Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Grande mídia aproxima-se de uma vitória de Pirro?, por Wilson Ferreira

Ao declarar seu “susto” com o posicionamento da revista “Veja” contra o desarmamento em 2005 no referendo sobre armas, Bárbara Gancia foi uma dos primeiros jornalistas a perceberem uma contradição na grande mídia que vem crescendo desde então: como ser politicamente conservador e ao mesmo tempo liberal nos costumes? O vale-tudo atual da grande mídia de buscar em águas turvas o apoio de setores política e culturalmente retrógrados para desgastar o Governo Federal pode ser uma vitória de Pirro. Serginho Groisman e Jô Soares  estão percebendo isso. E o recente editorial do jornal “Folha de São Paulo” contra o “obscurantismo” do outrora incensado líder da Câmara Eduardo Cunha foi mais um sinal. Para a grande mídia a questão não é apenas política mas trata-se de sua própria sobrevivência diante da tecnologia de convergência que lhe arranca nacos de audiência. Após a vitória final com a terra arrasada, a mídia tradicional encontraria uma nova geração de jovens conectados aos seus dispositivos móveis e Internet e nem um pouco receptivos a uma agenda política baseada no conservadorismo de costumes.

Em 2005, a jornalista Bárbara Gancia percebeu os primeiros sinais de uma tendência de cobertura política da grande mídia que nos anos posteriores só cresceu: a defesa de uma agenda conservadora política e de costumes com uma visão de mundo segregacionista dentro de uma estratégia de vale-tudo para disseminar o ódio contra o Governo Federal e as próprias esquerdas.

“Deu a louca na revista Veja?”, perguntava perplexa a jornalista, ao ver o semanário sair em defesa “histericamente” pela opção do não desarmamento no referendo sobre armas que era realizado naquele momento. “Assino Veja há 20 anos, leio a revista de cabo a rabo e faço parte do grupo que acredita que o governo do PT é um embuste”, afirmava Gancia, sentindo-se traída pelo conservadorismo da Veja que acreditava que andar armado é um direito fundamental do indivíduo.

Em primeira mão a jornalista sentiu a contradição que agora parece ser insustentável para a grande mídia: como ser politicamente conservador e ao mesmo tempo liberal nos costumes?

Após a grande mídia, em um primeiro momento, tentar mobilizar pautas de esquerda contra o Governo Federal para criar situações de desconforto (questão indígena ou causas ecológicas, por exemplo), partiu para o vale-tudo ao aliar-se aos setores político e culturalmente mais retrógrados. 

Desde a guerra da revista Veja em 2005 contra a iniciativa do desarmamento da população como medida da diminuição da violência, a grande mídia mergulhou nas águas mais escuras da sociedade brasileira: o apoio à redução da maioridade penal; o entusiasmo com a vitória de Eduardo Cunha para o comando da Câmara dos Deputados que, junto com evangélicos e ruralistas, dificulta as causa LGBT e a liberalização do aborto;  crescimento da chamada “bancada da bala” no Congresso etc.

A mídia abriu a Caixa de Pandora

O resultado é que uma espécie de Caixa de Pandora foi aberta: o fenômeno da “direita envergonhada” (presente no Brasil por três décadas desde o fim da ditadura militar) desaparece na polarização política estimulada pela mídia, que ganha as ruas no balaio de gatos em que se transformaram as manifestações anti-Dilma – defesas de uma imediata intervenção militar, paranoia anti-comunista (ou “bolivariana”, se quiserem), abaixo-assinados da TFP pelas ruas em defesa de uma suposta ameaça à família brasileira, denúncias sobre as sinistras conspirações de uma “ditadura gay”, a gestação de um “partido militar” ou simplesmente defesas pelo fim de qualquer partido ou sindicato.

