Carta Aberta dos ex-integrantes do Conselho Curador da EBC

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Jornal GGN – A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) foi, por alguns anos, o que de mais importante aconteceu em termos de empresa pública de comunicação. Os programas de TV, rádio e o jornalismo online fizeram a diferença no cenário da comunicação brasileira. Como interino, Temer tentou intervir. A justiça negou. Agora presidente, com 61 votos de senadores, Temer põe fim a um conceito de informação que fará falta ao Brasil. 

Ex-integrantes do Conselho Curador da EBC soltaram, dia 6, uma Carta Aberta sobre a intervenção na empresa de comunicação. Leia a seguir.

Carta Aberta de ex-integrantes do

Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC)

Os sistemas de radiodifusão de serviço público não comercial têm sido, ao longo da história da comunicação nas democracias, uma notável marca civilizatória. Na Europa, tendo a BBC britânica como sua principal referência, esses sistemas representam até hoje, não obstante o avanço da radiodifusão comercial, uma alternativa de programações jornalísticas, educativas e culturais recebida e admirada pelas sociedades em que estão inseridas. Mesmo nos Estados Unidos onde, a exemplo do Brasil, a radiodifusão comercial foi dominante desde suas origens, o sistema PBS – Public Broadcasting Service – é conhecido e respeitado por seu jornalismo equilibrado, seus documentários aprofundados, sua dramaturgia desvinculada da superficialidade comercial e sobretudo, por seus programas infantis e juvenis de indiscutível qualidade educativa e cultural.

A EBC, Empresa Brasil de Comunicação, foi criada no Brasil para ser, nos limites de nossas possibilidades políticas, culturais, sociais e econômicas, um sistema de radiodifusão de serviço público não comercial que, ao longo de seu desenvolvimento, almejasse chegar um dia a ser, se não uma BBC, por conta das diferenças estruturais do desenvolvimento da radiodifusão na Europa e no Brasil, mas, ao menos, uma prestadora de serviço público nos moldes da PBS americana. Uma prestadora de serviço público de radiodifusão não comercial, mantida em parte por recursos públicos, em parte por apoios culturais e patrocínios, em parte por prestação de serviços à sociedade.

Mas, criada em 2008, a EBC mal teve tempo de, nos termos formulados pelo Conselho Curador em 2012, rever seu modelo institucional, por meio de seminários internos e debates com a sociedade ao ser atingida por intempestiva decisão do novo governo, que, na prática, destrói aquele modelo, ao, entre outras medidas, extinguir o Conselho, ao qual cabe assegurar, por força da representação social de que é revestido, a autonomia da empresa e o estrito cumprimento da lei que a criou.

Não deixa de ser paradoxal, no momento mesmo em que a sociedade e o Poder Judiciário reivindicam medidas de controle sobre o Estado e, em particular, sobre as empresas estatais, que a única empresa pública a ter, definido por Lei, um Conselho Curador – ativo e operante – seja alcançada por uma medida que esvazia, quando não impede, o exercício de controle que se torna uma exigência dos valores democráticos aplicados à gestão de autarquias e empresas estatais.

Os abaixo-assinados, ex-integrantes do Conselho Curador da EBC, vêm a público apelar ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo no sentido de que reformem a decisão de encaminhar e acolher a Medida Provisória que, na prática, ao extinguir o Conselho Curador, extingue o primeiro, e ainda em curso, processo de se ter no Brasil uma experiência fundamental de radiodifusão de serviço público não comercial, pública, autônoma e inclusiva.

Como ex-integrantes do Conselho Curador da EBC, que deram início e participaram do debate de revisão e melhoramento do modelo institucional da empresa, nos colocamos à disposição das autoridades responsáveis daqueles poderes, em harmonia com o atual Conselho, com a direção da empresa, com as mais diversas representações da sociedade, para, juntos, não deixarmos morrer no Brasil uma iniciativa civilizatória à altura das mais nobres esperanças democráticas e cidadãs, para este e qualquer outro país.

Em 06 de setembro de 2016

 

Assinam:

 

Cláudio Lembo

Jurista, professor universitário, ex-governador de São Paulo

 

Daniel Aarão Reis

Professor de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense (UFF)

 

João Jorge Rodrigues

Presidente, Samba Reggae & Cidadania

 

Luiz Gonzaga Belluzzo

Economista, professor universitário, foi presidente do Conselho Curador da EBC

 

Maria da Penha Fernandes

Militante feminista e inspiradora da criação da lei federal no. 11.340/2006, batizada com seu nome: Lei Maria da Penha.

 

Murilo César Ramos

Professor e pesquisador do Laboratório de Políticas de Comunicação (LaPCom), da Universidade de Brasília (UnB)

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. EBC

    Com as Instituições em frangalhos sera muito mais facil para esse governo passar como trator por cima de toda representação democratica. E não se espera muito do Judiciario.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador