Maira Vasconcelos
Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).
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Insetos do Mundo, a-crônica de Maíra Vasconcelos

Confundida pelos rumos da escrita, devolvo agora este recado a uma amiga leitora. Beth telefonou-me às 7h30 da manhã, e transpôs em poucas palavras aquilo que apenas vindo de outros somos capazes de perceber. Pois imersos no que vem de nós mesmos padecemos disso que chamaria de: autodespiste, estado subconsciente sobre onde estamos e como atuamos. Então, enxerguei-me nova e outra, porém sendo esta mesma que sou no atuar de dada realidade, quando Beth afirmou: tens tu um desafio grande, mas angariar leitores é algo mágico. O que ela falou clarificou-me: esse é um recado amigo a ser esquecido. Mesmo sendo este dizer muito amigo, não o escutei amigável. Porque sou incapaz de trabalhar palavras pensando no mundo-leitores, pensando em escritos fora de casa que soariam num tom de recepção bem-vindos e desejados. Para isso teriam minhas palavras que serem queridas, e celebrantes, e corridas num entendimento de voo rasante mantenedoras de pessoas interagidas e cooptadas. Mas ninguém quer atirar-se do precipício e sentir que o retorno é um talvez. E às vezes minhas palavras são assim escuras e claras, dúbias, precisadas do sacrifício de enrosque dentro de quem as lê, e o que não se compreende logo é rejeitado, mas não vejo outra coisa que o mundo falsamente vivo entregando-se a morrer diariamente. As procuras do mundo estão dormidas e repetidas e não renovadas. Perdeu-se a curiosidade como motor. Para vibrar. Acordar e estar alerta, isso, esse é meu padrão de vida, por isso como fazer da escrita um desejo, logo torná-la objeto, e ter enfim meus-leitores? Se não dou pulo fora de, do meu eu aporrinhado falando para querer existir. Porque sinto, por vezes, não existo e escrevo como afirmação de ser, fugindo do mundo comedor das partes de mim, da minha alegria, da alegoria, e da alienação para sorrir. Escrevo rejeitando ser achatada pelo mundo, pela sua avareza e pelo bichinho pequenininho que ele é. Até mesmo sonhei a humanidade reconhecendo-se em sua forma minúscula de bicho em patas finas marrons e cinzas, e quando acordei estava feliz, porque esse bichinho não tinha aparências, nem frívolas necessidades, sendo apenas um inseto caminhando buscando a direção daquilo que refletisse produzir, comer e respirar. O mundo era um inseto alçando seu crescer! Então pode ser essa a mágica mencionada pela minha amiga, a mágica daqueles que conseguem escrever e reunir leitores está na delicadeza e simplicidade das palavras que transformam a realidade do mundo num inseto feliz e sorridente. Isso que até este momento foi apenas um sonho, se nada escrevi sobre a vida do mundo-inseto-alegre. Mas espere minha amiga, a mágica poderá vir a se abater sobre meu escrever, e espero poder compartilhá-la, sem guardar todinha para mim a delícia de ver um insetinho desenvolvendo-se na alegria.

Maira Vasconcelos

Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).

1 Comentário

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  1. Tem horas que tenho mesmo é

    Tem horas que tenho mesmo é vontade de pegar um avião, bater na sua porta, sentar na sua sala e por lá ficar até dormirmos de tanto falar. Como adoro essas a-crônicas, o único problema é que quando paro para lê-las, meu mundo inteiro atrasa porque quero ler mais e mais. Sempre senti necessidade de escrever, desde criança. Não durmo bem se ao meu lado não tiver um caderno com folhas em branco e uma caneta. Na verdade, não me sinto completa sem esses artefatos por perto. Mas sabe, com o tempo, percebi que eram escritos não feitos para mim. São escritos feitos por mim para o mundo. E não uma multidão, mas se pelo menos uma pessoa, que já é um mundo em si, sente que o que escrevi faz sentido para ela, minha alegria é completa. Essa é a mágica mais incrível que já experimentei. Para alcançá-la, no entanto, preciso perder a vergonha, desnudar-me por completo, encarar os mais perversos medos. Assim, a cada sábado te admiro um tanto mais e a saudades só aperta!

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