O irônico de tudo isso é que os fantasmas libertos da caixa de Pandora se voltam contra a própria mídia que a despertou:

(a) A crise de audiência na novela Babilônia da TV Globo resultante da rejeição de telespectadores e grupos evangélicos motivado pelo beijo de personagens lésbicas em uma atmosfera de intolerância ao liberalismo de costumes;

(b) Novelas esteticamente conservadoras e melodramáticas como Os Dez Mandamentos e Mil e Uma Noites respectivamente das emissoras Record e Band roubam cada vez mais audiência das narrativas mais realistas e liberais da TV Globo;

(c) O reforço diário no telejornalismo da percepção de que o País está à beira do abismo econômico resulta em um tiro no próprio pé com a redução dos próprios patrocinadores.

(d) O telejornalismo monocórdico e de contínuo “baixo astral” com crises, denúncias e ódio faz espectadores jovens migrarem para Internet em busca de informações mais variadas e alternativas.

 

A cobra engole o próprio rabo

Diante dessa conjuntura que poderíamos chamar da “cobra que começa a engolir seu próprio rabo”, comunicadores e veículos começam a tentar se blindar diante de possível consequências do crescimento do conservadorismo com o qual eles próprios um dia se aliaram:

(a) A resposta do apresentador Serginho Groisman à pergunta “pegadinha” no “Domingão do Faustão” onde argumentou que, apesar da crescente polarização política, deve-se respeitar o voto e a Democracia;  

(b) A guinada do apresentador Jô Soares (cujo programa foi, desde a “crise do Mensalão”, um dos veículos da disseminação do ódio anti-PT) que, diante das assustadas “meninas do Jô”, começou a demonstrar indignação contra a “bobagem” do fantasma do bolivarianismo e a sair em defesa do respeito ao voto e críticas a um possível impeachment, culminando com uma entrevista com a presidenta Dilma;

(c) Após o jornal Folha de São Paulo apoiar Eduardo Cunha para a liderança à Câmara dos Deputados e esconder dos leitores a série de inquéritos contra o deputado federal, em editorial recente a Folha denunciou os “abusos” de Cunha num “país de tradições laicas e liberais” que poderiam levar ao “obscurantismo, repressão e preconceitos”.

(d) Após o programa CQC da Band ter embarcado na onda raivosa da mídia em ano eleitoral e ter sofrido críticas nos bastidores da própria produtora argentina dona da franquia (culminando com a saída do apresentador Marcelo Tas), a atração agora tenta desmanchar o mal que produziu: reage a um vídeo produzido por um “hater” (“haters”, pessoas ou grupos que demonstram ódio, racismo ou preconceito nas redes sociais e fóruns) contra haitianos que trabalhavam como frentistas. O irônico é que o vídeo denunciado pelo programa adotava a mesma linguagem que o CQC usou e abusou para intimidar e humilhar personagens social e politicamente mais fracos – sobre isso clique aqui.

 

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

8 Comentários

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  1. Globo: A DITADURA QUE NÃO TEM FIM

    O Globo – jornal dos Marinhos – fez cruel e sistemática oposição a Getúlio Vargas, o que acabaria por levá-lo à morte.

     

    Vargas, o homem que industrializara o Brasil e criara os direitos trabalhistas. um político adorado pelos brasileiros, assim como o Lula, que agora também está sendo exterminado moralmente por essa mesma sinecura nefasta. juntamente com a Presidenta Dilma – bom não esquecermos.

     

    A morte de Getúlio geraria a grave crise que descambou no golpe civil-militar de 1964 que depôs João Goulart e implantou feroz ditadura em nosso país. 

     

    João Goulart, bom não esquecer, um presidente legitimamente eleito pelo povo e seguidor das políticas de Getúlio Vargas. 

     

    Por sua decisiva e cruel colaboração com o alto comando da ditadura, cujas ramificações se estendiam por outros países, sobretudo os Estados Unidos, Roberto Marinho ganhou de mão beijada a TV Globo, uma emissora que, no início, não tinha nenhum cacife para concorrer com a Tupi de Assis Chateaubriand, o poderoso magnata de um império midiático que abarcava 36 jornais, 18 revistas, 36 rádios e 18 emissoras de televisão, além de bater recordes de tiragens com sua principal revista: O Cruzeiro – uma espécie de Veja, embora não tão nefasta.

