Corte apenas suaviza papel do gasto público no crescimento

Do Valor

Corte apenas suaviza papel do gasto público no crescimento

Claudia Safatle | De Brasília
11/02/2011

O corte de R$ 50 bilhões nas despesas públicas não fará da política fiscal do novo governo um instrumento de efetiva contração da demanda. O aumento do gasto público federal, que ainda crescerá 3,7% reais este ano sobre 2010, porém, foi “suavizado” o suficiente para ajudar o Banco Central no controle da inflação. Essa é a avaliação que fazem economistas do governo, após o anúncio do programa fiscal para este ano. O IPCA, que hoje esbarra em 6%, só deverá voltar para o centro da meta de 4,5% em 2012, preveem.

O compromisso de corte equivale a um aumento de 1 ponto percentual na taxa de juros Selic, estimam técnicos oficiais. E, ao contrário da elevação dos juros que leva de seis a nove meses para produzir efeitos sobre a demanda agregada da economia, a subtração de gastos do orçamento começa a gerar resultados mais rapidamente, em cerca de três meses, asseguram.

OscaOs cálculos sobre os impactos macroeconômicos do pacote fiscal indicam, ainda, que o corte de despesas, associado às medidas de restrição ao crédito e ao aumento dos juros que o BC fará este ano, deve levar o crescimento do PIB dos quase 8% do ano passado para 5%.

O mercado reagiu com descrença às promessas dos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, de realizar o ajuste e cumprir a meta de superávit primário “cheia” (sem abater recursos do PAC e sem enfeitar a contabilidade pública) de 3% do PIB. Eles não mostraram onde e como vão passar a tesoura, o que fomentou ainda mais a dúvida sobre a real intenção do governo, que promete essas informações para a próxima semana.

Para uma parte dos analistas privados, o valor do corte é insuficiente para cumprir a meta fiscal. Para outra, trata-se de uma promessa inviável. Nesse caso, argumenta-se que os gastos com custeio não têm gordura suficiente para receber uma poda desse valor e o governo garantiu que não tocará nos investimentos programados. Não se chegaria jamais à cifra prometida com economias em viagens, diárias e aluguéis.

Fontes oficiais lembram que há alguns pormenores a considerar nas contas. O gasto terá que ser reduzido, de fato, em R$ 32 bilhões, enquanto R$ 18 bilhões serão subtraídos de um lote de R$ 21 bilhões em emendas parlamentares das quais devem sobrar só R$ 3 bilhões. São despesas criadas sem as receitas correspondentes e, portanto, corta-se ilusão.

Ainda assim é muito dinheiro, concordam. Ressalvam, no entanto, que este ano começam as obras do PAC 2. Nos primeiros dois anos do PAC (2007 e 2008) os desembolsos de recursos orçamentários foram baixos – por todo o processo moroso entre ter o projeto aprovado e iniciar sua execução. O programa só tomou ritmo nos dois últimos anos e, especialmente, em 2010, ano das eleições presidenciais, as obras estavam a pleno vapor. No ano passado, os investimentos do orçamento federal chegaram à cifra recorde de R$ 48 bilhões.

Com o PAC 2 os cronogramas não devem ser muito diferentes. Apesar de haver uma dotação de R$ 43,5 bilhões para o programa este ano, a perspectiva de realização plena desse gasto é baixa. Não é preciso o governo anunciar que vai cortar investimentos e ter o desgaste político da decisão, se os próprios procedimentos burocráticos podem fazer isso.

Por outro lado, argumentam esses economistas, se a saída para controlar o crescimento e a inflação for sempre a de cortar os gastos com investimentos – dado que, enquanto estão em fase de execução, pressionam a demanda – o país jamais chegará à fase de aumento da oferta. E, sem isso, estará preso ao dilema do crescimento versus inflação.

Os Estados, com os novos governadores, também devem jogar a favor da redução do gasto este ano. O ciclo político é conhecido: economiza-se nos primeiros dois anos para poder gastar nos dois últimos e colher frutos nas eleições. Não se deve esquecer, ainda, que uma taxa de inflação mais elevada sempre ajuda o governo a administrar suas contas. E, por fim, salientam alguns técnicos, não é aconselhável subestimar o poder do controle na boca do caixa da União.

Em suma, a política fiscal de 2011 não será contracionista, mas também não será expansionista como em 2009 e 2010, primeiro pela crise global, e depois pelas eleições presidenciais. Como disse uma fonte, o corte anunciado “suaviza” o papel do gasto público como indutor do crescimento, mas não torna a vida do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, confortável este ano. 

Luis Nassif

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