Santa Corrupção, por Janderson Lacerda

Ana Gabriela Sales
Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.
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Imagem: Reprodução/Internet

Santa Corrupção

por Janderson Lacerda

Madalena levantou-se bem cedo (antes que o galo cantasse) não despediu de seu marido que dormia sem incomodar-se com o, estrondoso, barulho provocado por seu próprio ronco. Apanhou o terço, a bolsa e saiu em jejum, balbuciando uma oração; correu para não perder o ônibus e viajou por quinze quilômetros até chegar ao seu destino final; a igreja católica, localizada, próxima ao terminal metropolitano de São Mateus.

A igreja era pequena, mas muito bem conservada. O pároco mal terminou de abrir as portas, quando Madalena adentrou apressada no santuário.

Sua bênção, padre.

Deus te abençoe! Resmungou o pároco em meio a um longo bocejo.

Madalena sentou-se na primeira fileira e começou a rezar, pedindo a São Jérôme que a agraciasse com um emprego.

A mulher era devota de São Jérôme, por acreditar que os santos franceses teriam maior influência no reino celestial. Nunca explicou o que a motivava a pensar desta forma, apenas dizia isto ao seu marido, e o estimulava a rezar e cultuar o mesmo Santo. Enquanto Madalena fazia sua prece, o padre dormia debruçado sobre a mesa que ficava próxima a entrada principal da igreja.

Madalena era fervorosa e rezava incessantemente, até que viu um raio de luz brotar do teto que protegia o altar. A mulher arregalou os olhos e viu um homem magro de túnica azul e aparência angelical sair do feixe de luz.

— Quem é você? Perguntou Madalena, descrente da visão.

— Ora, tu me invocas há tanto tempo e não me reconheces? Onde está tua fé?

— São Jérôme, é o senhor? Madalena prostrou-se no chão e começou a adorá-lo.

— Levanta-te, mulher! Bradou impaciente o Santo e afastou-se sorrateiramente.

— Perdoe-me, Senhor!

— Tá, tá… Diga-me, Madalena o que desejas?

— Senhor tu sabes que não sou merecedora, mas preciso de um emprego! Expressou-se rapidamente, a fim de não irritar o Santo.

— Emprego? Tu sabes que a crise econômica está terrível! É uma crise dos infernos (perdoe-me Senhor, justificou São Jérôme, olhando para o Cristo crucificado em cima do altar).

— Eu sei meu Senhor! Mas, estou precisando desesperadamente!

— Vou ser sincero, Madalena até posso ajudá-la, mas… Preciso de uma contribuição de, no mínimo, mil reais. Os pedidos no céu são muitos; e sabe como é… Um agradinho pode facilitar as coisas…

— Mas, Senhor isto é errado! Respondeu com certa timidez a mulher!

— Veja bem, Madalena como pode ser pecado se eu sou Santo? Acusar-me-á algum inquisidor por acaso?

— Perdoe-me, novamente, Senhor; eu sou tola mesmo!

— Tudo bem, Madalena. Você pode trazer o pagamento em espécie até amanhã.

— Mas, ainda não recebi o salário, Senhor!

— Tende fé, mulher (vociferou o Santo). Tu não queres a graça?

— Sim Senhor, sim Senhor!

— Então me traga mil reais até amanhã e não conte nada a ninguém.

Madalena agradeceu a São Jérôme e saiu sem, sequer, despedir-se do padre.

No mesmo dia a mulher conseguiu dinheiro emprestado em uma financeira; e na manhã seguinte foi até a igreja, conforme combinado. Pensou em fazer o mesmo ritual do dia anterior, mas para sua surpresa: deparou-se com São Jérôme já na entrada da igreja.

— E o padre? Perguntou Madalena.

— Dormindo… Você trouxe? Quis saber o Santo.

— É claro meu Senhor! A mulher entregou o envelope para São Jérôme que o guardou rapidamente e disse: — Vá em paz minha filha, pois tua graça alcançaste; e desapareceu!

Madalena voltava para casa distraída e feliz, confiante que receberia a boa nova. Até que se descuidou para atravessar a rua e foi atropelada por um carro branco, não identificado, que fugiu sem prestar socorro.

A mulher faleceu antes mesmo que um pedestre qualquer tivesse tempo para chamar o resgate.

Atordoada, Madalena despertou na eternidade, e deparou-se com uma porta fechada. A porta era gigantesca, feita de ouro maciço e jaspes claros como os cristais, capaz de iluminar tudo que estava ao seu redor. A mulher levantou-se com dificuldade e ouviu um brado, quase, retumbante:

— Pode levá-la!

Madalena, então, foi lançada no inferno junto com diversas pessoas, algumas até conhecidas. Nas profundezas do hades, entre um gemido e outro, perguntou ao superintendente da repartição por que estava lá, já que sempre fora uma mulher de fé.

— Corrupção de santos. Respondeu o carrasco enquanto a fustigava.

— Como assim? Quer dizer que estou no inferno por ter dado dinheiro ao Santo?

— Sim. E levou mais duas chibatadas!

— E onde está São Jérôme? Perguntou com indignação a mulher!

— Ora, ora e tu já viu Santo ser condenado? E gargalhou o superintendente, enquanto a esbofeteava…

Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

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