Jair Bolsonaro recebe documento de apoio da FPA, nas mãos do deputado Onyx Lorenzoni, ao lado da presidente da frente, Tereza Cristina (DEM-MS), e de Nabhan Garcia (UDR), em sua casa no Rio – Reprodução da FSP, 2.out.2018.
Bancadas BBB e Boçalnazi
por Fernando Nogueira da Costa
A bancada do boi já capturou a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência. A FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), braço congressual do setor, declarou apoio nesta véspera de eleição no 1º. turno ao deputado-capitão da bancada da bala desde 1991. Participante ativa da base de apoio ao governo golpista, corrupto e aprofundador da crise econômica, seu cinismo político e moral é descarado. “Uniremos esforços para evitar que candidatos ligados à esquemas de corrupção e ao aprofundamento da crise econômica brasileira retornem ao comando do nosso país”, disse em nota a deputada do DEM-MS, presidente da Frente ruralista. Predominam políticos do Centro-Oeste, não por acaso a região conservadora onde ele atinge os maiores índices de intenção de voto.
A FPA diz reunir 261 de 594 deputados e senadores. Historicamente ligada à candidatura do PSDB e fortemente integrada por membros do chamado Centrão, a mistura partidária conservadora também denominada de “emedebismo”, a frente vinha se aproximando de Bolsonaro e sabotando a candidatura de Geraldo Alckmin. A traição política se deu sem o menor pudor. O capitão contra o MST (Movimento dos Sem Terra) já contava com o apoio do presidente da reacionária UDR (União Democrática Ruralista), como conselheiro principal na área rural.
Além da importância econômica, o agronegócio tem grande capilaridade em Estados onde se necessita de menos votos para se eleger. A Sociedade Rural Brasileira estima haver 5,5 milhões de pessoas empregadas diretamente em sua cadeia produtiva no Brasil. Cada uma delas tem família e geralmente integra núcleos comunitários regionais, ampliando em quatro ou cinco vezes seu alcance. Predomina ainda o “curral eleitoral”?
Vai caindo a máscara de Bolsonaro. Antes ele proferia um discurso de rejeição à política tradicional. Agora já comemora o apoio do Centrão, majoritário na composição da frente ruralista, e o apoio dos fazendeiros reacionários. Eles compõem o agrupamento social mais refratário ao petismo aliado ao MST.
Houve crescimento do apoio ao candidato conservador principalmente entre eleitoras mulheres, pobres (renda de menos de dois salários mínimos) e evangélicas. No último fim de semana, líderes evangélicos orientaram os votos a favor do conservadorismo dos fiéis durante os cultos, alimentando o sentimento anti-PT e contra a pauta identitária do “elenão”. No domingo (30/9), o bispo Edir Macedo, dono da Igreja Universal do Reino de Deus, declarou apoio ao capitão reformado. Na terça (2/10), o presidente emérito da Assembleia de Deus anunciou voto no candidato de extrema-direita. São os verdadeiros líderes da bancada da bíblia.
A bancada da bala reúne, oficialmente, 35 congressistas, mas chega a agregar até uma centena quando as votações envolvem interesses corporativos de policiais militares, civis e federais. O grupo de políticos profissionais defende mudanças no Estatuto do Desarmamento, com o apoio de setores conservadores da sociedade e da indústria armamentista e de munições. Conta, em particular, com a apreensão da população perante os índices de violência em alta. O clamor por segurança pública é respondido com a promessa de armamento geral e consequente aumento da violência. Discussões de trânsito, ciúmes e qualquer contrariedade pessoal se resolveriam na bala!
O livro “How Democracies Die” [Como as Democracias Morrem], cujos coautores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt são professores da Universidade Harvard, a ser lançado no Brasil pela editora Zahar, apresenta uma tabela, denominada de Teste de Litmus da Democracia. Originalmente, esse teste é usado na química para medir a alcalinidade ou acidez de uma substância. Se algum dos quatro indicadores não é respeitado, o sinal de ameaça à democracia é aceso.
