Richelieu e a centralização do poder, por Motta Araújo

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Por Motta Araújo

RICHELIEU E A CENTRALIZAÇÃO DO PODER – O Cardeal e Duque de Richelieu é o grande mestre do poder na História Moderna. Sua longa trajetória, que começa como representante da Igreja nos Estados Gerais, passa por agregação à corte da Rainha Mãe do Rei Luis XIII, Maria de Médicis como braço direito do favorito da Rainha, Concini, até que o Rei, já livre da regência da mãe – a mãe regente desde a morte do pai, Henrique IV,  primeiro Bourbon a reinar,  até a maioridade de Luis XIII – manda prendê-la no castelo de Blois, no Vale do Loire, em 1617, com o que Richelieu cai em desgraça até, pacientemente, reconstruir sua posição na corte de Luis XIII.

Em 1919 Maria de Médicis foge do castelo de Blois e lidera conspiração de nobres contra o filho. Coube a Richelieu ser o intermediário do armistício entre filho e mãe. Como recompensa Luis XIII o indica como Cardeal e o Papa Gregório VI o nomeia em agosto de 1622. Richelieu já Cardeal e com o cargo de Secretário de Estado ainda não é ministro, aonde chega em 1624, mas tem que subordinar-se ao Primeiro Ministro,  Cardeal de La Rochefoucauld até1629, quando passa a ser o Primeiro Ministro depois de infinitas manobras e intrigas.

Richelieu tem como sua grande marca a centralização do poder do Rei contra a nobreza, criando o primeiro verdadeiro Estado Nacional no continente europeu. O poder até então era fragmentado, o Rei mandava pouco, depois de Richelieu cria-se o absolutismo, onde o Monarca tem poder absoluto sobre os nobres. Richelieu manda inclusive desarmar os castelos para evitar que possam resistir ao exército real, elimina os corpos armados da nobreza e cria o monopólio militar do Rei.

A ordens do Rei eram então obedecidas sem hesitação por toda a França, acabaram as constantes rebeliões dos nobres, muitas vezes aliados a potências estrangeiras, como foi o caso dos hugenotes em La Rochelle, apoiados pelos ingleses.

Com o poder real consolidado o Cardeal pode se dedicar à politica externa, ao enfrentamento com a Áustria e Espanha, o chamado Império, não tem qualquer problema em fazer acordos com os protestantes quando convém.

Morre em 1942, deixando a maior fortuna da França, maior que a do próprio Rei e a sucessão de seu cargo encaminhada na pessoa do Cardeal Mazarin, de nascença o italiano Giulio Mazarino, seu amigo e parceiro.

A lição a extrair de Richelieu, no século Armand Jean du Plessis, é a necessidade que os grandes Estados tem em ter um poder central forte para evitar a FRAGMENTAÇÃO do Estado, fenômeno que estamos assistindo em plena ebulição hoje no Brasil, processo que torna o Estado nacional INGOVERNÁVEL.  Hoje surgem pelo Brasil tentativas de captura de poder à custa da diminuição do poder central do Chefe de Estado, que vai perdendo dia a dia sua capacidade de ver suas ordens cumpridas sem que aparentemente  a população se dê conta desse processo.

Hoje uma decisão de um juiz de 1ª instância tem maior impacto que uma decisão da Presidente da Repùblica.

O Presidente da Câmara por sua vez torna-se personagem politico central, temido e respeitado acima do Planalto.

Precisamos lembrar sempre que o Brasil é o maior país da América Latina porque tivemos um processo histórico onde o poder central tinha completa autoridade sobre o território, ao contrário da América Espanhola. Essa centralidade faz parte do caráter do Estado brasileiro, se perdermos isso o Brasil pode esfacelar-se tardiamente.

A partir da Constituição de 1988 como reação “in extremis” ao centralizado regime militar deu-se maior valor à criação de “ilhas de poder”, de “poder às minorias”, de “poder a  direitos sociais”, tudo à custa do poder do ESTADO NACIONAL, que foi a base da manutenção da integralidade do Estado Brasileiro.  Hoje o País não tem um projeto nacional, tem “agendas” de grupos e de corporações, como se fôssemos uma arquipélago de gente e não um País.

Vultos históricos perceberam essa tendência à fragmentação. Floriano Peixoto baseou seu autoritarismo na luta contra o esfacelamento do poder, ameaçou até fechar o Supremo Tribunal Federal.  Vargas foi por excelência o grande centralizador do Estado Nacional, é a base de sua ideologia desde 1930 até 1954, tudo o que Vargas fez mostra uma continuidade na preservação da integralidade do Estado Nacional. O regime militar de 1964 tinha total controle do aparelho estatal a partir de um núcleo duro central sem concessões a poderes paralelos.

