Quem será que anistia os corruptos?, por Mariana Matos de Oliveira

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Quem será que anistia os corruptos?, por Mariana Matos de Oliveira

Numa das muitas tentativas de desacreditar as mudanças introduzidas pela Medida Provisória n.º 703, de 18 de dezembro de 2015, o Procurador da República, Carlos Fernando Lima, um dos coordenadores da operação Lava Jato, concedeu entrevista aos jornalistas Renato Onofre e Thiago Herdy, publicada no jornal O Globo, na qual afirmou “(…) Sempre soubemos que, a longo prazo, as elites vão se compor de maneira a reduzir prejuízos que tiveram nessas operações. É o caso das legislações que vêm a posteriori. A MP 703 e a lei da repatriação são exemplo disso. A repatriação vem sendo falada desde o caso Banestado. É uma medida para socorrer elites (…) A urgência da MP da leniência só existe para evitar a aplicação de inidoneidade contra empreiteiras. Elas têm muito a falar sobre o próprio governo. Portanto, tem dedo do governo, tanto na repatriação, quanto nessa MP. (…)”[1]

A crítica, na forma como apresentada, somente serve ao propósito de impedir que a sociedade conheça as verdadeiras causas e situações de anistia das penas a serem aplicadas ao corruptos e as empresas que eles integram ou representam. 

Nenhuma das alterações introduzidas pela Medida Provisória 703 possui o condão de estimular a prática de atos de corrupção e/ou de deixar de punir severamente as condutas corruptas.

Com efeito, a nova disciplina do acordo de leniência é inflexível na exigência de reparação integral dos danos causados ao patrimônio público por todas as empresas envolvidas na prática de atos de corrupção, sejam elas nacionais ou estrangeiras. (Em contraponto, a exigência de reparação parcial e/ou integral dos danos causados não é obrigatória na celebração dos acordos de delação premiada e nem tampouco alcança empresas estrangeiras). 

Se a reparação integral do dano continua sendo condição essencial para a celebração do acordo de leniência, é forçoso concluir que somente essa circunstância já seria capaz de afastar a afirmação de que a nova disciplina da Medida Provisória 703 tenha introduzido qualquer anistia ou estímulo a prática de atos de corrupção, principalmente quando obrigatória a comunicação formal dos Tribunais de Contas para que possam revisar, se entenderem cabível, o montante financeiro do ressarcimento dos prejuízos. (Na delação premiada, além da ausência de obrigatoriedade de cláusula de reparação integral dos danos, inexiste a imposição de que os Tribunais de Contas sejam imediatamente comunicados sobre os acordos firmados)

Do mesmo modo, a nova disciplina da Medida Provisória 703 continua a exigir que as pessoas jurídicas assumam a responsabilidade objetiva pelos atos de corrupção praticados e apresentem os documentos e/ou informações que dispuserem sobre os fatos investigados, de modo a permitir a identificação de todos os envolvidos e das respectivas condutas, viabilizando a responsabilização penal das pessoas físicas sem as benesses de redução de pena. (Os acordos de delação premiada têm possibilitado reduções significativas da responsabilidade penal dos delatores)

Na mesma toada, as pessoas jurídicas assumem o compromisso de implantar políticas de compliance e programas de integridade corporativa aptos a prevenirem a prática de atos corruptos futuros, numa clara demonstração de que o acordo de leniência continua a ser o único instrumento de combate à corrupção na sua forma mais plena. (Os acordos de delação premiada não estabelecem quaisquer mecanismos de prevenção de novos atos de corrupção, fixando, apenas, um período de “quarentena” em que a reincidência é inadmitida).

O mesmo ocorre com a possibilidade de suspensão das penas de restrição ao direito de licitar e de contratar com a administração pública. Tal medida jamais pode ser confundida com uma anistia concedida a empresas corruptas, mas sim como providência necessária a garantir o bem maior decorrente da continuidade da atividade empresarial, da manutenção dos empregos e da estabilidade econômica, principalmente quando a sua adoção somente se torna possível com a participação do Ministério Público e/ou das Advocacias Públicas na elaboração dos termos do acordo de leniência.

Em contrapartida, os cuidados exigidos para celebração dos acordos de leniência deixam de ser observados nos acordos de delação premiada da operação Lava Jato, nos quais os Procuradores da República, além de ofertarem amplas anistias no campo da responsabilidade penal, ainda conferem perdão e/ou redução significativa do dever de reparação dos danos decorrentes dos atos de corrupção.

