Desde a campanha de 2018, o projeto foi apresentado, de maneira límpida, tornando desnecessária a perda de tempo em debatê-lo: criar um quadrúpede chamado Brasil apoiado por quatro patas. Para ganhar a eleição, as duas patas dianteiras: bíblia e bala, tendo na retaguarda o boi e a banca. Para governar, trocam de posições, adiantando-se o agronegócio e os bancos de negócios, e colocando o projeto sob a garantia ou do evangelismo ou do armamentismo. As quatro bancadas foram contempladas
Foto: Reprodução vídeo
Distopia Brasileira
Por Fernando Nogueira da Costa[1]
Ano de 2022. Os Estados Unidos do Brasil comemoram ter trocado as 27 estrelas de sua bandeira por apenas uma. Não cabia a 51ª. estrela na dos Estados Unidos da América. Oficialmente declarado Estado Livre Associado do Brasil, passou a ser um território não incorporado dos Estados Unidos das Américas (s acrescentado), localizado na América do Sul. Acima da Pátria, só Deus – e acima de todos os EUA. Abaixo a independência!
Seus habitantes não possuem representação no Congresso e não participam das eleições presidenciais norte-americanas. Ao mesmo tempo, os brasileirosganharam o status de cidadãos norte-americanos, sujeitos ao serviço militar e às leis federais, porém,têm o impedimento de lá trabalhar, dado o excesso de latinos em disputa de vagas de trabalho manual mal remunerado.
O governador brasileiro continuará a ser nomeado para um mandato de quatro anos dentro da dinastia estabelecida pelo clã Bolsonaro. Garantidos pelo menos mais três mandatos, o único dissidente do regime evangélico-militar foi o midiático ministro da Justiça, dado seu projeto de ser tornar governador desta colônia norte-americana. Um providencial encarceramento na República de Curitiba o levará à voluntáriaautocrítica.
De 2018 a 2022, a política brasileira foi dominada por um partido defensor da associação voluntária com os EUA. O PSL favorável à transformação do Brasil em estado norte-americano, ganhará certamente pelo menos mais três nomeações para governador. Aliás, sistema partidário é uma ex-crescência, dada sua demasiada quantidade, fragmentado em excesso, tornou-se uma superfluidade. Desequilibra a harmonia de um todo dominado pelas quatro bancadas de interesses (BBBB) sem fidelidade partidária.
Desde a campanha de 2018, o projeto foi apresentado, de maneira límpida, tornando desnecessária a perda de tempo em debatê-lo: criar um quadrúpede chamado Brasil apoiado por quatro patas. Para ganhar a eleição, as duas patas dianteiras: bíblia e bala, tendo na retaguarda o boi e a banca. Para governar, trocam de posições, adiantando-se o agronegócio e os bancos de negócios, e colocando o projeto sob a garantia ou do evangelismo ou do armamentismo. As quatro bancadas foram contempladas.
Assim se montou o ministério com uma fácil equação política cartesiana. Dividiu-se o aparelho do Estado brasileiro em quatro: toda a economia sob a casta dos mercadores-financistas, exceto o agrobusiness, porque ninguém tasca os ruralistas. Colocou sob esses até a secretária da concentração fundiária com o vice-ministro presidente da UDR. Coisa de gênio, assim como foi nomear as raposas especialistas nos seus respectivos galinheiros. Cuidou-se de detalhes com requintes de cruel sabedoria ao escolher um astronauta para pairar acima da C&T (Ciência e Tecnologia), um fundamentalista pró-Trump em defesa da soberania norte-americana sobre o Ocidente quiçá o mundo, um adepto da Escola Sem Partido como ministro da Deseducação. O aparelho de segurança, naturalmente, ficou sob a casta da farda e a casta da toga, para atuarem em dobradinha.
Comparando com o quadro existente em 2018, deu-se continuidade à tendência de regressão histórico-social do impopular governo anterior. Temer ficou! Deixou suas marcas indeléveis na história brasileira: corte dos direitos trabalhistas e imposição de corte de gastos públicos para os vinte anos seguintes! Atendeu a quase todos os reclamos dos mercadores-financistas, exceto o corte de direitos previdenciários por um detalhe de má-fé do ex-procurador geral da República: a gravação de uma conversa não-republicana, confidencial e de fórum íntimo entre o (i)legítimo presidente da República e um reles corruptor insistente em suborná-lo na calada da noite.
O fim do polarizado ciclo eleitoral e a expectativa concretizada de o novo presidente formar uma equipe econômica de velhos chicagões com viésultraliberal e reformista (leia-se privatizante), soou como música para os ouvidos de O Mercado. A onda de otimismo fez o Ibovespa, índicereferência do mercado acionário, renovar as máximas de forma consecutiva de modo aromper logo a barreira dos 120 mil pontos.
