“Catching-up”, por Yoshiaki Nakano

Folha de S.Paulo
 
Por Yoshiaki Nakano, de 24/01/2010
 
“Catching-up”
 
Sem um moderno Estado nacional não é possível construir uma eficiente máquina capitalista
 
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(Foto Marcelo Camargo ABr)
 
MARX, NO prefácio de “O Capital” afirma: “O país industrialmente mais desenvolvido mostra ao menos desenvolvido tão-somente a imagem do próprio futuro”. Como na distância entre os dois situa-se o fenômeno do desenvolvimento, este seria um processo de “catch up”, em que o mais atrasado alcança o mais avançado. De fato, em países que crescem rapidamente, como a China, a palavra de ordem em todos os níveis da sociedade e que estimula e inspira a ação diária de toda a população é o sentimento de estar engajado num processo de “catch up”. Tudo isso seria muito óbvio e simples se o mais atrasado, ao copiar o modelo do mais avançado, pudesse seguir uma cartilha geral, como reza o pensamento convencional expresso, por exemplo, no defunto Consenso de Washington. Nada mais longe da verdade. 
 
O próprio Marx já observava que a situação social do país atrasado poderia ser muito pior do que o ponto de partida do país hoje avançado e que cada país teria que seguir caminho próprio e específico. Os países retardatários não poderiam saltar etapas, mas poderiam abreviar e minorar as dores do parto. Pior, diagnosticou Celso Furtado, a situação histórica de subdesenvolvimento apresenta patologias congênitas -herdadas do passado colonial- e modernas, como a dependência, contemporânea ao próprio processo de desenvolvimento dos mais avançados. Então estamos condenados ao subdesenvolvimento? 
 
Não. Um país pode aprender com outros, e isso começa ao tornar-se uma nação, com a descoberta do interesse nacional e da sua identidade para poder traçar um projeto nacional de desenvolvimento. Assim, o processo de “catch up”, para ser bem-sucedido, acaba comprometendo toda a sociedade e beneficiando todas as classes. É por isso que os processos de modernização conduzidos por grupos que buscam moldar o país pela coação ou formando o pensamento dominante, na maioria das vezes importado do exterior, para privilegiar alguns setores em detrimento de outros, em regra acabam com oposições, instabilidades, crises e terminam fracassando. Daí a modernização inacabada no Brasil. 
 
Na verdade, as nações mais avançadas são aquelas que construíram ao longo da sua história duas grandes instituições que necessitam uma da outra para sobreviver: o moderno Estado nacional e a máquina de produção de mercado capitalista. O moderno Estado nacional, a maior e mais poderosa organização inventada pelo ser humano, caracteriza-se pela generalização dos direitos sociais, civis e políticos, isto é, a conquista da verdadeira cidadania pela população, que passa a ser fonte última de poder, com o Estado ao seu serviço. 
 
Com representação política falha, sem verdadeiros partidos políticos, com leis e Justiça que valem para alguns e não para outros, com burocracia que não sabe o que é interesse público e nacional e sem controle efetivo da sociedade daqueles que controlam o aparelho do Estado e que agem com arbitrariedade para defender interesses escusos, como acontece no Brasil, a construção de um Estado nacional moderno é a agenda perdida e um longo caminho a ser percorrido. E sem um moderno Estado nacional não é possível construir uma eficiente e competitiva máquina de produção capitalista nem mercados eficientes. 
 
YOSHIAKI NAKANO , 65, diretor da Escola de Economia de São Paulo, da FGV (Fundação Getulio Vargas), foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).
Redação

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  1. A divisão internacional do trabalho

    Em razão da divisão internacional do trabalho, a Serra Leoa, por exemplo, jamais trilhará o caminho da Alemanha. Em regra, os países da parte Ocidental hemisfério Norte são sociedades afluentes, cuja prosperidade decorre da pilhagem dos países industrialmente atrasados. Se bem que as indústrias estão dos países industrialmente avançados estão migrando para os países atrasados, em busca de operários que aceitem salários mais baixos.

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