Foto: Arquivo
Mineira de família conservadora, a Gilse envereda na política estudantil em colégio católico de freiras, quando entra na Juventude Estudantil Católica, a JEC, e participa de grêmio estudantil. Tinha 16 anos. Estava em curso a campanha pelas “reformas de base” do governo João Goulart. Logo que entrou na PUC em 1964, veio o golpe militar.
Gilse, de imediato, sentiu a necessidade de resistir ao golpe. Torna-se uma líder estudantil e entra em Ação Popular, a AP. Foi eleita presidente de Diretório em escola da PUC-MG e em 1966 foi vice-presidente do Diretório Central dos Estudantes.
Por essa época já travava abertamente a luta contra a ditadura, pois que a AP se empenhou nessa luta desde o primeiro dia da instalação da ditadura.
O movimento estudantil brasileiro nunca se deixou levar pela cantilena da ditadura que o tentou cooptar. Quando os militares quiseram criar o Diretório Nacional dos Estudantes, o movimento estudantil disse não, ficou com a UNE, perseguida, posta na ilegalidade, mas em luta.
Nisso foi grande o papel que teve a AP. Talvez possa se dizer que o movimento estudantil brasileiro tomou posições anti-ditatorias desde 1964 por causa da influência que aí tinha a AP, bem mais que qualquer outra organização na época.
Respondendo com radicalização a radicalização da ditadura, a AP orientou suas lideranças perseguidas a entrarem na clandestinidade e irem trabalhar com operários ou camponeses, organizando a resistência.
E nessa direção Gilse e seu companheiro Abel Rodrigues, recém-casados, terminaram numa zona camponesa de Minas, perto de Coronel Fabriciano. Gilse assumiu o nome de guerra de Ceci, Abel o de Túlio.
Fui visitá-los nessa situação, “integrados junto as massas camponesas”, como dizíamos na época. Eu dirigia a Comissão Nacional Camponesa. Fiquei na casa deles, onde viviam como camponeses. Ceci estava grávida. Era bem quista pelo povo local, tinha liderança junto às mulheres. Lembro-me de que se queixava muito do machismo existente no meio camponês, que era grande. Os dois ficavam animados com as notícias da luta geral que eu transmitia de que a organização da resistência crescia.
Em 1969 Gilse foi presa. Segue-se a rotina dantesca de massacre, torturas atrozes, físicas e psicológicas.
Foi a época em que outras quatro companheiras, com a Gilse, iam sendo trucidadas nas masmorras da ditadura, mas resistiram. O jornalista comunista Luiz Manfredini conta a história desse capítulo honroso no livro “As moças de Minas”, que eram cinco, Loreta, Sissi, Gilse, Ludelina e Rosário. Uma página que enaltece as mulheres e o povo brasileiro. A tortura era brutal, o objetivo era o torturado delatar. O prêmio, deixar de sofrer tortura. O resultado: nada de delação.
Quando é solta, a Gilse reencontra seu companheiro e filha e integra-se em outra batalha em curso, a da incorporação de Ação Popular Marxista Leninista no antigo e renovado Partido Comunista do Brasil.
Logo após a incorporação de APML no PC do B, o Partido cria sua Comissão Nacional de Organização com Pedro Pomar, Sérgio Miranda e eu. Pomar, velho dirigente desde 1935, Miranda, bem mais jovem, mas já era do Partido, e eu que estava chegando de AP. Eu era quem conhecia a turma de AP que chegava, eu era quem dava as informações.
Discutíamos como reforçar o trabalho em locais fragilizados, um deles, o Ceará. Em uma de nossas reuniões clandestinas dei a notícia: da turma chegada de AP tinha uma dupla do melhor nível, Gilse e Abel. Providências foram tomadas e lá se foi a “dupla do melhor nível” para o Ceará, ajudar na reorganização do Partido. Gilse assumiria a tarefa da direção principal.
Depois, veio a anistia e Gilse, com sotaque mineiro vira nordestina de coração cearense, e empenha-se, como sempre, nas novas batalhas que se colocam.
Traiçoeiro, um câncer lhe pegou e ela fez o que sabia, lutou contra ele. Anos a fio.
Foi-se Gilse. Fica sua memória, de mulher vibrante, alegre, inteligente, simples, mãe de duas filhas que lhes honram, mineira e cearense, brasileira de coração, comunista pela vida.
Haroldo Lima é membro da Comissão Política Nacional do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil.
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São relatos como esse que nos
São relatos como esse que nos mantém firmes na luta, ainda confiando no Ser Humano. Viva Gilse/Ceci !!
O sofrimento pode ser uma das
O sofrimento pode ser uma das explicações para somatização de doenças e morte.
Mas pelo menos, aqueles e aquelas que prejudicam a vida alheia, DA MORTE NÃO ESCAPAM, E SABE-SE LÁ O QUE LHES AGUARDA. Pelo menos para TORTURADORES, A MORTE JÁ É UM MERECIDO CASTIGO !!!
Eram tão jovens essas moças
Eram tão jovens essas moças que a gente fica pensando de onde tiravam tanta coragem pra lutar contra um regime bruto como aquele. Mesmo depois de ter sido presa e possivelmente torturada, a danada voltou à frente de batalha por seus ideais.
Não por acaso os generais diziam sobre o Brasil para amá-lo ou deixá-lo. Queriam se perpetuar no poder, e não o fizeram porque, pra glória da Nação, os ditadores se viram em maus bocados algumas vezes por causa desses brasileiros porretas.
Chico Buarque costuma dizer que os generais o incomodaram muito, mas que ele também soube incomodar os generais.
Pelo visto, gilse deveria ter uns quase 70 anos quando foi pega pela doença.
Que Deus a receba na Sua Santa Paz.
Cunhada do Henfil?
O sobrenome Cosenza cutucou a memória, fui pesquisar direto na vida do Henfil, estava certo, foi casado com Gilda Cosenza, tiveram o filho Ivan. Pelo jeito, Gilse/Gilda são irmãs, nesse caso cabia uma citação pelo autor.
Gilse fez grandes coisas pelo olvido, não pela glória
Elogio do Trabalho Clandestino
(Bertolt Brecht)
É bonito
Usar da palavra na luta de classes
Clamar em alto e bom som pela luta das massas
Pisar os opressores, libertar os oprimidos.
Árdua e útil é a pequena tarefa de cada dia
Que, secreta e tenaz, tece
A rede do partido sob
Os fuzis apontados dos capitalistas:
Falar mas
Escondendo o orador.
Vencer mas
Escondendo o vencedor.
Morrer mas
Dissimulando a morte.
Pela glória, quem não faria grandes coisas? Mas quem
As faz pelo olvido?
No entanto, o pobre que mal come senta a honra à sua mesa;
Das pequenas cabanas em ruinas
Surge a grandeza irressistível.
E a glória busca em vão
Os autores do grande feito.
Sai da sombra
Por um momento
Rostos anónimos, dissimulados, e aceitai
O nosso agradecimento
Obrigada equipe GGN! Gilse
Obrigada equipe GGN! Gilse Consenza foi exemplo de resistência das mulheres na ditadura militar, Kerison lopes a definiu como a expressão de um aço em forma de flor. Em sua memória, e em respeito à sua familia e amigos, precisamos falar sobre ela, sobre a ditadura e seus crimes. Ditadura nunca mais.
https://www.youtube.com/watch?v=ka5YG_E4qQ8
https://www.youtube.com/watch?v=KFLpOoYl00I
https://www.youtube.com/watch?v=ITttWvK0NQY
Em respeito a essa e tant@s
Em respeito a essa e tant@s lutadores que não desistimos!