Muito embora os diplomas legais que disciplinam a delação premiada não estabeleçam a exigência de reparação integral e/ou parcial dos danos causados como condição obrigatória para a celebração desse ajuste, é certo que jamais conferem aos membros do Ministério Público o poder de anistiar a responsabilidade civil da pessoa física delatora e das pessoas jurídicas envolvidas nos fatos delituosos.

Ao alvedrio disso, a Lei n.º 9.469, de 10 de julho de 1997,  em seus artigos 1º, parágrafos quarto e quinto, e 2º, desautoriza os Procuradores da República a firmarem acordos que representem o perdão de quaisquer dívidas e/ou obrigações civis que ultrapassem o limite máximo previamente fixado em normativo interno a cargo da Advocacia Geral da União e/ou do Procurador Geral da República. Se o perdão de obrigações civis extrapolarem tal limite[2], os Procuradores da República somente podem celebrar o acordo com prévia autorização do Advogado Geral da União ou do Procurador Geral da República, existindo casos em que ainda se faz necessário o aval de outras autoridades.

Mas não é isso que se verifica nos inúmeros acordos de delação premiada firmados pelos Procuradores da República com os delatores de fatos vinculados a operação Lava Jato. Muito embora a obrigação de reparação de danos dos delatores e das empresas a ele vinculadas excedam sensivelmente os limites estabelecidos nos normativos internos vigentes, os Procuradores da República não se furtam em anistiar a responsabilidade patrimonial daqueles ou estabelecer a compensação desta com as penalidades de multas pecuniárias estabelecidas nos referenciados ajustes. (A compensação proposta pelos Procuradores da República é juridicamente nula, dada a divergência de natureza jurídica entre a multa – que representa uma penalidade pelo ato infracional praticado – e o dever de reparação – que corresponde a obrigação de restituir tudo aquilo que foi objeto de apropriação criminosa)

Se os Procuradores da República perdoam ou reduzem responsabilidade civil dos delatores e das pessoas jurídicas a eles vinculadas, sem prévia anuência formal das autoridades competentes e sem quaisquer garantias de prevenção da prática de atos corruptos futuros (não podem exigir a implantação de políticas de compliance e de programas de integridade corporativa), não é difícil concluir onde se mostra presente a verdadeira anistia conferida aos corruptos.

Não restam dúvidas, portanto, que os argumentos de irresignação lançados pelo Procurador da República seriam mais apropriados caso dirigidos aos acordos de delação premiada firmados na operação Lava Jato, que, tal como demonstrado, atendem apenas aos interesses do delator e das empresas a ele vinculadas e não possibilitam a efetiva prevenção de novos atos corruptos pela impossibilidade de exigirem que as empresas implantem programas de compliance e de integridade corporativa, únicos meios efetivos de combate à corrupção.

[2] Ordem de Serviço n.º 13, de 9 de outubro de 2009, da Procuradoria Geral da União.

Mariana Matos de Oliveira é sócia da Oliveira e Leite Advogados; Procuradora do Estado da Bahia; Diretora do Centro de Estudos de Sociedades de Advogados – CESA e Diretora do Instituto Latino Americano de Estudos Jurídicos – ILAEJ

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

7 Comentários

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  1. o artigo, parece-me, não só

    o artigo, parece-me, não só defende com argumentos os

    acordos de leniencia,como rebate com autoridade a famigerada

    entrevista do procuorador da fuantanamo curitibana,dada  ao gloo semana passada.

    os leigos como eu percebem intuitivamente os equivocos da

    suspeita delação premiada, onde os caras como youssef  praicam crimes

    na operação banestado e depois nessa da lava-jato e sempre

    são anistiados, prontos para outra oportunidade de infringir a lei…

    o doleiro virou profissional do crime e da delação…

    a operação lava-jato tende a isso mesmo: criar corruptos especialistas em delação premiada…

    levam trinta anos de pena e, delatando, cumprem ujm ano, o que praticamemnte é nada…