O anúncio de implantação de um regime de capitalização em lugar do regime de repartição lembrou o sucesso da política juvenil dos Chicago’s Oldies ao servir à ditadura chilena: uma bolha de ativos inflada e explodida, mas propícia ao enriquecimento de quem já detinha os poucos ativos existentes em resposta ao choque de demanda. E o Brasil quebrou o recorde chileno: lá, entre 2010 e 2015, 936 adultos maiores de 70 anos tiraram sua própria vida no período. Aqui a taxa de suicídio de idosos foi muito maior!
Com a eleição deste projeto pró-livre mercado, 146.571 pessoas físicas ingressaram na bolsa de valores em 2018. O numero de investidores individuais ativos bateu um recorde histórico com 766.196 contas de pessoas físicas, superando o de investidores ativos no Tesouro Direto com 724.093 brasileiros. Um detalhe era o perfil dos investidores individuais ser ¾ masculino. Acima de 66 anos tinham 14% das contas e concentravam 44% dos valores. O segmento de 123.370 clientes Private Banking com riqueza financeira per capita de R$ 8,5 milhões tinha 19% em ações, sendo 14% diretamente e 5% através de fundos de terceiros ou exclusivos. Representava R$ 199 bilhões do total de R$ 1,047 trilhão retidos pelos ricaços antes da privatização das empresas estatais.
Mesmo com o cenário doméstico cercado de expectativas positivas, houve grande volatilidade na bolsa a partir de 2019 por conta de turbulências internacionais. A queda do preço do petróleo, a guerra comercial entre EUA e China, o ritmo de elevação dos juros pelo banco central americano e o ritmo de desaceleração das duas maiores potências econômicas mundiais desiludiram os investidores em relação ao risco Brasil.
Incompreensíveis com o radiante futuro brasileiro, dado o anúncio da agenda de reformas modernizantes-conservadoras, os estrangeiros na bolsa brasileira (detentores de 49% dos valores nela investidos) executaram uma fuga de capitais como em um dos seus piores momentos na história. A saída de R$ 10,04 bilhões da B3 no ano, até o fim de novembro de 2018,foi a maior desde a crise financeira de 2008, quando os não residentes sacaram R$ 24,2 bilhões.
Em contrapartida, o Investimento Direto no País (IDP) passou a registrar o resultadoacumulado em 12 meses de US$ 79,8 bilhões bem acima do déficit no balanço de transações correntes de US$ 11,3 bilhões no período até outubro de 2018. As operações do tipo empréstimos intercompanhia eram fruto de decisões estratégicas de longo prazo para controlar a exportação dos recursos naturais e o mercado interno brasileiro através das montadoras industriais. Entre 2016 e 2017, a rentabilidade média do estoque de investimentos diretos no país mantido sob a forma de participação no capital subiu a 5,3%, depois de uma queda a 2,1% em 2015.
Mas seguia inferior à rentabilidade entre 6,8% e 9,1% observados entre 2010 e 2013, antes de o país entrar em grande depressão com o processo golpista. Para comparação, os investimentos diretos feitos por brasileiros no exterior tiveram retorno de 4,8% em 2017. Os EUA eram o principal país de origemdos investimentos diretos, com 22% do estoque de IDP sob a forma de participação no capital. A Espanha tinha 12%, e a Bélgica, 10,4%. A China aindaera o nono maior investidor e respondia por 3,9%.
Em vez de convencer à China fazer investimentos na infraestrutura brasileira, interessada potencial por ser o destino de 26,8% das exportações brasileiras, os adeptos do fundamentalismo evangélico de origem norte-americana pretenderam tomar partido no conflito comercial com os Estados Unidos. Quase metade (47,7%, ou US$ 47,3 bilhões) dos produtos básicos brasileiros em grãos, carnes e minério foi para o país asiático no acumulado até outubro de 2018. Os chineses aumentarem sua vantagem como maior parceiro comercial do Brasil. Os EUA, segundo lugar nas exportações, tinham menos da metade: 12%. Sem pragmatismo, o governo ideológico colocou sua anacrônica doutrina anticomunista acima dos interesses comerciais.
Mas o Brasil conseguiu outro destaque negativo. Em 2017, as três esferas de governo investiram o equivalente a 1,16% do PIB, o menor nível da série iniciada em 1947. Entre 2000 e 2017, a média anual do investimento público no Brasil foi de apenas 1,92% do PIB, a segunda mais baixa entre um grupo de 42 países. No período, apenas na Costa Rica o governo investiu menos (1,87% do PIB) em relação à média dos 42 países (3,51% do PIB), atingindo 5,3% do PIB na Estônia. A base de dados compilada pela OCDE referia-se a gastos da União, Estados e municípios, sem investimentos de empresas estatais.