Os constituintes de 1988 e seus seguidores até hoje parecem dar maior valor à fragmentação do poder em “polos” do que à centralidade do poder no interesse do ESTADO NACIONAL. Hoje o Estado está fraturado, a politica justicializada, o Ministério Publico quer legislar, o Congresso sitiado por inquéritos, o ordenamento jurídico inteiramente subvertido, já não se sabe mais quais são as garantias individuais, a Constituição pode valer ou não, depende das forças que tem interesse em cada caso, nunca o Brasil esteve tão estilhaçado em pedaços como agora. O mundo olha estarrecido um grande País se dissolvendo no poder quebrado em pedaços que não se colam.

O resultado ai está , um País ingovernável, processo cuja reversão custará muito tempo no futuro.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

7 Comentários

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  1. Atenção para a cronologia

    O texto viaja no túnel do tempo, do século XVII ao século XX, numa tremenda obra de ficção científica.

    Cuidado com a revisão.

  2. Atenção para a cronologia

    O texto viaja no túnel do tempo, do século XVII ao século XX, numa tremenda obra de ficção científica.

    Cuidado com a revisão.

  3. FUTURO

    Custará muito tempo no futuro ? Mas isto aqui já é o futuro faz tempo ………. Estamos há 27 anos da promulgacão da Carta Magna , na verdade tentando nos desvencilhar dela. Basta olhar o número de Remendas que ela já sofreu …….

  4. notável texto, só li agora

    Não tenho nem 10% da tua cultura, Motta Araújo,  mas creio que a sanha descentralizadora nos afanou duas vezes: na proclamação da repuública e na constiuinte.

    Quando ingressei no serviço público federal, lembro o quanto me foi martelada a noção de que responsividade – descentralização – foco no resultado eram o sustentáculo da nova administração pública, delineada na constituição cidadã. Não sou tampouco constitucionalista, mas creio que o pior é que é verdade.

    E é lamentável, porque soa ótimo. Parece com aquela fábula humanista, bela e falsa, que contam sobre as raízes do estado norte-americano. 

    Mas especulo um pouco além: a CF 88 reflete um momento em que o Brasil se permitiu sonhar. Ele queria não apenas ser desenvolvido, mas queria ser desenvolvido, justo e humano. Não há capitalismo assim, e quando disso se aproxima é por condições especialíssimas, exógenas e viáveis apenas em nichos, não por estarem declaradas na lei.

    Ou seja, a CF até poderia funcionar, se o Brasil já fosse dotado de uma posição econômica, cultural e social compatível com a realização dessa utopia. Mas ele ainda precisa se desenvolver, precisa antes de tudo ser capaz de mobilizar seu potencial na direação de superar o subdesenvolvimento, para, então buscar o seu modelo de capitalismo próprio. 

    Não segue daí que não devamos fazer políticas sociais distributivistas, certamente devemos. Mas isso é para a sociedade definir nas urnas a cada ciclo político. A regra simples um homem, um voto, desde que apoiada em uma regulação descente da mídia seria suficiente e mais efetivo. 

    E poderíamos fazer isso no âmbito de um projeto de desenvolvimento real, mais imune a sabotagens de todos os lados. 

     

     

  5. Excelente

    Como sempre, os textos do Sr. Motta Araújo continuam Excelentes. Merece cinco estrelas. O Brasil, enquanto mantiver esta Constituinte cidadã que fragmenta o Poder, continuará um país de crescimento econômico baixo, e patinando em crises.

    Mas aqui uma reflexão: A Constituição cidadã é um cavalo de Tróia. Seria fácil, convocar uma nova constituinte, ao invés de fazer dezenas de Reformas e nunca ficar bom. Como um técnico em computadores responsável, saberia a hora de formatar o HD e começar tudo de novo.

    Só que isto não acontece por que na Constituição de 88 foi anexado direitos adquiridos, direitos trabalhistas e CLT. O povo tem medo que se fizer outra Constituinte possa perder os direitos, e com razão, teme um congresso conservador como existe hoje. O povo tolera o que dificulta o crescimento econômico só por medo de perder direitos.

    Então, muitos erros que poderiam ser corrigidos, como mais poder para o Presidente, incluindo demitir ministério Publico, dificilmente serão mudados.Se fosse nos EUA esta crise da Petrobrás não duraria um dia. Lá o Presidente demitiria imediatamente o Ministério Público e nomearia outro. Por estas e outras os EUA tem o maior PIB do planeta. Nos EUA uma operação como a lava jato pouparia as empresas e empresários, considerados quase que sagrados e puniria apenas os políticos.

    Não é a toa que os tucanos José Serra e Mario covas escreveram a Constituinte. E Ulisses Guimarães. Eles criaram um monstrengo que até hoje nos impede de crescer na economia.

    A solução seria um pacote de Reformas apenas nesta área. Outra solução é não fazer nada, e deixar que a crise se agrave tanto que o desemprego e a recessão levem o povo a pedir uma nova constituinte, o que seria o pior caminho.

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