Steven Levitsky esteve no Brasil para dar uma palestra na Fundação FHC (disponível em https://www.youtube.com/watch?v=8bX7EdK0-1M). Pesquisou sobre o candidato autoritário e aplicou nele o teste decisivo sobre seu potencial de matar a democracia.
Primeiro indicador: ele rejeita as regras do jogo democrático. Ao longo de sua carreira política, desde 1991, ele sempre elogiou a ditadura militar e contestou a legitimidade da democracia após 1985. Já defendeu o encerramento do Congresso, prometeu o abarrotamento do STF com juízes conservadores nomeados por ele, questionou o sistema de urnas eletrônicas preanunciando não aceitar o resultado eleitoral caso perca, aceitou um general como vice-presidente a favor de um autogolpe. Logo, não apenas se apresentou de maneira autoritária de forma mais aberta e ofensiva se comparado aos demais “assassinos da democracia liberal” como Erdogan, Orban, Fujimori, Maduro e golpistas do Paraguai. Nenhum deles tinha antes de ser eleito defendido uma ditadura.
Segundo indicador: ele tem intolerância frente às diferenças de costumes e incentiva a violência. Em 1998, Bolsonaro lamentou os militares não terem matado 30 mil pessoas, inclusive o então presidente Fernando Henrique Cardoso, incentivou a polícia extrajudicial a matar suspeitos de crimes, acolheu esquadrões da morte (“milícias composta por ex-militares”) no Rio de Janeiro, justificou a chacina de 19 trabalhadores rurais no Pará em 1996, defende o armamentismo geral, é contra as lutas feministas, antirracistas e homo fóbico.
Terceiro indicador: nega a legitimidade da existência de rivais partidários. Denomina-os levianamente de corruptos, criminosos, e promete tratar o MST como fosse um grupo terrorista.
Quarto indicador: a vontade de reduzir a liberdade civil dos adversários. Bolsonaro endossou, repetidamente, o uso da tortura e matança extrajudicial, inclusive contra ativistas e políticos esquerdistas.
Conclusão: Bolsonaro é uma figura completamente autoritária, distinto dos demais candidatos principais. Entre eles quatro, nenhum é reprovado no teste da democracia.
Como a democracia brasileira pode se proteger contra esse candidato autoritário? Os partidos políticos (PT, PDT, PSB, PSDB, PSOL, REDE) e os políticos democratas, inclusive do PMDB como o senador Requião, desempenham papel vital como guardiões da democracia.
Diz Levitsky: “O autoritarismo eleito raramente chega ao poder sozinho. Quase sempre, recebe ajuda da elite. Políticos moderados abrem as portas para ele e cometem um erro de cálculo trágico. Enganam-se ao considerar uma aliança com o extremista de direita ser politicamente útil, porque pode ajudá-los a conquistar ou reter o poder, ou talvez a derrotar um adversário ideológico odiado. Eles presumem serem capazes de controlar o extremista, quando ele for eleito. A história mundial prova isso ser um erro calamitoso”.
Movidos por uma combinação de medo, ignorância e ambições imediatistas, os políticos moderados não podem apoiar um candidato extremista antidemocrático. Isso, em outros países, já provou ser um erro de cálculo trágico. Esses políticos não só precisam resistir à tentação de se alinhar aos extremistas, mas devem também se dispor a unir forças com rivais ideológicos a fim de garantir a derrota do extremista. Diante de uma ameaça autoritária, os democratas devem se unir ao oponente do autoritarismo, mesmo estando distantes ideologicamente, se ele tem o compromisso com a sobrevivência da ordem política democrática. Engana-se quem diz “o PT é tão ruim quanto o candidato autoritário”. O PT governou democraticamente, assim como tinha feito o PSDB durante o governo FHC. Ambos partidos, aliados com PDT, PSB, PSOL, REDE, etc., são pilares da democracia brasileira.
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