A retomada da infraestrutura passava necessariamente pela revisão do teto de gastos públicos, regra impeditivada ampliação dos investimentos além da variação da inflação de um ano para o outro. O Estado brasileiro tinha perdido a capacidade de investimento. Porém, a subcasta da banca de negócios manteve a PEC do teto de gastos, justificativa para a privatização das estatais para seus parceiros comprarem barato e revenderem um pouco mais caro para os estrangeiros.Desnacionalizaram a soberania das decisões.
Os investidores financeiros – gestoras, fundos de investimento, fundos de pensão –ambicionavam papel mais relevante na infraestrutura, apostando em energia, rodovias, portos, entre outros bons negócios de compra e venda em privatizações. O saneamento, entretanto, era deixado de lado, mesmo com grande necessidade social para a saúde pública. Quem investia, destacava a pulverização, as questões regulatórias e o risco elevado como principais problemas nessa área. Mas foi uma solução perfeita: com a maior mortandade e a queda da esperança de vida no Brasil, o livre-mercado levou à autorregulação do problema da Previdência Social: os pobres idosos se aposentam… e se matam!
[1]Professor Titular do IE-UNICAMP. Autor de “Métodos de Análise Econômica” (Editora Contexto; 2018).http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/ E-mail: [email protected].
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NOSSA DISTOPIA
Boa Noite
Parabéns ao Prof. Fernado pelo texto. Com efeito, após o golpe e com a eleição do fascista, estamos caminhando, céleres, para o retorno à época colonial.
No futuro, quando não estivermos mais aqui, e esses bandidos tiverem sido derrotados, os manuais de história apresentarão uma nova divisão para o nosso chamado “período histórico” (com vênias aos povos indígenas): Brasil Colônia, Império, República e Brasil das Trevas, iniciadas em 2016 e consolidadas a partir do 2018.
Triste país.
NOSSA DISTOPIA
Boa Noite
Parabéns ao Prof. Fernado pelo texto. Com efeito, após o golpe e com a eleição do fascista, estamos caminhando, céleres, para o retorno à época colonial.
No futuro, quando não estivermos mais aqui, e esses bandidos tiverem sido derrotados, os manuais de história apresentarão uma nova divisão para o nosso chamado “período histórico” (com vênias aos povos indígenas): Brasil Colônia, Império, República e Brasil das Trevas, iniciadas em 2016 e consolidadas a partir do 2018.
Triste país.
Boi, bala, bíblia e banca…
Boa! Eis o Brasil se tornando, de novo e depois de um breve intervalo de 12 anos, um país “B”. Um filme “B” e de terror, ainda por cima.
Mas acho que essa distopia não se realizará, caro Fernando. O povo brasileiro já se levantou algumas vezes contra esses ataques do capitalismo. Lula foi eleito porque FHC empobreceu geral, inclusive a tal de classe média. Além, é claro, de ter privatizado e se dobrado ao dólar, exatamente o que quer fazer a turma que realemnte manda, por trás do Bolsonaro. Não há porque, desta vez, a classe média – seja lá o que isso for – suportar a pobreza caracteristicamente imposta aos anexados periféricos do dólar. Alguns anos desse achatamento causarão reviravolta histórica. Só espero que nos lembremos da lição: iniciativa privada gerindo o estado, pobreza para todos, nunca mais!
Além disso nossa história não é a história do povo dos EUA. Não somos tão doutrinados, alienados de nossa cidadania assim. Tudo o que aprendemos desde que nascemos é diferente do que o que aprendem as crianças estadunidenses. E doutrinar para estado mínimo leva décadas, séculos. Temos arraigadamente outra cultura, outro jeito de viver, no campo ou na cidade, nos centros ou nas periferias.
E por último… “clã” dos Bolsonaro?! Bolsonaro é, no máximo um grupelho mal organizado de oportunistas sem a menor envergadura – moral, cultural, econômica, de formação e até estirpe – para se tornar um clã. Se voarem será um vôo de galinha. Mas não será surpresa quando começarem a brigar entre si por poder, dividirem-se na divisão do butim.
Desculpe, caro, mas essa distopia não vai rolar.
Crônica do povo doido e pastores ricos, sob o “capitão”.;
Faltou acrescentar que devido aos membros jovens da “nossa” elite serem criados no exterior, o idioma português foi gradativamente substituído pelo inglês. Na fase de transição, o populacho usou o “portinglês” das novelas da Rede Globo.
