Contingenciamento de despesas vai adiar saída da crise, por Laura Carvalho

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
 
Jornal GGN – Em sua coluna de hoje (6) na Folha de S. Paulo, a professora de economia da USP, Laura Carvalho, analisa o contingenciamento que o governo terá de realizar para cumprir a meta fiscal deste ano, no valor de R$ 42,5 bilhões. 
 
Para Carvalho, as expectativas do governo para o crescimento da economia em 2017 – que nortearam a aprovação do Orçamento  – foram muito otimistas. A professora argumenta que o governo Temer terminou de soterrar qualquer sonho de retomada econômica neste ano ao reconhecer seu próprio irrealismo fiscal, e que também aumenta o pessimismo para o ano que vem. 
 
“Está mais do que na hora de o governo brasileiro passar a navegar a favor dos ventos da macroeconomia em vez de insistir em remar contra a maré”, afirma a economista.

 
Leia mais abaixo: 
 
Da Folha
 
Contingenciamento e investimento público menor adiam saída da crise
 
por Laura Carvalho
 
Com atraso em relação ao que prevê a Lei de Diretrizes Orçamentárias, o governo informou no dia 29 de março o valor e a composição do contingenciamento de despesas que terá de realizar para o cumprimento da meta fiscal de 2017. O total contingenciado será de R$ 42,1 bilhões, sendo R$ 10,5 bilhões nos investimentos públicos.
 
A necessidade de contingenciar recursos —limitar o empenho e a movimentação financeira com rubricas previamente aprovadas no Orçamento— pouco surpreende. Só mesmo os que caíram na estratégia de marketing do próprio governo ainda esperavam que se concretizassem as expectativas otimistas para o crescimento da economia e para a arrecadação federal que nortearam a aprovação do Orçamento de 2017.
 
Sempre esteve claro também que o governo estava refém de uma base de apoio ao impeachment que interditava um ajuste mais equilibrado, com elevação de impostos sobre os que pouco pagam.
 
Do valor total do ajuste de R$ 58,2 bilhões anunciado, só R$ 16,1 bilhões referem-se a um aumento da arrecadação. Desses, no entanto, R$ 10,1 bilhões virão de receitas extraordinárias oriundas da concessão de hidrelétricas. Ou seja, a parte do ajuste que se dará pela via tributária resumiu-se a R$ 6 bilhões, dos quais R$ 4,8 bilhões referem-se à eliminação da desoneração da folha de pagamentos para alguns setores e R$ 1,2 bilhão à cobrança de IOF sobre cooperativas de crédito, que parecem gozar de baixíssimo prestígio.
 
Além de acabar de enterrar os sonhos de retomada da economia em 2017 pelo reconhecimento de seu próprio irrealismo fiscal —fazendo-nos lembrar das sucessivas frustrações de 2015—, o governo nos deixa mais pessimistas para 2018. Ainda que o fim do ciclo de baixa nos preços dos produtos que mais exportamos possa nos dar uma pequena ajuda, a retirada de recursos de investimentos públicos e outras rubricas com forte impacto sobre o conjunto de setores da economia brasileira contribuirá para um quadro de estagnação.
 
O valor total do contingenciamento é muito próximo, por exemplo, do total de recursos liberados pela autorização de saque de contas inativas do FGTS, que será de R$ 43,6 bilhões. No entanto, a estimativa é que a maior parte desses saques seja utilizada para pagar dívidas e que apenas um valor entre R$ 12 bilhões e R$ 16 bilhões seja injetado na economia via consumo das famílias. O ajuste anunciado certamente terá efeito contracionista de magnitude maior do que esse estímulo, levando-nos de volta à estaca zero.
 
Olhando para a frente, o foco na contenção de despesas discricionárias como resposta a um cenário de frustração de receitas tende a ser cada vez maior, à medida que a PEC do teto de gastos tornar-se mais restritiva com a queda da inflação. Sem revisão da PEC, nem uma aprovação da reforma da Previdência tal qual enviada ao Congresso seria suficiente para reverter esse quadro no curto ou médio prazo.
 
Do outro lado do oceano, a recusa em continuar contribuindo com a espiral recessiva da austeridade não impediu o socialista Antonio Costa, que assumiu como primeiro-ministro em 2015 em coligação com o Bloco de Esquerda, de superar em muito as expectativas do FMI e reduzir o deficit fiscal como proporção do PIB pela metade, levando-o ao seu menor nível desde a transição democrática de 1974. A retomada do crescimento econômico e a recuperação dos salários ajudaram.
 
Após dois anos de frustrações, está mais do que na hora de o governo brasileiro passar a navegar a favor dos ventos da macroeconomia em vez de insistir em remar contra a maré. 
 
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Redação

2 Comentários

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  1. E se te algum governo que

    E se te algum governo que pode rever a PEC, se trata desse, pq a esquerda jamais terá como revÊ-la.

    O Brasil foi destruído por seu próprio povo canalha e lesa-pátria que apoiou essa aventura aí.

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