadas com ênfase e lhes é concedida ampla visibilidade. Ora, isto, atualmente, todo mundo faz na imprensa. Parece até que o editor do “O Globo” passou a trabalhar no blog.

    As propostas de solução, ou instigações aos leitores para refletirem sobre elas, tão frequentes antes no blog, onde estão agora? Leitores do blog, ao menos alguns, como é meu caso, querem refletir sobre soluções, e, não apenas, se abater com as ameaças (e que fique bem entendido: não quaisquer soluções, mas as comprometidas – ou viabilizadoras de – com a democracia, com distribuição de renda, com desenvolvimento, com reafirmação da soberania nacional, com nossas tradições culturais). Como responder às ameaças tão enfaticamente noticiadas?, essa é a questão. Ora, para ter, apenas, notícias desalentadoras, não se precisa vir aqui, elas estão por toda parte na “grande” imprensa.

    Gostava mais quando, além de mostrar as ameaças, o blog sugeria, também, e não apenas pontualmente, soluções; e estimulava reflexões de seus leitores sobre soluções para o país. Promovia, entre os leitores, pensamentos construtivos, positivos, orientados para os resultados que transcendem também o espaço político. Punha-as no palco (ou em pauta) em grande quantidade e com frequência. Esta característica distintiva ajudou o blog a se tornar líder.

    Perspectivas de soluções propostas por gente inteligente, bem informada, experiente e, mormente, bem intencionada, pessoas que fazem parte do blog e outras às quais o blog tem acesso, além do benefício de ajudar a resolver o problema específico com o qual a particular solução se vincula, faz com que se saia desse clima baixo astral, negativo, destrutivo para o qual a oposição, com a participação decisiva da mídia, atirou o país (aliás, gostaria de ver o impacto que um jornal, televisivo por exemplo, teria no mercado de informação se considerasse preferencialmente como notícia fatos positivos e construtivos, ao invés dos negativos e destrutivos – o que seria uma ligeira revisão do conceito de notícia).

    Soluções, please. Chega de desânimo e de ecoar tanto desalento e desestímulo.

     

    1. Amigo, assino embaixo.
      Sempre

      Amigo, assino embaixo.

      Sempre tenho a impressçai que nos blogs progressistas se escreve mais a palavra “impeachment” do que até mesmo nas notícias dos PIG. Os blogs estão se deixando contaminar e seguindo a pauta pigal.

  4. É de estarrecer !!!!

    A implacável perseguição segue a todo vapor !  Vergonha, muita vergonha de vivenciar esses tristes acontecimentos!  Há terrorismo em nosso país. Um terrorismo escancarado com a finalidade de atingir um governo democraticamente eleito e legítimo. A que ponto chegam os que querem desconstruir o país e a democracia. Para complementar, José Serra se desdobrando para acabar como Pré Sal dos brasileiros!  Nâo podemos ficar calados!  Quem sabe faz a hora!  Não permitamos as insanidades desses golpistas sejam da política ou do judiciário! Onde estão os homens dígnos de nosso país?   

  5. contas da Dilma

    A Tucanada está doida para fazer o golpe Paraguaio.

    Só se esquece que a Dilma foi eleita por 54 milhões de eleitores que não vão aceitar passivamente este golpe.

    Que tome juizo esta oposição golpista pois podemos facilmente cair numa guerra civil onde não teremos previsão de como sair.

    Este pais poderara se tornar um novo Iraque ou no mínimo uma Colômbia. 

  6. A fila das tentativas de

    A fila das tentativas de catimbar governos trabalhistas é interminável e não acabará nem em 2018, quando o Lula for eleito, claro.

    A fila está andando.

    Sai Cunha, entra o TCU, quando sair o TCU virá o TSE.

    E depois tem muito mais.

     

     

  7. podem ter certeza de uma coisa…

    tocar terror no Brasil atual, como fazem o tcu e a oposição, vale muita grana

    ofertas mil para políticos fracassados, no caso de acontecer o golpe paraguaio

    não se esqueçam, e vocês devem saber melhor do que eu, que aquisição de novas empresas se dá pelo ataque ao lucro das já existentes

    1. bom dia, AA…

      como és um craque no assunto, seria muito bem vindo, e em boa hora, um post sobre a história e/ou o crescimento do conglomerado industrial americano

  8. A Era dos governos petistas

    A Era dos governos petistas passará para a história como o período em que as tradições são interrompidas e as reeleituras dão o tom. Claro que sempre motivadas e direcionadas contra o partido que promoveu algumas significativas no país. 

    Tudo que antes era permitido, passa a ser proibido. Práxis se transformam em “teorias” que por sua vez vão enquadrar petistas e seus próceres. Exemplos:  o velho e surradíssimo Caixa 2, nomeação de militantes ou simpatizantes para cargos de confiança, alianças políticas visando a governabilidade, doações para campanhas, usufruto das mordomias do Poder etc etc. 

     

  9. Estou curioso: Quem, em

    Estou curioso: Quem, em última análise julgará as contas da Presidenta será o mesmo Congresso que aprovou, a toque-de-caixa, as contas de seus dois últimos antecessores, com pedaladas e tudo o mais que lhe foi oferecido. 

  10.  
    Essa informação me deixou

     

    Essa informação me deixou profundamente entristecido. Estou arrazado e vocês não imaginam como

    Quer dizer que não vou poder falar

    NUNCAANTESNAHISTÓRIADESSEPAIZ um presidente teve as contas rejeitadas no TCU.

    Dá licença que eu vou chorar.

     

     

  11. Não aguento mais tanta inanição

    Curto e rasteiro: trocou o ministro da justiça? Não trocou. Então ta.

    E O Globo aponta o afastamento do ministro Flores para suscitar no leitor que o governo Dilma esta tentando o mesmo com o ministro do PSDB Nardez.

  12. O da tesoura.
    Era uma piada,

    O da tesoura.

    Era uma piada, até engraçada.

    Não vai deixar passar uma piada inocente agora?

    Censura nunca mais!

     

     

  13. É isto mesmo o PT é ladrão.

    Partido ladrão este que veio roubar o país depois de anos de homens honestos governando. Lula e seu filho limpador de bosta são bilhonários. Dilma é ladra que vá pra cadeia. 

  14. Mais do que ninguém essa

    Mais do que ninguém essa curriola sabe que não vai ter impeachment. Estão tentando fazer agora o que não conseguiram em 2005. 

  15. O outro que comprou reeleição

    O outro que comprou reeleição anda por ai todo prosa…
    Tiram lá do fundo do baú quando interessam…

    Aqueles que receberam o “bribe” lá da CBF NINGUEM FALA!

  16.  
    “A história se repete, a

     

    “A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa.”
    Ah este Karl Marx!

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