  2.  OLha só o passado do
     OLha só o passado do moço:  ISTOÉ[(Edição de setembro de 2002)]  Propinoduto|   N° Edição:  1771 |  10.Set.03 – 10:00 |  Atualizado em 23.Jan.16 – 09:33  CPI do Banestado investiga conduta de procurador que apura lavagem Amaury Ribeiro Jr.  e Sônia Filgueiras – Curitiba A primeira vítima da CPI do Banestado no Congresso não é caça, e sim caçador. Encarregada de investigar a evasão de US$ 30 bilhões por intermédio do banco estadual paranaense, a CPI recebeu na última semana documentos aos quais ISTOÉ teve acesso comprovando que, entre 1995 e 2001, Vera Márcia dos Santos Lima, então mulher do procurador da República do Paraná Carlos Fernando dos Santos Lima, trabalhava no Banestado, como revelou a revista na última edição. Durante boa parte desse período, o marido-procurador já participava da força-tarefa encarregada de investigar o esquema de lavagem no Banestado e outros bancos, bem como o envolvimento de clientes e funcionários em atividades ilegais. Integrantes da CPI do Banestado também decidiram investigar o comportamento de Santos Lima durante seu depoimento à comissão no dia 24 de julho, junto com outros três colegas. Diante das perguntas dos deputados Moroni Torgan (PFL-CE) e Robson Tuma (PFL-SP), se tinha conhecimento da notícia de que alguma autoridade encarregada de investigar o caso teria um parente no Banestado, Santos Lima escondeu o fato de ter sido casado com uma funcionária do banco.Em sua ficha funcional, consta que Vera Márcia trabalhou em dois dos principais locais onde funcionava a lavanderia no Banestado. De acordo com os documentos, entre 1995 e 1997, quando ocorreu a maior parte das remessas irregulares para o Exterior, Vera Márcia, ainda casada com Santos Lima, trabalhava como escriturária no setor de abertura de contas da agência da Ponte da Amizade, em Foz de Iguaçu. A investigação da Polícia Federal sobre a evasão de divisas por intermédio do banco mostra que a maioria das contas de laranjas, usadas para mandar o dinheiro para o Exterior, foi aberta exatamente nessa agência. Em 1997, ao se mudar com o então marido para Curitiba, Vera Márcia caiu em um setor ainda mais estratégico da lavanderia: o Departamento de Operações Internacionais do Banestado, onde eram fechadas transações fraudulentas de câmbio. O funcionamento da área de câmbio foi relatado por ex-gerentes do banco em depoimentos à CPI da Assembléia Legislativa de Curitiba, que também investiga o escândalo. Segundo os ex-gerentes, os funcionários desse setor recebiam comissão para recrutar doleiros e pessoas interessadas em enviar recursos para o Exterior. Ainda de acordo com sua ficha funcional, Vera Márcia trabalhou no local até 2001. Em um e-mail enviado aos colegas na semana passada, Santos Lima disse que se divorciou de Vera em 2002. O próprio procurador também informa ter entrado no caso Banestado em 1997. “Esses fatos mostram que, além de mentiroso, esse procurador não tem mais condições de chefiar a força-tarefa do Banestado. Deve ser afastado imediatamente. Na época em que sua mulher trabalhava nesses dois setores ele devia se dizer impedido para investigar o caso. Isso mostra por que ele mentiu descaradamente para a CPI quando perguntado se tinha algum parente que havia trabalhado no Banestado”, afirma o deputado Eduardo Valverde (PT-RO).Reação – Na quinta-feira 4, Valverde protocolou na CPI requerimento convocando Santos Lima e Vera Márcia para depor na comissão. O deputado petista não é o único irritado com o comportamento do procurador. “Isso, para mim, é muito grave”, reage Moroni Torgan.