Angola 15++

Campanha da Anistia Internacional pela soltura dos presos políticos angolanos

É proibido falar em Angola” é uma série que aborda a questão dos presos políticos angolanos, conhecidos por Angola 15+.  No dia 20 de junho deste ano, 15 jovens ativistas foram presos em Luanda quando se reuniam para debater as ideias do livro From Dictatorship to Democracy: A Conceptual Framework for Liberation, do autor Gene Sharp. Na sequência dessas prisões, foram presos outros ativistas fora de Luanda em condições e acusações semelhantes, a de atentarem contra o Presidente da República e outros membros dos órgãos de soberania do Estado. Várias organizações não-governamentais se mobilizaram solicitando a soltura dos presos políticos, dois dos quais chegaram a condições críticas de saúde devido a greves de fome. Já se vão 154 dias de prisão e o governo não parece ceder a qualquer pressão. Atua como se cada dia de prisão pudesse fazer calar os protestos. Sim, o Estado angolano quer calar e meter medo aos seus cidadãos.     

Quando estive em Angola pela primeira vez, em março de 2003, conheci um ativista que me contou que embora Angola estivesse naquela ocasião celebrando a tão sonhada paz (após mais de três décadas de guerra pela independência, 1961-1975), o país ainda não estava pronto para eleições presidenciais. Naquele ano de 2003, viajei pesquisando abusos cometidos contra os direitos humanos, conhecendo e entrevistando várias pessoas em todos os cantos de Angola, do Uíge ao Moxico e Cunene. Meu novo amigo estava certo. As pessoas que eu entrevistava não tinham ânimo para falar de eleições. As lembranças e dores da guerra brutal que sucedera a primeira eleição em Angola (em 1992) ainda estavam frescas nas mentes das pessoas. O medo estava no ar.

Era um medo bastante conveniente ao governo e ao Presidente José Eduardo dos Santos que deixavam claro que a paz havia sido conseguida não graças a negociações ou acordos de paz (que foram tantos na história do conflito) mas sim graças a uma vitória militar. O MPLA havia vencido a guerra.

O lado perdedor, a principal força de oposição há época, a UNITA, não estava em condições de demandar muito. O MPLA havia assassinado seu principal líder, Jonas Savimbi, e a UNITA precisava se redefinir e reestruturar novamente como partido político em um novo cenário.

Transições e reconstrução pós-conflicto são sempre delicadas e muito complicadas e cientes disso, os angolanos deram um voto de confiança ao poder do MPLA. Mas nos últimos 13 anos de “transição” o que se viu foi uma extrema concentração das (muitas) riquezas de Angola por uma minoria ligada ao partido do presidente por vias de corrupção direta ou indireta. Em um país com um PIB de US$124.2 bilhões de dólares graças às enormes reservas de petróleo e diamantes, a maioria dos angolanos ainda vive em condições de pobreza absoluta ou abaixo da linha da pobreza (recebendo menos do que US$1.90 – um dólar e noventa centavos – por dia). A prestação de serviços de saneamento básico como esgoto e coleta de lixo é insuficiente e irregular. Os serviços de saúde e educação não são acessíveis à toda a população. Além disso, a prestação desses serviços muitas vezes está sujeita à capacidade do cidadão de pagar uma propina, subornos ou a famosa “gasosa”. Há uma falta generalizada de advogados e juizes dificultando o acesso à justiça. A polícia não recebe treinamento adequado e suficiente, seus salários são baixos e seu poder letal é alto. São comuns os casos de tortura, prisão arbitrária e execusões sumárias. Em suma, a falta de habilidade e compromisso do governo em fornecer serviços básicos e segurança aos seus cidadãos tem gerado tremenda insatisfação e instabilidade social.

Não foi surpresa alguma quando, em 2011, vários jovens ativistas inspirados pela Primavera Árabe começaram a se organizar para demandar mais democracia. Foram apelidados de Revús (os revolucionários). Suas manifestações e protestos seguindo procedimentos de desobediência civil foram duramente reprimidos. O governo do MPLA foi implacável contra os manifestantes aplicando um modus operandi típico de governos autoritários com prisões arbitrárias, espancamentos, desparecimentos forçados, tortura e, inclusive, valendo-se de grupos para-militares. Mas eles resistem e se organizam sob uma nova aliança de oposição denominada CASA-CE.

Em um primeiro momento, a estratégia do governo parece ter funcionado pois dos Santos ganhou as eleições de 2012 de maneira avassaladora. Mas violência e a opressão serviram apenas em um primeiro momento porque a instabilidade social permanece e os protestos continuam. Hoje em dia, há mais mobilização interna e externa dando maior visibilidade a assuntos angolanos. Gradativamente essa mobilização contribui para uma clara perda de credibilidade e legitimidade do governo do Presidente dos Santos. As crianças de ontem, hoje são jovens e adultos que talvez não tenham vivido no tempo da guerra mas sabem que com 40 anos desde a independência de Angola, 36 anos de dos Santos é muito!  

Redação

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