     

    Para derrubar os concorrentes, engolir quase que a totalidade da verba publicitária em circulação no país, a Globo “importou” dos Estados Unidos os equipamentos mais modernos e sofisticados, ao mesmo tempo em que passou a contratar e manter sob rigoroso (e perpétuo) contrato os artistas mais populares do Brasil, tomando assim na mão grande o monopólio dos eventos mais populares, como futebol, carnaval, novelas, e implantando o JN como a voz oficial da ditadura, a qual passou a louvar e sustentar por mais de duas décadas, ao mesmo tempo em que seu dono se tornava o homem mais rico e poderoso do Brasil (e um dos maiores do mundo), a ponto de conspirar junto ao governo norte-americanos sobre quais generais iriam ocupar o trono, ao mesmo tempo em que escondia do povo toda a crueldade que ocorria nos porões da ditadura.

     

    Agora observem: os militares caíram, porque o povo queria democracia, porém a Globo permanece, mais poderosa que nunca, matando culturalmente o país, fazendo e derrubando governos, conspirando contra o povo, sempre amparada nas mesmas leis arbitrárias que a transformaram nesse verdadeiro império do mal.

     

    Até quando?   

  2. Nao estou escrevendo, pensando!
    Nao veria assim, como complentar.
    A midia, este confronto entre o conservador contra o moderno, na realidade o mundo esta passando por uma guerra, um grande combate e lutando contra si.
    Agora esta acontecendo mais claro no Brasil.
    E esta assustado alguns e uma parcela nao entende o efeito manada, aliais na minha e do LN, tinhamos previsto lah atraz que a crise de 2008 levaria o mundo a guerra e a protectionismo do mercado. Eramos.
    Se fizermos um levantamento e observa a crise como centro na america e espalhando ao mundo, com a guerra final errada no Iraque e a do Afghanistan o deslocamento. Passando pelo ultraconservadores em Israel, e o que o Lula falou ontem dos levantes Arabes, a Europa e depois a crise da Espanha, Irlanda, Portugual e finalmente a Grecia chegamos depois na marola ao Brasil e america latina como tambem a Asia com eleicoes na ilha chinesa.
    Entao vamos ao pensamento.
    Nao houve guerra.
    Nao percebemos, mais sim a humanidade se declarou em guerra contra a imagem e o que se viu de si.
    A luta entre liberdade e avancos virou uma guerra pessoal, humana, religiosa, racista, libertadora de grupos, etc.
    O que se passa aqui, passa na America, no Iraque, na China, na Russia e no mundo.
    Uma guerra local, irmaos contra irmaos, o espaco reduzido, a realidade, ai o Lula esta certo sem utopia nao vale, o retrocesso religioso e racista esta diretamente ligado ao risco e fato da probreza.
    A midia faz parte desta aventura do progresso tecnico do mundo informatizado e com opinioes em tempo real. Eles nao mudaram de opiniao e sim foram atingidos por que nao viram. E sabem que podem perde muito mais.
    O mundo esta em guerra existencial pela crise e em sua crise humana.
    A pobreza humana do seculo.
    A guerra e luta dos homens entre por cada causa um inferno na sua sobrevivencia, a pobreza e o mesmo nao deixam e nao dara tempo para a brutalidade e o irracional se levantar do barbaro humano.
    Esta vivendo o tempo da guerra selvagem humana!
    E viviamos e nao sabiamos.