“Se é assim, ele mentiu. Por quê?”, diz o deputado Robson Tuma (PFL-SP), que estuda o afastamento do procurador do caso, seu indiciamento pela CPI, sua reconvocação, junto com a ex-mulher, e a quebra dos sigilos fiscal e bancário dos dois. O senador Magno Malta (PL-ES) apóia: “É preciso que o dr. Fonteles (Cláudio Fonteles, atual procurador-geral da República) troque esse procurador.”Senadores e deputados também ficaram indignados com uma outra informação publicada por ISTOÉ e confirmada pelo presidente da CPI, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), quando relatou os resultados da viagem de integrantes da comissão, da PF e do MP a Nova York para buscar novos documentos sobre o caso: durante a reunião com os promotores americanos, Santos Lima chegou a colocar em risco o acesso da CPI a mais de 300 caixas de papéis sobre a movimentação de dezenas de contas milionárias que receberam dinheiro sujo do esquema Banestado. O procurador afirmou que o MP brasileiro não era obrigado a considerar provas ou conclusões de comissões parlamentares de inquérito.A história de Santos Lima mostra que o “instituto de suspeição”, instrumento em que uma autoridade se diz impedida de investigar um caso, não é mesmo o seu forte. No ano de 2000, estourou no Paraná o escândalo da venda irregular de ações do Sercomtel (empresa de telefonia pública de Londrina) para a companhia Paranaense de Energia. A transação envolveu a Banestado CTVM, corretora ligada ao banco estadual, e o Banco FonteCindam. A operação foi considerada fraudulenta pelo Tribunal de Contas do Estado. O TCE condenou ainda a contratação por cerca de R$ 2 milhões, sem licitação, do advogado Cleverson Merlin Cleve, encarregado de dar respaldo legal à transação. Advogado do ex-prefeito de Londrina, Paulo Belinati, cassado por corrupção, Cleverson é casado com a procuradora-chefe do MP Federal do Paraná, Marcela Peixoto, amiga de Santos Lima desde 1990, quando trabalhavam em Foz de Iguaçu. Esse laço de amizade, no entanto, não impediu que o procurador avocasse para si, por meio de portaria assinada no dia 16 de junho de 2000, o procedimento interno que apurava as irregularidades na compra de ações, em tramitação no MP de Londrina.História ainda mais intrigante consta do ofício interno nº 037/97, a cuja cópia ISTOÉ teve acesso, enviado no dia 15 de dezembro de 1997 a Santos Lima por seu colega de trabalho, Jaime Arnoldo Walter. No comunicado, Walter, que havia trocado de gabinete com Santos Lima, pede explicações sobre vários processos que teriam sumido de um armário. “Não fosse tal atitude por si inusitada, pude constatar também que os processos a que me referi de início foram sumariamente transferidos para local ignorado, sem qualquer critério de transporte ou armazenagem, fato que causará inevitavelmente prejuízo no exercício de minhas atribuições”, diz Arnoldo Walter a Santos Lima no documento. Curiosamente, um dos processos citados no ofício apura a participação de funcionários do Banestado numa quadrilha que falsificava guias de recolhimento de impostos. O processo foi encaminhado pela PF à Justiça, sem o acompanhamento do MP, em maio deste ano.Na defesa – A reação à reportagem de ISTOÉ, que movimentou a correspondência interna dos procuradores federais, foi liderada pelo representante máximo do órgão, o procurador-geral da República, Cláudio Fonteles. Em entrevista coletiva na segunda-feira 1º, Fonteles repetiu as explicações que recebeu de Santos Lima em um relatório. Reforçou que o procurador agiu de forma “perfeita” para resguardar a validade das provas e tentou minimizar o fato de que sua ex-mulher trabalhava no Banestado na época em que investigava o caso. Para Fonteles, esse fato não tem importância, já que Vera ocupava um simples cargo de escriturária. Ao defender o procurador, Fonteles argumentou que as denúncias do MP contra várias pessoas acusadas de lavagem de dinheiro, protocoladas em agosto desse ano, são a prova de que o procurador está atuando com rigor no caso. Santos Lima, no entanto, só começou a agir em março, depois de ISTOÉ denunciar o abandono das investigações e quando já havia sido a instaurada a CPI na Assembléia Legislativa. Na última semana, Santos Lima, que responde, com mais outros quatro procuradores, a processo por uso ilegal do dinheiro das diárias, anunciou que entrará na Justiça contra a ISTOÉ por se julgar prejudicado pelas reportagens sobre o Banestado. 

