BC acaba com a regulação do faz de conta

Coluna Econômica – 15/03/2012

O discurso econômico do governo mudou 180 graus da semana passada para cá. A mobilização contra o “tsunami” monetário, a apreciação cambial e a desindustrialização tornou-se tema hegemônico tanto nos discursos de autoridades quanto na cobertura jornalística.

E essa abertura está expondo a incrível leniência com que, nas últimas décadas, as autoridades monetárias trataram a questão da especulação em dólares.

Desde a histórica reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) em fins de agosto passado – na qual decidiu-se derrubar a taxa Selic, contrariando a confraria da Selic -, o BC vem se firmando como autoridade monetária séria.

Nos últimos períodos – incluindo o longuíssimo período Henrique Meirelles – era apenas uma agência pública capturada pelo mercado. A ponto de, uma semana antes da reunião do Copom, diretores do BC reunirem-se com analistas de mercadoem São Paulo, em uma promiscuidade ímpar.

Em sua audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, o Ministro Guido Mantega enfatizou esses pontos.

Essa promiscuidade estendia-se às formas de controle do capital externo especulativo. A Fazenda definia taxação para investimentos em renda fixa. Imediatamente, multinacionais mudavam a rubrica, entrando como investimento direto. O dinheiro batia no seu caixa e era imediatamente transferido para holdings – que aplicavam em renda fixa.

Apesar das evidências gritantes de burla nas próprias normas do banco, ele alegava que sua fiscalização terminava no caixa da empresa, não podendo ir além.

No seu  depoimento, Mantega lembrou que no primeiro trimestre do ano passado o Brasil recebeu US$ 36 bilhões pela conta financeira. E anunciou que o BC passaria a vigiar todos os canais de entrada de dólares no país.

Uma das fontes de vazamento eram os chamados ACCs (Adiantamento de Contrato de Câmbio). O exportador descontava no banco e não tinha prazo para remeter a mercadoria.  Apenas em 2011 essa movimentação com ACCs chegou a US$ 50 bilhões, grande parte empregada em arbitragem de juros.

Agora, os exportadores terão até 360 dias para efetivar a exportação.

O grande desafio do BC, no entanto, será acabar com a taxa Selic.

Há dois tipos de utilização dos títulos da dívida pública: captação de longo prazo; e aqueles utilizados para política monetária, isto é, para permitir ao BC enxugar ou colocar dinheiro na economia.

Os primeiros pagam taxas mais elevadas, porque embutem um fator de incerteza futura. Os segundos deveriam pagar taxas irrisórias, já que são utilizados apenas para troca de reservas entre os bancos. Internacionalmente, são papéis que pagam por volta de 1% ao ano.

A grande questão é que, na hora de fazer política monetária, o BC passou a utilizar os papéis de longo prazo do Tesouro – que pagam Selic. Era compreensível no período hiper inflacionário, mas inconcebível após a estabilização. O resultado foi uma gigantesca transferência de recursos do Tesouro para investidores privados.

Agora, como propôs recentemente o economista Yoshiaki Nakano, chegou a hora de acabar com a Selic.

Luis Nassif

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