Mais uma diferenciação entre a elite, fluente no idioma da “pátria campeã da liberdade” de exploração e a gentinha. Quanto aos setores médios, ainda passam vergonha quanto a pronúncia, como bem mostra o “exemplo” do juiz preferido do governo estadunidense e sua exótica “maxaxusetis”.
Enquanto os governadores-gerais prestam continência aos “sub do sub do sub” da “make America great”, o ralé econômica, “instruída” pelo astrólogo Olavo proclamam o seu novo “slogan”: “make Brazii down”.
Outros gurus, como Silas Malafaia continuam “making money forever” com muito mais ênfase ao abocanhar generosas verbas públicas para pregar nas escolas a teoria da (própria) prosperidade.
Rir para não chorar! Só tenho
Rir para não chorar! Só tenho dois senões. Não acho que o super xerife da Gestapo tupiniquim vai ser um dissidente do sistema. Certo que o camisa preta quer ser presidente da república, melhor dizendo imperador do reino, mas em não podendo, aceitará, de bom grado, lugar de honra no STF, como prêmio de consolação.
E o outro é que eu acho que tem algo que não fecha. Ideologia ok, todos essas “patas” do qaudrúpede Brasil concordam que o PT, Psol, MST, MTST, CUT, Quilombolas, LGBTs, macumbeiros, maconheiros e demais vagabundos devem ser extermidados. E todos tem uma admiração servil e vira-lata pela superior civilização estadounidense.
Só que não rasgam dinheiro! Mudar a embaixada para Jerusalém para agradar o patrão, seria uma boa desde que a liga árabe não parasse de comprar de uma das patas, a do boi, causando sérios prejuízos financeiros. E a China? São comunistas e nosso senhor não gosta deles. Só que se pararem de comprar nossas coisinhas, já era, os lucros fabolusoso vão para as cucuias.
Ou seja, nesse cenário aí o quadrúpede fica manco. Os milicos da cúpula sabem disso e falaram para o pessoal subalterno segurarem a onda. “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos, os EUA mais um pouqinha acima, mas meu dindim no ultimo degrau da escada!”
A Caminho do Cativeiro
“Sôbolos rios que vão / por Babilônia me achei…” — redondilha, Camões
Nassif: adorei o texto. Corretíssimo. Mais admito por uma óptica diferente.
Concordo que o nome do Pais deva mudar. Afinal, se o território é quintal os donos da gleba são eles os que devem batizar o galinheiro e o chiqueiro. Essa de “Estado Livre Associado de Pindorama” tá de bom tamanho. É um Protetorado. Mostra a autonomia local em gargarejar e botar ôvo, tanto quanto produzir toucinho. Porém, quando se tratar do Breakingfast, serão eles que dirão o número de ovos e a quantidade de bacon na omelete.
Concordo também com os gringos em não colocarem mais uma estrela em sua bandeira. Trata-se de autoinclusão da Terra de Santa Cruz à sua tutela. Ora, se os verdeolivas, para receberem alguns favores e missangas, resolvem doarem as terras descobertas por Cabral (não esse em cana), isso, quando muito, é um Protetorado e não um Estado. Cada Estado deve corresponder a uma estrela. Mas o Pais não merece ser uma estrela. Tá mais pra um buraco negro, que tem o fuzil por Justiça e a bandeira por mortalha, para gasalhar seu Povo.
Concordo, finalmente, com a continência à bandeira. Se Savonarola dos Pinhais (atualmente no papel de EliotNessTupiniquim) já havia inaugurado, via Japonês de Curitiba, a máxima da safadeza judiciária, criada pelo Morcegão (aquele que mora em Miami), que custa mostrar que a caserna também está submetida aos mesmos planos trazidos pela CIA? Temos que respeita a atitude, até porque esta desnuda o lacaio enrustido, pois o ato está respaldado por 56 milhões de extremistas de direita.
A ironia disso tudo é que os da EstrelaAmarela são coautores dessa nova modalidade do Salmo 136, que seremos obrigados a cantar sob as ordens de Messias, regidos pelo ApóstoloMaldito e apresentada no átrio do Templo de Salomão.
Livro Crise e Golpe – aula do professor Alysson Mascaro
Uma aula do professor Alysson Mascaro, autor do livro Crise e Golpe (Boitempo, 2018).
Canal Tapera Taperá – Apresentação do livro Crise e Golpe – Alysson Mascaro
[video:https://www.youtube.com/watch?v=PGs-leExgGQ&t=4008s%5D
https://www.youtube.com/watch?v=PGs-leExgGQ&t=4008s
Sampa/SP, 01/12/2018 – 15:30 (em luto).