  3. A lei da leniência é

    A lei da leniência é necessária para que as empresas se mantenam de pé e paguem as multas, o que não será possível de falirem, é assim em qualquer parte do mundo. Se bem que a Lava Jato é um processo politico sob controle da midia e seus alidados, o que querem mesmo é esvaziar o tesouro para solapar as políticas de inclusão social

    A anistia está sendo concedida pelo MPF, mídia, PF, Moro….não passa nada nas mãos de Janot que possa comprometer um tucano, Moro então é outra celebridade com poder de anistiar…

  4. As idéias e os fatos.

    As idéias e os fatos não se correspondem.

    O fato: Dr. Moro abateu as penas dos delatores em 93% com a atuação conjunta dos Procuradores. A idéia: o Procurador é contra acordos de leniência com anistia ou abatimento de penalidades para empresas.

    Faça o que digo, mas não faça o que faço.

    Lembre-mo-nos que o Dr. Moro condenara e abatera a pena do Sr. Youssef na ocasião anterior, em que o doleiro empresário firmou acordo de delação premiada no caso Banestado – coisa de R$ 30 bi . O Sr. Youssef delatou outros doleiros e se tornou sgors um delinquente de porte nacional, depis que reduziu a concorrência com as delações de outros doleiros no caso Banestado. Diz uma reportagem que denúncias de irregularidades no Banestedo dormitavam na gaveta do insigne Procurador falante desde 1998, e só depois de uma reportagem da Isto È a coisa andou (https://jornalggn.com.br/noticia/banestado-procurador-tentou-barrar-repasse-de-dossie-de-correntistas)

    Hoje temos Procuradores na berlinda. Um Capez – Deputado Estadual, Presidente da ALESP – delatado por suposto envolvimento com irregularidades em licitações de merenda escolar, outro Senise investigado por supostamente auxiliar indevidamente uma rede varejista. Quem nos proteje deles?

    Não existem Batmans nem Liga da Justiça, nem Hulks e Vingadores.

     

  5. Só podia ser escrito por advogada mesmo.

    Se os Procuradores da República perdoam ou reduzem responsabilidade civil dos delatores e das pessoas jurídicas a eles vinculadas, sem prévia anuência formal das autoridades competentes e sem quaisquer garantias de prevenção da prática de atos corruptos futuros (não podem exigir a implantação de políticas de compliance e de programas de integridade corporativa), não é difícil concluir onde se mostra presente a verdadeira anistia conferida aos corruptos.

    Minha filha, nenhum procurador jamais reduziu responsabilidade civil de empresa não senhora sem autorização de autoridade competente e muito menos sem garantia de prevenção de crimes futuros. Pra início de conversa, quem valida os acordos de colaboração com a Justiça é justamente a autoridade competente, o juiz. O procurador pode propor o que quiser ao acusado, mas só o que o juiz validar será aceito. No caso da Lava Jato, TODOS acordos de delação premiada e tiveram de ser validados não apenas em 1ª instância, mas até no STF, pois nenhum réu citado nesses acordos aceitou a decisão do juiz Moro. Então não foi por falta de autoridade competente que as penas foram reduzidas, a não ser é claro que a “dotôra” argumente que STF não é autoridade competente para isso (mas daí pode aproveitar e ir reclamar com o Papa).

    Em segundo lugar, a ideia de “quarentena” nos acordos de delação é uma afronta não só à verdade, mas ao bom senso. A advogada argumenta que depois de passar um período quieto o delator pode voltar a delinquir com anuência do Judiciário. Com o devido respeito, só se for na terra onde ela já trabalhou como procuradora, pois no Brasil inteiro é diferente. Youssef foi pego delinquindo quase 10 anos depois de ter assinado seu primeiro acordo de delação, e o juiz Moro cancelou aquele acordo no ato, fazendo ele pegar uma no mínimo 10 anos de cadeia em regime fechado. Não espanta que ele tenha corrido a tentar fechar um novo acordo com a Justiça para evitar o pior. Pobre doleiro, se tivesse sido pego na comarca da dona aí de cima, poderia assinar um acordo com “quarentena” e hoje estaria livre, leve, solto e com muito dinheiro no bolso (claro, se tivesse a sorte de pegar um juiz tão ignorante sobre a lei quanto a própria).

    Em terceiro lugar, “dotôra”, a senhora está atirando no alvo errado. O procurador apenas manifestou sua opinião pessoal, mas não é o MPF que está ameaçando detonar a “MP da Leniência” e sim o TCU que entrou em pé de guerra com o Executivo pela perda de poder que a nova lei lhe acarretará. O MPF não tem preocupação em responsabilizar empresas, mas sim as pessoas físicas delinquentes que atuam nelas. Então não precisa mentir sobre os acordos celebrados na Justiça Federal para defender seu interesse pessoal (legítimo, reconheça-se) enquanto advogada de grandes empresas envolvidas em falcatruas. Apenas faça como ele fez: dê sua opinião, explique porque a MP 703 pode ser boa para o país, e que vença o melhor no debate.

    Aliás, sobre essa lei, você não falou nada. E sobre a delação premiada, você só falou abobrinha. É vergonhoso que uma ex-procuradora e sócia de escritório de advocacia especializado na defesa de empresas escreva um artigo mostrando tamanho desconhecimento sobre o próprio trabalho. Nem no Conjur, que é um site criado por Daniel Dantas para patrocinar suas chicanas jurídicas, um artigo desse nível passava. Mas no 247 passa. Ah se passa!

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