  3. Sofismas…

    Não espantam as contradições. A grande midia se move ao sabor ao das circunstâncias, conveniências e interesses. A Globo, por exemplo, com seu histeria ela liberdade de expressão e contra a regulamentação, sexualiza precocemente a criançada com a programação, faz a política de exclusão da Casa Grande, e depois, hipocritamente, com arroubos de moralidade, faz novelas, além de reportagens sobre prostituição de menores e turismo sexual no Nordeste. Não parece claro que liberalismo não é mesma coisa que democracia?  Na célebre epigrafe de ‘Saló, os 120 dias de Sodoma’ , Pasolini adverte: “Nós, facistas, somos os únicos e verdadeiros anarquistas. A verdadeira anarquia é a do poder”. Daí não espantar a lógica do “negocio”. Aparentemente ilógico, calcula e joga com o ser e o não-ser no mundo dos valores, não importam os o meios, afim de obter vantagens. Se é vitória de Pirro ou não, só uma coisa importa ao ‘ eu e sua propriedade’: dinheiro e poder, custe o que custar.

  4. Excelente post, Wilson. Creio

    Excelente post, Wilson. Creio que voce foi no cerne da questão “ser ou não ser” da mídia atualmente. E foi preciso ao qualificar o governo Dilma como “republicanismo omisso”

  5. Tudo que teve valor de

    Tudo que teve valor de exportação no Brasil foi apropriado pelos colonos e pelos seus descendentes: pau-brasil, açúcar, ouro, café, borracha, manufaturados, grãos e carne. Com FHC eles conseguiram embolsar a riqueza do minério de ferro e das jazidas de outros minerais. A única coisa com valor de exportação que não foi apropriada pela elite branca patrimonialista foi o petróleo. Eles são capazes de assassinar metade da população brasileira para controlar o destino dos 8 trilhões de dólares que estão enterrados no fundo de nosso litoral? Esta, meus caros, é a única pergunta que vale a pena ser feita e respondida neste momento. 

  6. A GUERRA MIDIÁTICA PARA CONTENÇÃO CEREBRAL DAS MASSAS

    Estamos a testemunhar o advento da guerra midiática, não como substituto das carnificinas tradicionais que desovam armamentos em larga escala e geram lucros descomunais à indústria bélica multinacional, mas como estratégia de contenção cerebral das massas. 

    Continua-se a fomentar a matança em escala progressiva, até como forma de controle demográfico, ao mesmo tempo em que se destruirá fisicamente os países mais fracos, para que gigantescas corporações assumam a restauração do espólio devastando, gerando assim mais bilhões aos controladores das bolsas de valores espalhadas pelo mundo.

    Sempre com foco nas riquezas naturais dos países conquistados, evidentemente: petróleo e outros minérios mais nobres.

    Na cobertura, claro, o poderoso exército despido de metralhadoras mas devidamente protegido em bunkers midiáticos, de onde disseminam ódio aos governantes que ousem resistir ao avanço, e idiotizam os povos.  

  7. Confuso

    Um texto confuso, que repete a ladainha dos esteriótipos do conservador retrógrado preconceituoso, e do liberal progressista mente aberta. Que falta faz o preparo intelectual! 

  8. VELÓRIO

    .

     

     

    VELÓRIO

    Vejo pessoas alegres
    Ao lado de um caixão
    Com celulares e tablets
    Em suas ágeis mãos
    E no interior do féretro
    Vários mortos gélidos
    Atraindo os olhares
    Daqueles curiosos
    Que fotografam o velório
    Com os seus celulares.

    Entre os mortos encontro
    Muitos livros de papel 
    E vinis bem redondos
    Que já tocaram Gardel
    E várias máquinas de escrever
    Que morreram antes de nascer
    O avanço tecnológico 
    E uma porção de canetas
    Mortinhas com suas tintas secas
    Bem como relógios analógicos. 

    Morreram os jornais
    Que eram impressos
    E as revistas semanais
    Morreram sem sucesso
    A TV teve morte súbita
    E apesar da música
    Morreram o rádio e a fita cassete
    E quando alguém perguntou:
    Quem foi que os matou?
    Um blogueiro disse: A Internet.

    Eduardo de Paula Barreto

     

     

    .

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