Repensar o princípio de Robin Wood, por Angus Deaton

Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.
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Cidadania implica em questões que não são partilhadas além de fronteiras, diz economista

Jornal GGN – A ajuda internacional ao desenvolvimento tem como base o princípio de Robin Wood, que é tirar dos ricos para dar aos pobres. A partir de tal ponto, as agências nacionais de desenvolvimento, as organizações multilaterais e as ONGs efetuam a transferência anual de mais de US$ 135 bilhões dos países ricos aos países pobres.

Em artigo publicado no site Project Syndicate, Angus Deaton, vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 2015, explica que o “prioritariarismo cosmopolita” é uma regra ética global onde todas as pessoas devem ser consideradas da mesma forma no mundo, independentemente do local onde estejam, e a partir daí concentrar a ajuda onde os efeitos serão mais favoráveis. “As pessoas que tem menos tem prioridade em relação às que tem mais. Este princípio norteia implícita ou explicitamente a ajuda ao desenvolvimento econômico, à saúde e a situações de emergência humanitária”.

O prioritarianismo cosmopolita pode fazer sentido em um primeiro momento mas, segundo o articulista, questões factuais e éticas levantam problemas no que se refere à ajuda humanitária. “É inegável a realização de progressos substanciais na redução da pobreza global, mais graças ao crescimento e à globalização do que à ajuda externa. O número de pobres que vivem abaixo do limiar de pobreza sofreu uma redução nos últimos 40 anos, passando de mais de 2 bilhões para pouco menos de 1 bilhão – um resultado notável, tendo em conta o aumento da população mundial e a desaceleração a longo prazo do crescimento da economia global, especialmente desde 2008”.

Entretanto, o articulista afirma que a redução da pobreza também teve seus custos. “A globalização, que beneficiou grandemente uma parte importante da população dos países pobres, prejudicou algumas pessoas nos países ricos, já que fábricas e empregos migraram para onde a mão-de-obra é mais barata. Este fato pode parecer aceitável do ponto de vista ético, porque os que perdiam já eram mais ricos (e saudáveis) do que os que ficavam”.

Segundo Deaton, a questão o incomoda “desde longa data”, uma vez que quem faz tais juízos não se encontra em uma posição particularmente privilegiada para avaliar os custos (como acadêmicos e a indústria de desenvolvimento), mas que a globalização acaba sendo menos deslumbrante para quem sente seus efeitos. “Há muito que sabemos que os norte-americanos menos instruídos e com rendimentos mais baixos, por exemplo, registraram lucros econômicos reduzidos durante quatro décadas, e que o segmento inferior do mercado de trabalho dos EUA pode apresentar um ambiente cruel. Porém, até que ponto tais americanos sofrem as consequências nefastas da globalização?”

Além disso, Deaton afirma que a tão apregoada igualdade de oportunidades dos Estados Unidos encontra-se em perigo. “As vilas e cidades que perderam as suas fábricas devido à globalização também perderam as respectivas receitas fiscais, e têm dificuldade em manter a qualidade do ensino nas escolas — a rota de fuga para a próxima geração. As escolas de elite, por sua vez, recrutam entre os mais ricos para pagar as suas contas, enquanto cortejam as minorias para compensar séculos de discriminação, o que fomenta ressentimentos entre a classe trabalhadora branca, cujos filhos não encontram lugar neste admirável mundo novo”.

O articulista ressalta ainda que a cidadania implica em diversos direitos e responsabilidades que não são partilhadas com quem está além de nossas fronteiras. Porém, a parte “cosmopolita” da diretriz ética não tem em conta as obrigações da nossa parte para com os nossos concidadãos.

“Quando os cidadãos acreditam que as elites se preocupam mais com as pessoas que se encontram do outro lado do oceano do que com as que se encontram do outro lado da linha do comboio, o seguro cai por terra, ficamos divididos em facções, e os que são deixados para trás ficam indignados e desiludidos com uma política que já não lhes é favorável”, diz Deaton. “Podemos não concordar com as soluções que procuram, mas ignoramos as verdadeiras reivindicações, o que é um risco para eles e para nós”.

Tatiane Correia

Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.

2 Comentários

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  1. Não funciona assim

    Robin Wood não funciona. Isto porque quem tem a chave do cofre são os ricos e eles são aprimoradíssimos em proteger seu dinheiro. Não se “rouba” de ninguém mais, menos ainda de ricos.

    As políticas assistencialistas de Lula, embora funcionem com perfeição, desde que ninguém as boicote, também estarão fadadas ao fracasso, pois serão boicotadas ao extremo pelas elites.

    Isto é xadrez. Precisa virar o jogo de uma forma que as elites precisem dos pobres. Uma das equações possíveis seria diminuir a taxa de natalidade dos pobres voluntariamente até que pela diminuição da população proletária o preço da mão de obra proletária subisse. Pela lei de oferta e procura funcionaria. e seria uma forma pacífista de luta, pela renuncia à procriação, algo ao estilo Mahatma Ghandi.

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