Venda da Liquigás traz risco de desabastecimento e aumento de preços

Venda da Liquigás pode causar risco de desabastecimento e aumento de preços

Por Bruno Boris

A Petrobras atravessa um dos piores momentos de sua história, tendo encerrado o ano de 2015 com um prejuízo estimado em 34,8 bilhões de reais e com grande perda do grau de investimento e de credibilidade no mercado. Estima-se que a dívida total, hoje, esteja na casa de US$ 125 bilhões (cento e vinte e cinco bilhões de dólares) – algo em torno de 500 bilhões de reais.

Diante dessa grave crise financeira e de credibilidade, e com o propósito de retomar seu crescimento, a atual diretoria da Estatal iniciou um processo denominado de “desinvestimento”, que engloba a venda de uma série de ativos da companhia.

Entre esses ativos, está a Liquigás, que atua no engarrafamento, distribuição e comercialização de Gás Liquefeito de Petróleo, também conhecido como GLP. A empresa está presente em 23 estados brasileiros, contando com 23 centros operativos, 19 depósitos, uma base de armazenagem e carregamento rodoferroviário e uma rede de aproximadamente 4.800 revendedores autorizados.

A empresa ostenta ampla cobertura nacional e detém aproximadamente 21,86% da cota de participação no mercado, o que lhe garante a vice-liderança no segmento de GLP e a liderança no mercado exclusivo de gás de cozinha (13Kg). E é justamente por isso que a possível venda da Liquigás pode ser extremamente prejudicial a todos os consumidores do Brasil.

Segundo dados do Sindicato das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo, a Ultragaz detém 23,50% de participação de mercado, seguida pela Liquigás, com 21,86%, a Supergasbrás, com 20,44%, a Nacional Gás, com 19,44%, a Copagaz, com 8,25%, a Fogas, com 1,80%, e outras, com 3,98%.

E embora ainda não existam informações oficiais e concretas, especula-se que apenas as empresas líderes do segmento participariam da operação. Tais empresas possuem consideráveis cotas de participação no mercado de GLP e a aquisição da Liquigás por alguma delas causaria grande concentração no setor e certamente prejudicaria a concorrência e a competitividade, provocando forte aumento dos preços do produto, repercutindo, diretamente, no bolso do cidadão brasileiro. Em determinadas regiões, em razão de características próprias do mercado de GLP, a concentração geraria um monopólio de fato, deixando o mercado de GLP nas mãos de apenas um fornecedor, sem a possibilidade de ingresso de novos concorrentes.

É notório que muitos integrantes da ANP reconhecem que a concentração de mercado no segmento GLP é extremamente prejudicial ao consumidor final e seus revendedores, além da sua real impossibilidade estrutural de fiscalizar com eficácia e eficiência práticas anticoncorrenciais já existentes no mercado de GLP.

Além da forte concentração de mercado, a venda da Liquigás, nos moldes especulados, poderá causar graves danos ao patrimônio público. Especula-se que a operação seria concretizada por aproximadamente R$ 1,5 bilhão ou R$ 2,5 bilhão, algo próximo à metade de seu faturamento anual, que é de cerca de R$ 3,8 bilhões. Um preço manifestamente desproporcional e não condizente com a importância e rentabilidade da Liquigás.

Portanto, embora se espere que o anseio da atual diretoria seja realmente a recuperação financeira da Petrobras, não restam dúvidas de que a venda da Liquigás, na forma como vem sendo noticiada, atenta contra princípios que regem a boa gestão da coisa pública. Isso porque por envolver valores baixíssimos, e, também, gerar prejuízo aos consumidores de todo Brasil, que sofrerão com a inevitável alta dos preços diante da forte concentração do mercado, que, sem dúvidas, beirará o monopólio.

Nesse cenário, espera-se que a operação não seja concretizada, pois, além de se tratar de um importante ativo da Estatal, a Liquigás detém uma função de Estado relevantíssima, sobretudo no balizamento dos preços praticados no mercado de GLP, não podendo, ainda, a Companhia desfazer-se de parte do patrimônio nacional, por preço tão baixo e sem ampla discussão com a sociedade.

No mais, em aspecto mais amplo, há que se questionar e apurar todos os efeitos decorrentes desse plano de desinvestimento, que é feito no pior momento possível, com uma crise econômica em curso, com o valor de mercado da Petrobrás na lona e com seus ativos mais desvalorizados do que nunca. A própria obscuridade da dívida declarada colabora para que os ativos sejam avaliados em valor mais baixo.

A condução até aqui empreendida pode levar a Petrobrás a uma situação econômica insustentável, e junto com ela, centenas de empresas, com o desemprego e mais crise daí decorrentes.

Bruno Boris é professor da Faculdade de Direito e administração da Universidade Presbiteriana Campinas

Redação

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. É evidente que este prejuízo de 2015 é falso
    Vários analistas do balanço da Petrobrás disseram que este prejuízo de 2015 é absolutamente falso. Foi “forjado” com previsões sobrevalorizadas de despesas com pagamento de indenizações. Um texto desses tem que explicar tudo isso detalhadamente para ser mais exato.

  2. Não será por falta de esforço

    Não será por falta de esforço que esse governo fantoche do mercado não levará esse país pro buracom,,,nao diferem nem um pouco daqueles que tomaram de assalto o Iraque, Líbia….ah, o povo…hum,,,desde quando interessa ao mercado se o povo morre ou passe fome: quanto mais miseráveis, mais mão de obra farta e barata e é isso que importa a quem só pensa em acumular faturar mais e mais….

  3. “embora ainda não existam

    “embora ainda não existam informações oficiais e concretas, especula-se que […]”

     

    Toda exposição baseada em especulação? Sério mesmo?

  4. Repete-se a história das

    Repete-se a história das privatizaçõs no (des)governo de FHC: falta de discussões sobre o plano de ”desinvestimento”, seus efeitos, os valores cobrados pelos bens estatais (empresas) e a política ideológica que sustenta essas opções. Caso a operação seja efetuada, veremos novamente casos como o das teles – alguém falou em Oi?

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador